Caça e Caçador escrita por Prímera


Capítulo 1
A maldição do elo.


Notas iniciais do capítulo

A todos uma boa leitura :)



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O clima estava sombrio naquela parte do Japão, em um pequeno vilarejo situado a quilômetros de distância da capital. Não fosse pelo conhecimento alheio, de pessoas da redondeza, seria impossível para visitantes como ele achar sua localização em meio a tantas árvores e caminhos estreitos. A neblina somente piorou a visibilidade e aparentemente tornava-se mais densa à medida que se aproximava do vilarejo.

Chegando ao destino, os cavalos trotavam pelas ruas desertas conduzindo a carruagem até o centro onde seria realizada a execução das bruxas. A escassez de pessoas logo quando adentrou foi devidamente explicada assim que desceu da carruagem no local designado. Todos os habitantes estavam presentes, do mais novo ao mais velho, para assistir ao que seria o ultimo dia de vida daquelas mulheres.

O belo jovem abria caminho pelos moradores até o palanque de madeira, montado somente para aquele proposito. Pelo visto foi o ultimo a chegar e logo se juntou aos seus companheiros.

– Você demorou, Shaoran. – Afirmou o mais alto dos rapazes com a aproximação do amigo.

– Tive problemas com os sócios da família na venda das ações. – Disse juntamente a um suspiro pesaroso. Seus olhos acompanhavam duas mulheres sendo escoltadas até a guilhotina – Vejo que a dificuldade não foi tão grande quanto pensei que seria, mesmo elas estando no nível oito de penas.

– Embora tenham deixado alguns hematomas nele. – Como exemplo ao que acabou de falar, Fay empurrou o indicador no braço de Kurogane mostrando a parte afetada.

Num sobressalto, Kurogane afastou-se do loiro segurando o braço, praguejando. – Fui pego desprevenido. E outra, estou poupando esforços para meu encontro com Tsubasa.

– Tsubasa? – Indagou Shaoran, franzindo o cenho. – Fala da lenda sobre a bruxa primordial com uma magia tão poderosa que chegou ao nível máximo de quatorze penas?

– E lá vamos nós. – Fay revirou os claros olhos azuis, enquanto seu amigo prosseguia empolgado.

– Tenho a certeza de que ela está neste momento em qualquer lugar, bem escondida, sugando a energia de pessoas inocentes com suas asas infernais...

Um sorriso desconcertado saiu dos lábios de Shaoran. – Não acha que se ela realmente existisse, em todos esses anos como caçadores, a teríamos encontrado assim como elas. – Apontou para frente, onde o julgamento estava sendo efetuado. – E mesmo que estivesse se escondendo entre bruxas de menor poder, algo escaparia e chegaria aos nossos ouvidos.

– Tenho que admitir, Shaoran está certo! Somos os melhores e mais experientes trackers do norte ao sul do planeta. Viajamos pelo mundo procurando e eliminando esses seres devoradores de almas humanas. Algo conseguiríamos, ao invés do mesmo conto para crianças dormirem.

– Do que me chamou?

O barulho do corte atraiu a atenção dos caçadores. Shaoran voltou-se para o palanque onde uma das bruxas já havia sido decapitada e a outra era empurrada na direção da guilhotina. Em meio ao caminho, a desgasta mulher de negros cabelos lisos emaranhados parou encarando os olhos castanhos do jovem rapaz.

Seu semblante mudou, passando de um desolado para surpreso. A bruxa ficou estagnada por cerca de instantes, lutando contra as puxadas grosseiras de seu carrasco. Por fim, soltou uma gargalhada forçada pela falta de energia e sem qualquer resquício de humor, e apontou os dedos trêmulos em direção a Shaoran.

– Se arrependerá amargamente pelo que faz... – A próxima sequencia de palavras foram ditas de olhos fechados, como que se deliciando com alguma imagem mentalizada. – Nos meus sonhos pude ver, serás traído pelo teu próprio coração. De caçador, passarás a ser a caça. Todos os teus sonhos, desejos e conceitos girarão em torno dela, e tudo somente por defende-la...

Fora algo tão inesperado, que a princípio o chinês ficou sem reação, assimilando cada palavra. As bruxas também eram conhecidas por suas previsões através dos sonhos, o que não acontecia com frequência, ou captura-las seria uma missão impossível.

– Ficarás do nosso lado, do lado de Tsubas...

– Que asneira!! – Interrompeu aos gritos, cortando o ar na diagonal com a mão num gesto que indicava basta, surpreendendo até os amigos que raramente o viam alterado. – Nunca ficarei do lado inimigo! Tenho bons motivos para exterminá-las.

A morte de seu pai passou como um flash, durando frações de segundos na mente, mas o suficiente para lhe trazer amargas lembranças do passado. Motivo considerável para que sua tolerância chegasse ao extremo do limite.

– E você... – Se dirigiu para o carrasco. – O que espera? Mate-a!! – Rosnou furioso.

– Shaoran... – Chamou Fay, tocando seu ombro.

Respirando fundo, se demorou fitando o chão, impaciente, para somente depois de controlado seus ressentimentos responder o amigo com um aceno positivo de cabeça e receber um sorriso condescendente em troca.

(...)

O sol nascia em meio ao horizonte. Por trás dos montes que rodeavam o centro de Tóquio, raios quentes aqueciam a cidadela que tão cedo já se encontrava movimentada.

Após um dia e meio de viagem, a carruagem com os três amigos parou frente à entrada de um casarão o qual estavam hospedados desde a chegada de Hong Kong, dois meses atrás.

O lugar onde a grande casa se situava não passava de vinte minutos de distancia da capital. Cercada por um vasto campo esverdeado e arvores que a qualquer horário do dia faziam sombras para repouso dos residentes, provocou em Shaoran recordações de seu verdadeiro lar na China. A sensação de finalmente estar em casa, mesmo essa sendo por mais um mês, lhe causou certa calmaria, relaxando todos os músculos contraídos e em alerta de seu corpo.

Respirou fundo aquela deliciosa brisa de outono, e pensou em ficar ali, inerte, por mais um período, não fosse um grito feminino e bem familiar para quebrar o clima apaziguador. Teve uma extrema vontade de pular na carruagem ao lado do cocheiro e golpear os cavalos para que regressassem ao trabalho o mais depressa possível.

– Shaorann...!! – A bela chinesa passou por todos num piscar de olhos e se atirou nos braços do amado.

– C-Calma Meiling! – Sugeriu, fracassando na tentativa de afastá-la. A garota lhe parecia um grude daqueles difíceis de remover das roupas. – Acabei de chegar. Poderia me dar um descanso?

– O que? – Desacreditou. – Mas acabamos de nos encontrar depois de semanas separados. – Os olhos avermelhados se enchiam de lágrimas. – Saiba que eu batalhei duro para me deixarem acompanhar nessa vinda para o Japão.

– Concordo com seu primo, Srta. Meiling, – Pendurada no pescoço do jovem caçador, a chinesa fuzilou desgostosa o intruso na conversa. – eles chegaram nesse momento e precisam descansar.

– Eriol também? – Estranhou, enquanto o rapaz de fisionomia branda se juntava ao grupo. – O que o trouxe ao Japão? – Segurando os braços da garota, retirou-a de seu pescoço.

– Seu pai... – Mediante a cara feia feita pelo Shaoran, pigarreou reformulando sua referencia. – No caso, seu padrasto, determinou que fosse fechada a negociação das ações.

– Como? – Apesar de surpreso com a repentina antecipação, tal golpe covarde lhe era esperado conhecendo o homem com o qual sua mãe houvera se casado novamente. – Eu estava tratando para que fossem vendidas por um preço acima do calculado. Nossas ações não são meras partes de uma firma, são boas, produtivas... – Mordiscou o lábio inferior na intenção de conter a raiva. – Ele está jogando no lixo a fortuna que minha família lutou para conseguir durante anos. Meu pai nunca teria vendido por menores que fossem dentre as demais.

– Lamento Shaoran, no entanto cumpro ordens.

– Não estou o culpando, Eriol. Confio em sua lealdade para com os Li. – Comentou segurando o ombro alheio.

Mesmo tendo motivos para estar injuriado, não seria honesto de sua parte descontá-lo nos outros, embora fosse exatamente isso que aquele homem planejava.

– Presumo que obtiveram êxito na missão. – Os orbes de um azul cobalto examinaram os três de forma minuciosa, não encontrando ferimentos externos.

– Putz! Até parece que duas bruxas com oito peninhas seriam páreo pra mim. – Kurogane se gabou, fitando de soslaio a suposta pessoa ao lado como quem dissesse em uma conversa particular “Fale algo e acerto seu pescoço com essa espada”.

– Como assim, duas bruxas? – Precipitou Meiling com a mesma dúvida do inglês. – Foi citado na conversa em Hong Kong apenas uma. – Complementou preocupada.

– Por isso vim os três não foi má ideia. Mera coincidência nesse caso estaria fora de cogitação. Deduziu.

– No final, uma das bruxas ainda teve a ousadia de amaldiçoar o Shaoran com algo semelhante a um elo de amor ou coisa parecida. – Fay zombou.

– Amor? – Repetiu o moreno alto, arqueando uma sobrancelha. O loiro não se corrigiu, ele aparentemente conhecia o terreno onde pisava.

O chinês ainda tentou calar a língua solta do companheiro por meio de gestos nada discretos, porém era tarde demais. Sua prima estava a fumaçar pelas narinas com a menção.

– O que a infeliz fez? – Vociferou na direção do tracker de olhos âmbar.

– E você acreditou nisso? – Rebateu, dando-lhe as costas. Notoriamente cansado, Shaoran caminhou de encontro às escadarias. – Vou para meus aposentos.

– Hã... Mas... – Meiling buscou argumentar, procurando palavras.

– Não durma muito, pois hoje ao entardecer iremos a um leilão. – Fay mal conteve a malícia explícita na voz.

– Leilão?

– Obviamente que não! – Exclamou a chinesa, voltando-se com as mãos abertas de modo protetor. – Na medida em que seguíamos para cá, ouvi boatos sobre esse leilão: Dentre os escravos que são vendidos normalmente para trabalhar nas lavouras de arroz, nas firmas ou residências, há também mulheres que servem para o deleite dos homens que as compram. – Bufou imaginando a cena. – Não vou permitir que o Shaoran vá!

– Não tem o direito de decidir por mim, Meiling. – Tornou segurando um dos pulsos da jovem.

– Então me deixe acompanha-lo. – Suplicou, manhosa.

– Não! Se for um evento desse porte, senhoritas como você não deveriam ir. Aliás, já fez muito vindo para o Japão. – A simples alusão no assunto a fez transpirar. – A tia sabe de sua visita, não sabe? – As pupilas do caçador se dilataram, triando sua reação.

– Ora, mas é c-claro que sabe. – Sorriu escandalosamente com a mão tapando a boca. – Acho que ouvi meu nome. Devem precisar de mim, então, se me derem licença vou me retirar. – Avançou poucos passos, detendo-se antes da ausência. – Tome cuidado, Shaoran.

Com a retirada da prima, o jovem suspirou, aliviado. Podia até ter se saído dessa, mas com certeza ela ainda lhe daria trabalho no decorrer de sua estadia.

(...)

A quantidade de pessoas reunidas era surpreendente, em sua maioria homens de grande poder aquisitivo, assim aparentavam. Notou que alguns poucos estavam acompanhados de belas mulheres, embora essas não interagissem nos diálogos com eles, apenas observavam mantendo uma distância razoável. Baixou o olhar para suas mãos e nelas continham uma pulseira de ferro como adorno. Uma estranha opção de adorno por sinal. Talvez fossem as escravas leiloadas. Pensou consigo. Mas, elas não deveriam ser negras? Questionou-se ainda em pensamentos.

– Vamos Shaoran, o leilão já começou. – Fay o puxou na direção de um grande aglomerado de gente. Adentrando aquela multidão agitada, parou em meio, percebendo junto a si os amigos Kurogane e Eriol. Eles não perderam tempo. Insinuou, meneando a cabeça.

“O que temos agora... Podem trazê-los.” – Chamou o apresentador, e Shaoran levantou seu rosto para assistir entre o balançar dos braços de homens a frente.

Um grupo de quatro pessoas seguiu em fila única, amarrados pelos pulsos até o centro do palanque, pouco mais atrás do leiloeiro. Na concepção do rapaz, de maneira alguma eles eram escravos.

– Achei que os escravos nesse leilão fossem negros. – Sibilou num tom em que Fay pôde ouvi-lo.

– E são! Mas se está se referindo a eles, provavelmente alguma família devedora. Quando se deve ao governo e, dentro do prazo estipulado pela lei, não pagam, são tratados como escravos e vendidos para quitar suas dividas. – Explicou o loiro.

– Triste, mas lei é lei. – Proferiu Kurogane sem deixar de olhar adiante.

“Um passo a frente mocinha...” – Ordenou o apresentador.

A jovem permaneceu imóvel e somente através de um grosseiro empurrão andou tropega até o local desejado.

“O que acham senhores? Temos um bom material aqui”. – A agitação dos homens na plateia deixou evidente o quanto estavam de acordo. Naquele momento, Shaoran os igualou a cães no sil.

Voltando-se para a infeliz garota, acabou se encontrando com duas belas esmeraldas. Por cerca de segundos ficou nervoso, sentiu um calor se formar por dentro e crescer de maneira a transparecer em sua face conforme seu coração comprimia as batidas.

– O que acha dela Kurogane? – Propôs Fay, levando a mão ao queixo de forma a analisar o produto.

– Não é meu tipo.

– Também acho! A doçura dela não assenta com o jeito selvagem do Kurogane. – Eriol avaliou com naturalidade.

– Repita o que disse? – O tracker mostrou o punho cerrado para o Inglês, que, no entanto, não se abalou, continuando sorridente igualmente ao loiro, se divertindo com a cena criada.

– E quanto ao Shaoran?

– Como? Não... Estou aqui apenas como observador. Além do mais, tenho servos o suficiente.

O chinês pareceu ter dito uma boa piada, pois seus companheiros se acabaram em gargalhadas, o deixando constrangido.

– Ela não lhe servirá para isso. – Esclareceu Eriol. – A função de muitas que são vendidas aqui, principalmente belas como esta – ele apontou de maneira elegante para frente. – é para o prazer do comprador.

– Diferente das demais criadas, serviçais ou escravas, ela será de uso exclusivo seu. – Fay arriscou simplificar de outra forma, acotovelando-o e dando uma piscadela.

Antes que pudesse responder, Kurogane o segurou pelo pulso e ergueu seu braço.

“Temos mais um ofertante ali senhores. Alguém dá mais?”.

– Observem o que fizeram? – Resmungou, massageando o área comprimida após puxar.

“Ninguém mais... – Procurou, esperançoso, já que a oferta lhe estava num valor agradável aos bolsos. – “Então está vendida para o jovem senhor ali no meio”.

Alguns próximos se viraram, curiosos, para Shaoran. Ele recuou, engolindo em seco, um tanto quanto atordoado com os olhares analistas ao mesmo tempo. Instantes seguintes sua fixa caiu e o desespero se apossou por completo de seu rosto.

Acabei de comprar uma mulher?!


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Notas finais do capítulo

O que fará Shaoran com mais essa responsabilidade? E a reação de Meiling ao descobrir que seu amado tem uma intima serviçal. Contarei tudo no próximo capítulo. Até o/



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