Never Again escrita por Maga Clari


Capítulo 4
Capítulo 4 - Eu não vou voltar.


Notas iniciais do capítulo

Atendendo à pedidos, Pan e Wendy finalmente conversaram :) Desculpa pela demora, pessoal, hope you enjoy ^^



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A noite de Londres deu uma trégua aos nossos amigos que estavam à beira da janela. Não mais nevava, ainda que o ar preservasse o vento frio do inverno inglês.

Decerto, Pan e Wendy compartilhavam a mesma mania de sonhar acordado e se comunicar com os olhos. Entretanto, uma hora teriam de conversar. E logo isso não tardaria a acontecer.

— Gosta de histórias? — Wendy fora a primeira a quebrar o silêncio.

Pan pareceu ser acordado de um longo transe e então piscou os olhos para enxergá-la melhor, ali da outra janela.

— Por que acha que sou ator? — ele disse, sem desfazer-se do sorriso — Gosto. Gosto muito delas.

— Então vou te contar uma agora. Quem sabe assim você volte a dormir.

— Estou sem sono — assumiu, em tom hesitante — Mas ficarei bem feliz em ouvir qualquer história sobre... Aventuras!

Pan alargou o sorriso, esquecendo-se de que estava triste segundos atrás.

— Pois então você vai adorar essa — Wendy continuou. Seus rosto brilhava de empolgação — Trata-se de...Piratas! Sereias! Índios ! — ela riu ao ver os olhos de Pan mais atentos a cada palavra dita — Fadas! Donzelas e...

— E o quê?

A garota tenteou encontrar as palavras certas. Algo a desconfortara de repente.

— E... meninos que não querem crescer.

— Não sei se quero ouvir essa história...

— Por que? Bem... Talvez não tenha um final como o da Cinderela, mas... Gosto muito desta.

Pan já ouvira isso antes. Seu rosto se iluminou ao recordar cenas, ou lembranças, de uma infância tão remota e ao mesmo tempo tão recente. Ele mal tivera tempo de pensar em tudo aquilo quando fora trazido ao presente pela voz doce de Wendy Darling. Ela interpretara seu silêncio nostálgico como um sinal de aprovação.

— Era uma vez uma menina. Uma menina ingênua e sonhadora que adorava aventuras — acrescentara, procurando ver o que isso causava em Pan — Um belo dia... seu pai lhe falou sobre beijos e dedais. E claro, ela queria experimentar. Então a menina começou a crescer e crescer...

— Não estou gostando dessa his...

— Pssssiu! Não me interrompa — reclamou, rindo levemente — Ainda nem cheguei na metade! Então. Ela começou a crescer e crescer. E toda a sua família estava feliz com isso, menos ela. Queriam levá-la para um quarto separado, mas ela queria continuar com os irmãos. E numa de suas últimas noites antes de mudar-se completamente para o outro quarto, a tal menina recebera uma visita...

Não dava para saber se sua expressão era tristonha, alegre ou nostálgica; o fato é que Wendy estava numa luta interna para definir como se sentia em relação àquela história. Pan não a interrompera mais. Ela prosseguiu.

— E então, a menina e seus dois irmãos voaram com pó mágico e lutaram bravamente com piratas e tudo que tinham direito! — Wendy gesticulara, enfaticamente, para dar mais movimento à sua narrativa — Ela conheceu o líder do bando, brigou com ele... Juntou-se aos piratas, mas então o menino que a visitou apareceu e ela pode finalmente dar seu precioso dedal...

— Espera... Você falou dedal? — a mente de Pan já havia estava a mil por hora — Dedal... — então, de repente, as mãos de Pan se enfiaram nos próprios bolsos, procurando desesperadamente por qualquer coisa que parecia ser muito importante.

— Sim... Bem, então... — aquela informação pareceu passar despercebida por Wendy, que logo continuou sua história, tamanha era sua pressa em terminá-la. A menção ao dedal lhe deixara um pouco desconfortável; só não sabia exatamente o porquê — A menina, os novos amigos dela e seus irmãos voltaram para casa porque... eles queriam crescer. E não podiam abandonar sua família. Mas o menino não. E nunca mais ele...

— ACHEI!

"... apareceu"

A voz de Wendy foi desaparecendo assim que vira um anel que caberia perfeitamente em seus dedos delicados. Pan estendeu-o para mostrá-la e Wendy o achou bem familiar...

— Wendy — Pan disse, finalmente — Eu ganhei esse dedal faz alguns anos, mas não consigo me lembrar de quem. E eu gosto de mantê-lo aqui perto de mim, sabe?

Wendy simplesmente afirmou com a cabeça.

— Você não prestou atenção na minha história, não é? Você não gostou?

— É só que... — Pan ficou sem jeito ao vê-la decepcionada. Seus olhos estavam pesados ao continuar: — Eu conheço essa história. Ela aparece para mim durante a noite. E é estranho porque... eu pareço estar nela. Acha que isso faz de mim um maluco?

— Não, não, é claro que não — e então Wendy sorriu, balançando as pernas do lado de fora da janela — Principalmente porque isso também acontece comigo.

— Que esquisito!

— É...

Um silêncio brotou mais uma vez entre eles.

Não muito tempo depois, Wendy fez a pergunta que não quis se calar.

— Por que não quer ir para casa?

— Olha... — Pan mordera os lábios, reprimindo uma crise nervosa — Não gosto de lá. Nunca gostei, sabe. Eu já fugi uma vez... Não me recordo de quando, mas lembro claramente que já fugi. Eles falavam do meu futuro. Que um dia eu teria um escritório. Mulher e filhos. Isso me assustou...

— Você ainda mora com seus pais?

— Ah, tenho dezessete anos... Como pagarei minhas contas sendo apenas ator? Um pouco difícil, sabe. Mas acho que tomei uma decisão. E você? É aqui mesmo que você mora?

— Sei como é. Moro com meu irmão John num flat pertíssimo daqui. Mas faço faculdade, ainda não trabalho. Tenho poucos anos mais que você, só. Tenho dezenove...

Wendy respirou fundo para então olhá-lo nos olhos.

— Mas qual é a decisão que estava para me falar?

Pan pareceu procurar as palavras certas. Gaguejou um pouco, até soltar o ar que o sufocava:

— Eu não vou voltar. Nunca mais.

Wendy o observou, incrédula. O que Pan queria dizer com aquilo? Ficaria morando com ela sem ser ao menos convidado?

Resolvera deixar de pensar no assunto por algum tempo. O que quer que Pan houvesse decidido não mudaria o fato de estar apreciando a sua companhia.

A madrugada dava adeus, e em seu lugar, trazia uma manhã fresca e nublada. Cochilaram durante as primeiras horas do dia, e, se não fosse por Tina e Miguel, continuariam mergulhados num sono profundo onde compartilhariam as mesmas aventuras, ditas na noite anterior.

— Wendy? Ei, Wendy!

Pés foram ouvidos ao se arrastarem escada acima.

— Ela ainda está dormindo, Miguel – Tina respondeu, displicentemente, enquanto penteava o cabelo — O que foi?

— Só vim avisá-la de que o amigo dela su... — mas quando pôs as mãos no lençol para chamá-la, não havia ninguém lá — ... mil.

A voz de Miguel desapareceu aos poucos,  seus olhos esbanjavam terror.

— Tina..?

— Que foi, Miguel? — ela já estava impaciente. Entretanto, ao ver a expressão do garoto, percebeu que tratava-se de algo sério.

Mas antes que pudesse responder, Miguel já corria assustado por todos os cômodos da casa, chamando o nome de Wendy.

Já alertara seus pais, que não tardaram em se juntar ao filho para procurá-la.

O senhor e a senhora Darling foram tomados por uma incômoda sensação de nostalgia. Eles já haviam passado por uma situação parecidíssima com aquela.

Dessa vez, entretanto, Wendy sumira sozinha.

Certo?


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