Bem ao Lado escrita por Alessa Petroski


Capítulo 47
Capítulo 47




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O período do fim das aulas estava chegando. O relógio redondo e branco acima do quadro branco da minha sala marcava 11:10. E a professora de História estava em seu monólogo sobre algum conteúdo que eu nem me dera o trabalho de saber. Não é que eu não quisesse prestar atenção. Na verdade, o que acontecia era que eu estava encontrando muita dificuldade para me fixar em qualquer assunto que fosse. Até os meus olhos estavam ficando desfocados enquanto eu olhava para aquela mulher de largas proporções.

Lucius escorregou sorrateiramente para a cadeira vazia de Giane. A professora nem chegou a titubear. Aquilo era admirável.

– Como você está? - ele indagou baixo, puxando rapidamente a carteira para mais perto da minha.

Tive que ordenar para que os meus dentes soltassem meu lábio de tão tensa que estava.

– Tenho mesmo que responder a isso?

– Ser educada não faz mal.

– E nem é vergonhoso - completei para ele.

Pelo canto do olho o vi cruzar os braços sob o peito e esticar as pernas. Sob seus olhos vi uma camada de pele arroxeada e seus ombros pareciam a ponto de se partir de tensão.

Ignorei o olhar ferino de Tamara - a única que parecia estar desperta na aula além de nós dois. Aproximei-me do Lucius e deixei minha mão descansar sobre seu braço, mas em momento algum desviei o olhar da professora.

– Estamos juntos. Não se preocupe muito - falei baixinho.

Ele deslizou a mão por sobre a minha e a tirou delicadamente de seu braço e entrelaçou nossos dedos em um aperto que além de cúmplice servia como um ponto ao qual se agarrar em meio à turbulência de emoções.

Encostei a cabeça no ombro dele e vi com a cabeça na lateral o passar vagaroso dos minutos. Era assustadora a capacidade que o relógio tinha de passar os minutos devagar quando se esperava que passasse voando.

Quando no relógio estava marcado 11:25 me levantei e fui em direção à mesa da professora. Ela, recostada em sua mesa, parou de falar subitamente.

– Preciso ir ao banheiro - falei.

Ela começou a abrir a boca. A interrompi.

– Estou naqueles dias. Sabe como é. E preciso conferir como está a situação - disparei para evitar que ela recomeçasse a falar.

– Pode ir - ela disse em um suspiro.

Antes de a porta da sala bater atrás de mim quando saí, a voz dela já voltara a povoar a sala.

...

Cinco minutos depois o sino soou e eu estava de frente para uma das inúmeras salas do terceiro ano. Era a sala de Vini.

Em todo o corredor, de todas as salas, o aluno que saiu mais rápido foi o astro de futebol da escola. Em um quarto de segundo o segurei pelo braço e o puxei para além do corredor, para um vão onde ninguém nos veria.

– Você está louca? Veio repetir a dose daquele dia - ele indagou com o sorriso frouxo, acariciando a mandíbula.

– Nunca estive mais lúcida. E não se faça de inocente. Ambos sabemos que aquilo foi pouco se comparado ao que já me fez.

Ele vacilou por um segundo o suficiente para eu saber que poderia descobrir algo dessa conversa. Era tão fácil agora ver quando ele mentia! Eu fora uma estúpida por não ter podido detectar o que era simulação e o que era verdade nele em nossa relação.

Tirei minha mão do braço dele e ignorei à vontade de esfregar a mão na calça, com o intuito de descontaminá-la.

Eu imaginara cada palavra que deveria usar. No entanto, cara a cara com ele as palavras simplesmente evaporaram.

– Está sentindo a minha falta? - ele indaga me encurralando, apoiando um braço na parede bem ao lado da minha cabeça.

Aquilo me fez relembrar tudo o que estava preso na minha garganta.

– Jamais. Nem lembro mais que estivemos juntos.

– Sua raiva à deixa mais atraente.

– Que seja - falei revirando os olhos - Soube que vai ser pai.

Ele vacilou no sorriso. Aquilo o incomodava muito. Na noite do dia em que descobri sobre a gravidez de Márcia, ela publicara em suas redes sociais a novidade. Em nenhuma das mensagens ela parecera triste, ao contrário, parecia fervilhar de alegria. Bem diferente das lágrimas que eu havia presenciado.

– Infelizmente, Márcia nunca soube ser discreta. Quer saber? - ele perguntou e eu nem me dei ao trabalho de responder - A discrição é uma das inúmeras qualidades que admiro em você.

Eu estava tão acostumada a reagir bem aos elogios do Vini, que, no momento, meu coração bateu forte. Mas foi uma batida única. Solitária. Afinal eu não o amava mais. Nem sequer gostava dele.

– O que me interessa foi o que fez a Giane.

– E o que seria isso? - ele colocou a mão sob o queixo - Não diga que foi o fora que dei nela há anos atrás, não é?

– Você não passa de um canalha. Estou falando do incêndio.

Ele demorou um segundo para compreender o que eu dissera e fez o que eu não esperava. Vini gargalhou como se o que eu disse fosse à coisa mais engraçada do mundo.

– Não. Agora tenho certeza que está louca. Acha mesmo que fiz isso?

Apertei com força o meu nariz e lutei contra a raiva que começara a borbulhar em mim. Ele estava me tirando do sério, todavia eu não podia perder o controle antes de conseguir o que queria.

Abri os olhos e vi aquele sorriso de volta.

– Não duvido. Foi você o crápula que me deu isso - levantei o meu braço outrora rasgado por um caco de vidro e que agora brilhava uma cicatriz rosada.

Vini vacilou mais uma vez e pude jurar que o senti arrependido. Somente aquilo bastou para que eu detectasse o que era verdade do que era mentira.

– Não seja estúpida. Acho que está delirando.

– Você não presta - falei alto.

– Você não tem como provar nada - ele disse.

– Não confio em você.

Saí do corredor a passadas largas. Várias pessoas ainda permaneciam no corredor e não fui notada.

Vini não machucara Giane provocando o incêndio. Isso eu provara com suas reações. Eu sentia em meu ser que o culpado estava próximo e enquanto eu voltava para a minha sala para pegar minha mochila, olhei várias vezes ao redor para a face de cada pessoa que estava em meu caminho. Tentei identificar quem fizera aquilo com minha amiga.

Obviamente, não obtive resultado. O que importava era que eu não desistiria de descobrir a identidade do culpado. Eu faria aquilo por Giane.


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