Crônicas Do Olimpo - O Mar De Monstros escrita por Laís Bohrer


Capítulo 11
Não são Tubarões...


Notas iniciais do capítulo

Minha parte favorita de "O Mar de Monstros"... :D



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Tínhamos acabado de fazer um pequeno tour forçado pelo navio de confederados mortos. Vimos o depósito de carvão, as caldeiras e o motor, que bufava e gemia como se fosse explodir a qualquer minuto. Vimos à casa do leme, o paiol de pólvora e o convés de artilharia (Clarisse : O meu favorito...), com dois canhões Dahlgren de cano liso a bombordo e a estibordo e um canhão Brooke estriado de nove polegadas na proa e na popa – todos eles adaptados para disparar lulas de bronze celestial.

Marinheiros confederados mortos nos olhavam fixamente, a todo lugar que íamos, as caras barbadas fantasmagóricas tremeluzindo nos crânios. Eu me sentia meio desconfortável... Sabem, não é sempre que eu embarco em um navio repleto de esqueletos humanos andando pelo convés... Exceto uma vez no mundo inferior...

Eles aprovaram Jake, pois era filho do deus da guerra e segundo ele, era da Virgínea. Mas eles me odiaram quando eu disse que era de Nova York e vaiaram e jogaram pragas contra os ianques. Tyler ficou aterrorizado com eles. Durante toda a excursão insistiu para que eu segurasse sua mão. Claro... Isso me deixou meio desconfortável, mas não pude discutir.

Finalmente, fomos escoltados para o jantar. O alojamento do capitão do Birmingham era mais ou menos do tamanho de um closet, mas ainda assim muito maior do que qualquer outro recinto bordo.

A mesa estava posta com linho branco e porcelana. Manteiga de amendoim, sanduíches de geleia, batatas fritas e refrigerantes foram servidos por tripulantes esqueléticos. Eu não queria comer nada que fosse servido por fantasmas, mas minha fome foi maior que o medo.

– Vocês estão muito encrencados. – disse Clarisse. - Tântalo expulsou vocês por toda a eternidade, O senhor D disse que se mostrarem a cara de novo no acampamento vai transformá-los em esquilos e passar por cima com sua caminhonete.

– Foram eles que deram este navio a você? – perguntou Jake.

– O Sr. D tem uma caminhonete? – perguntei.

Clarisse bufou.

– Meu pai me deu um navio. – disse ela.

– Ares? – perguntei quase engasgando.

– Não... Afrodite. – ironizou ela. – Acha que só seu pai tem poderes no mar? Os espíritos do lado perdedor em todas as guerras devem tributo a Ares. É sua maldição por terem sido derrotados. Pedi a meu pai um transporte naval, e esses caras vão fazer tudo o que eu mandar. Não é verdade, capitão?

O capitão estava em pé atrás dela, rígido e zangado. Seus olhos verdes e brilhantes me fixaram com um olhar faminto.

– Se isso significa dar fim a essa guerra infernal, madame, finalmente a paz, vamos fazer qualquer coisa. Destruir qualquer um.

– Destruir qualquer um... – Clarisse sorriu. – Eu gosto disso.

Tyler engoliu seco ao meu lado.

– Clarisse... – chamei sua atenção. – Luke também esta atrás do Velocino, ele tem as coordenadas, Tem um navio de cruzeiro cheio de monstros...

– Bom... Vou explodi-lo para fora do mar. – disse ela.

– Acho que você não esta entendendo. – disse Jake. – Precisamos nos unir.

Clarisse deu um murro na mesa.

– Desculpe irmãozinho... Mas Não! – disse ela. – Essa é a minha missão. Finalmente chegou minha vez de ser a heroína, e vocês dois não vão roubar minha chance!

– Onde estão os seus colegas de chalé? – perguntei.

– O que? – perguntou ela.

– Você tem permissão de levar dois colegas na missão. – falei.

– Eles não... Eu os deixei para trás. Para proteger o acampamento.

– Você quer dizer que nem mesmo as pessoas do seu próprio chalé quiseram ajudá-la?

– Cala a boca, “peixinha”, eu não preciso deles! E nem de você! – disse ela.

– Clarisse – falei. – Tântalo está usando você. Ele não importa com o acampamento. Adoraria vê-lo destruído. Está armando para você fracassar.

– Não ligo! – rosnou. – Não me importa o que o Oráculo...

Ela hesitou?

– O quê? – disse eu. – O que o Oráculo lhe contou?

– Nada. – As orelhas de Clarisse ficaram rosadas. – Tudo o que vocês precisam saber é que vou terminar essa missão e vocês não vão ajudar. Por outro lado, não posso deixá-los ir...

Jake suspirou.

– Então vai nos fazer de prisioneiros? – perguntou.

– Hospedes por enquanto. – disse ela. – Capitão, leve-os para baixo. Ceda redes para eles no convés-dormitório. Se eles não se comportarem bem, mostre-lhes como lidamos com espiões por aqui...

O Capitão fez o que ela ordenou.

Assim que eu fechei os olhos, outro sonho com Hansel veio à tona.

Ele estava desmanchando mais a cauda do vestido de noiva, ele estava sentado no tear, uma hora olhando para uma enorme pedra que o separava da liberdade e outra hora olhando para as próprias mãos. Foi quando a porta de rocha rolou para o lado e o ciclope berrou:

– Aha! Então é esse o problema!

Hansel tremeu.

– Querido... Você entrou tão quieto... – gaguejou ele em falsete. - Eu... Eu não estava...

– Venha!

Polifemo agarrou ele pela cintura e carregou, em parte arrastou o sátiro pelos túneis da caverna. Hansel lutou para manter os sapatos de salto alto nos cascos. Seu véu balançando na cabeça, ameaçando cair.

O ciclope o puxou para dentro de uma caverna do tamanho de um armazém decorada com bugigangas de carneiros. Havia uma cadeira reclinável e um televisor cobertos de lã, toscas estantes de livros cheias de objetos colecionáveis sobre carneiros... E o que me fez tremer: ossos de sátiros que tinham ido à ilha à procura de Pan.

Polifemo pôs meu melhor amigo no chão apenas por tempo suficiente para mover outra rocha enorme. A luz do dia se infiltrou na caverna e o menino-jegue choramingou, tão perto...

– Ar fresco!

O ciclope o arrastou para fora até o topo de uma colina de onde se avistava a ilha mais bonita que eu já vi na vida. Havia colinas verdes luxuriantes dos dois lados e um largo vale entre elas, cortado por uma ravina atravessada por uma ponte de corda. Lindos riachos corriam até a beira do cânion e caíam em cascatas nas cores do arco-íris. Papagaios voavam entre as árvores. Flores cor-de-rosa e roxas floresciam nos arbustos. Centenas de carneiros pastavam nas campinas, a lã brilhando de modo estranho, como moedas de cobre e prata.

Então lá no centro de tudo isso, eu vi... Bem ao lado da ponte de corda, havia um carvalho enorme e retorcido, com alguma coisa reluzindo em seu galho mais baixo. O Velocino de Ouro.

Mesmo em sonho, pude sentir seu poder se irradiando pela ilha, tornando a grama mais verde, as flores mais bonitas. Era quase possível sentir o cheiro da magia da natureza fazendo seu trabalho. Fiquei imaginando como aquele perfume seria poderoso para um sátiro.

Hansel choramingou.

– Sim – disse Polifemo com orgulho. – Está vendo ali adiante? O Velocino é o troféu mais valioso da minha coleção! Roubei-o dos heróis muito tempo atrás, e desde então... Comida de graça! Chegam aqui sátiros do mundo inteiro, como traças atraídas pelas chamas. Sátiros são boa comida! E agora...

Polifemo pegou uma tosquiadeira de bronze de aparência ameaçadora. Eu queria gritar o nome de Hansel, que gemeu. Porém, Polifemo agarrou o carneiro mais próximo como se fosse um animal empalhado e cortou rente sua lã. Ele entregou a massa fofa para Hansel que quase deixou este cair mal podendo controlar sua tremedeira.

– Ponha isso na roca! – disse ele, arrogante. – É mágica. Não pode ser desfeita.

– Ah!... Bem...

– Pobre docinho! – sorriu Polifemo. – Tecedeira ruim. Há-ha! Não se preocupe. Esse fio resolverá o problema. Acabe a cauda do vestido até amanhã!

– Muito... Atencioso da sua parte.

– Hehe.

– Mas... Mas, querido – Hansel engoliu em seco. – E se alguém quisesse... Atacar esta ilha?

Hansel olhava diretamente para mim, me senti horrível apenas observando meu amigo ali sem poder ajuda-lo...

– O que os impediria de marchar direto para cá, para a sua caverna?

– Esposinha assustada! Que gracinha! Não se preocupe. Polifemo tem um sistema de segurança de última geração. Eles terão de passar pelos meus bichinhos de estimação.

– Bichinhos de estimação?...

Hansel correu os olhos pela ilha, mas nada havia além de carneiros pastando...

– E depois terão de passar por mim! – Deu um murro na rocha mais próxima, que rachou e se partiu ao meio fazendo o chão tremer. – Agora venha! – bradou ele. – De volta à caverna.

Hansel parecia que iria chorar... Pobre garoto-jegue... Tão perto da liberdade, Lágrimas brotaram de seus olhos enquanto a porta de rocha se fechava rolando, aprisionando-o de novo na fedorenta caverna iluminada por tochas do ciclope.


Acordei chamando seu nome.

– Hansel! – exclamei.

Uma cara fantasmagórica apareceu diante de mim berrando com a voz áspera:

– Levante-se, ianque. Seus amigos já estão lá em cima. Estamos nos aproximando da entrada.

– Entrada do que? – perguntei.

– Do Mar de Monstros é claro! – então com um sorriso fantasmagórico ele me deixou.

Enfiei meus poucos pertences que haviam sobrevivido à Hidra em um saco de marinheiro de lona e o pendurei no ombro. Tinha a leve suspeita de que, de um jeito ou de outro, não passaria outra noite a bordo do Birmingham.

Eu estava subindo quando alguma coisa me fez congelar. Algo familiar e desagradável, por um momento sem sentido eu tive uma enorme vontade de arranjar uma briga. Queria esmurrar as escadas por me fazerem tropeçar. A última vez que senti esse tipo de coisa foi...

Eu me arrastei até a beira da grade de ventilação e me esgueirei por lá para espiar, no convés das caldeiras. Clarisse estava logo abaixo de mim, falando com uma imagem que tremeluzia no vapor das caldeiras – um homem alto e musculoso, com roupas de motociclista de couro preto, corte de cabelo militar, óculos escuros de lentes vermelhas e uma faca presa do lado por uma correia. Meus punhos se fecharam.

Era meu olimpiano menos favorito: Ares, o deus da guerra.

– Não quero desculpas, garotinha. – urrou o deus da guerra.

– S-Sim pai. – gaguejou Clarisse, estranho... Nunca vi Clarisse gaguejar... Nem mesmo os touros de bronze a deixaram tremendo como a visão de Ares a deixava.

– Não me quer ver zangado, quer? – disse Ares... Se ali ele estava pacifico, imagina zangado!

– N-não pai.

– “Não pai” – Ares a imitou afinando a voz (O que não surgiu muito resultado.)- Você é tão patética... Deveria ter dado essa missão a um dos meus filhos. Não me faça me arrepender.

– Eu vou conseguir. – disse Clarisse com a voz tremula. – Vou lhe deixar orgulhoso!

– Melhor mesmo... – disse ele. – Você me pediu essa missão! Se deixar aquela imprestável Filha do Barbas de alga, lhe roubar esta glória...

– Mas o oráculo...

– NÃO ME IMPORTA! – berrou ele, Até eu tremi... - Você vai conseguir. Se não...

Ele ergueu o punho. Muito embora fosse apenas uma figura no vapor, Clarisse se encolheu.

– Estamos entendidos? – rosnou Ares.

As sirenes tocaram de novo. Ouvi vozes vindo em minha direção, oficiais gritando ordens para preparar os canhões. Eu me afastei da grade de ventilação engatinhando e fui encontrar com meus amigos no convés superior.


Assim que cheguei por trás de Jake ele perguntou:

– Você esta com uma cara horrível. – disse ele. – O que houve? Outro sonho?

Apenas confirmei... Não sabia o que pensar a respeito do que vira lá embaixo. Mas achei melhor não contar nada, não que eu tivesse medo de Clarisse... Fala sério! Mas acho que se eu fosse ela, não iria gostar muito. Clarisse subiu as escadas logo atrás de mim. Tentei não olhar para ela. Ela agarrou o par de binóculos de um oficial zumbi e olhou na direção do horizonte.

– Adiante a todo vapor! – ordenou ela.

Olhei na mesma direção que ela, mas não consegui ver muita coisa. O céu estava encoberto. O ar era nevoento e úmido, como vapor de um ferro de passar. Se eu apertasse os olhos com muita força, podia apenas distinguir um par de manchas escuras indistintas a distância. Meu cabelo negro batia no meu rosto que dificultava minha visão.

Meu senso de orientação náutico dizia que estávamos em algum lugar na costa norte da Flórida; portanto, tínhamos avançado uma longa distância durante a noite, mais longe do que qualquer navio mortal seria capaz de navegar. O motor gemeu quando aumentamos a velocidade.

Tyler murmurou meio nervoso:

– Pressão demais nos pistões. O motor não foi feito para águas profundas.

Não sabia o que ele queria dizer com isso e nem como ele sabia disso, mas aquilo com toda certeza, não me deixou mais tranquila...

Ao norte, uma enorme massa de rocha se erguia do mar – uma ilha com falésias de pelo menos trinta metros de altura. Cerca de um quilômetro ao sul, a outra mancha de escuridão era uma tempestade que se formava. O céu e o mar ferviam juntos em uma massa trovejante.

– O que é aquilo? – perguntou Jake.

– Caríbdis... – disse Clarisse.

Ele a encarou.

– Esta maluca? – perguntou.

– É a única entrada para o Mar de Monstros. Bem entre Caríbdis e sua irmã Squila.

Ela apontou para o alto, no topo das falésias, seja lá o que for que tinha lá cima, não iria nos receber com uma faixa de boas vindas...

– Se quer entrar no Mar de Monstros você precisa navegar por entre as duas. – completou Clarisse. – Também há outra opção, as Rochas Colidentes, mas não conseguiria explodi-las com meus canhões... É essa a única opção.

Olhei mais ao redor, nos estávamos nos aproximando mais, agora eu conseguia ver, o que pareciam ser barbatanas superiores nadando em uma espécie de circulo gigante.

Jake se aproximou.

– Por favor, diga que aquilo são tubarões.

Olhei para ele como se ele tivesse acabado de dizer que queria dar um mergulho no Rio Estige com um Buldogue Frances.

Não tirei os olhos da coisa, mas não eram tubarões, mesmo só olhando pareciam pontudos demais para serem tubarões, eles eram amarelados e tinham alguns pontos negros, também havia pedaços de coisas como metal e outros pertences perdidos, tipo um aparelho gigante para dentes...

– Não são tubarões... – falei.

– Eu disse para dizer que são! – disse ele.

– Deixem isso para a lua de mel. – disse Clarisse.

– Clarisse – falei – Caríbdis suga o mar. Não é essa a história?

– E o cospe de volta depois, sim.

– E Squila?

– Ela vive em uma caverna, no alto daquelas falésias. Se chegarmos perto demais, suas cabeças de serpente vão descer e começar a arrancar marinheiros do navio.

– Então escolha Squila – disse. – Todo mundo vai para o convés de baixo e passamos direto.

– Não! – insistiu Clarisse. – Se Squila não conseguir sua comida facilmente, poderá pegar o navio inteiro. Caríbdis fica sentada lá, no centro do seu redemoinho. Vamos avançar diretamente para ela, mirar nossos canhões e mandá-la para o Tártaro!

Quase acreditei. Quase. O motor ainda zunia, Tyler choramingava. À medida que nos aproximávamos dos monstros, o som de Caríbdis era cada vez mais alto – um horrível rugido molhado, como a descarga do maior vaso sanitário da galáxia. A cada vez que Caríbdis inspirava, o navio estremecia e era arremessado para frente. A cada vez que ela expirava, subíamos na água e éramos castigados por ondas de quatro metros.

Essas ondas eu conseguia controlar, tentei controlar também o redemoinho de Caríbdis, mas eu não conseguia. Tentei cronometrar o redemoinho. Até onde pude perceber, Caríbdis levava cerca de três minutos para sugar e destruir tudo num raio de um quilômetro. Para evitá-la, teríamos de passar bem perto das falésias de Squila. De um jeito ou de outro, não poderíamos atravessar e viver felizes para sempre sem se arriscar.

Os marinheiros mortos vivos realizavam com calma suas tarefas no convés superior. Imaginei que talvez eles não se preocupassem com a possibilidade de ser destruídos, porque já eram defuntos. Jake se agarrava a amurada, uma vez me distrai demais e quase cai para frente.

– Você ainda tem sua garrafa térmica cheia de vento? – perguntou Jake.

– Sim, mas é perigoso usa-la no meio de um redemoinho como aquele lá. Liberar mais vento só vai tornar as coisas ainda piores. – falei

Ele pareceu achar sentido no que eu acabara de dizer.

– Pode controlar a água? – perguntou. – Você é filha de Poseidon! Já fez isso não?

Fechei os olhos e tentei acalmar o oceano, mas não conseguia me concentrar. O ruído de Caríbdis era alto e forte demais. As ondas não me respondiam.

– Eu... – falei nervosa. – Desculpe, não consigo aqui.

– Tudo bem. – disse ele.

– O motor não está bom. – disse Tyler.

– O que? -perguntou Jake.

– Pressão. Os pistões precisam de conserto!

Antes que ele pudesse explicar, o vaso sanitário cósmico deu descarga com um possante chuááááâ! O navio se lançou para frente, e eu fui arremessada no convés com um grito. Estávamos no redemoinho.

– Retaguarda total! – gritou Clarisse mais alto que o barulho.

O mar se agitava à nossa volta, as ondas arrebentavam no convés. As chapas de ferro agora estavam tão quentes que fumegavam. Isso não ia dar certo...

– Levem-nos à linha de tiro! Preparem os canhões de estibordo! – gritou Clarisse.

Os confederados mortos corriam de um lado para o outro. O motor entrou em reverso ruidosamente, tentando reduzir a marcha do navio, mas continuamos a deslizar em direção ao centro do vórtice. Um marinheiro-zumbi de repente saiu do porão e correu até Clarisse. Seu uniforme cinzento fumegava. A barba estava em chamas.

Tossi com a fumaça.

– Impossível! – gritou o marinheiro. – Estamos nos vaporizando com o calor!

– Só preciso de mais alguns minutos! Apenas o bastante para chegar à linha de tiro!

– Estamos indo depressa demais – disse o capitão em tom sinistro. – Preparem-se para morrer!

– Não! – Tyler exclamou. – Eu posso concertar!

Clarisse olhou para ele, incrédula e pasma.

– Pode? – disse ela.

– Pode? – disse eu.

– Ele imune ao fogo. E entende de mecânica. – disse Jake.

Clarisse suspirou.

– Vá!

– Não! – me agarrei a Tyler. – É perigoso!

Ele deu uma palmadinha na minha mão. Meus olhos estavam cheios de lagrimas, eu acabei de ganhar um irmão, não queria perde-lo...

– Não tem outro jeito, irmã. – disse ele sério e determinado, nunca o vi daquele jeito antes... – Volto já.

– NÃO! – berrei, mas ele se foi.

Jake me agarrou pela cintura impedindo-me de ir atrás dele.

– Megan... Fique calma... – dizia ele, mas eu ainda tinha aquela sensação terrível.

Eu ia manda-lo calar a boca, quando o navio de novo foi lançado para frente.

Caríbdis surgiu algumas centenas de metros adiante, em meio a um turbilhão de névoa, fumaça e água. Então eu pude ver melhor a coisa. Por roda a volta, a água girava como num funil, como luz ao redor de um buraco negro - uma enorme boca com lábios vistosos e dentes cobertos de musgo do tamanho de botes a remo. Pedaços de madeira, peixes mortos e outras coisas.

Caríbdis era o pesadelo de qualquer dentista. Nada mais que uma enorme boca negra, com dentes estragados e mal alinhados, os caninos e os incisivos exageradamente projetados sobre os dentes de baixo, e que havia séculos não fazia nada a não ser comer sem escovar os dentes depois das refeições.

Enquanto eu olhava, todo o mar à sua volta foi sugado para o vazio – tubarões, cardumes de peixes, uma lula gigante. E percebi que em poucos segundos o Birmingham seria o próximo.

– Lady Clarisse! – bradou o capitão. – Canhões de estibordo e de proa ao alcance!

– Fogo! – ordenou Clarisse.

Três projéteis foram disparados para dentro da boca do monstro. Um arrancou um pedaço de um incisivo. Outro desapareceu em sua garganta. O terceiro atingiu o metal do aparelho e ricocheteou de volta, arrancando do mastro a bandeira de Ares.

– De novo! – berrou ela.

– Nos vamos morrer... – murmurei.

Teríamos de golpear o monstro cem vezes mais para causar algum dano real, e não tínhamos todo esse tempo. Estávamos sendo sugados depressa demais. Então as vibrações no convés mudaram. O zumbido do motor ficou mais forte e mais firme. O navio estremeceu e começamos a nos afastar da boca.

– Tyler conseguiu... – sorri.

– Esperem! – disse Clarisse. - Precisamos ficar perto...

– TÁ DOIDA? A GENTE VAI MORRER! – gritei.

– Temos que nos afastar. – disse Jake.

Agarrei-me à amurada enquanto o navio lutava para não ser sugado. A bandeira arrancada de Ares passou voando por nós e se alojou no aparelho de Caríbdis. Não estávamos fazendo muito progresso, mas ao menos mantínhamos a posição.

De repente, a boca se fechou. O mar ficou absolutamente calmo e pacifico, Caríbdis fora encoberta pela água. E com a mesma rapidez que aquela boca enorme se fechou, ela se abriu em uma explosão cuspindo uma muralha de água que consegui desviar. Tentei usar todo o meu poder para controlar a água, mas nem isso adiantou. Tudo o que não era comestível era cuspido para nos... Inclusive nossas balas de canhão, uma das quais atingiu o costado do Birmingham com um plim! Fomos lançados para trás em uma onda que devia medir uns doze metros.

Outro marinheiro incandescente saiu de repente do porão e foi de encontro a Clarisse, quase lançando ambos ao mar.

Olhei ao redor, Jake estava de pé ao meu lado ainda agarrado a amurada, Eu fazia o mesmo, porém sentada.

– O motor esta a ponto de explodir! – gritou o marinheiro.

Levantei-me cambaleando.

– Onde esta Tyler? – perguntei.

– Lá em baixo ainda! – disse ele. – Segurando as pontas, não faço ideia de como, mas não vai durar muito!

O capitão disse:

– Precisamos abandonar o navio.

– Não Podemos! – berrou Clarisse.

– Não temos escolha, milady. O casco já está rachando. Ele não pode...

O Pobre nem teve tempo de terminar a frase, Rápida como um raio, alguma coisa marrom e verde desceu do céu, agarrou o capitão e o levou embora. Tudo o que restou foram suas botas de couro. Ouvimos a voz dele ecoando e desaparecendo:

– SQUILAAAAAAAAAAAaaaaaaaa....

Aconteceu tão depressa que era como ver um raio laser, e não um monstro. Não pude nem distinguir a cara da coisa, só um relance de dentes e escamas. Outro marinheiro foi levado. Destampei Anaklusmos, Tentei golpear o monstro, mas fui lenta demais.

– Todo o mundo para baixo! – berrei.

– Não podemos! – Clarisse sacou sua espada. – O convés inferior está em chamas.

– Bote Salva-vidas! – gritou Jake.

– Seremos comidos de qualquer jeito! – gritou Clarisse.

– Temos que tentar! – disse ele. – Megan! A Garrafa!

– Não posso abandonar Tyler! – gritei.

– Temos de preparar os botes!

– EU NÃO POSSO! –berrei.

Clarisse e alguns dos seus marinheiros mortos vivos removeram a cobertura de um dos dois botes de emergência enquanto as cabeças de Squila despencavam do céu como uma chuva de meteoros com dentes, catando um marinheiro confederado após outro.

– Pegue o outro barco! – joguei a garrafa para Jake. – Preciso ir atrás de Tyler.

– Megan! Você não pode! Você vai morrer lá embaixo!

Não dei ouvidos. Corri para a escotilha da sala das caldeiras, mas de repente meus pés não estavam mais tocando o convés, gritei, eu estava voando para cima. Ouvi Jake me gritar, Squila me pagara de algum modo pelo saco de viagem nas minhas costas. Em Pânico consegui acerta seu olho e ela me soltara. A queda já teria sido bastante ruim, considerando que eu estava a trinta metros de altura, mas, enquanto eu caía, o Birmingham explodiu lá embaixo.

BUUUUUM! Pedaços do Navio explodia para todo canto, lançando pedaços de couraça de ferro em todas as direções...

A queda foi rápida demais, não vi mais nada, não ouvi mais nada a não ser a explosão lá em cima. Agora diante de mim estava o mar, era como se o tempo ao meu redor fosse desacelerando.

– Tyler... – murmurei.

Naquele momento eu desejei me afogar, mas sabia que isso não seria possível... Eu estava sozinha me afundando na escuridão quase que infinita.

De novo.




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Notas finais do capítulo

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