Filha das Ondas. escrita por Cora


Capítulo 4
Solitária


Notas iniciais do capítulo

Consegui postar antes do final de semana, weeeeeeeeeeee!
Acho que nunca escrevi uma história tão triste, a sereiazinha me deixa com vontade de chorar. >
Espero que gostem, boa leitura.



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"Experimentei quase tudo, inclusive a paixão e o seu desespero. E agora só quereria ter o que eu tivesse sido e não fui.

– Clarice Lispector.



O sol começava a nascer quando avistou o castelo do belo príncipe.

Aria sentou-se na areia branca da praia, com as ondas batendo na ponta de sua cauda. Olhou-a mais uma vez, tentando gravar sua imagem na mente, seria tudo que teria dali em diante, mas lembranças. Sabia que sentiria falta dela, das escamas verdes e cintilantes e da leveza que sentia ao nadar nas profundezas do mar.

Suspirou e então bebeu o elixir, sabia que se pensasse demais poderia voltar atrás. Engoliu até a última gota e esperou.

Foi como se uma espada afiada atravessasse seu corpo. Sentia-se queimando, rasgando-se ao meio, era como se seu corpo fosse dividido ao meio, a dor era tão forte que ela perdeu os sentidos e seu corpo tombou com força no chão.


Estendida na areia branca do mar, banhada pelos raios de sol e com os longos cabelos vermelhos espalhados no chão, ele encontrou-a. Não conseguia ver seu rosto, mas sentia que a conhecia de algum lugar. Ela parecia embalada em um sono profundo, e ele poderia achar que ela estava dormindo, se não estivesse nua. Correu em direção a ela, tirou o casaco e colocou sobre seu corpo, chamando-a. Tentava acordá-la, mas não houve resposta. Verificou sua pulsação, pelo menos ainda estava viva, mas não conseguia fazê-la abrir os olhos e voltar a si. Levantou o corpo com firmeza, a cabeça apoiada em seu peito. Ele correu em direção ao castelo, gritava por ajuda.


O sol brilhava forte quando Aria despertou. Sentia dores fortíssimas pelo corpo e sua cabeça latejava como se tivesse chocado contra um tubarão. Abriu os olhos com dificuldade, à luz irritava seus olhos e ela sentia-se zonza. Tateou meio cega e sentiu uma textura suave entre seus dedos. Virou-se e viu que estava em um grande cômodo. As paredes era cor de neve, e estava deitada em uma enorme cama, rodeada de coisas estranhas com texturas suaves e delicadas, ela nunca tinha sentido algo assim. Aria tentou sentar-se, mas sua cabeça girou e ela quase deitou outra vez. Ela sentiu uma mão forte em seu ombro, virou a cabeça e teria gritado de surpresa, se ainda tivesse voz.

Ao seu lado estava o belo príncipe.

– Olá, vejo que acordou, isso me deixa muito aliviado. – Ele sorriu para ela. Tinha uma voz rouca e melodiosa.

– Qual seu nome? – perguntou ele. Aria tentou dizer, mas sua voz não saia. Olhou para ele, sentindo-se muito frustrada.

– Não falas? – ela negou – Que pena. Me chamo Philip, eu encontrei você na praia. O que fazias lá? O que te aconteceu? – Aria negou com a cabeça outra vez. Tentou gesticular com as mãos, mas sabia que ele não a entenderia. Olhou em desespero para ele. Como se pedisse perdão por não poder falar. Philip a abraçou e disse que tudo ficaria bem.

Aria sentiu o coração bater loucamente em seu peito, nunca nenhum homem a abraçou daquela forma, além de seu pai, e ela nunca sentiu-se tão viva em sua vida. Acreditou que seu sacrifício tinha valido a pena.

– Consegue se por de pé? – perguntou ele. Aria não respondeu, mas estendeu as longas pernas que agora ocupavam o lugar de sua linda cauda verde. Olhou para suas pernas, era alvas e muito bonitas, mas não brilhavam como sua cauda. Sentiu seu coração apertar.

O príncipe estendeu a mão e ela se apoiou nele. A dor que sentiu quando os pés tocaram o chão a teria feito cair, se o príncipe não a tivesse segurado com força. Ele conduziu-a pelo castelo, sentia dores insuportáveis quando caminhava, exatamente como a feiticeira lhe dissera, mas andou firme ao lado do príncipe, não deixaria que notassem o quanto doía.

Philip mostrou-lhe o castelo, subiram longas escadas de mármore e visitaram os lindos jardins. O castelo tinha uma bela vista do mar, e ao olhar sua imensidão azul, Aria não pode deixar de se perguntar se sua família já sentia sua falta. Por onde passava todos a admiravam. Elogiavam seu andar gracioso e leve. Olhavam encantados para seus longos cabelos vermelhos e a pele tão alva quando o mármore branco. Vestiram-na com seda e ouro, o colar que havia ganhado de sua avó ainda estava com ela, o que a deixou muito feliz. Era sua única lembrança de casa. Todos admiravam-na sem cansarem de contemplar sua fascinante beleza. As mulheres catavam para ela e o príncipe sobre as glórias conquistadas pelos antepassados, catavam e o príncipe aplaudia entre risos, ele lhe dissera que eram as vozes mais belas do reino, e a pequena Aria pensava: “Ah! Se ele soubesse que sacrifiquei uma voz muito mais bela do que estas por causa dele!...”

Depois de cantarem, as escravas começaram a dançar graciosamente ao som de lindas músicas tocadas por instrumentos que ela nunca tinha visto antes. Então Aria rendeu-se ao som das belas melodias e começou a dançar, erguendo os braços alvos e ficando na ponta dos pés mimosos, e todos a olhavam encantados. Philip ficou tão fascinado, que não permitiu que ela ficasse sozinha por um só instante. Achava-a tão bela quanto uma ninfa, vinda do mar profundo. Era tão delicada quanto as espumas do mar e tinha olhos cheios de sentimentos como uma tempestade.

Ninguém percebeu o sofrimento dilacerante que ela teve de suportar para poder dançar daquela forma.

Nos dias que se seguiram, ela foi mimada e cuidada como a mais sensível pétala de flor. Vestiu-se com um lindo traje de amazona para cavalgar ao lado do belo príncipe. Atravessaram florestas perfumadas e cavalgaram por entre as montanhas. Ela caminhou pelas beiras de um grande rio que refletia o brilho do sol, sentou-se em baixo de uma macieira e deitou-se na grama verde, enquanto olhava as nuvens do céu, que tinham formatos diferentes. Avistou um que lembrava os filhos do mar. Aria ria diante de todos, mas sentia seus pés sangrarem.

Durante a noite, enquanto todos dormiam, ela descia as escondidas pela escadaria de mármore e ia até a praia para refrescar os pés em fogo, nas águas frias do oceano. Quando deitava, envolta nos lençóis de linho, sentia uma saudade profundo enchendo a alma.

Porém os dias ao lado do príncipe a animavam. Sabia que a confiança e estima por ela cresciam a cada dia. Mas ela não entendia porque não parecia com os sentimentos que ela nutria por ele, e que aumentavam a cada instante.

Uma noite, Aria viu as irmãs nadando de mãos dadas em torno do castelo. Cantavam com uma voz tão triste que um nós prendeu-se na garganta dela. Ela acenou, quase pulando, enquanto tentava fazer algum som que chamasse a atenção das irmãs. Elas olharam para ela, e durante longos instantes sequer se moveram. Mas quando Aria começava a perguntar-se se elas a reconheceram, as cinco nadaram rapidamente para próximo dela.

– Oh, minha linda irmã, o que fizestes?

Ela não respondeu. Mesmo que quisesse, não podia. As irmãs contaram-lhe sobre a tristeza que sentiram por causa dela. De como sua avó definhava com o passar dos dias e seu pai, que procurou por ela por dias, até finalmente desistir.

Todas as noites elas voltavam. Animando o coração da filha do mar. Um dia trouxeram-lhe o pai, que há anos não subia a superfície.

– Que fiz eu, minha filha, para que fizestes isso? – Nada, ela queria responder. Não foi tua culpa, meu pai, foi minha. Eu escolhi isso, não te culpes, não sofras por mim, deixe-me sofrer sozinha. Mas as palavras não saiam.

– Sinto tanto a tua falta, que nada parece alegrar-me como tu fazias. Quando voltará para casa? Quando voltará para mim? – O velho Tritão estendeu os braços, chamando-a para ele.

Nunca, pensou. Nunca mais. Perdoe-me, por favor, eu só queria poder dizer-te que sinto sua falta, de todos vocês. Mas não posso. Oh deuses! Eu não posso mais! Ela apertou a aquamarine em seu peito, abraçava a si mesma.

Um dia de sol, Aria estava sentada ao lado do príncipe a beira de um rio. As mãos estavam próximas e ela sentia-se tão feliz quanto um golfinho dando piruetas no mar. Ela olhava para ele com intensidade. Havia-se passado mais da metade do prazo que a feiticeira havia lhe dito, e ela não tinha certeza do que estava por vir.

– Porque me olhas assim? – perguntou o príncipe. Ela corou.

– Minha pequena, quem me dera saber quem tu és! Sabes que gosto muito de ti. Tens um coração mais puro que as outras, e és tão delicada e serena quanto à lua. Escute, quero contar-lhe um segredo. Quando meu navio naufragou, fui empurrado pelas ondas até uma praia, perto de um convento de freiras. Foi uma delas quem me encontrou, jogado a beira da praia, e salvou-me a vida.

Não! Queria gritar ela. Fui eu quem o salvei, não ela! Fui eu, eu!

– Eu só a vi duas vezes, porém, foi o suficiente para apaixonar-me perdidamente por ela. És tão parecida com ela que chega a assustar-me. Por vezes tua imagem até substitui a dela em meus sonhos. Eu a amo, minha pequena.

O coração de Aria se despedaçou. Ele ignora que fui eu quem o levei até o convento, salvando-lhe a vida, e ama outra! Mas ela está presa em um convento, e eles nunca poderão ficar juntos. Ainda existe esperança para mim, talvez ele a esqueça e me escolha. Eu o amarei para sempre, muito mais do que ela nunca o amará.

O tempo passava e os sentimentos do príncipe Philip mantinham-se os mesmos. Amava-a como uma criança meiga, e ria de suas rebeldias. Mas não olhava-a como a uma mulher, nem pensava em torná-la sua esposa. Por vezes ele a beijava na fronte carinhosamente, e os olhos de Aria lhe perguntavam em silêncio:

– Não gostas mais de mim do que da outra? – Mas ele nada dizia. Talvez ele nem notasse.

Um dia, Aria encontrava-se debruçada sobre a sacada, olhando o mar com saudade, quando uma de suas irmãs apareceu. Era Maera. A filha do mar olhou para a irmã, notou que seu olhar era vago e muito triste, sentiu a dor da mais jovem e uma dor no peito quase a fez dar meia volta a voltar para casa. Mas Aria a viu, e ela não pode evitar.

– Aria, minha irmã, trago-lhe tristes notícias. – Não sabia por onde começar, não queria dizer as palavras que veio para dizer. Apertou as mãos com força, suspirou.

– Nossa avó, nossa velha avó Rodes, morreu antes do sol de hoje se pôr.

Aria olhou-a, inexpressiva. Não, repetiu a si mesma. Não é verdade.

– Ela pediu que dissesse que sentia sua falta, e a amava. – A irmã queria tocá-la, confortar Aria, mas não podia.

A mais nova olhou para o mar. A lembrança do último abraço que recera de sua amada avó encheu sua mente, o sorriso ainda brilhava para ela. Aria não notou quando Maera foi embora, estava alheia a tudo naquele instante. Sentiu-se sozinha, verdadeiramente sozinha. Suas pernas tremeram e vacilaram, e o corpo caiu no chão sem forças para se manter de pé. Aria gritou um silêncio mais doloroso do que toda dor que sentira até agora.

Chorou pela primeira vez na vida.


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Notas finais do capítulo

Gostou? comentem!
Próximo capítulo na semana que vem!
— Cora.



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