A Bênção De Estige escrita por O Raposa


Capítulo 1
Prólogo.


Notas iniciais do capítulo

Dedico essa história a Camille Machado, amiga e escritora, que merecia coisa melhor.



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O vento assobiava, trazia consigo o clima úmido de uma recente chuva e uma noite de trágicos destinos. Estávamos a beirada de um penhasco, do nosso lado direito estava o precipício e em baixo encontrava-se um riacho que aparentava ser calmo, mas não deixe se enganar pelas aparências, ele tinha, no mínimo, 7 metros de profundidade e também era encantado. Qualquer um que ali caísse teria que sacrificar o que mais dava valor e deixar cair em suas profundezas, se você não o fizesse você também seria sugado e apenas escaparia quando seu coração não bombeasse mais.

Ao lado esquerdo ficava o resto do penhasco que ia ficando mais largo até se juntar a um pequeno bosque, que também ficava por ali. Havia várias rachaduras na pedra e entre elas ficavam vários musgos escorregadios e plantas que morriam por falta de espaço antes mesmo de crescerem.

Finalmente a minha frente estava uma linda mulher, essa que era dona de toda minha atenção no momento, vestida com sua já habitual armadura impecavelmente polida e empunhando uma espada em meu pescoço. A expressão de incorformação que ela mantinha assolava e afugentava completamente qualquer outro sentimento que pudesse sentir, seus cabelos negros, contrastantes com a pele, que quase chegavam ao quadril estavam desalinhados e balançavam com alguns fracos sopros do vento. Abria e fechava a boca constantemente, queria dizer algo, mas suas palavras eram levadas para longe antes que pudessem se tornar audível.

Pressionou um pouco mais a espada contra meu pescoço fazendo um pequeno corte, que em poucos segundos já estava totalmente curado. A espada que ela brandia com tanto cuidado e disciplina não era uma espada comum, um presente meu, uma arma perigosa e letal para qualquer ser sobrenatural, mas totalmente inofensiva para humanos. A lâmina de dois gumes era negra e feita de um metal que havia sido extinto a muito tempo, indestrutível. A guarda era encrustada com 3 pedras, duas em cada uma das extremidades e uma no centro, cada uma de cada cor, vermelha, verde e azul. Representavam Fogo, terra e mar. O punho era feito de couro de centauro, tão negro quanto sua lâmina, e por fim o pomo também havia uma pedra encrustada, iguais às da guarda, era incolor e assemelhava-se a um diamante, esta representava o ar.

Ela abaixava a espada, lentamente, até que já não estava posicionada ao meu pescoço, bateu a ponta dela no chão, com força, algumas fagulhas soltaram devido ao atrito da pedra com a lâmina. Estava cabisbaixa e agora seu cabelo tampava seu rosto.

– Eu confiei em você. – sua voz era carregada e chorosa – Está feliz agora!? Não, você não sente, certo? Você é apenas... – fez uma pausa, sua voz tinha um tom ludibrioso – um monstro.

Senti algo crescer dentro de mim, algo que eu já havia sentido antes e que eu não poderia sentir mais, estava sendo acusado de um crime que eu não cometi, de um assassinato que eu não tive nenhuma relação. Ela estava certa, eu era um monstro, mas não havia feito aquilo.

Abri a boca para pronunciar algo e novamente aquela sensação, o ar escapou dos meus pulmões e nenhum som emitiu de minha boca. Calei-me e fechei os olhos. Eu não estava autorizado a sentir. Respirei calmamente até que aquela sensação se afastasse e então, sumisse. Novamente abri a boca e pela primeira vez falei.

– Você está certa, eu sou um monstro. – Minha voz e meu rosto eram neutros, não demonstravam expressões ou sentimentos, ela levantou a cabeça abruptamente, seus olhos por um momento se arregalaram em espanto e novamente uma expressão de devastação tomou seu rosto, continuei. – Mas não cometi aquilo, eu... Não matei ninguém.

Encaramo-nos por alguns minutos que se pareciam horas torturantes, estava prestes a desaparecer quando ela voltou a falar.

– Sua mão... – disse cautelosa – Me dê sua mão. Repetiu agora convicta do que estava falando e colocando a espada em uma bainha que ficava em sua cintura.

O nome dela era Mira, o fato dela querer minha mão era porque ela já foi uma deusa. Há muito tempo foi considerada deusa das batalhas e campos, mas revogou ao seu cargo para se tornar humana. Em troca de deixar seu posto teria direito a três desejos. Estes foram: Uma floresta do tamanho de três dos maiores reinos e que seja protegida de intrusos, nenhum humano a encontraria a não ser que ela deixasse; tropas de guerreiras: ninfas da floresta para que pudessem cuidar da comida e do lazer e algumas elfas, as melhores arqueiras; e, por último, desejou que antes de sua vida humanada se findasse encontraria o amor, o amor humano que ela sempre ouviu em histórias e presenciara dos céus. Assim foi a ela concebida, com o tempo ela construiu um grande castelo onde pôde abrigar toda a sua tropa e a cada dia seu governo ficava cada vez mais forte.

Mesmo tendo desistido de ser uma divindade, alguns dons não podem ser retirados dela, um deles é o poder do Oráculo. Ver o passado e o futuro de alguém com um toque. Estava receoso, mas assim o fiz, entreguei minha mão e ela.

Ela fazia círculos em minha mão com seus polegares, como se a estivesse acariciando, e soletrava algumas palavras que eu era incapaz de compreender, devia ser alguma língua morta falada pelos deuses. Alguns minutos depois ela parou, seus olhos estavam completamente brancos e imóveis, ela estava imóvel. Apertava minha mão com força que começara a doer. Ficou um tempo naquele estado até que voltou ao normal, respirava descompassadamente, como se estivesse segurando a respiração por muito tempo. Ela olhou-me ainda ofegante, seu rosto agora parecia mais aliviado. Fechou os olhos e inspirou o ar, ficando com ele bastante tempo em seu pulmão, e soltou. Parecia reconfortada.

Sua boca dobrou-se em um meio sorriso, o primeiro que eu vi em seu rosto naquele dia, aquilo para mim também era... Reconfortante.

Assim chegaram suas tropas, um bando de mulheres e Elfas vestidas com armaduras brilhantes, humanas empunhavam em suas mãos espadas e as Elfas já se posicionavam com o Arco mirando em minha direção. Uma mulher robusta, cabelos ruivos e ondulados caminhou até nós, era Zanyth, Mira a nomeara líder das tropas e seu braço direito. Em seu rosto, do canto do olho esquerdo até a ponta da boca, estava uma cicatriz branca em formato de lua, o que a tornava ainda mais assustadora. Aproximou-se até ficar em um espaço de dez paços entre nós.

– Senhora, precisamos matá-lo. – Disse calma, porém confiante, estava disposta a fazer o que fosse preciso para ter minha cabeça em uma lança.

– Não! – Respondeu Mira quase instantaneamente, ela andou, aproximando-se de Zanyth até que ficasse cara-a-cara com ela – Eu vi, ele é inocente.

– Mas senhora, ele continua sendo um monstro. Temos que acabar com ele! – Retrucou. Mas em um movimento em que estava fazendo com os braços, junto da fala, acabou encostando a mão no ombro de Mira e assim ficou. Permaneci onde estava antes, observando. Mira e Zanyth estavam imóveis e ambos os olhos estavam brancos, como quando Mira vira meu passado. As duas cambalearam para trás, como se tivessem recebido empurrões. Mira firmou a mão na testa, como se acabasse de ter uma horrível dor de cabeça. Zanyth forçou os joelhos para não cair no chão.

Quando Mira se recuperou juntamente com Zanyth seu rosto era de espanto, como se acabasse de descobrir algo que abalara toda a sua estrutura. Zanyth por outro lado tinha um rosto enfurecido, como se seu grande plano acabasse de ter sido arruinado.

– Você... – Mira começou a dizer, porém não teve tempo de articular mais nenhuma palavra. No mesmo minuto Zanyth esbravejou para as Elfas atrás dela.

– Atirem! Matem-no! – Segundos, Milésimos. No outro momento eu só pude enxergar várias flechas fortalecidas por um encantamento das Elfas vindo em minha direção, fechei meus olhos sem mesmo perceber, mas o que senti foi diferente. Um peso caindo sobre mim e um baque mudou de um metal, uma armadura. Mira. Segurei-a em meus braços porque ela já não tinha força para manter-se em seus próprios pés. As flechas tinham um encantamento muito forte, eram duas vezes mais destrutivas que uma flecha normal e em sua ponta continha um veneno capaz de matar um ser humano em poucos minutos. Duas flechas haviam conseguido penetrar a armadura pela lateral. Seu rosto estava ainda mais pálido, estava morrendo. Com o pouco de força que ainda lhe restara ela forçou-se a colocar a boca em meu ouvido e sussurrar.

– E-eu vou... – Parou e respirou pesadamente por um instante, sua voz estava fraca e falha – Volta-ar pra vo-ocê.

Terminou de falar e assim faleceu em meus braços. Olhei para frente, a tropa toda estava em choque. Eu estava em choque. Pela primeira vez em muitos anos voltei a sentir raiva, ódio, medo, tristeza e luto. Eram tantos sentimentos que eu havia aprendido a controlar que eu não sabia como agir. Senti minha pele arder e meus olhos vacilarem, estava voltando minha verdadeira forma, realmente teria acontecido se o grito de Zanyth não tivesse me despertado de alguma espécie de transe.

– Peguem-no! – Ela gritou para tropa. Elas demoraram alguns segundos para digerir e assimilar as palavras, mas então já estavam correndo atrás de mim, estava sem saída. Fiz a única coisa que me pareceu lógica no momento. Apertei ainda mais o corpo de Mira junto ao meu e então... Pulei penhasco abaixo. A queda foi rápida e o encontro com a agua foi extremamente doloroso. Eu sabia que aquilo não me mataria, por isso pulei, mas havia me esquecido de algo, o riacho era encantado. Quanto mais tentava subir para a margem junto com o corpo de Mira, mais ele me puxava para baixo, até eu me lembrar do que Mira havia me dito uma vez:

Este é um rio amaldiçoado. Se algum dia caíres nele, terás que sacrificar o que tiver de mais valor consigo, se não fizer, morrerás.

Acariciei seu rosto selando de leve nossos lábios. Peguei a espada que estava na bainha e o colar que ela usava e então a soltei. Fiquei olhando ela cair até meus olhos a perderem na escuridão do riacho. Novamente nadei, rapidamente, e cheguei à margem, quando olhei pra cima Zanyth estava na beirada do penhasco, encarando-me. Uma fúria incontrolável invadiu meu coração, mas não podia me deixar dominar. As tropas já estavam quase me alcançando, não seria difícil escapar delas, era muito mais rápido que todas juntas, encarei Zanyth mais uma vez e corri. Desapareci por entre a floresta tão rápido que foi como se eu nunca estivesse ali.

Corri até chegar a algum lugar que eu nunca havia estado antes, as juntas das minhas pernas doíam, já estava amanhecendo e os primeiros raios de sol estavam se fazendo presente, a minha frente estava uma cerejeira, ainda jovem. Carreguei a espada até a árvore e escrevi o nome de Mira em uma língua dos deuses, uma das poucas palavras que ela me ensinara em seu antigo idioma. Em uma pequena fogueira que fiz, queimei o colar que havia pegado e recitei algumas palavras em um idioma antigo, morto.

Este era um pequeno ritual feito há muitos séculos a deuses que morriam em batalhas, diziam que serviam para honrarem sua memória.

Estava exausto como nunca estive em muito tempo, encostei minhas costas na cerejeira e coloquei a espada em meu colo, adormeci. Naquele dia eu sonhei, não, era uma memória, algo que há muito tempo eu havia esquecido. Em uma época onde deuses interagiam diretamente com humanos, um deles burlou uma regra e contou-nos um segredo que devia ser guardado. Deuses sempre terão a essência divina, tendo desistido de seus cargos ou não e, então, o mais importante...

As últimas palavras de um deus sempre se tornam profecias.



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Notas finais do capítulo

Oe! o. Bom, essa não é minha primeira fanfic aqui mas é a primeira que eu pretendo dar continuidade. Não tenho a melhor escrita mas acreditem, já foi pior. Muito pior.

Devo toda essa "evolução" em escrever é credito a Mille (http://fanfiction.com.br/u/199912/)que esteve sempre me ajudando, obrigado!

Bom, espero que gostem e me mandem comentários. Obrigado por ler! ^^