O copo de leite continua lá.

- Beba. - digo encarando-o.

- Beba. - diz ele olhando em meus olhos. - Ok. Feche os olhos. Eu vou beber metade, e você bebe o resto.

- Porque eu tenho que fechar os olhos? - pergunto.

- Só feche! - diz ele. Reviro os olhos e fecho-os. - Ok. - Escutos seus goles e em seguida, sinto o vidro gelado em meus lábios. - Beba. - Começo a beber o leite, mas começo a perceber que isso é mais do que a metade. Tento afastar o rosto, mas ele segura meu queixo. - Beba. - Minha boca começa a ficar cheia, mas não engulo. Ele tira o copo de meus lábios. - Engula. - Nego com a cabeça, com as bochechas cheias. - Shannon, para de ser idiota! Engula.

Engulo o líquido e suspiro.

- Satisfeito? - pergunto ofegante. 

- Muito. - Ele sorri e passa a mão no lado de meu rosto. - Pare.

- Com o que? - pergunto rindo. 

- De agir como se só eu merecesse sobreviver.

- É o único que vai conseguir. - murmuro olhando para o chão. - Sabe que é verdade.

- Não, não é. - diz ele sério.

- Eu não consigo ficar em pé. - digo encarando seus olhos. - Como espera que eu sobreviva?

Ele ri.

- Vai mesmo me fazer sobreviver, para depois ter que ouvir um: eu te avisei do meu pai? - Ele sorri. 

Cruzo os braços e as pernas.

- Então prefere morrer? 

- Não. 

- Então o que quer? - Encaro seus olhos. - Você não vai sair daqui e agir como se nada aconteceu, não é? 

- Quem disse que vou encontrar com ele? - Ele se deita no chão. - Eu não pretendo falar com ele.

- Mas ele quer falar com você.

- Eu quero minha mãe de volta. E ai? Vou conseguir isso? Não. Nem tudo o que ele quer, ele vai ter. - Ele se senta no chão e me encara. - Estamos mesmo agindo como se... Eu achasse uma saída?

Dou de ombros.

- Você é muito idiota. 

- Você também. - digo sorrindo.

- Não é nenhuma novidade. - murmura ele bebendo um gole de licor.

- Não. - digo de olhos fechados. - Por favor. Se quer ficar bêbado, faça isso depois da minha morte.

- Se chama conhaque. - diz ele. - Esquenta o corpo. Não é necessário mais do que um copo pequeno. Beba.

Ele segura o copo de vidro e serve um dedo do líquido, entregando-o para mim.

**

- Deixou conhaque lá? - grito batendo em eu braço.

- Pare! - grita ele. - Eu esqueci completamente que Nathan sabia muito de bebidas. 

- Deveria ter pensado nisso antes de morder a perna dela. - diz com a mão na cintura, andando de um lado para o outro. - Não faz mais diferença este frio. 

- Não. Só tem uma garrafa. Eu tenho certeza.

Reviro os olhos e me jogo na cadeira, bebendo mais um gole de vinho.

**

- Eu não vou beber. - digo girando meu corpo na direção da porta, sentindo minha perna doer.

- Não vai deixar você bêbada. - diz ele. - É só um gole. Como um xarope.

- Eu não vou beber. - repito. 

- Shan. 

- Eu não vou fazer isso. - digo. 

- Porque? Abe não contou nenhuma história. Vai ter que me contar.

- Não tem história nenhuma.

- Então, você tem algum problema com sobrevivência? 

Me viro e arranco o copo de sua mão, empurrando o líquido por minha garganta.

- Feliz?

- Quem deveria estar feliz é você. Não vai morrer de frio. 

Sinto minha pele esquentar.

Vejo uma gota de suor cair da testa de Nathan.

- Está com frio? - pergunta ele com as sobrancelhas levantadas. Nego com a cabeça. - Mereço um obrigado?

- Obrigada. - digo.

- E um beijo? - Ele se aproxima, mas o empurro. 

- Não. - digo. - Você me deu bebida, nada de tão... Impressionante.

- Pare de ser chata. - murmura ele.

- Pare de ser idiota. - digo encarando seus olhos. 

Ele se inclina em minha direção, deixando-me deitada e encarando seus olhos.

- Sou idiota por gostar de você?

- Você normalmente gosta de vadias. Então, isso está longe de ser um elogio.

- E se eu disser que não estou pensando em você como uma vadia?

- Vou achar que você está bêbado.

- E se eu provar isso?

- Vou chutar você em um lugar não muito agradável. 

- Você está tão gentil hoje. A mordida te deixou assim? 

- Não. Saber que vou morrer, me deixou assim. 

**

- Eles estão mesmo... - Começa Carter boquiaberto.

- Conversando. - Completo. 

Essa é a conversa mais estranha já vista.

Nathan está sobre Shannon e ela parece não se importar com isso. 

Carter também parece estar irritado, como se ele...

- Você gosta dela. - digo. Ele me encara seriamente. - Você gosta mesmo dela. Você não deixava ela sair não porque eles poderiam não voltar, mas porque ela estaria com o Nathan. Carter Lewis, pela primeira vez, você realmente gosta de uma garota.

- Como se você estivesse bem com o Nathan em cima dela.

Solto uma risada. 

- Ah, mas eu pelo menos aproveitei. - sussurro em seu ouvido, segurando seu ombro. - Não é?

**

Sinto a respiração de Nathan em meus lábios.

- Pretende ficar muito tempo ai? - pergunto.

Ele move os olhos na direção da sobrancelha e franze o queixo.

- Talvez. Isso te incomoda? 

Empurro seu ombro, fazendo-o cair de costas ao meu lado.

- Um pouco. - digo olhando para o lado e sorrindo. 

- Como vai a perna? - Ele encara o teto.

- Bem. - digo sentindo-a arder. Sinto algo preso em minha garganta. Sento no chão e tusso, até que esta maldita sensação passe. - Mas acho que estou doente.

- Agora que você disse... Posso dizer que sim. Mas pode ser só um resfriado.

- Ou o sinal de que ela está virando um bicho. - diz Georgia e ri. - Sabe, nós dois estávamos discutindo aqui e... Chegamos a conclusão que vocês foram a melhor comida viva que já passou por essa casa. 

- E espera que a gente fique feliz com isso? - pergunto.

- Por educação, sim.

- Educado comer a carne das pessoas. - murmura Nathan. - Ok. Podem pelo menos dizer á quanto tempo estamos aqui?

- Três dias.

Não parece tanto. 

Mesmo parecendo pouco, isso só pode significar uma coisa.

Eu e Nathan nos encaramos, provavelmente pensando no mesmo trecho, de um mesmo livro.

Após três dias de um corte profundo. Os sintomas de tosse, enjoo e ardência no corte, pode significar a transformação de humano, para um animal irracional.