Parte II de II

Laxus ficou imóvel durante os primeiros segundos.

Num momento estava comemorando o fim da guerra e sente o abraço de Cana as suas costas numa demonstração incomum de carinho e no segundo seguinte foi empurrado com todas as forças que ela tinha. Virou o pescoço num reflexo para ver o que aconteceu e foi então que viu a cena mais desesperadora de sua vida.

Na velocidade equivalente a de um raio um feitiço atingiu a mulher que amava, ela bem que tentou usar um escudo, mas não foi suficiente. Viu o sangue dela jorrar e o corpo cair sobre a poça viscosa respingando nos presentes inerte. O líder da aliança morreu em seguida, aquele foi seu ultimo golpe para tentar deixar sua marca de sangue no mundo.

Não conseguia mexer um músculo.

O mundo estava parado e tudo o que conseguia ver era Cana caída sem vida.

Ela sabia que aquele golpe vinha.

Ela recebeu-o em seu lugar.

O amor da vida dele tinha morrido para salvar sua vida.

***

Os dois magos mais fortes da Fairy Tail estavam sentados naquelas cadeiras desconfortáveis um ao lado do outro sem trocar palavras por horas. Atrás e a frente deles passava a todo momento uma equipe de médicos e enfermeiros com pacientes para a emergência.

Infelizmente aquela guerra tinha alcançado não-magos inocentes que se machucaram e haviam magos e mais magos que lutaram e que ainda lutavam contra alguns remanescentes que chegavam precisando de auxilio para curar suas feridas. Já fazia muitas horas que a dupla estava ali esperando alguma noticia vinda da emergência.

As piores horas da vida daqueles dois homens.

Um pedaço da camisa do Dreyar tinha ficado no campo de batalha e o que restou do pano estava encharcado com o sangue da Alberona e aquele cheiro de ferrugem estava enlouquecendo Laxus. Gildarts estava ao lado sem conseguir acreditar ainda que sua filha estava entre a vida e a morte.

Num baque violento as portas duplas do hospital foram abertas revelando um grupo de magos da Fairy Tail que perguntaram a Jura que estava perto onde estavam os feridos da guilda e foi então que receberam a noticia e viram os dois titans despedaçados.

- Ela salvou a vida do Laxus-san... – disse Jura para Erza – Era um golpe fatal, nem sabemos como está viva...

- Cana...

Erza sentiu um aperto no peito e toda enfaixada olhou para Mirajane que estava quase em prantos já. As duas haviam sido as maiores incentivadoras daquele relacionamento e agora recebiam aquela noticia. Todos sabiam que a guerra podia gerar baixas, mas entre possibilidades e a realidade existia uma grande distância.

A Raijinshuu estourou vendo seu líder e todos correram pensando em dizer palavras de apoio, mas somente o silêncio foi possível. A Guilda mais barulhenta de Fiore agora estava silenciosa em respeito a nakama abatida. Era simplesmente de cortar o coração o olhar estoico que o mago do relâmpago mantinha para um ponto inexistente...

Ele estava quebrado, despedaçado, acabado...

Mas o pior de tudo era que isso não era devido a sua dura batalha, todos os estragos da guerra agora eram irrisórios perto dos danos sentimentais.

- Laxus... – Fried chamou e recebeu um leve levantar de olhar – Você precisa de atendimento médico... Vamos até a enfermaria.

- Não vou sair daqui, Fried. – a voz dele saiu quase num fio –

- Mas laxus, você estava lutando diretamente com o líder da aliança Balan... Deve estar cheio de danos internos... – Mira tentou argumentar –

- Não vou sair daqui até saber da Cana.

- La-...

Gildarts fez um sinal com a cabeça para que Erza se calasse.

Olhou para o garoto ao seu lado e se compadeceu da dor dele, ele sabia o que era perder o amor da vida de forma repentina. Quando Cornelia foi embora sem deixar rastros, Gildarts achou que não sobreviveria até o próximo amanhecer e depois anos para frente quando soube de sua morte foi como se nunca mais pudesse voltar a sentir alguma coisa.

Não era justo tirar a vida de uma criança, porque era aquilo que todos aqueles magos que ele comandava agora eram.

***

Laxus estava sentado no balcão improvisado da guilda com um prato de comida intacto a sua frente. A sede havia sido um dos primeiros alvos da guerra e agora estava sendo reconstruída. Cerca de dois meses haviam se passado e as paredes já estavam ficando de pé.

O lugar ainda não tinha a vivacidade de antes, tanto porque ainda haviam muitos feridos, tanto porque Cana estava em coma sem nenhuma previsão de que viria a acordar algum dia. Quando ouviu aquilo, o Dreyar desabou em lágrimas na frente de todos que estavam no hospital com ele sem se importar.

Não podia acreditar no que estava acontecendo.

Depois de tantas idiotices que fez na vida o preço que lhe era cobrado era a vida da sua parceira. Qual o sentido disso? Tinha passado por todos os estágios: desde a negação, passando pela raiva e terminando na letargia. Os médicos foram enfáticos dizendo que era praticamente um milagre ela não ter morrido na hora e que as chances dela acordar eram praticamente nulas.

Ninguém tinha mais palavras de conforto para dizer, nada aparentemente podia alcança-lo mais. Passou a primeira semana sem arredar o pé do hospital e só saiu de lá após um conluio de Mira, Erza, Fried e Gildarts, foi sedado e passou 48 horas desacordado recendo medicação intra-venosa.

Todos estavam tristes, mas também não entendiam aquela ausência de melhora dele, afinal, existem coisas que acontecem na vida e que temos que lidar. Lucy estava sentada numa das mesas no colo de um enfaixado Dragon Slayer branco que bebia uma cerveja.

- É de cortar o coração olhar para o Laxus, todos entendemos o quanto ele gostava da Cana, todos sentimos falta dela, mas... – a loira segurou a respiração – Mas ela não salvou a vida dele para que ele definhasse desse jeito...

- Ele não tem escolha, Blondie.

- Todos temos uma escolha, Sting... Eu quero que a Cana volte, todos queremos vê-la sentada no balcão bebendo de novo, mas ela muito provavelmente não vai voltar e eu sei que ela não iria querer vê-lo assim, mestre Makarov também...

- Ele não tem escolha, Lucy. – disse o loiro chamando atenção dela, Sting NUNCA a chamava pelo nome – Cana era a parceira dele, se ela morrer, vai ser como se ele morresse também.

- Nani?

O drangon slayer suspirou e olhou nos olhos castanhos de sua namorada.

- O cara é um dragon slayer, certo?

- Sim, da segunda geração, o Natsu adora falar que ele é fajuto... – a garota riu vendo Natsu do outro lado da guilda caçando encrenca com Gajeel –

- O Natsu é um baka! Mas bem... – suspirou – Os dragões são animais monogâmicos, eles escolhem um parceiro e passam a vida inteira com eles. Isso também serve para dragon slayers também... Se essa Cana era a parceira dele e morrer, Laxus vai passar o resto da vida sozinho.

- Isso é loucura, Sting!

- Não é algo que tenhamos controle, Lucy... Se o parceiro ou parceira de um dragão morria, ele terminava seus dias sozinho, não importa o quanto aceite, supere ou consiga viver com isso, a ligação é um laço que não se quebra nem pela morte.

- Okay isso acontecer com os Dragões, mas a sociedade humana é muito mais complexa, relacionamentos terminam, divórcios acontecem...

- Um dragon slayer não vai estabelecer a ligação com qualquer um e com certeza vai fazer de tudo para manter essa pessoa interessada, é quase impossível resistir a esse tipo de amor... A natureza é bastante esperta. Mas para os casos de não dar certo, infelizmente não dá para simplesmente desfazer a ligação e tentar de novo.

- Isso... isso é lindo e triste ao mesmo tempo.

Lucy olhou para o loiro no balcão brincando com a comida.

- Mas como saber se ela é a parceira dele? Talvez ela seja uma parte da vida dele e...

- Não, Blondie, quando isso acontece a magia meio que forma uma aura ao redor da parceiro, não é algo perceptível a qualquer um, acho que só outros dragon slayers e aquele cara das roupas bizarras e tatuagem na língua que notaram... É um tipo de entrosamento, não sei bem como te explicar...

Lucy escorou a cabeça no peito de Sting e segurou algumas lágrimas que queriam cair.

Aquela história era uma tragédia.

***

Aos poucos o ritmo normal dos dias foi voltando na guilda e inevitavelmente a missões voltaram e com muita dificuldade e até mesmo vassouradas de Polyusca Laxus saiu em uma missão seis meses após o fim da guerra. A velha maga curandeira havia se fechado completamente na floresta após a morte de Makarov, mas após Gildarts procura-la para contar do estado de seu neto.

O Clive era uma das poucas pessoas no mundo que sabia disso e por mais que não quisesse deixar seu refúgio, sabia que precisava fazer isso já que Makarov não estava lá para fazê-lo.

Aquela criança estava destroçada.

Não precisava saber sobre a história de monogamia dos dragões para saber que aquela garota era um pedaço dele, mas independente do quanto fosse grande a ligação, ele precisava reagir, nem que fosse a base de vassouradas. Acompanhada do atual mestre da guilda foram ao hospital fazer uma visita.

Já fazia algum tempo que ela fora transferida para um quarto.

Quando chegaram a enfermeira acabara de sair depois de abrir a janela e trocar os lençóis. Definitivamente ela estava mais magra, com a pele mais branca pela ausência de sol, mas ainda sim continuava bonita. Depois de alguns minutos dentro do quarto, a velha maga virou para Gildarts:

- Ela pode prever o futuro certo?

- Sim, Cana conseguia prever...

- Gildarts, você conheceu Blair Wood, certo?

(N/A: Para quem não leu Impressão Draconica, existe um capitulo só dedicado a essa personagem!)

- Um pouco, ela foi a mentora a minha esposa e eu soube que Makarov e você foram amigos dela...

- Pois bem... Blair foi a maior maga de cartas que existiu sem sangue cigano e um dia ela me contou coisas a respeito da leitura do futuro. – sentou-se na cadeira ao lado da cama e pegou a mão da maga – Sua filha está presa numa espécie de limbo mágico, ela deve ter previsto a morte de Laxus e provavelmente era um ponto fixo.

- Como assim?

O mago crash estava confuso.

- O mundo é regido por um equilíbrio de começo e fim, vida e morte... E os humanos não entendem isso. Passam a vida aterrorizados com o fim, sendo que tudo é um ciclo perfeito, onde a morte não é o fim, mas sim um novo começo...

- O que isso tem a ver com a Cana?

- Naquela noite meu neto deveria ter morrido, uma morte por conta daquele golpe era necessária, um ponto fixo, ela tomou o lugar dele. Até aí nenhum problema, mas vocês salvaram a vida dela... E agora aconteceu o desequilíbrio. Ela deveria estar morta, mas está vida... mantê-la nesse estado inerte é uma tentativa das forças que não compreendemos de encontrar o equilíbrio.

- Isso quer dizer que... – o Clive olhou para a filha que parecia dormir tranquilamente – Nunca mais vamos tê-la de novo?

- Eu não sei, Gildarts, ela mexeu com leis cósmicas, fez o equilíbrio tender ao caos, esteja feliz por até agora nenhuma mudança de futuro armagedonica ter acontecido.

- Então de qualquer maneira eles não vão ter uma chance... Afinal, ela não vai acordar, se ele não morrer.

- As coisas não são mais tão simples. Eles alteraram tudo, agora só kami sabe como esse desequilíbrio vai ser corrigido... – Polyusca apertou a mão de cana – Você consegue sentir essa força? Parece com o poder do Laxus... É como se um pouco da magia dele estivesse com ela e vice-versa.

- Isso faz tempo, desde que eles assumiram o namoro... Eu assuntei por aí e descobri que tem a ver com essa coisa de Dragon Slayer do Laxus.

- É muito forte, agora entendo o motivo do garoto estar tão acabado...

- Tomara que seja forte o suficiente para ela abrir os olhos outra vez.

***

O Dreyar estava sentado na cadeira onde antes a avó esteve sentada conversando com a namorada e com a mão entrelaçada com a dela. Os médicos falaram que conversar podia ajudar, alguns estudos apontam que muito pacientes que acordam de um coma ouviram muitas coisas que lhes foram ditas.

Contou sobre a missão, sobre como as coisas estavam na guilda, falou um pouco sobre tudo o que podia pensar. Tinha tanta esperança de que a qualquer momento ela abriria olhos e voltaria, mas cada dia esse ia se tornando um sonho mais distante. Os médicos falaram que não compreendiam os motivos dela estar assim, todos os ferimentos haviam sido curados e aparentemente não houveram danos cerebrais.

Beijou a mão dela apertando-a contra a sua.

Podia ouvir o coração dela batia em compassos ritmados e a respiração tranquila. Parecia que a qualquer momento ela acordaria e olharia para ele perguntando o motivo daquela cara de idiota. Daria qualquer coisa para ouvi-la de novo, senti-la abraçando-o...

 Estava completamente perdido que nem notou a repentina aparição daquele corpo astral vulgarmente conhecido como Mavis Vermellion. De repente levantou os olhos e a viu sentada na janela no beiral da janela aberta balançando os pés.

- Olá Laxus-kun!

- Você não deveria ficar confinada em Tenroujima?

Indagou cético.

- Hey, é chato ficar lá o tempo todo sozinha... E também eu queria ver como minhas crianças estavam se saindo.

Ela saltou para o chão e caminhou até a cama sentando-se perto do corpo de Cana e lhe fazendo um carinho nos cabelos.

- Cana-chan é tão poderosa, pena que não conhece nem todo seu potencial... Sabe, ela quebrou uma regra salvando sua vida... Essa mulher te ama...

- Regra?

- Ela não deveria ter interferido no futuro assim, agora está presa até que as forças encontrem um jeito de corrigir o caos...

- Eu posso fazer alguma por ela?

- Não. Infelizmente o futuro de vocês está jogado a sorte... De alguma forma o universo vai cobrar a conta pela interferência.

- Ela... – suspirou – Ela ainda pode morrer?

- Provavelmente não.

- Ela vai acordar?

Mavis passou a mãozinha pelo rosto feminino e sorriu dolorosamente.

- Talvez.

- Eu só queria que ela abrisse os olhos, não me importa mais nada.

- Cuidado com suas palavras, Laxus-kun, o destino é caprichoso e vocês dois brincaram com fogo!

- Eu amo essa mulher e não vou conseguir ter uma vida sem ela, mas se for para ela acordar, voltar a sorrir, rir, beber, voltar para o mundo... Eu seria capaz de abrir mão dela.

- Você a ama o suficiente para deixa-la ir?

***

Alguns dias depois a Fairy Tail entrou em festa.

Depois de sete meses receberam a notícia de que Cana tinha acordado do coma. Foi um rebuliço e uma renca de magos barulhentos foi parar no hospital, obviamente que só a alguns foi permitida a entrada no quarto. E os sortudos foram Laxus, Gildarts, Mirajane e Erza...

Cana estava sentada na cama com a enfermeira ajudando a pentear os cabelos longos e todos ficaram tão felizes em vê-la que tiveram quase o ímpeto de correr em sua direção. Mas se contiveram pela emoção e não podiam estar mais felizes.

- Cana!!!

Chamou Mira com lagrimas nos olhos.

A Alberona lhes olhou e piscou duas vezes.

- Estão falando com você, querida! – disse a enfermeira num tom quase maternal –

- Oh sim... – ela parecia confusa, mas sorria – Desculpem, mas é que eu ainda estou confusa... Eu os conheço?

Todos os sorrisos se desfizeram e o clima no quarto ficou pesado, a enfermeira se virou para olhá-los com um sorriso complacente. Tinha presenciado aquela história desde o início.

- Cana-san perdeu toda a memória, não sabe nem o próprio nome.

Owari...