Equinocial escrita por Babi Sorah
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*Capítulo 16*
Um Guerreiro solitário no campo de batalha
Parte I
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“Deixe o tambor bater uma vez
Respire, deixe sua mente se desembaraçar
[…]
Eu sou a guerra interna
Eu sou a linha de batalha
Eu sou a maré alta
Eu sou a guerra que eu luto”
( The War Inside — Switchfoot )
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Instituto Ironheart — Área Sul
03h:05m
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Eu sei onde você a escondeu. Vamos, pegue-a!
Você também quer isso, não quer? Então, por que está se segurando? Não pense muito. Apenas acabe com tudo…
Geralmente, ele conseguia ignorar as vozes por quase todo o tempo.
Ignorava os sussurros que vinham lhe saudar pela manhã, lhe pedindo para caçar e matar mais alvos do que sua lista permitia. Fingia não ouvir as súplicas ao pé de seu ouvido durante a tarde, que imploravam para que ele rasgasse a traqueia de cada uma das pessoas que olhavam-no com desprezo e o tratavam com repulsa.
Sufocava os constantes pedidos traiçoeiros de desistir daquela farsa de bom comportamento. Afugentava os cochichos em sua cabeça e as sugestões tentadoras lhe dizendo para mandar tudo e a todos naquele lugar para o inferno.
Com as vozes ele sempre soube lidar.
Mas, com os fantasmas era diferente.
Os fantasmas eram seus velhos conhecidos e tradicionais inquilinos. Habitavam as sombras ao redor do alojamento, escondiam-se através da penumbra sob os móveis e se aconchegavam nos cantos escuros dos cômodos do prédio; gostavam de se sentar nas extremidades de seu quarto e frequentemente se escondiam debaixo de sua cama.
Eram quietos e educados, nunca interrompiam suas conversas com outras pessoas e jamais se intrometiam em seus assuntos diários.
Os fantasmas não gostavam de dividir sua atenção. E por isso, só vinham visitá-lo justamente quando ele ficava sozinho na calada da noite. Só abriam suas bocas quando não havia testemunhas ou grandes distrações que pudessem libertá-lo de sua influência.
Quando falavam, era sempre num único sussurro macio e persuasivo. Achegavam -se na hora mais silenciosa e sopravam palavras na cabeceira de sua cama. Suave, persistente e cheio de complacência; falsas vozes de consolo e compaixão. Incitando, atormentando, seduzindo.
É por isso que os fantasmas são os mais difíceis de ignorar.
E nesta noite, ele se esforçava ao máximo para não lhes dar ouvidos. Sacudia a cabeça para afastar a tentação que sussurrava sobre seu ombro e se revirava de novo e de novo sobre a cama, inquieto. O suor frio porejava em toda a sua pele, os lençóis de algodão grudados em seu corpo tenso. A respiração era arfante, o peito subia e descia sucessivamente. Doía. O fôlego lhe escapava.
Eu sei onde você a escondeu. Vai e pegue-a!
É simples e fácil. Simples e fácil…
Eu sei que ela está no guarda-roupa, lá no fundo falso da última gaveta. Vamos… Faça isso. É simples e fácil…
E depois tudo vai ficar bem.
Cambaleante, ele inclinou o tronco e se sentou na cama. O coração disparava. Sua garganta estava ressecada, quente e áspera. Abriu os olhos. Olhou em volta. Um quarto escuro. Um quarto que ele ocupava, mas que não era realmente seu.
O criado-mudo estava ao alcance de seu braço e bastou se esticar um pouco para apanhar o frasco de pílulas. Entornou tudo na palma da mão e olhou para aquelas contas brancas. Horrível. Nojento. Intragável. Seu estômago se contorceu. Um gosto amargo inundou sua boca. Náuseas.
Arremessou as pílulas no chão, ergueu-se da cama e se livrou dos lençóis. Inspirou e expirou fundo (uma… e duas… três vezes). Desistiu de tentar dormir.
O sono não viria, ainda que ele implorasse.
Levantou-se. Olhou para o guarda-roupa.
Ela ainda está lá, no fundo falso da última gaveta.
Vamos, pegue-a! É simples e fácil.
Faça, faça, faça, faça, faça… Faça!
Simples e fácil. Simples e fácil. É simples e fácil!
A voz em coro ainda lhe pedia, suave e insistente. As mãos dele tremiam perigosamente. A silhueta escura do guarda-roupa estava a pouco mais de um metro de distância. Um passo, dois passos, três passos. E agora estava perto demais.
Pegue-a. Ela está na última gaveta.
Você sabe exatamente o que deve fazer. Ande logo.
É simples e fácil. Simples e fácil.
Faça, faça, faça…
Depois disso, vai ficar tudo bem.
É só puxar o gatilho!
O chão se dissolveu. As paredes começaram a girar. Estava sufocando. À beira de um colapso. Desmoronando. Mais uma vez. Não! Já chega! Não podia, não aguentava e não iria mais ficar preso ali.
Saiu do quarto e seguiu apressado pelo corredor, desceu as escadas pulando os degraus e disparou para o primeiro andar. Agarrou a maçaneta e abriu a porta num puxão, quase arrancando-a das dobradiças. E começou a correr.
Ele correu para fora do prédio incansavelmente como um fugitivo. O grande Pátio se estendia à frente e ele o atravessava com todo o fôlego. O céu noturno era limpo e negro, a escuridão agia como uma cúmplice e escondia sua fuga sob um manto de sombras.
Ele sentia seus pés descalços baterem no solo, a grama estalando a cada pisada, o cheiro da terra e das árvores. A ventania pinicava a pele nua e úmida de seu tórax e braços, chicoteava seus cabelos e zumbia em seus ouvidos. Ele vestia apenas uma calça de flanela, mas não se importava com o frio. Era bom sentir o vento contra sua pele. Era bom ainda ser capaz de sentir alguma coisa além daquela voz em sua cabeça.
Não era isso o que você queria?
Então, por que está se segurando? Não pense muito.
Apenas acabe com tudo…
Não! Como eles ainda conseguiam segui-lo? Por que não ficavam quietos pelo menos uma vez? E desde quando ficaram tão rápidos? Talvez tivessem se agarrado em seus tornozelos enquanto não estava olhando. Sim… talvez tenha sido isso!
Sua mente era um enxame de pensamentos confusos e caóticos. Queria ir embora, desaparecer. Silenciar aquelas malditas vozes.
Ele sabia que não conseguiria ficar quieto na biblioteca. E voltar ao alojamento era impossível. Vasculhou a memória e procurou alguma opção viável, mas as poucas que tinha eram péssimas. Para onde ele poderia ir…?
Sem saber para onde, ele correu a esmo permitindo que suas pernas o guiassem. E foram elas que o levaram até o lugar certo.
Ele parou de correr ao se aproximar dos limites internos do Pátio, seus pés derraparam e mutilaram a grama. Arqueou as costas e apoiou as mãos sobre os joelhos, estabilizando a própria respiração. Inclinou a cabeça e olhou para o alto, vislumbrando a entrada de um edifício.
E enquanto ele encarava as grandes portas daquele prédio, os fantasmas ainda encontraram forças para lhe sussurrar uma última vez.
Por cima do ombro, ele sentiu o hálito frio dos espectros deslizar por sua nuca. As mãos etéreas rodearam seu pescoço num abraço gélido, como se o acolhessem como um igual.
E então ele soube, com uma conclusão amarga e resignada: Ainda que ele corresse até os confins do mundo, as vozes nunca silenciariam. Elas já haviam feito morada dentro dele.
Você sabe exatamente o que deve fazer.
Apenas acabe com tudo…
Não pense muito nisso.
Apenas mate todos. E no final…
É só puxar o gatilho e tudo vai ficar bem.
Ele finalmente compreendeu e assentiu consigo mesmo, dando a sua confirmação. E como uma criança obediente, virou-se, estendeu a mão e aceitou a companhia deles.
Porque ele realmente precisava acabar com tudo.
E no final, alguém teria que puxar o gatilho.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!Notas finais do capítulo
Uma cena curta, mas ainda importante para compreender melhor a segunda parte.
Em minha defesa, eu juro que minha intenção era postar um capítulo muito maior. Mas... infelizmente, as coisas não saíram como o planejado, e cá estou eu postando mais um capítulo em duas partes. Acreditem, eu não gosto de fazer isso. Porém, algumas vezes esta é a minha única opção para manter essa estória atualizada.
Muito obrigada por lerem, e me desculpem pela demora. Nos vemos na semana que vem.
Ps: meu humor está pra baixo. Por favor, relevem essa nota travada.
See you soon!