Enquanto o Sol se Pôr escrita por murilo


Capítulo 6
Sentimentos


Notas iniciais do capítulo

o meu preferido (LÊ ATÉ O FIM)



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/36934/chapter/6

            Já era noite quando ouvi os gritos lá da calçada. Estava deitado no sofá, exausto. À tarde tinha ido correr com Maria no parque, Cláudia não fora porque estava um pouco doente. Os gritos não pararam até que eu abri a porta. E lá estava ele, me olhando de longe. Rodrigo, e sua moto.

            Atravessei o jardim, meio tímido. Já fazia muito tempo que não o via, e pra ser sincero, nem o procurara, um descuido da minha parte. Estava inseguro, não conseguia decifrar a sua expressão. Ele me falou logo que aproximei:

            _Sobe na moto! – E me passou um capacete, eu estranhei, não falei nada, só o olhei como que tentando entender aquilo _Sobe, não vai subir não?

            Rodrigo mudara, não parecia o velho Rodrigo, o Rodrigo simpático que eu conhecera. As palavras saíam frias de sua boca. Aquilo tudo seria por causa de Maria? Subi na moto, de qualquer forma, eu queria mesmo ter uma conversa com ele. Aquelas semanas com Maria me trouxeram um pouco de coragem, que eu desconhecia até então. Aprendera com ela que o que era pra ser dito não devia ficar escondido. E eu queria ficar ao lado dela, e pronto. Não teria Rodrigo que dissesse ao contrário. Ela nem gostava dele, era o que parecia. Eu diria tudo, assim que sentássemos pra conversar.

            A moto saiu do lugar, rápida, fazendo um ronco estranho. O vento vinha contra o meu rosto, o vento frio da noite. Estava escura, a rua inteira, talvez a cidade, mas Rodrigo corria, como se conhecesse cada pedaço da estrada. Segurei firme na moto, as mãos suando um pouco. Equilíbrio não era comigo, Rodrigo devia saber daquilo. Ele acelerou ainda mais, os postes passavam como carros de corrida ao nosso lado, as árvores, as casas, viravam uns borrões na rapidez da moto de Rodrigo. Eu estava suando muito pelas mãos.

            _Pode ir mais devagar? – Perguntei, a voz me falhava

            O vento não me deixava ouvir direito, mas consegui escutar uma risada, uma gargalhada empolgada de Rodrigo. Bem... o velho Rodrigo não havia morrido.

            _Não está gostando? Eu adoro essa sensação! – Ele gritava pra mim

            _Não! Não! Eu estou... to com medo! – Respondi

            Rodrigo ainda fez umas curvas perigosas, nossos joelhos quase se encostando ao chão, e ele gritou, diminuindo um pouco a velocidade:

            _Estamos chegando!

            Respirei um pouco aliviado, a moto fez uma curva e entrou em um caminho de terra, muito escuro, apenas os faróis e a luz da lua iluminavam a estrada, cercada por altas árvores e uma quantidade inexplicável de mato. Eu, realmente, não podia estar completamente aliviado.

            Fomos estrada adentro, afastando cada vez mais da estrada principal. A cidade ficara pra trás há uns extensos vinte minutos. A pé eu não chegaria em casa dali. A moto entrou por mais algum tempo, naquele lugar estranho, de barulhos estranhos. Eu queria perguntar onde estava, mas não conseguia, faltava voz. Eu era medroso, não escondia de ninguém. Querendo ou não, eu ainda era o Marcos que ficava sempre no quarto, que nunca saía de casa, que preferia dormir com a luz acesa. Algumas coisas estavam mudadas, mas o principal permanece, por toda a vida.

            _É bem ali! – Rodrigo apontou um espaço que a mata fazia, onde dava para ver bem a lua lá longe

            Ele parou a moto, e descemos. Entreguei o capacete a ele, lançando-lhe um olhar confuso. Ele sorriu, pela primeira vez naquela noite. Tentei imita-lo, eu não iria conseguir, não naquela situação.

            Me fazendo um gesto para que eu o seguisse, Rodrigo seguiu a pé para o lugar em que a mata abria espaço. Ao aproximar, vi que ali, tinha uma grande rocha, gelada, e lá em baixo,uma imensidão de água sumia no horizonte.

            _É o mar? – Perguntei, maravilhado, o medo passara por um milésimo de segundo

            _Isso mesmo, é o meu segundo lugar preferido da cidade. –O primeiro, deveria ser a vista do meu quarto, como ele me mesmo havia dito, mas para mim, não havia pôr do sol que conseguisse ser mais bonito do que aquela imagem, a lua refletida nas águas do mar, escuras como o céu, cheio de estrelas

            Ele se sentou na rocha, e me convidou também. Estava fria, aconchegante. Respirei fundo, o coração ainda batia forte, mas a sensação de liberdade era muito mais forte. O vento assobiava às minhas orelhas, uma música suave, bonita.

            _É tudo tão lindo! – Eu disse, varrendo todos os pensamentos da minha cabeça, eu só queria sentir aquele momento

            Rodrigo, admirava as águas lá longe,sem olhar para mim, parecia que iria falar alguma coisa, aquilo que eu estava esperando.

            _E aí? Como foram esses dias?

            _Bem... eu, me diverti bastante! – Respondi, o mais sincero que eu podia ser

            Ele balançou a cabeça afirmativamente, estava sério, ainda não olhara para mim. Engoliu seco, eu olhava para ele pelo canto dos olhos, e parecia que ele me olhava também. Rodrigo estava mesmo com vergonha? Eu achava aquilo impossível!

            _E... você e a Maria? – Ele fez uma pequena pausa, respirou _Estão... juntos?

            Eu abaixei a cabeça, passando o dedo indicador na rocha, ensaiei algumas palavras e disse:

            _Rodrigo! Qual é a sua, cara? – Aquilo me soou mais forte do que eu imaginava, e eu percebi que Rodrigo achara a mesma coisa, ele pareceu querer correr para longe, o sorriso completamente desfeito  _Eu não quero me afastar da Maria... Eu gosto muito dela! E se você quiser, que fale com ela da sua situação. Se você quer saber, a gente quase não fala de você, e foram muito bons todos esses dias... Mesmo sem você! Eu te admiro muito, você é espontâneo, engraçado... Mostra isso pra ela! Porque só comigo? Mostra esse seu jeito pra ela, ela vai adorar, ela vai aprender a gostar de você, sai com a gente! Mas não... você some! Ficou com raiva disso cara, da gente juntos?

            _Fiquei! – Ele não mentiu, e pela primeira vez me olhou nos olhos, juro que me intimidei um pouco na hora, mas logo lembrei que aquilo deveria ser feito

            _Então o que você quer, que eu me afaste dela? Pra te dar a oportunidade de mostrar que você é uma ótima pessoa, que é engraçado, e simpático e irresistível, como a Cláudia diz? É isso? Que é melhor que eu? Eu me afasto. Não é difícil ser melhor que eu! Você vai conseguir, mas tem que ir atrás dela, se mostrar, cara... Quer isso? Mas eu vou te dizer, eu quero a amizade dela, e isso você não vai tirar de mim... Mas vá lá, conquiste-a, é o que você quer...

            _Eu não quero! – Ele me cortou, a voz agora estava alta, a respiração ofegante, aquela conversa estava despencando pra um lado desconhecido _Eu não quero!

            Eu olhei pro rosto do Rodrigo, ilegível, mas tenso.

            _Então o que Rodrigo? O que você quer, rapaz?

            _Você! – Aquelas palavras vieram, como uma faca atravessa um peito, eu não podia estar... bem, não era aquilo, não estava acontecendo

            Eu não consegui falar mais nada, nem ele. Eu não olharia pra ele nunca, nem que ficássemos ali por toda a eternidade. Eu não saberia lidar com a situação... Se ele não falasse nada, mas falou:

            _Você é tão... tão cego assim? – Era um desabafo, quase um choro _Eu estava dizendo que... cara, eu gosto de você. E não é como amigo, Marcos. Marcos... Não existe Maria, você está me entendendo? Eu não quero saber dela!

            Era eu quem escutava agora, mas não queria entender, era tudo complicado para mim. Eu tinha medo, um novo medo. O único que ainda eu não tivesse experimentado. Abria a boca, mas não tinha palavras... Rodrigo continuou por mim.

            _Eu só... só fiz a minha parte. Eu falei o que eu tinha pra falar... Eu me afastei todo esse tempo, pra isso sumir da minha cabeça. Mas você acha isso fácil? Não é! – Algumas lágrimas começavam a surgir nos seus olhos, a voz foi ficando mais fraca _Você pode me odiar se quiser...

            Eu o olhei, por alguns segundos, os olhos cheio de lágrimas, o rosto pálido e triste. Não era o Rodrigo que conhecera. Aquele sentimento o mudara. Ele já não era o mesmo, talvez nunca voltasse a ser.

            _Desde quando? – Foi a única coisa que saiu da minha boca

            _Desde sempre! Cada dia mais forte... – Ele respondeu, num sussurro, sofrendo a cada sílaba

            Ficamos em silêncio por alguns minutos, eu para entender, Rodrigo para chorar um pouco. Quis ir embora, pedi que me levasse em casa, precisava de um tempo, para mim, sozinho.

            _Eu te levo. – Ele respondeu tentando secar as lágrimas com as costas das mãos

            Fomos à moto e subimos, ela partiu devagar, deixando a rocha, o luar e todo o mar pra trás. O silêncio da estrada estava agora muito mais intenso, muito mais presente. Eu estava confuso, como nunca estivera. Eu não sabia o que dizer a Rodrigo, a não ser que aquilo era errado, mas aquilo todo pai dizia... E não era o que eu queria passar a ele. Eu queria ajudá-lo de verdade, no que conseguisse... Da forma que conseguisse. Só não sabia como. Mas eu ainda faria alguma coisa. Mas de alguma forma, eu ainda não acreditava naquilo que acabara de acontecer, ou simplesmente não queria acreditar.

            A moto chegou à cidade, e depois à minha casa. Rodrigo parou, descemos e eu o entreguei o capacete, e ele, sem tirar o seu me disse, numa voz fraca, mas de uma idéia fixa:

            _Eu te amo...

            Senti vacilar nas pernas, e um arrepio ligeiro pelo braço. Não. Ele não ousaria dizer aquilo. Eu não deixaria.

            _Rodrigo...

            _E isso você não pode me impedir de fazer. –Foi como se ele lesse os meus pensamentos, como sempre costumava fazer, eu não queria ser amado por ele, mas o que poderia fazer?

            Um pingo de chuva atingiu o meu braço, e logo um outro caiu sobre meus ombros, Rodrigo me olhava, através do capacete. E eu o olhava, fixo nos olhos.

            Dei-lhe as costas e corri o jardim, o mais rápido que podia, calado, sem me despedir. A moto de Rodrigo ficou ali, na chuva, eu não a vi partir, era como se ele quisesse ficar ali, me esperando, a vida inteira que fosse, mas não me deixaria.

~.~


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

capitulo sete em andamento! Gostando aí, não esquece dos reviews... eles me fazem um bem! Beijo... atéé breve o/



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Enquanto o Sol se Pôr" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.