Cecília escrita por Claire Capelotti


Capítulo 8
Capítulo 8


Notas iniciais do capítulo

Capítulo finalizado.



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O cheiro de Chay já estava invadindo minhas narinas e causando o efeito de sempre. Desejei loucamente que ele me beijasse. O quê? Socorro! Estou agindo como uma vadia! Tudo isso por culpa dele, estou me transformando!

– Oi Chay – e ele me beijou. A única coisa que ele não poderia fazer que ele não devia. Por quê? Isso é castigo por ter partido a cara de Marcela? Só pode ser. Eu estava com um sorriso idiota no rosto. – Essa é minha amiga Manu.

– Oi, sou o Chay. – ele disse como quando nos conhecemos e um pequeno sorriso surgiu no meu rosto. – Ah... Eu fiz.

– É. – digo sorrindo.

– E aí Chay! Sou a melhor amiga dela. Quais suas intenções com ela? O que pretendem fazer?

– Hun, as melhores possíveis. Acho que vamos dar uma volta, tomar um milkshake? – Chay responde envergonhado.

Por que raios ela tem de agir como se fosse meu pai? Na verdade, nem meu pai trataria meu namorado assim, talvez seja para isso que servem os amigos: envergonhar-nos e se essa fosse realmente a função dela, parabéns, estava conseguindo.

Ali estava Manu, falando e falando coisas que me envergonhavam como uma vez que ri tanto e saiu milkshake de flocos do meu nariz ou quando eu estava conversando com um garoto e ela derrubou refrigerante em nós “acidentalmente” e sobre minha vergonha de ficar a sós com um garoto que ela chamou de “medo de intimidade”. Isso sempre me chateava, mas é o jeito dela e nada mudaria.

Eu queria poder cavar um buraco com as unhas no concreto e enfiar minha cara nele como uma avestruz só para poder fugir daquela situação que Chay achava “engraçado, divertido e legal de saber mais sobre mim”.

Finalmente ela parou de falar – ainda bem, porque eu estava prestes a empurra-la escada abaixo caso ela não calasse a boca.

– Tome cuidado para não passar vergonha com ela! – Manu disse rindo e andando para o lado oposto da rua para qual eu e Chay iríamos.

“Não se preocupe” pensei “Sem você por perto não teremos esse problema”.

– Sua amiga merece ser estudada... – Chay comentou enquanto andávamos com as mãos entrelaçadas.

– Que vergonha...

– Medo de intimidade, ein?

– Ela é demente, não devia sair falando isso pra qualquer um.

– Ah, então quer dizer que sou qualquer um? Legal.

– Idiota.

– Agora entendi porque você ficou nervosa na casinha, sabe? Tão sexy.

– Há há, muito engraçado.

Eu disse que garotos são como cães! Cães que ao invés de farejar drogas ilícitas em aeroportos farejam o medo das garotas. Filhos da mãe!

– E você tem medo de que? – disse e ele me olhou como se dissesse “não acha que vou falar, não é?” – Qual é você sabe o meu medo!

– Ventiladores.

– Você esta zoando comigo?

– Eu estou falando muito sério. Principalmente os de teto, você está lá deitado, dormindo ou se refrescando e eles caem e decepam sua cabeça.

Senti vontade de rir, mas ele não riu de mim, então não o fiz. Fomos para o McDonalds que é perto da minha casa e sentamos em uma mesa qualquer para tomarmos milkshake e comer batata fritas.

– Tenho medo de pombos. – Chay disse e quase engasguei com a batata.

Quem tem medo de pombos? Bom, ele tem. Mas é um medo tão... Idiota? O que aquele pássaro pode fazer contra ele além de passar doenças se entrar em contato?

– Eles defecam na sua cabeça! Você já viu aquela cara? Olham-te como se fossem te matar! Pombos são feios, não cantam, são considerados pragas. São inúteis.

“Acho que sou um pombo” pensei.

– As coisas estão acontecendo bem rápido, tipo nos conhecemos a tão pouco tempo.

– Realmente, mas sabia que as pessoas podem se apaixonar em 1/5 de segundo? Li isso em alguma revista. – ele respondeu.

Queria responder “quem disse que estou apaixonada?”, mas ao invés disso bebi o milkshake encarando a mesa, a bebida congelou meus dentes, mas eu não parei de beber ate ter que soltar a respiração. As coisas eram assim entre nós, uma hora conversávamos muito e outra, ficávamos em silencio.

Não sabia se ele estava me observando e tinha vergonha de levantar os olhos para dar uma olhada, aquela sensação de não saber como agir voltou junto com o desespero, minhas mãos estavam geladas por segurar o copo por tanto tempo, larguei a mão em cima da mesa e senti as pontas dos dedos dele tocarem aos meus dando um choque imaginário.

– Você é linda. – Chay disse.

– Obrigada – disse quase engasgando com a saliva. Tenho tendência de engasgar até com a língua quando estou nervosa. – Você também é.

Eu deveria ter respondido isso? Espero que sim. Enquanto estava nesse dilema de saber como reagir nem percebi Marcela e suas amigas entrarem no McDonalds com um curativo no nariz, ela passou ao lado da nossa mesa e piscou para Chay, provavelmente não me viu. Ou viu e fez isso para me provocar.

Marcela sentou-se à mesa ao lado da nossa e então percebeu (?) a minha presença. Sempre desejei ser invisível, sempre foi meu super poder favorito, mas nunca desejei tanto aquela habilidade como naquele momento.

– Está vendo meu nariz? – Marcela disse para Chay – Sua amiguinha que fez.

– Sério? Ela é cirurgiã plástica? Que incrível! – Ele respondeu irônico.

– Há há, que lindinho! Quanto senso de humor! Mas não, ela não fez esse ótimo trabalho, só foi a culpada dessa cirurgia porque quebrou o meu narizinho. É uma ogra! Um príncipe como você não deveria ficar com ela.

– Talvez eu seja o Shrek, já pensou nisso?

– Não mesmo, é um príncipe que merece uma princesa delicada, como eu.

– Gosto mais das violentas e valentes. Desculpe te decepcionar.

Aquele debate acontecia como se eu nem estivesse ali, eu nem tinha me pronunciado, apenas assistia aquela cena sem expressar nada, nem no meu interior, nem no exterior. Eu sentia nada. Devia sentir, mas sabia que Marcela só estava agindo daquele jeito para me provocar, não porque ele era bonito o suficiente para ser um príncipe encantado.

– A propósito, ela não é minha amiguinha, é minha namorada.

– Estou muito desapontada! – Marcela fez bico e riu, ele sorriu amarelo de volta.

– É a vida, cheia de decepções!

Então ele parou de dar atenção para ela e olhou para mim, segurou minhas mãos e sorriu como um retardado. Não consegui conter e comecei a rir daquele meu jeito escandaloso.

– Por que sempre ri da minha cara? – ele perguntou indignado, mas ainda sorrindo.

– Você fica me olhando assim, parece...

– Que vou te beijar? - Chay me cortou – É, talvez eu faça isso.

Eu detestava aquela coisa, aquela “melação”, o jeito e o rumo que as coisas estavam tomando, parecendo um filme romântico, queria fugir daquilo, queria beija-lo, queria fugir dos seus beijos, eu queria ficar. “Minha namorada”. Por que eu aceitei sair com ele mesmo?

Chay levantou-se e aproximou para me beijar e num impulso minha mão empurrou o peito dele fazendo-o sentar novamente.

– Vou morar em Nova York.

Quando aquelas palavras saíram da minha boca de um modo nada sutil meu coração doeu só de ver seus olhos brilhantes ficarem opacos e tristes, meu ombro doeu como se tivesse um peso de 36kg e alguém me socando, queria dizer “brincadeirinha”, mas não era.

– Você o que? Nova York é um prédio novo? – ele perguntou tentando sorrir e balancei a cabeça negativamente – Quando?

– Não sei ainda.

Chay levantou bruscamente da mesa e me puxou dando um beijo. Eu não imaginava que ele fosse me beijar, sei que nos conhecemos a pouco tempo, mas o que acontecia com meu coração quando estava ao seu lado nunca tinha me acontecido e era uma ótima sensação.

– Pare de me impedir de te beijar, ok? – Ele segurou minha mão e saímos do McDonalds. – Acho que já roubei você demais esses dias, vou te deixar em casa.

– Você deveria aproveitar já que segunda começam minhas provas e não vou ter como te ver.

– Teremos as férias.

Eu já estava em casa, segura dos sentimentos que Chay causava e de volta a mim mesma, no meu estado normal, consciente, enfim.

Meus pais não estavam em casa. Sozinha como sempre.

Resolvi arrumar meu guarda-roupa para passar o tempo e também porque já estava tão bagunçado que era capaz de ter um ninho de ratos. A primeira coisa que peguei foi minha caixinha de cartas, há meses eu não tocava nas cartas e comecei a ler algumas anotações antigas.

08 DE NOVEMBRO,

Eu mal vejo meus pais, sinto falta deles, mas não temos tempo nem para conversar sobre isso, eles chegam muito tarde do trabalho, tão tarde que apesar de tentar espera-los quando chegam já estou dormindo, passo metade do dia na escola e em aulas extras, mas já estou me acostumando com isso.

Nome: Cecília Lins

Apelido: Lia

Idade: 13

Cor favorita: Branco

Comida favorita: Lasanha

Medos: Ficar sozinha “para sempre”.

10 DE MARÇO,

Mudei de colégio com minha amiga Marcela, ela se afastou de mim e tem falado mentiras, as pessoas estão me zoando, ela fala comigo ainda, mas não como antes. Não tenho amigos. Estou sozinha. Não me importo.

Nome: Cecília Lins

Apelido: Lia

Idade: 14

Cor favorita: Preto

Comida favorita: Macarronada

Medos: Não “tenho medo de nada”.

Eu costumava ser chamada de Lia, Marcela me deu esse apelido quando ficamos amigas, ela dizia que era fofo e forte ao mesmo tempo, parecia comigo, meus pais nunca me chamavam por apelidos, então nunca tive um até ela, quando Marcela se tornou uma estranha para mim era terrível ouvir alguém me chamar de Lia, então Manuela surgiu e me chamou de Cissy, porque ela achava moderno, ela sempre fora assim “doida”, fiquei feliz por ter um apelido novo. Foi bastante significativo.

Eu também costumava escrever essas coisas todos os anos, não lembrava mais até ler. Eu tinha mudado tanto em tão pouco tempo, era bom anotar essas coisas, escrevo-as desde os oito anos quando uma professora tomou os livros do “clube de livros” e depois eu relia para ver como eu amadurecia e também para lembrar como me sentia na época.

Decidi escrever sobre o meu momento, sobre essa confusão dos sentimentos, dessa vez sem data.

“Talvez apenas talvez eu esteja me apaixonando. É cedo demais para isso, eu acho. Vou me mudar para Nova York, provavelmente, mas não quero largar minha amiga, nem ele. Ele tem nome, Chay.

Nome: Cecília Lins

Apelido: Cissy

Idade: 16

Cor favorita: Cinza

Comida favorita: Pizza

Medos: Intimidade”


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