Be Your Everything escrita por Rainy


Capítulo 2
Capítulo 1 - Sou fundo de caridade para medingos


Notas iniciais do capítulo

Atualização: 07/01/2015



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— Velha, saí da minha frente! — esbravejei.

— Isso lá são modos, menina? Sua mãe não te deu educação? — retrucou, enquanto tentava juntar seus pertences. Ela tinha tropeçado sei lá como e sua bolsa caiu, derramando o guarda roupa de Nárnia no chão do aeroporto e interrompendo a passagem.

Por que idoso não vai pra cova mais cedo? Sério, eles só atrapalham.

— Não. Ela estava ocupada demais queimando os neurônios com descolorante. Agora cai fora daí — fui chutando suas porcarias para o lado, até arrumar espaço suficiente para passar meu carrinho com as malas.

Ela exclamou um “Oh” e algumas pessoas começaram a me olhar feio.

Mostrei-lhes o dedo do meio e continuei andando.

Desci as escadas rolantes e passei a olhar ao redor, na esperança de encontrar meus novos parceiros de casa. Então lembrei que nunca tinha os visto na minha vida e minha mãe fora imprestável demais para sequer dizer seus sobrenomes ou algo do tipo. Eu não tinha nem seu telefone!

Ai, droga.

Sem escolha, fui chutando minhas três malas até o balcão de informações do aeroporto. A atendente tinha aqueles cabelos de palha e mascava o chiclete de uma forma que respingos de baba caiam por cima de alguns papéis.

Ela demorou exatos três minutos e quarenta e cinco segundos para perceber que eu estava ali, e mesmo quando me viu não fez questão de falar nada. Imprestável.

— Ei, descabeçada — ela voltou a me olhar, um pouco irritada agora.

— Boa tarde, senhorita. Em que posso te ajudar? — disse com uma dose recheada de falsidade.

— É que eu estou meio perdida, ent... —

— O juizado de menores é no andar de cima. — interrompeu-me. — Tenho certeza de que vai encontrar seus pais lá. Passar bem — a loira-cabelo-de-palha virou a cadeira de costas pra mim e voltou a lixar as unhas.

MAS MEUS PAIS ESTÃO EM ALGUM CANTO DA EUROPA, foi o que eu quis gritar para ela, mas avistei algo que poderia me ajudar mais do que a vaca na minha frente.

Mexer naquilo não era tão complicado. Só apertei o botão vermelho e logo um ruído foi se espalhando pelo aeroporto.

— Olá. Meu nome é Katherine Elizabeth Moore, e —

— Mas que merda você está fazendo, garota? — a vaca se levantou da cadeira e tentou puxar o alto falante das minhas mãos. — Me dá isso!

— Cai fora ou eu arranco os pelos da sua sobrancelha com os dentes! — seus olhos se arregalaram e ela deu a volta no balcão, correndo para qualquer lugar no mundo que não me interessa.

Ótimo. Menos uma no meu caminho.

— Continuando... — pigarreei — Eu gostaria de saber quais de vocês, americanos de merda, são os responsáveis de me levar para a minha nova casa. Fique sabendo que eu não queria estar aqui e já tenho um ódio mortal por vocês. Vir para esse país de gente que acha que camada de ozônio é nome de produto de cabelo é realmente decepcionante, mas, como não tenho como voltar pra casa, o lance é ficar por aqui mesmo. Então, seres humanos com inteligência em falta, estou esperando no balcão de informações.

Joguei o alto falante de qualquer jeito no balcão e ele quicou, fazendo um barulho alto e irritante. Escutei um murmurinho nas minhas costas e me virei para ver o que era, me deparando com algumas pessoas que bem irritadas. Eles estavam prontos para me retalhar. Até aquela velha de mais cedo estava lá, apontando seu guarda-chuva na minha direção e, pela sua cara, eu sabia que ela queria me bater com aquilo.

— Senhorita, venha comigo, por favor — o segurança nem me deixou responder, e já foi puxando meu braço e me levando no meio da multidão.

— Esse povo quer me matar — sussurrei, desviando de umas bolinhas de papel lançadas em minha direção.

O segurança riu.

— Não posso culpá-los. Você xingou um aeroporto inteiro.

Neguei com a cabeça.

— Eu xinguei os imprestáveis que deveriam me buscar e que, pelo visto, nem estão aqui. Mas, dane-se, o xingamento vale pra vocês também. Ah, espera — tentei parar de andar, mas o aperto em meu braço aumentou e continuei sendo arrastada. — As minhas malas!

Ele apontou com a cabeça para trás e me virei o suficiente para ver dois policiais carregando minha bagagem. Que maneiro. Nunca tive escravos antes.

— Mas, então, segurança... — estiquei-me o suficiente para ver o nome em seu crachá — James, para onde está me levando?

Atravessamos as portas do aeroporto e logo vi uma viatura parada bem em frente.

— Para a delegacia, senhorita Moore.

Agora ferrou de vez.

(...)

Eu estava sentada em um banquinho da delegacia, com um cara do meu lado esquerdo que tinha o nariz escorrendo em sangue, e do lado direito um mendigo que estava lá por tentativa de assalto.

Deus, eu nasci com a dádiva de atrair azar, só pode.

De acordo com o que uma policial tinha me explicado mais cedo, eu estava lá porque “violei a paz” e também porque era uma menor de idade sem responsável. Torci para que eles me deportassem de volta para a Inglaterra, mas só pegaram meus documentos e me jogaram nessa porcaria de banquinho.

— Elizabeth Moore. — a secretária do distrito chamou-me.

— É Katherine, cacete! — resmunguei, arrastando minhas malas até o balcão, já que deixar perto daqueles criminosos não era uma opção.

Ela faz um barulho estranho com a boca e lançou-me um olhar repreendedor.

— Você não é nem um pouco educada, Katherine.

Dei de ombros.

— Já me disseram coisa pior. Mas, então, já tá tudo resolvido?

— Não tão rápido, mocinha — eu ia retrucar, mas ela fez cara de poucos amigos então fiquei quieta. — Mas nós conseguimos falar com o seu pai e ele nos explicou a situação. É verdade que você já foi para cinco reformatórios? — seus olhos se arregalaram um pouco, incrédulos e, ao mesmo tempo, curiosos.

— Olha, não sei que espécie de novela mexicana meu pai te contou, e provavelmente é verdade, mas eu quero saber quando é que eu vou sair daqui. Então dá pra agilizar ou seus cérebros americanos de batata entraram em curto circuito?

Ela jogou os documentos na minha cara e me mandou voltar para o banquinho. Oh, demência...

— Ei — peguei um bloco de notas em cima do balcão e joguei na cabeça do mendigo. — Te dou cinco dólares se você carregar minhas malas até aí.

Eu sei que o espaço de um lugar para o outro era ridículo, mas minhas malas estavam muito pesadas e eu precisava evitar a fadiga.

Ele balançou a cabeça, negando.

— Trinta dólares. — respondeu.

— Quinze e uma latinha de refrigerante, seu sugador capitalista.

Ele fez um cara de quem “comeu e não gostou”, mas se levantou e levou minha bagagem para perto do banco. Aproveitei que ninguém estava olhando e peguei uma lata de coca cola que estava na mesa de um tal de “delegado Dawson”. Tenho certeza que ele não vai sentir falta.

Entreguei o pagamento na mão do mendigo e joguei meu corpo no assento.

Porcaria de vida.

Porcaria de país.

Porcaria de...

— Aproveitadora — tentei encontrar a voz que interrompeu meus pensamentos, mas olhei em volta e não vi nada demais.

Ótimo. Agora estou ficando louca.

— Além de aproveitadora, é lerda. — virei meu corpo para o meu lado esquerdo, onde o cara com o nariz ensanguentado estava. O pano branco cobria grande parte do seu rosto então não consegui ver direito como ele era. A única coisa que se ressaltava era sua pele branca — não tão branca como a minha, já que eu era praticamente um zumbi — e os cabelos bem pretos.

— Garoto, poupe seus comentários inúteis para si mesmo. Ninguém precisa ter o desprazer de ouvi-los. — eu disse enquanto virava de costas e olhava o mendigo acabar com a sua coca. Mas que visão do paraíso...

A secretária — que tinha saído para fazer sei-lá-o-que — voltou ao seu posto e chamou mais um nome, mas não era o meu então não dei muita importância. Vi quando o garoto se levantou e foi até ela, e eu — nada curiosa — fui prestando atenção na conversa dos dois, até porque não tinha coisa melhor pra fazer. Não mesmo.

— Hellen. Que bom te ver. — disse o garoto apoiando os cotovelos no balcão.

— Sabe, às vezes eu acho que te vejo com mais frequência do que meus filhos. — ela riu e balançou a cabeça, negativamente. — O que aprontou dessa vez?

O menino deu de ombros, fazendo pouco caso.

— Nada demais.

— Se fosse mesmo “nada demais” — fez aspas no ar —, você não teria vindo parar aqui. Mas, tudo bem. Ninguém prestou queixa, para a sua sorte. Já liguei pra sua mãe, ela deve estar vindo te buscar.

Fala sério. O menino devia ter uns dezenove e a mãe ainda tinha que buscar ele? Eu não podia deixar essa passar.

— Então... — falei, vendo-o sentar do meu lado — Quer dizer que a mamãe vem buscar o neném na creche?

— Não enche o saco, pirralha. — resmungou.

— Mas isso é tão adorável. Ela vem trocar sua fralda também? — bati palmas e comecei a rir. Foi ai que um pano foi jogado no meu rosto. Um pano ensanguentado.

Levantei do banco e parei em frente ao garoto.

— VOCÊ TÁ MALUCO?! — gritei, não me importando se estava cercada de policias armados, que poderiam muito bem me prender a qualquer momento.

Os cantos da sua boca se ergueram, formando um sorrisinho debochado que me irritou profundamente.

— Que foi, princesa?

— Não me chame de princesa. — retruquei.

— Eu te chamo do que eu quiser.

— E posso saber quem te deu esse direito?!

— Eu. — sorriu dessa vez mostrando todos os dentes. Eu poderia dizer que os dentes dele eram perfeitamente brancos e alinhados, mas isso não vem ao caso. O garoto ainda era um ogro.

— Vai se f... —

— Filho! — uma voz feminina interrompeu minha fala. Mas que merda!

O garoto acenou com a cabeça, e sua mãe veio correndo ao seu encontro e segurou seu rosto com força.

— Tá tudo bem com você? — disse, analisando os estragos em sua face. — Te machucaram muito?

Aquela cena se não fosse cómica, seria trágica.

O filhinho da mamãe percebeu os meus risos e foi logo se levantando irritado, colocando o dedo na frente do meu rosto.

— Para de rir, pirralha.

Dei um tapa em sua mão.

— Não me diga o que fazer, descabeçado.

Nós começamos a nos encarar. Meus olhos azuis lindos e brilhantes, contra aqueles verdes cor-de-bosta-de-cavalo. Acho que ficaríamos ali por uma eternidade, se a mãe do lesado não tivesse interrompido.

— Elizabeth? — disse ela, olhando para mim com espanto.

— É Katherine, caramba!

Ela colocou as mãos na boca, como se não acreditasse no que estava vendo.

— Ai meu Deus! É você mesma. Sempre odiava que as pessoas te chamassem pelo segundo nome...

Olhei para ela como se tivesse acabado de ver um alienígena. O tapado acabou fazendo a pergunta de ouro:

— Mãe, dá onde você conhece essa pirralha?

— Ora, filho. — ela deu tapinhas nas costas dele. — Essa é a filha dos meus amigos, a Katherine. É ela que vai morar conosco nessas férias. Isso não é maravilhoso?

— Não! — eu e o bebê das fraldas respondemos ao mesmo tempo.

Senhor. O que eu fiz pra merecer isso?


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Notas finais do capítulo

Gostaaaaaaaram? Espero que sim (:
Beijoooos