Uma semana após o ataque Percy estava no modo alerta. Ele não havia conseguido dormir nada nos últimos três dias. Aquela era uma Terça-Feira nebulosa e branca. O garoto estava sentado na mesa da cozinha , comia um bolo azul e tomava Coca Cola. Sua mãe estava assando pães de queijo , seu avental com estampa de flores balançava com o vento que entrava pela janela aberta.

Percy estava balançando o garfo nos restos de sua fatia , o olhar do garoto era pesado e cansado. Ele havia tido uma briga feia com Annabeth no dia anterior. Na hora ele pôde ouvir a risada de Tártaro ecoar.

—Vai logo Percy , senão vai se atrasar querido – a mãe do garoto o abraçou , Percy afundou a cabeça na cintura dela , cheirava à bolo e biscoitos recém-assados.

Percy assentiu e deu um beijo na bochecha dela.

O garoto foi até seu quarto e pegou o fichário em cima da cama. Assim como seu iPhone. Se ele não conseguia estudar quando tudo estava bem , imagine quando tudo estava um caos.

Percy esticou a mão para Contracorrente e a colocou no bolso. A caneta/espada estava sendo sua única companhia nos momentos difíceis.

Ele colocou o fichário embaixo do braço e saiu com as mãos enfiadas nos bolsos da jaqueta preta. Estava bem agasalhado , com os jeans pretos e a touca.

Saiu pela porta de casa e respirou o ar seco da manhã de Dezembro. Algumas pessoas transitavam ali , alheias à terrível situação que acontecia em céus e terra. Os veículos tentavam transpassar pela neve , já que a prefeitura ainda não havia retirado grande parte dela.

Ele andou calado pela rua , as mãos nos bolsos da jaqueta. A Goode ficava bem longe , mas seu carro havia sido destruído no ataque de Tártaro no fim do verão. Percy sempre ia andando , por isso saía de casa quarenta minutos antes do horário escolar.

As ruas do Upper East Side passaram como um borrão. O garoto ouvia música nos fones em um volume bem alto.

Quando os grandes edifícios tomaram conta da paisagem ele avistou o prédio de arenito da Goode High School. Os alunos estavam sorrindo e conversando nas escadas que levava ao pátio de arcos em mármore branco. Percy subiu as escadas com os olhos semicerrados. As pessoas levantaram o olhar para ele curiosas. O garoto desviou o olhar.

O pátio externo da Goode estava coberto de neve e as árvores estavam peladas. Alguns grupos de pessoas estavam sentadas nos bancos , fumando e conversando. Com um calafrio Percy se lembrou de que havia enfrentado uma Dracaena bem ali , no início do verão.

Percy afastou os pensamentos e esvaziou a mente. Ultimamente , os sonhos sempre se focalizavam naquilo que o garoto pensava , fossem lutas , Annabeth e ou o Acampamento.

O garoto passou pelas portas da escola e se dirigiu para os armários do corredor. Ele colocou a combinação e abriu a pequena porta azul clara e desbotada. Estava cheia de fotos , ele e Annabeth , sua mãe , fotos dos passeios do casal. Percy pegou seu caderno de Matemática e fechou a porta do armário.

Ele andou pelos corredores abarrotados de pessoas e entrou na sala de aula. Estava vazia , a aula só começaria em cinco minutos. Percy se sentou no fundo e no canto. Colocou o capuz da jaqueta e os fones no último volume.

As aulas estavam passando como borrões nos últimos meses , todos estavam bitolados e preocupados com os vestibulares e faculdades. Percy não , o garoto sabia que corria um perigo iminente , ele poderia nem chegar a terminar ou entrar numa faculdade , e se o fizesse ela acabaria destruída.

O garoto se perguntava como a Goode ainda estava inteira.

No almoço Percy pegou uma caixinha de leite e se sentou no corredor , perto de seu armário. Ele comia algumas maçãs e pães de queijo do dia anterior.

Quando terminou e jogou tudo no lixo ouviu um estalo vindo do corredor à esquerda. Levantou os olhos bem devagar , estava cheio de pessoas. Ele temia o pior.

Retirou a caneta do bolso e começou a andar na direção dos barulhos , eram um tipo de estalo constante.

Ele aumentou o passo e as luzes piscaram no corredor. Percy parou subitamente. As pessoas olhavam para ele , alguns estavam sentados em grupos no chão.

Percy ficou parado , olhando para o fim do corredor sem saída. E quando as luzes piscaram novamente , houve uma explosão. O chão de mármore verde lustroso sofreu uma espécie de rachadura. As luzes estavam falhando. As explosões continuaram , os alunos começaram a se empertigar e correr para longe dali.

Uma explosão mais forte fez o chão se espatifar , uma fumaça negra subiu aonde antes havia chão. Agora , no lugar do piso havia um buraco negro como a noite , e algo estava saindo de dentro dele.

Percy se manteve firme enquanto os alunos correram para as saídas.

Primeiro veio o machado. Saiu voando de dentro do buraco. Ele rodou e se fincou nos armários da parede. Logo depois veio ele , o inimigo mais antigo de Percy , o que ele enfrentou quando ainda nem sabia quem era. O Minotauro pulou do abismo , ele soltou uma baforada de ar para cima e pegou o machado.

Percy sorriu.

—Um velho amigo – o garoto falou , destampando sua espada.

Percy ouviu uma espécie ruído bizarro , o Minotauro estava rindo.

Ele girou Contracorrente em sua mão , estalou o pescoço e deu alguns pulinhos no chão , ele não enfrentava algo grande desde a batalha contra o próprio Tártaro.

O Minotauro avançou primeiro , Percy se desviou da lâmina do machado e desferiu um golpe na lateral de seu corpo. Por um milímetro a espada não o acertou.

A luta estava acirrada , mas Percy estava apenas brincando , as habilidades do garoto estavam intensificadas , por causa do hábito de tomar café puro que ele havia adotado. Já que não podia dormir , tinha que se manter alerta durante o dia.

A luta continuou por alguns minutos até que Percy começou a ouvir sirenes de polícia vindos da rua. O garoto brandiu a espada e interceptou um golpe do adversário , ele girou Contracorrente e o machado do Minotauro caiu no chão. Percy se desviou das mãos dele e descreveu um pulo na diagonal. Ele fincou Contracorrente até o cabo , enterrando-a no pescoço do monstro. Quando a poeira tomou conta do corredor , algo chamou a atenção do garoto.

Uma espécie de corrente de ar estava movimentando o pó dourado no ar. Rapidamente elas se transformaram em três redemoinhos de nuvem dourada. Um vácuo percorreu o corredor , Percy cobriu os olhos , o pó fora espalhado para todos os lados.

Quando ele abriu os olhos novamente , se deparou com uma cena chocante. Ele se lembrou com um vislumbre embaçado de tê-las visto uma vez , durante uma excursão na sexta série.

As três senhoras mais estranhas do mundo , e elas estavam ali , sentadas lado a lado. Desta vez não tricotavam nenhuma meia ou nada parecido. Elas apenas olhavam para Percy. As três avós demoníacas.

—Perseu Jackson , nós somos as Moiras , filhas de Nix , a noite , fiamos o destino e tecemos as histórias , controlamos o futuro e cortamos as pontas , fiar , sortear e afastar , Cloto , Láquesis e Átropos.

O garoto se encolheu , elas falaram em uníssono , as vozes reverberavam nas paredes e faziam o piso tremer. Era um som diferente de tudo que ele já tinha escutado.

—O que querem comigo? – Percy não tampou a espada , só por precaução.

—Não o que queremos com você Meio-Sangue , o que você quer – elas falaram juntas , as três vozes dando a impressão de serem uma só.

—Quero que tudo volte ao normal , quero não ter que me preocupar com nada exceto a faculdade , não quero ter sonhos que predizem o futuro , quero ser normal – Percy disse a verdade , ele estava cansado de tudo isto.

—Infelizmente , para você isso nunca será possível , você tem um propósito para com o mundo – elas soaram sinistras.

—Não há proposito algum , já derrotamos Cronos , tudo está em paz – Percy quis acreditar que isso era verdade.

—Você não pode tentar enganar as Moiras , jovem meio-sangue , sabemos de muitas coisas , coisas que até o próprio Zeus nem em seus maiores devaneios há de descobrir.

Percy não respondeu.

—Você precisará terminar seu proposito , Percy Jackson , o mundo depende disto , o Livro – elas disseram , Percy arqueou uma sobrancelha.

—Livro?

—Sim , o Livro , o mais antigo dos livros , e o mais poderoso – elas tossiram , uma fumaça preta se misturou com o ar.

Percy viu um símbolo. Uma mão emergindo da terra , um Ômega pairava acima dela , brilhando em vermelho.

—Eu já vi isto antes , o que é? – Percy apontou para elas com a espada.

A Parca do meio tossiu mais uma vez e os olhos das três se reviraram. As luzes se apagaram e a névoa verde serpenteou pelas cadeiras de artesanato como cobras vivas.

“O herói obstinado o Livro deve buscar,

sozinho e desamparado , longe do lar.

O espírito guerreiro o irá esclarecer ,

E todos pensarão que a morte irá vencer”

Percy olhou para frente atônito , era uma profecia com certeza , ele guardou os versos na mente. A névoa verde estava desaparecendo no ar , e quando a luz voltou , as Parcas haviam sumido.

Percy guardou Contracorrente e o celular vibrou em seu bolso.

“Alô?”

“Oi , Percy...” Ele ouviu a voz de Connor Stoll na linha , ou talvez fosse Travis.

“Oi , como vai?” Percy se perguntou por que o filho de Hermes o estava telefonando.

“Não muito bem na verdade , mas não foi por isso que liguei” Percy percebeu o peso nas palavras dele.

“Porque ligou então” o garoto estava impaciente.

“É Annabeth , ela , ela... melhor você vir cara...” Percy desligou o celular e bateu no armário com força. Ela tinha que ter feito algo.

O garoto foi libertado de seu estupor em raiva quando escutou o bater de cascos ecoar pelo corredor.

“Ei Chefe , não destrua o armário”

Percy não respondeu , ele correu até o alazão negro e o montou.

—Para o Acampamento Meio-Sangue , rápido – ele rosnou.

Blackjack relinchou em desaprovação e fez meia volta , saindo pelas portas do prédio da Goode.