Equinocial escrita por Babi Sorah


Capítulo 15
Divergência


Notas iniciais do capítulo

E depois de uma longa pausa no site.... Cá está mais um capítulo!
Boa leitura!



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*Capítulo 15*

Divergência

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Área Hospitalar – Andar nº2

19h:35m

Karen caminhava pelos corredores assépticos da Área Hospitalar de maneira tão confiante como se fosse em sua própria casa. Seus scarpins de salto agulha batiam suavemente sobre o piso, em passos precisos e graciosos. Já estava tão habituada de ir e vir ao hospital do Instituto que agora já conhecia aquele andar como a palma de sua mão.

Alguns médicos e enfermeiros, já acostumados com sua presença, até davam cumprimentos discretos ao vê-la passar e ela se limitava a retribuí-los com um leve aceno. E Karen era sempre educada com todos, sempre polida e sucinta, mas nunca se misturava ou interagia verdadeiramente com ninguém. Era assim que ela lidava basicamente com todas as relações pessoais em sua vida diária, salvo algumas poucas e seletas exceções.

Desde cedo, seu pai a ensinou que cultivar relacionamentos fora do campo profissional sempre era uma má ideia.

Ouça bem o que eu lhe digo, minha filha. Em nosso mundo, existem apenas dois tipos de pessoas: Aqueles que serão seus inimigos, e os que possivelmente serão seus aliados. Escolha-os cuidadosamente e jamais se deixe influenciar.”

E de fato, ninguém melhor do que Karen poderia atestar a veracidade disto. Ela seguia estritamente esse conselho.

Devido a sua desconfiança e ceticismo natos, a maioria das pessoas frequentemente julgavam-na fria e insensível; alguns outros apenas a tomavam como arrogante. E ela não se importava com a opinião de nenhum deles. Talvez, por que no fundo, não estavam tão longe da verdade. Mas até mesmo isto era irrelevante. Sempre foi.

Após algum tempo, ela chegou à extremidade do corredor e finalmente parou em frente a porta da última sala daquele andar. O laboratório particular de Margoth Persson.

Muito bem.

Era hora de fazer uma visita a um de seus aliados.

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Com um olhar avaliativo, Karen rapidamente analisou os arredores, conferindo se havia alguma outra pessoa transitando pelo corredor ou a observando. Ao constatar que ninguém estava por perto, a pesquisadora procurou no bolso esquerdo de seu jaleco pela insígnia que ganhou de Margoth há mais de sete anos, quando decidiu abandonar a vida de caçadora e renunciou seu posto como Hunter.

A insígnia era uma medalha de ouro ornamentada com o desenho de uma chave.

Use isto para abrir as portas que se fecharem para você.

Foi o que sua mentora dissera, com um sorriso cheio de significados e um olhar que transbordava conhecimento e experiência. Na época, Karen nunca se sentiu tão feliz por ganhar um presente. Isso foi antes de ela compreender o que aquilo realmente significava.

Seus dedos encontraram o pequeno disco dourado e ela levou a insígnia até a fechadura da porta, pressionando-a levemente. A maçaneta de metal girou com um 'clanck', neutralizando o feitiço que protegia a entrada do laboratório. A porta se abriu, e logo depois de Karen atravessá-la, voltou a se fechar de modo automático.

Dentro da sala, a temperatura estava um pouco mais baixa e uma névoa prateada quase invisível se arrastava sobre o chão. A maioria das lâmpadas estavam desligadas, com exceção da cúpula de luz azul posicionada acima de uma grande mesa retangular, ocupada por diversos frascos cheios de ingredientes, tubos de ensaio, ampolas de fórmulas e outros materiais de pesquisa. No restante do recinto, os demais aparelhos e máquinas emitiam um leve zumbido, como se aguardassem por suas devidas oportunidades de serem usados.

E ao lado da mesa, parecendo extremamente concentrada ao utilizar um microscópio; trajando seu uniforme perfeitamente branco e impecável, estava Margoth Persson. Uma senhora esbelta, de estatura média e cabelos loiro-escuros sempre presos em um elaborado coque no alto da cabeça. Sua face era pálida e ainda conservava as feições clássicas e elegantes, apesar de marcado por rugas suaves e linhas ao redor dos olhos esverdeados.

Karen se aproximou da mesa com cautela, incerta se deveria ou não interromper o trabalho de sua mentora, apesar de ter certeza de que ela já notara sua presença ali. Por fim, achou melhor esperá-la concluir o que estava fazendo.

Com as mãos enluvadas, Margoth retirou a placa contendo a amostra de tecido que estivera analisando e a transferiu para um pequeno refratário transparente. Depois, escolheu uma das ampolas organizadas sobre a mesa e com a ajuda de um conta-gotas, despejou na amostra uma minúscula porção de fórmula líquida e observou pacientemente a reação entre ambas. Alguns segundos depois, a amostra se desintegrou em cinzas.

Margoth suspirou com uma decepção contida. Mais uma de suas inúmeras tentativas resultou em fracasso. No entanto, ela não estava disposta a desistir e muito menos demonstrar seu cansaço. Endireitou os ombros, ergueu o queixo e escondeu todas as suas frustrações. E quando finalmente se virou para receber sua discípula, estava novamente calma e confiante.

Se não a conhecesse, Karen acreditaria completamente em sua atuação. Mas, por respeito, não a contestou. Ela sabia que sua mentora trabalhava arduamente para otimizar as medicações e pílulas de Zero Kiryuu, mesmo ciente de que as chances de um verdadeiro sucesso fossem mínimas. Entretanto, também não podia julgá-la por isso.

As pessoas são capazes de se agarrar a qualquer esperança quando estão desesperadas. Ou quando estão atormentadas pela culpa.

— Usou extrato de ambrosia como ingrediente estabilizador? – Karen perguntou antes que lhe escapasse a oportunidade, apontando para as ampolas distribuídas sobre a mesa. — Uma escolha interessante, mas duvido muito que funcione. Experimente a essência de néctar púrpura. É mais fraco, mas em compensação as reações são menos agressivas.

Margoth esboçou um pequeno sorriso para ela.

— Eu testarei isto da próxima vez, muito obrigada pela sugestão. – Sua mentora a respondeu, a voz grave acentuando ainda mais o sotaque sueco do qual nunca conseguiu se livrar. — Já fazia algum tempo que você não aparecia por aqui. Eu posso ajudá-la em alguma coisa, Kareena?

Karen não conseguiu evitar que uma sensação estranha a atingisse. Dentre todas as pessoas, sua mentora era a única que ainda a chamava pelo nome de batismo.

— Ajudar a mim? Do meu ponto de vista, é você quem precisa de ajuda. Está trancada nesta sala há quase dez horas, esgotando suas energias em uma pesquisa sem futuro.

A médica inspirou fundo, reunindo a usual dose de paciência que usava ao lidar com o gênio de sua discípula.

— Eu só terei certeza de que não há nenhuma solução quando esgotar todas as possibilidades.

— É interessante como as suas palavras soam tão parecidas com as de Kaien Cross. – Karen constatou. — Ele me disse algo semelhante antes de me dar ordens para levar a sua paciente até a Câmara de Purificação. – por trás das lentes de seus óculos, os olhos cor de jade se estreitaram numa expressão carregada de desconfiança. — O que está havendo aqui, Margoth? Sei que estão escondendo algo, posso sentir isso. Por que se recusa a me contar?

— Acredite, eu lhe diria se pudesse. – a diretora respondeu em tom apologético. — Mas, desta vez, isso não envolve apenas a mim. Sinto muito.

Essa não era a resposta que Karen desejava ouvir e isso ficou evidente em sua face, que agora assumia uma frieza intensa e sombria.

Sente muito? — sua voz entoou áspera e cortante. — Por sua causa, eu concordei em vir para o Quartel General e aceitei assumir o antigo cargo de meu pai na Divisão Primária¹.Trabalhei para você; te ajudei pacientemente e sem fazer muitas perguntas pois confiava nas suas orientações. E você ainda quer que eu contribua com suas artimanhas, sem nem mesmo me explicar no que estou me envolvendo? Já estou farta disso!

“A partir de hoje, se quiser que eu a ajude, estarei a seus serviços para qualquer tarefa dentro de meu campo de atuação. Porém, no momento em que isto ultrapassar os limites do profissionalismo, não conte mais com a minha presença nesta Instituição. Não há mais absolutamente nada que me prenda a este lugar.”

— Por favor, não fale como se não tivesse nada a perder. Você também tem responsabilidades e deveres a cumprir. – Margoth a repreendeu. ― E quanto a Wesley? Aquele garoto finalmente encontrou um lugar aqui, e você pretende tirar isso?

— Sou a herdeira desta família, Wess fará tudo o que eu mandar. – Karen afirmou, resoluta. — E não se esqueça de que eu sou diferente do meu pai. Já faz muito tempo que não tenho interesse na Associação, não me importo com os caçadores e nem mesmo com as disputas de poder em Trillune.

Margoth a encarou, desejando não acreditar nas palavras que ouvia.

— Kareena, você não pode simplesmente controlar a vida dele para sempre. Wesley não é uma engrenagem ou um de seus projetos que você pode moldar e esquematizar a seu bel-prazer. Ele é seu irmão!

Diante dessa contestação, Karen apenas sorriu. Seu sorriso era frio e artificial, exatamente igual as inúmeras armas que ela já fabricou.

— Algumas vezes… – respondeu calmamente, com um olhar que era quase tão vazio quanto sua voz. ― Eu gostaria que não fosse.

E olhando atentamente para sua discípula, Margoth se deu conta de que não apenas seus sorrisos se transformaram em armas, mas também seus olhos, insensíveis e duros como vidro, e suas palavras agora eram metálicas e polidas como a lâmina de uma adaga.

Apesar de ainda conservar a mesma aparência, os mesmos cabelos lisos e vermelhos, a face delicada e a beleza altiva, Margoth não a reconhecia mais. Pouco havia restado daquela jovem de olhos verdes esfuziantes e cheia de vida que ela um dia conheceu. A guerra a transformou por completo.

— Será que algum dia você vai aprender a perdoar e esquecer o passado, Kareena? – a diretora disse, ainda tentando dissuadi-la.

Girando sobre seus saltos, Karen se afastou da mesa e seguiu para a saída. Seus dedos envolveram a maçaneta e antes de atravessar a porta, ela olhou uma última vez para sua mentora.

— E para quê? Alguma vez o perdão foi de alguma ajuda para qualquer um de nós? Desculpe, mas não consigo me lembrar.

E foi embora, fechando a porta atrás de si.

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Notas finais do capítulo

Fatóides:

¹ Divisão Primária: é um grupo seleto formado pela Elite dos caçadores de vampiros. Todos os seus membros são líderes ou herdeiros de seus respectivos clãs, e claro, são também os integrantes mais poderosos de suas famílias. Apesar de as principais decisões referentes a Associação sejam tomadas pelo Presidente, a Divisão Primária possui muita autoridade e influência, e sob um consenso, podem opinar e exigir mudanças conforme seus interesses. Se ajudar, pensem na Divisão Primária como um Parlamento ou um Conselho. É mais ou menos assim que ela funciona.

Nos próximos capítulos, eu darei mais informações e detalhes sobre eles.

E claro, tudo isto é invenção minha e não existe na versão original do mangá.

Ah, e a maioria já deve saber, mas não custa avisar: assim como os irmãos Nyckell, a personagem Margoth Persson também é de minha autoria.

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E agora todo mundo levanta e glorifica de pé... pois o Nyah voltou!! Diz amém aí, irmãos! o/ o/ o/

É o mais irônico é que um dia antes do site pifar, eu dei um aviso lá no meu perfil de que eu precisaria me ausentar. Mas de qualquer maneira, aqui estamos nós :D

Muito obrigada por todo o apoio de vocês!

E este foi mais um capítulo narrado pela Karen. E eu não sei bem o que vocês pensarão dela a partir daqui...

Mais uma vez, obrigada por lerem.

beijos e até a próxima!