Depois da Escuridão escrita por Lucas Alves Serjento


Capítulo 20
Capítulo 20 - O Que as Trevas Querem




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N/A: Estou repostando a história para corrigir a gramática e fazer leves alterações para tornar a história mais agradável de ler. Espero que gostem.

 

Capítulo 20 – O que as trevas querem.

 

Hatake Kakashi

Durante toda a minha vida eu nunca corri tão desesperadamente. Nunca disfarcei minha presença com tanto cuidado e esperança. Minha respiração é imperceptível, mas eu sinto meu peito inflar rápido e desesperado.

Eu consegui? Fiz valer o esforço de Ino para me colocar do lado de fora?

O Uchiha não sabia que eu estava familiarizado com a viagem interdimensional. Usuários de técnicas visuais tinham o péssimo hábito de usar esse tipo de transporte. Aos poucos, aprendi a me movimentar durante o transporte, desvencilhando das amarras que me prendiam ao dono original da técnica. Foi falha dele não ter transportado também a cadeira e aquelas cordas que me enfraqueciam. O meu teletransporte deve ter se concluído alguns metros de distância do ponto onde ele queria me levar.

Agora, sem as amarras, corria com o pouco chackra que meu corpo produzia, na direção do local onde sentira a Kyuubi pela última vez, com a esperança de encontrar Naruto por lá. Precisávamos resgatar Ino, que se sacrificara para me salvar.

Aos poucos, o chackra voltava a mim. Mesmo tendo me especializado em recuperação, sabia que demoraria até conseguir lutar novamente.

Ao longe, os rugidos da Kyuubi pararam. Estavam, até então, incessantes e furiosos. Um último e mais alto berro chamou a minha atenção. Desesperado para saber o que acontecera, aumentei minha velocidade ao máximo.

O portão principal da vila estava próximo. Eu pretendia cruzar a estrada principal e pegar um caminho em linha reta ate o local onde pensava que Naruto estaria. Estava firme nesse intento quando um som baixo pouco à frente me fez parar. Aumentei minha guarda, ressabiado. Concentrei-me, atento para algum som à frente.

Passos. Alguém andando. Mais de uma pessoa. Um grupo grande, a caminho do portão principal. Alguém que visita a vila? Eram passos despreocupados, de alguém que estava visitando por hobby. Um pouco mais tranquilo, avancei pela floresta, ainda cuidadoso para não ser notado. Encontrei-me sobre uma árvore camuflada a pouca distância, enxergando-o ao longe.

—Então. Gen. Qual o plano? – Conforme eles se aproximavam, as vozes se distinguiam melhor. Notei que era uma garota à frente quem falava, guiando o grupo ao lado de um rapaz que seguia paralelo a ela.

—O pai mudou de ideia. A nova irmã cuidará do recipiente principal e nós devemos nos identificar como ajuda para Konoha e ficar lá.

Não entendi o que eles queriam dizer. A interpretação mais simples era que se tratava de um grupo shinobi indo a Konoha como ajuda contra a Kyuubi. Da árvore, vi o garoto virar seu rosto para o lado oposto àquele onde eu estava. Como se sentisse algo. Pensei por um instante, indagando se sentira a minha presença de alguma forma. Ele abriu a boca, se dirigindo a algum ponto entre a mata.

—Você parece ter recebido a mesma ordem.

—Olá, Mamori. – Cumprimentou a garota que o acompanhava.

Dentre as árvores saiu uma garota, seguida por uma multidão. Mesmo em uma distância segura, pude sentir a pressão da massa de chackra que eles emanavam agora que não se escondiam mais.

—Eu e todos os outros. – Ela respondeu. – Parece que nosso pai que reunir o máximo de pessoas possível dentro de Konoha enquanto resolve os problemas internos. Ele nos encontrará no portão principal da vila e nos liderará a partir de lá para seguirmos com o planejamento.

Pai. Quem era aquela pessoa? O líder deles?

—A irmã vai conseguir se controlar? – Gen, que permanecera à frente, parecia preocupado com alguém. Eles continuaram marchando casualmente na direção do portão. O exército às costas deles mantinha a postura. Parecia cansativo para eles, já que tinham de acompanhar um ritmo lento, mantendo uma postura rígida e sustentando o peso de um equipamento pesado.

—Não sei. Enviaram Gahel para ajudá-la a se controlar. Se ele não conseguir, duvido que alguém mais consiga. Espero que tudo-

Ela parou a frase no meio. Estreitei meus olhos e agucei os ouvidos. Apesar de ainda andar normalmente, ela percebera algo.

Mamori virou seu rosto na minha direção. Apesar de saber que ela não me via, foi como se seus olhos vissem até a minha alma. Eu me mantive confiante de que estava suficientemente coberto por vegetação e pelo terreno favorável. “Impossível” Eu pensei. “Até mesmo para Naruto seria necessária muita concentração e esforço para me localizar a essa distância.” Confiei cegamente na minha experiência como rastreador e Anbu. Procurei em meus bolsos e encontrei a máscara enroscada em meu bolso. Tenzo não se dera ao trabalho de retirá-la enquanto me golpeava. Coloquei-a em meu rosto.

—Algum problema? – Gen perguntou a ela.

Era isso. Apesar de não aparentar, a kunoichi estivera atenta e se esforçando. Agora, um pouco mais calmo, pude perceber seu fluxo de chackra agitado.

—A guarda de Konoha está na floresta. – A voz dela estava serena. Mas, a julgar pela veia em sua testa, Gen também compreenderia que aquela frase não seria motivo para relaxar.

—Acho que é melhor pararmos de conversar sobre nós. – Gen sorria, mas a dissimulação era perceptível. – E começarmos a falar bem de Konoha. Não queremos fazer inimigos, não é mesmo?

Mamori e a outra garota sorriram. A encenação era quase convincente, mas meu instinto já não me permitia vê-los como aliados. Gravei seus rostos, atento para futuros encontros e, devagar, voltei a procurar Naruto. Tinha que resolver os problemas que começavam a se empilhar por ali.

Uzumaki Naruto

O silêncio era impressionante. Eu andava no ritmo lento que conseguia manter, buscando forças para chegar ao portão da vila e tentando cancelar o sharingan, que se recusava a “desligar”.

Colocara meu casaco novamente e senti certa sensação de alívio, apesar de meu corpo enfraquecer. Embora me mantivesse em pé, cada membro implorava por descanso.

—Olá Naruto.

Aquele tom de voz. De novo. Impossível de não reconhecer.

—Sakura? – A falta de força era tamanha que não consegui me virar para olhá-la.

—Não. Sakura é a detentora original desse corpo. Eu sou Nail. Meu pai me deu essa casca como morada temporária.

A garota andou em círculo ao meu redor até ficar à minha frente. Eu ainda tentava entender o que ela estava dizendo.

—E onde está Sakura?

—Aqui. Esse corpo é o mesmo corpo, não uma cópia. Eu só tomei o controle.

Inspirar. Expirar. Devagar. Inspirar. Expirar. Pensar. O que está acontecendo?

—Tomou o controle? Desde quando?

Ela ria um riso cínico.

—Acreditou mesmo que essa garota faria todas aquelas coisas com você? Eu estive aqui por algum tempo e sei do passado desse cérebro. – Ela tocou a própria cabeça. – Você acha que mesmo te odiando e amando outra pessoa ela seria capaz de fazer tudo o que fez?

Sakura riu fortemente. Gargalhadas que me permitiram ver que todas as veias de seu corpo pareciam forçadas ao máximo.

—Ela sofreu. – Ela disse e meu coração foi espremido por essas palavras. Ainda doía pensar em Sakura sofrendo. – Enquanto eu via você ser destruído por simples palavras, ela também se sentia destruir. Acredite. Eu também pude sentir. E ela não pôde fazer nada.

Meus olhos se estreitaram com a raiva. Procurei algum resquício de chackra em meu corpo. Não encontrei quase nada. Ainda assim, não afastei a ideia de lutar. Porque era a minha chance de encarar o passado. E eu precisava fazer alguma coisa.

 

Haruno Sakura

Eu sou Sakura Haruno. Não sou Nail. Eu sou Sakura Haruno. Não o Bijuu. Não parte dele. Esse corpo é meu, e não desse ser. Meu. Eu sou Sakura Haruno.

Minha mão enfim estava sob meu controle. Meu braço ainda era controlado pelo Bijuu, mas enquanto ele conversava com Naruto sobre coisas que eu evitava lembrar, pude perceber que minha mão e meu pulso eram meus novamente.

A sensação de conquista que tive ali foi imensa. Reconfortante. Uma vitória em meio a tantas derrotas recentes. Sorri internamente, pensando que talvez, apenas talvez, eu….

Dor.

Aos poucos, imperceptível de início e depois mais intensa, uma dor se espalhou pelo meu corpo. Como se forçasse meus músculos ao máximo. Senti minhas veias saltarem e os músculos enrijecerem.

“O que-!” Eu pensei. O Bijuu não respondeu a dúvida, conversando ainda com Naruto.

Eu queria me curvar, encolher meu corpo, buscar uma maneira de fazer a dor parar. Mas o Bijuu não parecia sentir nada, porque continuava conversando.

—Está na hora. – Ela falou. Eu falei. Minha mão fez um selo. Naruto se colocou em guarda. – Se prepare para rever Sakura. Kai!

No início, não entendi porque ela fez aquilo. Afinal, aquele era um gesto para liberar algo. E a única coisa que esse corpo estava prendendo….

—Sakura?

—Naruto? – Perguntei ao perceber que algo estranho ocorrera. Naruto me olhava com um rosto estranho. Como se eu tivesse mudado de alguma maneira.

Só então me dei conta de que conseguira articular uma palavra. Logo em seguida, notei também que minhas pernas eram minhas novamente. Surpresa, abri um sorriso imenso. Ou ao menos tentei fazê-lo quando senti que meu corpo queria explodir.

Meus músculos. Eles estavam esticados antes, agora pareciam se romper. Minhas veias, que antes saltaram, pareceram esticar até o ponto de ruptura. Minhas costelas quebraram e minhas costas torceram para trás. Minha barriga se esticou para frente.

Dor.

O grito que me veio à boca foi estrangulado pela quantidade de chackra e sangue que eu vomitei. Meus olhos saltaram das órbitas e meu corpo inteiro desfaleceu. Naruto se aproximou, berrando desesperado, tentando me manter em pé.

Minha barriga doía e toda a carne esticava. Senti lágrimas de sangue escorrer por meus olhos. Eu não conseguiria gritar porque me faltavam forças. Minhas mãos e braços se torciam para trás. Todo meu tronco teve um ataque incessante de espasmos que eu fui incapaz de deter. Meus olhos arregalados eram incapazes de focalizar em algo. A dor. Ela não parava. Eu vomitava chackra e sangue.

Dor.

Um formigamento subiu por meus pés, dominando meu corpo e eu me percebi deitada nos braços de Naruto, que apoiava minha cabeça um pouco acima do resto, impedindo que eu afogasse no meu próprio sangue.

Por um momento, o sangue e o chackra pararam de sair. Meu corpo se torcia e revirava nos braços dele. Algo me puxou pela espinha e eu senti como se tudo dentro de mim rompesse.

Eu berrei.

Um berro de desalento. Triste. Minha barriga abria de dentro para fora.

Naruto, desesperado, ameaçou largar minha cabeça para socorrer meu tronco que se rompia. Assustada, joguei sobre ele um dos braços, obrigando-o a permanecer como estava. Apesar da dor, eu compreendia que ele não teria tempo de tentar algo. Abri minha boca. Primeiro só consegui tremer os lábios. Ele se aproximou de meu rosto. Eu gemi de dores. Abri os lábios novamente. Ele estava com o ouvido encostado na minha boca. Com muito esforço, consegui balbuciar:

—Me desculpe.

Meus olhos lacrimejavam. Eu não sabia se a maior das dores era a física ou a perda de uma vida que eu não teria.

O céu acima de nós se confundia com os olhos azuis de Naruto. Eu o encarava lânguida e entregue ao destino, pensando no passado. Apesar dele não ter sido o amor da minha vida, achei-me na inusitada posição de considerar, à beira da morte, se eu amava mais a ele ou a Sai. Será que esse tempo todo eu estive fugindo? Pensando que tinha que vê-lo somente como amigo?

O céu acima de nós e os olhos azuis de Naruto. Uma gota que despenca do azul e cai sobre meu rosto.

—Me desculpe também. Sakura. Por não ter descoberto antes.

Isso. Eu não sou um Bijuu. Não sou Nail. Sou Sakura. Kunoichi de Konoha. Eu sou Sakura Haruno.

Não tenho mais tempo de pensar sobre mim, sobre Naruto ou Sai. Droga. Queria ter mais tempo. Queria….

A dor. Eu sinto o corpo enrijecer. O sangue ainda sai.

Não importa. Eu sou eu novamente.

Sorrio. Um sorriso eterno. Um sorriso que eu queria que ficasse na memória de todos. Para que tivessem de mim como última lembrança. Para que soubessem quem eu era de verdade e não se deixassem enganar por quem eu fui recentemente.

Eu sou Sakura Haruno.

 

Uzumaki Naruto

Sakura estava em meus braços. Seu corpo, ou o que restou dele, estava destruído. No local onde deveria estar seu estômago, rim, fígado, intestino delgado, costelas e os outros órgãos, restavam apenas alguns restos de carne e muito sangue. Sangue e tecidos e fluídos que banhavam a mim e o chão à nossa volta.

Eu sabia que Kakashi estava próximo. À beira da clareira ele nos olhava. Vira quase tudo e agora estava olhando para mim e para ela, com lágrimas molhando seu rosto. Ele estava sem sua bandana.

Ela estava inconsciente em meus braços há alguns segundos. Enquanto a segurava eu tentava não entrar em pânico. O sorriso em seu rosto era pálido, preso naquele rosto amarelado pela falta de sangue.

Repousei seu corpo com todo o cuidado possível e me levantei, olhando o centro da clareira onde estávamos. Todo o chackra que saíra do ventre e da boca de Sakura agora flutuava à frente, formando estranhos desenhos no ar.

—Parece que só tem ela de garota por aqui. – Procurei a origem do som, mas notei que apenas Kakashi estava ali. Não era ele falando. – Uma pena. Eu já estava enjoada dessa forma.

O torpor que tomava o meu corpo naquele momento fez com que o fato da massa de chackra ser capaz de articular sons fosse menos espetacular. E, da mesma maneira, não consegui me abalar muito ao perceber que ela estava tomando o formato e tamanho de um ser humano. Ela adquiriu uma silhueta, sua coloração se modificou e ela começou a se assemelhar cada vez a Sakura, tanto em roupas quanto na aparência física.

—O que é você? – Kakashi estava impressionado.

—A partir de agora, eu sou Sakura Haruno. – Ela respondeu com a transformação já no fim. – Mas vocês que sabem da verdade podem me chamar de Nail. Será o nosso segredinho. – Ela tocou a ponta de seu nariz com o dedo indicador.

—Pare de se aparecer. – Outra voz me surpreendeu. Olhei para a esquerda e notei um homem adentrando a clareira. Quando notei que sua aproximação passara despercebida por mim, ficou evidente que minhas forças estavam no fim. Afinal, ele carregava uma quantidade monstruosa de chackra. Em uma ocasião normal, eu o teria pressentido a quilômetros.

—Gahel! – Nail estava feliz. – Veja! Estou livre!

Meu corpo já não me obedecia. Estava tão franco que, só de olhar para os dois e sentir suas forças, meus membros paralisavam.

—O que vocês fizeram? – Meu tom de ódio não representava perigo algum para eles. Era evidente a falta de força, física e psicológica. Eu nunca estive tão vulnerável antes.

Nail me encarava, com o rosto de Sakura.

—Vocês não devem contar a ninguém o que aconteceu aqui. – O tom feliz de antes sumira. – Caso contrário, vamos fazer muito pior que aquilo com seus outros amiguinhos. – Ela apontava para Sakura. Voltou-se então para Kakashi. – Fui clara?

—Cale a boca. – Apesar da falta de forças, eu não a deixaria ameaçar mais ninguém.

Gahel deu um passo à frente.

—Você não está em condições de ameaçar ninguém, Naruto.

—É Uzumaki para vocês. – Minha voz estava rouca. – Gravem esse sobrenome. Eu sou o filho de Minato Namikaze e Kushina Uzumaki. Sou aquele que vai dar fim ao seu futuro.

—Espero que não. – Gahel sorria de canto. – Espero também não ter que te matar. Não gosto de sujar as mãos.

—Se quiser, eu mato ele. – Nail sugeriu em silêncio um pouco atrás. Kakashi deu um passo à frente, aproximando um pouco mais de mim. – Gosto do cheiro que o sangue quente deixa nas mãos. – Ela sorriu para mim, tentando me irritar. Admito que, se minhas pernas obedecessem, eu teria avançado em um ataque suicida.

—Deixe ele. – Gahel falou, dando-nos as costas e saindo da clareira em direção à floresta. – Não esqueça que ele tem algo que precisamos. E o amigo pode ser um inconveniente com o qual não precisamos lidar agora.

—Não podemos capturar? – Ela perguntou, correndo atrás dele.

Gahel soltou uma gargalhada. Eu senti um arrepio advindo do som daquele riso maligno.

—Se fizermos isso, como ele vai evoluir?

Nail passou por nós e foi atrás do companheiro. Kakashi esperou que eles estivessem distantes para ir até Sakura. Eu sabia que não era por esperança. Kakashi era esperto demais para isso.

—Ponha sua máscara. – Ele ordenou depois de parar o sangramento de uma forma mais ou menos limpa e arrumar a parte destruída do corpo para que ficasse suportável do ponto de vista exterior.

—Para quê? – Meu cérebro estava confuso e eu não entendia o que se passava.

—Vamos voltar para Konoha. – Ele sustentava Sakura com uma mão e colocava sua máscara com a outra.

Teríamos que ir devagar. Não havia motivo para pressa e eu estava tão exausto que, se tentasse forçar mais, Kakashi teria que me carregar também.

 

Senju Tsunade

—Tsunade-sama! – Olhei para o lado e vi Shizune entrando pela sala, olhando para a minha cadeira.

Eu voltara para o escritório depois que os rastros da Kyuubi sumiram e dera ordens à Shizune e Shikamaru para que reorganizassem os shinobis. Queria esperar Naruto, Kakashi e Ino sozinha em minha sala. Teríamos que pensar em uma estratégia para reintegrá-los à vila agora que a raposa fora destruída.

—Eu não disse para não entrar aqui e proibir consultas? – Perguntei indignada.

—É uma emergência. – Ela estava se esforçando para conter o nervosismo.

—O que é?

—Kougumaru está na vila.

Aquele nome significava muito mais que apenas uma pessoa. Kougumaru é um homem extremamente influente e eu não me refiro a uma influência comum. Apesar de não possuir controle político expresso sobre nenhuma vila ou reino, ele é o único descendente vivo da família mais rica do continente. Passou sua vida investindo sabiamente em diversos ramos e seu passatempo era emprestar (dar) dinheiro para os países com vilas ninja, além de investir nelas enquanto estavam em fase de crescimento. Graças a isso, tem direitos muito maiores que qualquer outra pessoa comum e uma influência política invejável. Ninguém entende como ele ainda está vivo. Dizem que ele esconde seu rosto porque não quer demonstrar a velhice, que seria um sinal de fraqueza. Vive seguido e guiado por um grupo de jovens adotados que o chamam de “pai”. Generoso, influente, amigo dos líderes das principais vilas, considerado membro do conselho de anciãos do continente e rico. É considerado “intocável”.

E, mesmo assim, eu não entendi porque ele viera a Konoha, já que nunca entrara em contato direto com as vilas ninjas, preferindo manter relações estritamente com os países aos quais estávamos vinculados.

O público só podia reconhecê-lo graças a uma marca que adotara durante a juventude. Segundo ele, quando chegasse o momento de escolher um substituto, essa marca seria passada adiante. Era um delta de cabeça para baixo, cravado em seu pescoço como numa tatuagem.

—O que ele está fazendo aqui? – Perguntei.

—Não sei. Ele chegou de repente, com um exército no portão, dizendo vir em paz. Perguntei o que queriam. Ele se identificou e pediu que o trouxesse até você.

Ótimo. Como se eu pudesse fazer algo em relação a isso.

—Ele está acompanhado?

—Sim. Dois jovens que dizem sempre estar com ele.

Suspirei.

—Traga-o. Venha com ele. Não quero ficar sozinha com três desconhecidos.

Ela acenou um “sim” com a cabeça e passou pela porta. Fiquei só por uns instantes, pensando sobre o que estava acontecendo. Antes, entretanto, que pudesse formular qualquer pensamento, Shizune abriu a porta e passou por ela, seguida por um garoto. Atrás dele, guiado pela mão do jovem em seu ombro, veio um homem. Não pude definir sua idade porque a cabeça e pescoço estavam completamente cobertos por faixas. Seu rosto era coberto também por uma máscara sem qualquer vão para os olhos. A única área descoberta era uma região do pescoço que exibia o triângulo de cabeça para baixo. O restante do corpo era coberto por um longo quimono. Até mesmo suas mãos eram cobertas pelas mangas da roupa.

Por último, atrás dele vinha uma garota.

—Seja bem-vindo, Kougumaru. – Cumprimentei à distância, fazendo uma pequena reverência mesmo sabendo que ele não a veria. – É uma honra recebê-lo.

Ele retribuiu o cumprimento com uma reverência. Os jovens imitaram o gesto.

—O prazer é meu, Godaime. – A menção à minha posição social na vila era sinal de que estava interessado nela. – Permita-me apresentar meus dois filhos. A garota se chama Mamori e o garoto se chama Gen. Se você permitir eu gostaria que eles continuassem aqui para o caso de surgir alguma necessidade por conta da minha idade. Ambos são de muita ajuda para mim.

Eu não o obrigaria a ficar sem os jovens. Enquanto me sentava, eles ajudavam o senhor a sentar sobre a cadeira que ficava à minha frente, colocando-se em pé aos lados dele em seguida.

—Eles podem ficar. – Mantive o meu tom tão casual quanto possível. Não era minha intenção dar a entender que não gostaria que ficassem. – Eu também gostaria de deixar uma assistente minha conosco, para o caso de precisarmos de ajuda.

Ele acenou rapidamente com a cabeça em concordância.

—Tsunade, eu gostaria de resolver um assunto o mais rápido possível, então se você não se importar, eu irei direto ao assunto, está bem?

—Sim.

—Recentemente, foram espalhados rumos e avisos de Danzou sobre a possibilidade de Naruto Uzumaki ter se tornado um fugitivo. Essa informação é verdadeira?

Eu queria suspirar, mas não podia demonstrar fraqueza.

—Sim. Naruto foi considerado fugitivo.

—É também verdade que Danzou morreu há algum tempo, enquanto Naruto estava foragido?

Um assunto frágil. E, novamente, alguém fazia com que a corda arrebentasse do lado de Naruto.

—Sim. É verdade. – Esperei que continuasse.

—É verdade também que ele liberou a raposa de nove caudas? Um rumor tão forte que me fez mobilizar meus exércitos para ajudar?

Esse era o motivo do exército. Eu precisava intervir a favor de Naruto.

—É verdade, da mesma maneira que, segundo estou informada, ele foi o responsável pela derrota da raposa.

—Mas você não tem uma fonte que possa confirmar isso? Uma fonte confiável, eu digo.

Mordi o lábio inferior, olhando para Shizune. Eu sabia que Naruto era inocente apenas porque confiava nele. Para quem visse de fora, seria fácil culpá-lo e dizer que Ino e Kakashi eram seus cúmplices.

—Se não foi Naruto, quem teria matado a raposa? – Perguntei.

—Enviei dois dos meus filhos até onde a raposa estava. Gahel e Nail. Gahel certamente virá me informar o ocorrido. Eles devem ter sido o suficiente para cuidar dela. Eu os trouxe sabendo disso. E, ainda que não fossem eu trouxe o meu exército porque sabia que seria necessária toda a ajuda possível.

Estreitei meus olhos. Não esperava que seus filhos fossem tão fortes. Eu escutara boatos sobre Kougumaru criar shinobis para servir como soldados e guardas, mas não fazia ideia que ele confiava em sua força a ponto de enviar somente dois para enfrentar um Bijuu.

—Godaime, com a sua aprovação, gostaria de colocar todos na vila a postos. Naruto deve ser considerado um perigo e um pronunciamento será o bastante para que todos entendam que ele é o principal inimigo da vila nesse momento. Assim como qualquer um que o ajudar.

Se eu tinha algo para dizer a favor de Naruto, teria que ser agora.

—Não existe nenhuma prova definitiva contra ele. Não podemos acusá-lo por algo que não temos certeza que fez.

—Mas se não tornar essa suspeita pública, a opinião pública vai achar que você não faz ideia de quem é o culpado e que a vila não tem controle sobre a situação.

—Os moradores sabem que a vila tem seus segredos.

—Mas morador nenhum admitiria um segredo capaz de trazer de volta a ameaça da Kyuubi.

Meio minuto depois nós ainda estávamos em silêncio. Eu procurava uma resposta para o que ele dissera e percebi o quanto ele era um homem paciente. Esperou bastante antes de continuar.

—Essa situação já não envolve apenas Konoha. – Outro sinal. Queria dizer que eu não tinha autoridade suficiente para controlar a situação. – Naruto se tornou uma ameaça grande demais para a ordem e o poder dele é forte o suficiente para executar um golpe sem precedentes. Você deve imaginar que eu não vim para essa vila com um exército somente para conversar.

O filho dele entendeu a frase como um sinal para se adiantar e estender um papel para mim, enquanto Kougumaru continuava falando.

—Se quiser, pode verificar a autenticidade do documento. Enquanto isso, tudo o que está ordenado deve ser cumprido imediatamente.

Eu analisava o selo da correspondência. Era o selo dos cinco senhores feudais. Um selo usado apenas quando os cinco se reuniam. Coisa séria.

Rompi o selo e abri o envelope.

 

*

31ª Reunião dos Senhores Feudais dos Cinco Grandes Países

Carta à Senju Tsunade, Neta de Senju Hashirama, Godaime Hokage de Konoha.

Os senhores feudais fazem saber, por intermédio da presente, em relação à Vila da Folha, a sua vontade.

Enquanto Naruto Uzumaki estiver foragido, as seguintes ordens deverão ser cumpridas:

Kougumaru será a nova figura líder da vila e ficará encarregado pela comunicação com a população;

Tsunade deterá apenas o poderio militar necessário para restabelecer a ordem, relegando as funções sociais e econômicas de liderança à pessoa de Kougumaru;

Tsunade será colocada em período probatório, sob a vigilância de Kougumaru, que deverá vistoriar todos seus atos militares, em decorrência dos relatos de contato pessoal entre a Hokage e o foragido;

Tanto o foragido quanto aqueles que já coadunaram com o mesmo devem ser detidos imediatamente.

TODAS ESSAS ORDENS ENTRAM EM VIGOR IMEDIATAMENTE

Essa é a vontade dos senhores feudais. A vontade dos senhores feudais é a vontade do senhor do fogo. A vontade do senhor do fogo é a vontade do país do fogo. E a vontade do fogo é a vontade de Konoha.

E que a vontade do fogo habite em todos nós

*

 

Senju Tsunade

Abaixo da mensagem estavam cinco selos, com os brasões oficiais dos cinco maiores senhores feudais do continente. Eu não tinha como desconfiar do documento.

—Se você já leu, eu espero que os preparativos para a minha pronunciação fiquem prontos hoje. – Kougumaru disse. – Você poderia cuidar disso?

Ele se levantou. Dei uma longa piscada, com desânimo.

—Claro que posso.

—Ótimo. – Não houve alteração alguma no tom de voz dele. – Nos vemos em quatro horas.

Ele saiu em um minuto, levando seus filhos junto.

—Tsunade-sama? – Era Shizune.

—Verifique a autenticidade do documento. – Entreguei a folha a ela. – Chame Yamato, Iruka e Sai. Mande que venham falar comigo.

—Está bem. – Ela fez uma reverência e foi para a porta.

—Shizune. – Ela se virou, com a mão na maçaneta. – Verifique pessoalmente.

—Eu terei que ficar fora por alguns dias para isso.

—Ainda assim, eu não confiaria isso a outra pessoa. Se o documento for falso, vá atrás de reforço das outras vilas. No que for importante, não confie em ninguém. Até onde sabemos, até mesmo os nossos aliados podem ser uma ameaça.

Ela acenou com a cabeça.

—Boa sorte, Shizune.

A porta se fechou e eu fiquei sozinha com as minhas dúvidas. Eu não sabia em quem confiar ou o que fazer. Mesmo que aquele pronunciamento fosse verdadeiro, eu ainda não saberia se Kougumaru era realmente confiável ou não.

A mim, restava apenas uma ação possível: Reunir todos aqueles em quem eu confiava e esperar pelo melhor.

Fim do Capítulo 20

*


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