Constância que estava em frente à penteadeira arrumando os cabelos, ouve o estrondo que a quebra da vidraça provocara e desce furiosa as escadarias que ligam o segundo ao primeiro andar da mansão.

Constância: - LUZIA! LUZIA! (Gritando o nome da criada). O que foi que você quebrou desta vez sua estabanada, não me diga que foram os meus cristais finos?! Se foram os meus cristais você está perdida! Você tem idéia de quanto eles custaram?

Luzia vem correndo da cozinha desesperada com a fúria da patroa e já tentando se explicar:

Luzia: - Baronesa, eu não...

Constância não deixa a empregada terminar de falar: - Mas quem é o responsável por esse disparate? (diz ela ainda mais furiosa ao se deparar com a vidraça da janela completamente destruída e com a bola que fora parar no meio da sala da mansão.)

Constância ruma para o exterior da casa buscando o responsável.

Constância: ALBERTINHO! ALBERTINHO! (Gritando o nome do filho) Eu avisei que se você quebrasse alguma coisa com essa sua maldita bola, você receberia um castigo inesquecível rapazinho, não avisei?

Albertinho olha para Laura apavorado e ela resolve logo assumir a culpa pelo ocorrido.

Laura: - Mãe...

Constância só agora repara na presença de Laura e no estado em que ela se encontrava.

Constância: - Laura?! (Diz ela olhando pra filha com olhar incrédulo e reprovativo). Mas o que é isso Laura?! (pergunta ela, andando em volta de Laura para que ela pudesse ter uma visão geral da filha) Você está imunda! Cheia de grama presa pelo corpo e os seus cabelos Laura, o que aconteceu?

Laura tenta responder:

Laura: - Mãe... eu... eu e o Albertinho...

Constância interrompe a filha mais uma vez.

Constância: - Não me diga que você está mancomunada com o seu irmão neste episódio? Vocês dois estão querendo me enlouquecer?

Laura vai ficando impaciente com o monólogo de repreensão materna que a baronesa faz e então resolve impor sua fala à da mãe:

Laura: - Mãe, o Albertinho e eu estávamos só brincando de corrida...

Constância: - Brincando? De corrida? Isso é coisa que uma moça faça Laura?

Laura: - Não eu não queria, mas a brincadeira do Albertinho estava atrapalhando a minha leitura, eu resolvi descer e pedir pra que ele me explicasse mais sobre o football, daí nós começamos a correr com a bola...

Albertinho: - Daí a Laura escorregou com essas botinhas dela e caiu no gramado (rindo) e eu achei que lhe fazendo cócegas eu conseguiria pegar minha bola de volta.

Laura começa a rir relembrando da cena e ao perceber a imaturidade de Albertinho que até mesmo em um momento de fúria da mãe, se atrevia a rir da situação:

Laura: - E então nós começamos a rolar na grama juntos, eu me levantei dei um chute forte na bola e aí... (Laura faz careta como se revivesse o momento em que quebrara a vidraça da janela.)

Constância: - Céus! É ainda pior do que eu pensava. Você estava jogando football, Laura? Você está louca? Aonde quer chegar com isso?! Você está parecendo uma moleca, ora onde já se viu uma menina jogando football? Olhe pra você Laura, toda suada, suja de terra e de grama, há grama presa até nos seus cabelos Laura. Meu Deus onde foi que eu errei na sua educação? A quem você puxou? Laura você já está uma moça, precisa ser delicada, prendada, aprender a se comportar como uma verdadeira dama e ao invés de se dedicar aos bordados, à pintura, ao refinamento você insiste em ficar enfurnada o tempo todo no seu quarto com a cara enfiada nos livros e quando enfim você resolve sair de lá é pra aprender a jogar football, Laura?! Assim  você nunca arrumará um pretendente.

Laura olha assustada para a mãe. A bronca sempre acompanhada de um discurso machista da baronesa, Laura já estava habituada, e estava habituada também a sempre retrucar, mas falar em um pretendente para ela, era a primeira vez que ouvira Constância tocar no assunto, Laura então questiona:

- Pretendente? (Assustada)

Constância: É, um pretendente Laura. Você já está uma moça, daqui a dois anos já será uma debutante, já precisamos pensar num pretendente pra você, ou você quer ficar solteirona como a sua tia Celinha?

Laura: - Não fale assim da tia Celinha. Ela é um pouco estabanada eu sei, mas é uma mulher íntegra e de bom coração.

Constância: - Um bom coração não arruma marido Laura. Você precisa se moldar ao comportamento de uma mulher prendada, refinada, delicada e de bom gosto que vá mostrar a quão boa esposa você será um dia minha filha, atendendo a todas as necessidades de um marido.

Laura: - Me moldar? Atender as necessidades de um marido? (Pergunta Laura indignada). É isso que a senhora quer de mim, mamãe? Então é só isso que eu posso e preciso esperar do meu futuro? Ser como todas as outras mulheres, seguir um modelo padrão de comportamento sem ter a esperança de um dia realizar todos os meus sonhos? Aliás, sem ter a esperança de realizar qualquer coisa por conta própria sem que pra isso eu necessite da ajuda e da aprovação de um homem?  Eu não entendo porque as coisas são assim. Terei que aceitar tudo que me é imposto, deixar de viver a minha própria vida e viver de futilidades como a senhora sempre faz? EU NÃO QUERO SER COMO VOCÊ!

Constância se enfurece com as palavras de Laura e tomada por ódio levanta a mão para a menina:

- Ah menina você passou de todos os limites! (Furiosa, Constância  levanta a mão pra Laura)