Intro

Acordei. Sentindo-me nua, com minhas roupas em frangalhos, e não reconhecendo o lugar onde eu estava. Lembrava-me vagamente dos últimos minutos apenas. Ou melhor, me lembrava do momento em que briguei mesmo com Anthony – meu pai – o momento em que ele tentou quebrar aquela maldita garrafa de cerveja na minha cabeça. Eu o soquei e saí, simplesmente. Não aguentava mais.

Mas honestamente, eu não ligava para isso. Ele mereceu. Eu vivia de julgar, de pesar os dois lados de uma situação e decidir. E ele estava errado, sempre esteve. Deixei-o desacordado, ali mesmo, sem nem ligar. Reuni uma mochila com roupas e comida, uma faca – que pus na cintura – e saí. Andei. Andei por muito tempo. Duas horas depois, parei para descansar. Sentei-me perto a um restaurante, já fechado a essa hora da noite, e tentei pensar no que faria para chegar ao trabalho, no meu maldito emprego de garçonete, no dia seguinte.

Até que aqueles babacas apareceram. Eu já não estava para brincadeira, quem pode me culpar? E aquela sensação estranha, por dias. Uma fúria, no lugar da falta de empatia. Eu, que costumava não ligar para os olhares estranhos, de pena ou escárnio, das outras pessoas, passei a odiá-las, ou pelo menos me irritar com isso. Eu vivia escondida, sempre vivi, aprendi a ficar quieta, além de conseguir passar dias sem comer ou beber direito, por causa do negligente do Anthony, mas agora... Isso me parecia uma injustiça total. Não me sentia a excluída ou a coitada, mas me enfurecia sempre que eu lembrava da situação. Desaprendi a viver como eu mesma. E foi num desses dias que aqueles babacas, três idiotas bêbados e jovens, me pegaram.

Pararam na esquina. Começaram a gritar gracinhas, que eu já não escutava. Bem, pelo menos não me conheciam. Poderiam ser turistas. E quanto mais eles chegavam perto, mais eu me enfurecia. Eu me levantei, e saquei a faca. Para matá-los, a facadas.

Só que não foi bem assim que aconteceu.