Cecília Nowrt - Reino de Norvagen

O dia estava nublado e ventava fortemente nos reinos de Norvagen, as árvores já quase sem folhas balançavam conforme o vento, todos os aldeões se preparavam para a possível tempestade que chegaria, rei Aaron e rainha Lauren permaneciam em seus aposentos, imaginando que sua filha e seu filho estariam fazendo o mesmo, porém príncipe Sírium continha outros planos.

— Preparada? - Perguntou Sírium para sua jovem irmã que se depositava em posição de batalha a sua frente.

— Nasci preparada - Praticamente rosnou a jovem Cecília em seus apenas dez anos, Sírium despojou um sorriso sarcástico e se colocou em posição fazendo sua armadura tilintar, aos seus pés estava posto um círculo com 15 adagas das quais pegou três e atacou contra a jovem morena.

"1... 2... 3..." Contou Cecília em sua própria mente enquanto desviava o caminho das adagas com chutes. "4... 5..." Desviou mais duas com suas próprias adagas gêmeas. "6... 7... 8... 9..." Mais quatro se foram por seus braceletes. "10... 11... 12... 13... 14..." Contou novamente se jogando para traz no ar, Cecília ficou esperando a décima quinta adaga mas esta não veio, a jovem se levantou abrindo os olhos e encarando seu irmão de maneira confusa, porém algo que a garota não esperava aconteceu, a última adaga veio voando em direção a seu rosto, e, em um reflexo rápido, a garota agarrou a adaga pelo cabo a centímetros de seu rosto, perplexa a menina abaixou a adaga e encarou seu irmão.

— Está progredindo bastante Cecília. - Sorriu Sírium.

— Tive um bom professor. - Falou ela divertidamente, então a jovem pode perceber o brilho cruel nos olhos de seu irmão, e seu único pensamento foi "O-oh".

— Argus! - O grande dragão branco que antes se depositava camuflado atrás da garota se mostrou e com sua longa cauda com espinhos deu uma rasteira na jovem, que, com um grito agoniado, foi parar do outro lado da enorme arena em que praticavam.

— Argh! Sírium isso foi trapaça! - Esbravejou enquanto tentava se levantar sem sucesso.

— Na guerra não existem regras minha irmã. - Explicou Sírium enquanto montava em seu dragão albino e voava em direção a irmã. - Você pensou que eu havia acabado, mas eu não tinha. Você pensa de mais Cecília, e na guerra, há momentos em que um guerreiro não deve pensar, deve apenas agir.

Terminando de falar, Sírium desceu do dragão, agora ao lado da jovem, o rapaz estendeu sua mão para que a irmã se segurasse nela e se levantasse, porém a mesma recusou a ajuda do irmão e se levantou por conta própria, o encarando com um misto de desgosto e admiração.

— Lembro-me, irmão, que também me ensinaste a nunca confiar em meus oponentes. - Retrucou ela. Ao ver o sorriso de aprovação no rosto do irmão, não deixou de se animar, mas é claro, não demonstrou sua felicidade.

— Venha, o treino acabou pequena irmã, Argus quer lhe mostrar uma coisa. - Sorriu Sírium para a mais nova, que lhe respondeu com um revirar de olhos.

— Eu não, estou com raiva de você Argus. - Disse a menina indo em direção ao dragão de brilhantes olhos púrpura enquanto tirava algumas curtas mechas negras que grudavam em seu rosto pálido. - Você me machucou Argus, não vou falar com você, mesmo sabendo que é o último dragão de Norvagen...

Ao terminar a frase, Cecília acariciou o focinho branco do dragão, que havia se abaixado para sua dona, ao fazer isso Cecília ouviu uma voz familiar atrás de si, logo virou-se para ver quem havia falado.

— Zenox?! - Indagou Sírium surpreso ao ver o mago albino que vinha voando acima de um bloco fino de gelo na direção dos dois

— Que bom vê-lo embaixador... - Resmungou Cecília largando Argus e indo em direção a seu irmão com os braços cruzados e uma expressão emburrada no rosto.

— Muito bom vê-la também jovem Cecília, mas quanto ao título de embaixador, fico imaginando, para que um embaixador dos dragões, se não há mais dragões? - Enquanto falava criou em sua mão um pequeno dragão de gelo que, assim que terminou a pergunta, quebrou. - Será que devo me aposentar?

Quando terminou sua pergunta, Zenox sentiu um ar muito quente lhe acertar o rosto e se virou para ver o que era, mas nada via ali, estreitou os olhos de maneira confusa, quando já ia virar-se para indagar aos irmãos o que havia sentido, o "nada" a sua frente começou a tomar forma, logo Zenox pode perceber o grande dragão que se depositava a sua frente, as escamas brancas que reluziam por todo o corpo, os espinhos enormes e assustadores que se espalhavam pela ponta de sua cauda e de suas asas, os olhos de um púrpura profundo e o cristal de mesma cor que havia grudado em uma parte de armadura draconiana em seu peito, o medo percorreu o corpo do homem mas a malícia e a cobiça eram claras em seus tempestuosos olhos azuis gelo.

— Acho que Argus não concorda com você Zenox. - Disse Sírium em tom de brincadeira, não percebendo o olhar cobiçoso do mago.

— Ah... Sim, sim.. - O embaixador forçou uma risada para Sírium. - Mas me diga rapaz, qual o poder do cristal de seu dragão? Invisibilidade?

— Camuflagem. - Resmungou Cecília novamente, a presença de Zenox a causava calafrios, podia ser apenas pelo fato de que ele era um mago de gelo, mas ela tinha certeza de que não era só isso. - Tenho certeza de que um mago tão poderoso como você, embaixador, não perderia seu precioso tempo de trabalho, só para saber qual o poder de nosso dragão, então, pode ao menos falar o que veio fazer em meu reino?

— Ah, sim, bem, apenas acho que o embaixador dos dragões, deveria ver de perto o primeiro voo de sua princesa, não concorda, minha jovem Cecília.- Ao terminar de ouvir a frase, Cecília se virou para seu irmão, a súplica e o desejo tomavam conta de suas íris cinzentas, suas mãos se juntaram a frente de seu queixo e em seus lábios finos um sorriso infantil apareceu.

— Oh Sírium, irmão meu, príncipe de Norvagen e herdeiro do trono. - A garota usava o linguajar de uma verdadeira princesa pois sabia que aquilo o afetava de alguma maneira. - Diga-me eu lhe suplício, diga-me que poderei mesmo fazer meu primeiro vôo com Argus hoje!

— Ah, sim, era esta a surpresa de Argus, mas como você está brigada com ele, vocês não poderão voar hoje, não é? - Brincou Sírium, adorava ver a irmã afobada daquele jeito.

— Eu e Argus? Brigados? - Perguntou a menina enquanto corria em direção ao dragão e se atirava nas escamas brancas de seu pescoço. - Somos melhores amigos! Não é, Argus?

Sírium riu da voz adocicada que sua irmã fazia, aquilo realmente não combinava com a menina, meneou com a cabeça em sinal positivo, demonstrando que poderia sim voar, a alegria lhe encheu o coração ao ver a alegria no rosto da menina e dragão se abaixando para que ela pudesse subir mais facilmente em sua corcunda, o rapaz vendo que a irmã tentava subir sem sucesso e foi ajuda-la, não muito tempo depois a morena conseguiu subir nas costas com a armadura gélida e enferrujada do grande dragão albino e logo agarrando suas mãos pálidas nas escamas reluzentes do mesmo.

— Zenox, já viu Argus se dar tão bem com alguém? - Pergunta Sírium ao mago enquanto os dois vêem o grande Dragão alçar voo, Zenox nada fez além de menear a cabeça negativamente, com os olhos gélidos fixos no dragão e na jovem princesa.

Cecília se agarrava ao dragão com toda sua força, a adrenalina de voar pela primeira vez estava clara em seu rosto, seus olhos cinzentos estavam fechados, um sorriso brotava de seus lábios finos e seus curtos e lisos cabelos negros balançavam conforme o vento. Logo a princesa começou a sentir o dragão desacelerar e o vento começar a parar, abriu seus olhos e se espantou com a visão, Argus estava voando baixo demais, a sua frente uma terra árida e escura predominava, escombros negros em formato de ossos gigantes, ossos de Dragão aos quais Cecília não tardou a reconhecer, aquele era o "templo" em homenagem a rainha Dragão, uma lembrança do motivo pelo qual os dragões foram embora, a traição.

— Argus, vamos! - Cecília ordenou a seu dragão quando sentiu um calafrio lhe percorrer a espinha, ela havia se lembrado, o templo ficava exatamente na fronteira dos quatro reinos, havia ido longe demais. - Argus! Vamos logo! - A menina tentava a todo custo fazer com que o dragão se virasse e voltasse, mas tudo que o albino fazia era subir mais alto, ele olhava fixamente para um pouco acima dos escombros vazios, uma tempestade se formava no céu, exatamente onde Argus olhava.

Repentinamente um pequeno ciclone começou a se formar no céu, agitando o ar de maneira absurda. "Ótimo!" pensou Cecília "Vou morrer!" Por mais que tentasse, o dragão não se movia, apenas continuava plano bem próximo ao ciclone, foi quando ela o viu, um grande dragão inteiramente feito de fogo saiu do ciclone e começou a rodar de cima para baixo, como se quisesse morder a própria cauda, quando finalmente conseguiu o dragão começou a rodar em várias direções sem largar sua cauda e logo começou uma esfera de fogo.

Cecília começou a se desesperar, Argus voava em direção a grande esfera ardente, ela gritava para que voltasse, gritava por seu nome pedindo para que não fosse, para que parasse, mas ele não parecia ouvir, suas asas batiam cada vez mais rápido indo na direção da esfera, esgotada a jovem desistiu, apenas colocando os braços na frente do rosto e se preparando para a morte certa, não tardou a sentir o calor das chamas a envolvendo, o dragão se separando dela e um baque surdo de seu corpo contra o chão, mas logo a dor havia sumido, assim como todo o resto, nada mais havia, lá estava ela, Cecília Nowrt, morta nos escombros negros de um templo.