Nossos Demônios escrita por Victoria Perfetto


Capítulo 2
Capítulo 2 ∞ De novo?


Notas iniciais do capítulo

Desculpe a demora de uma semana! Estou em semana de provas! Espero que gostem! Não se esqueçam de comentar!



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Já amanheceu. Os raios de sol entram através da cortina levemente aberta. Esfrego os olhos para poder enxergar melhor, e ver se aquela luz toda me trás forças para levantar. Hoje é domingo e normalmente neste dia da semana eu não faço questão alguma de sair da cama. Mas eu me lembrei ontem a noite de que havia esquecido minha calça jeans na Armani para fazer a barra, e que ela já está pronta a mais de um mês. Pensando bem... Eu poderia busca-la amanhã. Isso! Amanhã é perfeito. Mas amanhã é segunda, e segunda é o dia em que eu começo a trabalhar na Hilbert & Waldorf. Merda. Não vou ter tempo de pegar esta calça. Suspiro enquanto levanto a coberta e me sento na cama.



Olho para o criado mudo e percebo que a luz vermelha de meu BlackBerry está piscando. O pego e digito minha senha para desbloqueá-lo. 1 nova mensagem de Henry Waldorf.


23 de junho de 2013 – 9:30 a.m.

E aí Barbie? Já acordou de seu soninho de beleza? Se não, trate de acordar agora! Sabe como é... Seu pobre irmão vai chegar ao meio-dia no JFK e não está afim de pegar um táxi. Espero que minha querida irmãzinha possa ser gentil o suficiente de vir aqui e me fazer companhia.

Bjos Henry :*

Qual é a dele me chamando de Barbie? Soninho de beleza? Que idiota. Ninguém deve ter um irmão mais bobo que o meu. Pelo jeito hoje não vai ser um domingo convencional.

Henry é dois anos mais velho que eu, e também é formado em direito, tudo para seguir a carreira de nosso pai. Ele passou um ano fora da cidade estudando na Califórnia e cuidando dos negócios da advocacia pela região. Além disso, após meu pai começar a investir na área da agricultura e indústria petrolífera, Henry foi atrás para aprender a administrar tudo isso. Assim como eu também irei atrás agora que terminei a faculdade.

23 de junho de 2013 – 9:42 a.m.

Qual o seu problema com táxis? Te fazer companhia? Cadê as californianas para isso? Sorte sua de que hoje eu resolvi sair da cama, caso contrário você iria apodrecer no aeroporto.

Bom voo, Rebecca :/

Levanto da cama e ando até a janela abrindo a cortina. Aprecio a vista do Central Park, como amo esta cidade. Me viro e vou até o banheiro tomar um banho para ver se acordo. Lavo a cabeça e a seco rapidamente. Me enrolo em uma toalha e vou até o meu closet. Visto uma regata com um leão estampado fazendo conjunto com shorts jeans claro cheio de tarrachas. No pé coloco uma bota preta de cadarço, com cano no tornozelo, estilo Segunda Guerra.

Vou até o espelho e prendo meu cabelo em um coque alto e despenteado. Não estou muito afim de maquiagem hoje, que tal... hum... Pó e rímel é o suficiente para tirar esta cara pálida. Entre os meus perfumes escolho o Light Blue. Coloco meu Rolex e vários anéis e pulseiras para compor o look.

Vou até a poltrona do lado da cama e pego a bolsa de ontem a noite para pegar o meu cartão de crédito, quando vejo o vidro de Cura ressaca. Logan. Um flashback da noite passada passa pelos meus olhos. Chinelo, promotor, boate, vodca, música, Logan, Andrea, chão, desespero, colo, conversa, carro, casa. E... Meu pesadelo. Logan ajuda os seus clientes normalmente? Devo acreditar nele dando o “remédio” a Andrea? O que ele quis dizer com ponto positivo? Estava interessado por mim? Não seria uma novidade quando a cara de Rebecca Waldorf sempre está na capa da Teen Vogue e outras revistas de fofoca. Há sempre homens atrás de mim, mas nunca por quem eu sou e sim por causa da minha aparência. Será que com o moreno de olhos claros era a mesma coisa? Provavelmente. Mas por que estou tão preocupada? Ah merda! Eu achei ele um tesão mesmo depois de tudo!

Pego uma bolsa Michael Kors nela coloco minha carteira, óculos escuros e meu celular. Vou até o quarto de Andrea ver se ela já acordou. Ela continua na mesma posição em que a deixei. Resolvo escrever um bilhete para que ela não acorde e fique desesperada querendo saber onde estou. Pego uma de suas canetas de plumas e um bloquinho e escrevo:

Antes que você acorde não sabendo onde está e o que aconteceu, saiba que estou chateada. Controle-se! Cair no meio da pista é ridículo! Bem, depois a gente se fala pessoalmente sobre isso. Quando você acordar provavelmente eu não vou estar aqui, e não, eu não fugi. Estou indo buscar minha calça jeans na Armani e comer alguma coisa no Starbucks para refrescar a minha cabeça. Henry chega ao meio-dia. E sim, ele vai vir morar com a gente. Pois é... Nossa vida de mulher acabou, ou não. Provavelmente vamos ficar amigas das mulheres que ele vai trazer para cá. Falando em mulheres, me lembrei de algo que preciso te contar. Algo que você não viu por que estava desmaiada! Ah, eu me lembrei de mais uma coisa. Vou deixar um frasco de vidro aqui do lado do bilhete, dizem que a bebida que tem dentro ajuda na ressaca, mas não tenho provas de sua eficiência. Enfim, tenho que ir.

Deixo o Cura ressaca em cima do bilhete para evitar que o papel voe. Saio do quarto e vou até a sala. Abro as cortinas deixado a luz entrar, e saio do apartamento. No elevador abro minha bolsa e pego meus óculos aviador. Já no térreo ando depressa até a saída.

“Bom dia senhorita Waldorf.” Sorri o porteiro ao abrir o portão.

“Bom dia Jack!” retribuo o sorriso ao pisar na calçada.

A fumaça dos escapamentos misturado com o cheiro da comida dos carrinhos ambulantes, junto das camelôs e dos artistas de rua está animando o meu dia. Essa é a Nova York que eu conheço e amo. Mesmo sendo parte de uma certa elite da cidade, isso tudo não deixava de fazer parte do meu dia e me agradar. Ando na direção contrária ao Metropolitam, passo em frente a Apple Store onde uma fila gigantesca de pessoas começa a se formar, mesmo sendo domingo. Pais felizes ao lado de suas crianças entram na F.A.O. Atravesso a rua e continuo a admirar o domingo, onde normalmente eu aprecio na minha cama assistindo TV ou lendo algum livro.

Ao chegar em frente a Armani olho a vitrine a procura de algo que me interesse. Nada demais. Abro a porta de vidro que libera o ar gelado do ar condicionado de dentro da loja. Uma das várias vendedoras vem prestativamente em minha direção.

“Bom dia. Posso te ajudar em alguma coisa?”

“Claro, eu deixei uma calça aqui para fazer a barra.”

“A senhora ainda tem o recibo da compra para eu verificar?”

Droga! Eu sempre perco estes recibos. Abro minha bolsa e pego minha carteira. Mecho no zíper onde guardo os cupons fiscais, mas não acho nenhum recibo.

“Hmm. Eu não estou achando. Tem como você confirmar pelo sistema usando o meu nome?”

“Sim, venha comigo até o caixa.”

A sigo e apoio um de meus cotovelos no balcão de vidro. Ela segue para trás do balcão e começa a mexer em um dos computadores.

“Qual o seu nome?” ela pergunta digitando no teclado. Seu rosto é iluminado pela luz da tela.

“Rebecca Waldorf.”

“Re...becca... humm... Wal...dorf” ela diz enquanto digita o meu nome. “Aqui! Uma calça jeans preta. Já volto, vou busca-la.” Ela sai em direção aos fundos da loja me deixando sozinha.

“Tudo fica ótimo no senhor.” Escuto uma voz feminina irritante vindo dos provadores.

“Se isso fosse verdade eu me animaria.” Responde o homem. Sua voz séria parecia estar se aproximando. A mulher da uma risada.

“Apenas isso mesmo?” a mulher pergunta.

“Só.”

Ouço o barulho das sapatos no chão da loja, mas não faço questão de me virar e ver quem são. Apenas percebo uma mulher aparecer na minha frente no balcão, provavelmente a dona da voz irritante. Ela segura uma camiseta branca e uma preta em gola V, junto de uma jaqueta preta de couro. Ela abre uma gaveta e pega uma folha de papel de ceda e começa a embrulhar as camisetas, onde logo as coloca junto da jaqueta em uma sacola cinza com letras em preto formando o nome da marca.

“Ficou quatrocentos e quarenta e sete dólares.”

Vejo uma braço forte estender um Amex preto para a vendedora, que o pega e passa no leitor.

“Aqui senhorita Waldorf!” volta a mulher que estava me atendendo segurando a calça jeans.

“Rebecca?” A não! Essa voz! Me viro e vejo Logan ao meu lado. Está com uma camisa de linho branca com os dois primeiros botões abertos, onde um óculos aviador encontra-se pendurado. A manga está arregaçada até a altura dos cotovelos. Sua calça jeans de um azul escuro, cobre um pouco o seu sapa tênis. Seus cabelos de um preto vivo estão despenteados, o que de alguma maneira ficava bom nele. Ele está tão bonito... “Tudo bem com você?”

Ele sorri me mostrando seus dentes perfeitamente alinhados e brancos.

“Oi! Tudo sim e você?” tento parecer o mais natural possível.

“Tudo sim. Hum. Você mora por aqui?” pergunta franzindo o cenho, provavelmente tentando achar assunto, enquanto pega de volta seu cartão.

“Ah sim! Eu moro aqui na rua mesmo.” Sorrio apontando para o lado enquanto pego minha sacola com a calça.

“Jura? Que interessante, por que eu também moro aqui na rua. Então quer dizer que somos vizinhos?” ele vira o rosto para mim sorrindo de canto, enquanto guarda o cartão na carteira e a coloca no bolso.

Nos dirigimos para a saída, e logo escutamos o barulho das buzinas novamente.

“Hmm... A Quinta Avenida é bem extensa, talvez não sejamos exatamente vizinhos.” Digo indo em direção a faixa de pedestre, quero ir à um Starbucks aqui perto.

“Aposto que mora em alguma cobertura em frente ao Central Park.” Como ele sabe? Paro de andar na hora. Vejo ele parando ao meu lado também.

“Acertei? Não seria nenhuma novidade. Eu também moro em frente ao Central Park. Sabe, somos de uma elite Rebecca.” Levanto a cabeça para vê-lo melhor. Ele é tão alto e forte.

O sinal abre e atravesso a rua aumentando a velocidade de meu passo. Por que? Por que eu não quero a sua parecença? Mas por que ao mesmo tempo eu o quero? Me sinto um pouco desconfortável ao seu lado? O que está acontecendo comigo?

“Está fugindo de mim?”

“Sim.”

“Mas porque?”

“Por que não me sinto bem ao seu lado.”

“Como assim? Você mal me conhece.” Diz inconformado se juntando a mim. Eu não respondo e continuo a andar. Ele bufa e segura o meu braço.

“Ei! Me solte!” reclamo.

“Ainda está brava por eu ter apertado a sua bunda?”

“Sim.”

“A qual é Rebecca? Ninguém nunca fez isso com você?” ele me olha sério. Seus olhos tentam extrair algo dos meus.

Ele não entende. Não entende que isso faz os meus pesadelos renascerem. Ele fazia isso comigo. Algo tão natural para algumas pessoas que querem curtir a vida, algo que recuso que seja feito por um estranho, ou até mesmo por alguém que eu conheço. Poucas noites tive com outros homens depois dele. Eu realmente preciso confiar em alguém para fazer isso. E eu sei que aquela apertada de bunda em uma boate poderia acabar ajudando a renascer alguns demônios. Eu sei o que ele estava pensando na hora, e sei muito bem que não o conheço.

“Não sou santa Logan, mas também não sou uma qualquer.”

“Olha me desculpa, eu estava com os meus amigos e...” ele tenta se explicar amenizando sua expressão.

Colocando minha mão livre na frente de seu rosto, o interrompo.

“Esquece.” Fecho os olhos tentando organizar meus pensamento e depois os abro novamente. “Obrigada por ter me ajudado ontem, foi muito legal da sua parte. E eu sei onde você quer chegar, e... Não vai rolar.”

“Como você sabe que não?”

“Por que você nem tem a mínima ideia de quem sou.”

“Claro que tenho. Você é Rebecca Waldorf. Bonita, baixinha, loira, magra, tem olhos claros...”

O interrompo novamente. É só isso que as pessoas enxergam em mim?

“Se for para falar coisas desse tipo, então acho melhor ficar calado. Eu não sou apenas uma capa de revista Logan. Olha, quer saber esquece que você me conheceu.” Rio da situação, sem saber o que fazer. Que merda! Viro de costas e sigo o meu caminho.

“Rebecca! Espera!” ele diz correndo atrás de mim.

“Vai embora!” – aumento a velocidade de meus passos e ele também. Viro a esquina e entro no Central Park, este seria o melhor labirinto para despista-lo. As árvores tampariam a minha imagem. Escuto passos firmes no chão se aproximando. Esta deve estar sendo uma cena engraçada para quem está passando. Um homem correndo desesperadamente atrás de uma mulher pelo parque. Poderiam até estar pensando que ele é um ladrão, mas sua aparência sofisticada e bem tratada tira todas as possibilidades. Então ele é um homem correndo atrás do amor de uma mulher? Não pode ser, principalmente depois do que ele disse. Correndo atrás de desculpas? Mas se sou uma qualquer então isso significa que ele pode arranjar outras, e arranjar outras significa não se importar comigo, e muito menos com o que eu penso sobre ele.

Eu como sempre continuava sendo uma qualquer. Mas porque? Eu tento tanto, mais tanto. Será que o meu dinheiro atrapalha tudo? Bem, eu poderia até ser uma vadia se não tivesse passado por tudo aquilo. Por que aí eu não teria noção do mal que as pessoas fazem.

As vezes me pergunto se vou encontrar alguém um dia com quem possa me abrir abertamente sobre isso. Não que meus pais, meu irmão e Andrea não saibam, mas e um homem desconhecido? Será que algum dia vou parar de sofrer com o toque dos outros? Parar te tentar conhecer tanto as pessoas antes de entrar em um relacionamento sério com elas? Eu já tive relacionamentos bons e saudáveis no passado, mas nenhum deles soube do que aconteceu comigo. Nunca acreditei o suficiente. Quando se é conhecida tudo fica mais complicado. Uma confiança errada e tudo o que você tenta esconder vai por água abaixo.

Olho para o meu relógio, são onze e quinze, melhor ir logo para o aeroporto. Abro a bolsa e pego meu celular.

• • •

“E aí maninha?” ouço a voz empolgada de Henry entrar no carro. Eu chamei o motorista de nosso pai para me ajudar a buscá-lo no JFK.

Ele se joga no banco ao meu lado, com um sorriso no rosto.

“Oi!” sorrio enquanto o abraço com força. “Como foi lá?”

“Você não vai querer saber.” Ele me lança um olhar malicioso, enquanto se senta de lado para me olhar de frente.

Ai meu deus! Como é bobo!

“Não era isso que eu queria saber! Quem você leva para cama não é da minha conta.”

“Bem.” Ele faz uma pausa. “Os casos na Califórnia são mais fáceis do que os de Nova York. Nada de mais.”

“Papai me aceitou na advocacia.”

“Já não era de se esperar. Ele demorou para te colocar ali dentro. Começa amanhã?”

“Sim. Ele disse que vai nos separar por áreas.”

“Prossiga.”

“Nós dois permaneceremos advogando, mas eu irei também para a área da agricultura...”

“... e eu da petrolífera.” Ele me interrompe, completando minha frase.

Balanço a cabeça afirmando. Ele suspira e desvia o olhar para fora do carro.

Estamos atravessando a ponte do Brooklyn, nos aproximando de Manhattan. O céu está azul e sem nenhuma nuvem. Os pássaros voam ao nosso lado, junto dos carros, muitos deles táxis também vindos do aeroporto.

“Senti falta de casa.” Ele diz ainda olhando pela janela, enquanto cerca minha mão com a sua.

Sorrio encostando minha cabeça no banco.



• • •








“Chegamos.” Anuncio abrindo a porta da sala. Ninguém responde. Provavelmente Andrea ainda está dormindo. Dou um passo a frente para abrir caminho a Henry.



Ele entra colocando sua mala no chão, ao lado da porta. Seus olhos verdes percorrem toda a extensão do apartamento. As janelas enormes deixam a luz do dia e sua paisagem entrarem no ambiente. A televisão de tela plana pendurada na parede é apenas um dos vários aparelhos eletrônicos que tem ali.


“Gostei. Só queria saber o que aconteceu com o nosso antigo apartamento.” Ele coloca as mãos nos bolsos da calça jeans e anda até uma das janelas.

“Também não entendi direito. Quando voltei da faculdade papai me mandou para cá.”

“Nosso velho Thomas Waldorf deve ter sossegado. E não nos queria por perto.”

“Você acha? Os papéis do divórcio dele e da mamãe já saíram?” pergunto indo para a cozinha acoplada a sala.

“Do jeito que ele é, esses papéis não significam nada quando o assunto é arranjar alguém. Você já deveria saber disso.”

Dou de ombros abrindo a geladeira e pegando uma Samuel Adams.

“É difícil aceitar quem o seu pai realmente é. Me incomoda até hoje lembrar da nossa mãe chorando por causa dele.” Dou um gole na cerveja.

“Eu também quero.”

Ele se vira e vem em minha direção, abrindo a geladeira e pegando uma também.

“De certa forma eu entendo ele. Nossa mãe é muito dramática e ciumenta. Faria a mesma coisa em seu lugar.”

Viro os olhos.

“Vou dizer isso para a próxima mulher que você arranjar. Eu sempre soube que você é sem vergonha, mas nem tanto.”

“Sou homem e humano maninha, isso nunca dá uma numa boa junção.” Dá um gole.

“Rebecca?” Andrea geme baixinho atrás de mim. Me viro. Ela ainda está com a mesma roupa de untem a noite. Seu cabelo está bagunçado e seus olhos entreabertos.

Sua imagem me faz lembrar de Logan, não que ela seja parecida com ele, mas ele já esteve perto dela. Ponho as mãos em seu ombro e a abraço. Ela está com o cheiro dele, em decorrência de ter sido carregada pelo mesmo. O cheiro dele...

“Está melhor?” pergunto preocupada.

“Sei lá.”

“Já tomou o Cura ressaca?”

“Hmmm. Ah, sim. Já. Ele ajudou bastante. Obrigada.” Ela sorri. Percebo que Henry está com as sobrancelhas arqueadas.

“O que foi?” pergunto a ele.

Cura ressaca?” um sorriso de canto se forma em seus lábios.

“Longa história.” Respondo indo até o lixo e jogando fora a garrafa de cerveja.

“Bom dia Henry.” Ela diz apoiando o cotovelo no balcão da cozinha e deixando sua cabeça cair sobre a mão.

“Boa tarde.” Ele responde olhando para o relógio. “Eu que volto de viagem, e você que está perdida no fuso-horário?”

“Pois é.” Ela sorri.

“A farra deve ter sido boa ontem.” Ele cruza os braços e encosta na parede.

“Ela provavelmente não é a melhor pessoa para te responder isso.” digo.

Henry nos lança um olhar assustado, mas que logo se retrai em uma expressão de gozação.

“Não me diga que você travou.” Ele diz formando cada vez um sorriso maior.

“Sim.” Ela geme fechando os olhos. Henry solta uma gargalhada indo em direção a sala.

“Ai cara! Eu queria ter visto isso!”



• • •






O problema dos pesadelos é que eles sempre me pegam desprevenida. Aparecem nos momentos de maior vulnerabilidade. Me deixam confusa e me fazem sentir indefesa.





Para a minha decepção eles não ocorrem apenas enquanto durmo, mas também todas as manhãs na hora de acordar.


O som de guitarras ecoa pelo meu quarto, pelos meus ouvidos, pela minha cabeça. Abro meus olhos rapidamente. Aquilo é metalcore galesa se não me engano. Olho ao redor e me levanto rapidamente. Corro até a minha bolsa e pego meu celular, não é ele. Vou até as caixas de som do meu iLuv, também não é ele. Minha televisão está desligada. Olho para a porta que se encontra entreaberta. Henry. Aquele filho da mãe!

Abro bruscamente a porta, que bate da parede com força. Saio do meu quarto pisando firme no chão, mesmo descalça meus pés fazem um certo barulho na madeira, por conta da minha raiva. O som das guitarras misturado com a voz do vocalista ia aumentando cada vez mais.

Chego até a cozinha e vejo meu irmão apenas com uma box branca e com um avental de cozinha, preparando o café da manhã. Essa é a última cena que eu merecia ver logo pela manhã.

“Waking the demon! Where did you run to?” ele repete a letra da música enquanto mexe os ovos e o bacon na frigideira.

Bato a mão com força na parede chamando sua atenção. Ele se vira para mim assustado.

“Você acordou o demônio aqui.” Dou uma pausa. Minha voz é áspera, transbordando irritação. “E ele vai acabar com a tua raça!” grito indo em sua direção.

Ele sorri para mim quando paro em sua frente. Jogo minha cabeça para trás para poder olhar em seus olhos. Ele olha para baixo e analisa o meu corpo. Estou com uma camiseta preta colada no corpo e uma calcinha de renda rosa.

“Qualquer cara por ai gostaria de uma diabinha dessa acabando com a raça dele.”

Arregalo os olhos. Que pervertido! Bato em seu ombro e ele dá uma gargalhada. Henry sempre passa do limite em sua brincadeiras, e não é só comigo. Mesmo assim ele nunca faz isso por mal. Ele sempre espera ver as pessoas a sua volta rindo e se divertindo, já que considera o mundo sério demais para ficar com a cara fechada. Ele é uma pessoa boa.

“Calma! Estou só brincando. Sou seu irmão e te amo. Então... Me diga o motivo desta irritação toda logo pela manhã.” Ele volta a mexer na frigideira.

“Desliga esta merda de música.” Cruzo braços ao seu lado. Meu humor logo pela manhã nunca é bom. Eu sempre preciso de uma hora mais ou menos para acordar direito.

“Me de um motivo para fazer isso.”

“Eu estou pedindo.”

“Isso não é um motivo relevante.” Ele pega três canecas de café no armário.

“Ah não?” digo irônica arrancando seu iPod do tocador. Música para na hora. Dou de costas e vou para o meu quarto.

“Ei!” ele reclama jogando as canecas na pia, gerando um barulho ardido das louças quebrando.

Continuo a andar com paços largos. Entro em meu quarto. Escuto Henry se aproximar. Me tranco no banheiro a tempo, antes que ele me alcance. Coloco seu iPod na pia de mármore. Suas mãos batem com força na porta, me dando um susto.

“Abre esta porta!”

“Me de um motivo para fazer isso.” imito sua fala enquanto tiro minha camiseta.

Ouço ele respirar fundo. Sua mão colide com a porta novamente.

“Eu não estou brincando!”

“Eu também não.” Respondo tirando o resto da minha roupa.

“Eu só quero escutar música.”

“Problema seu.”

“Vá a merda Rebecca!” ele grita. Como sempre agindo como uma criança.

“Tchau Henry.” Falo alto entrando no box e ligando o chuveiro.

Escuto algumas coisas, provavelmente ele continua a falar. Não ligo. Deixo a água cair sobre meus cabelos loiros. Hoje será um dia agitado. Vou começar a trabalhar na Waldorf & Hilbert, a advocacia que meu pai, Thomas Waldorf, abriu junto de um amigo de faculdade, Dominic Hilbert. Me lembro de ter ido poucas vezes lá. A maioria quando era pequena. Meu pai sempre me levou junto de Henry para conhecer o ambiente, já que um dia estaríamos ali.

Respiro fundo. Estou totalmente confiante, Yale foi uma ótima formação. Só tenho medo de que o fato de ser filha de Thomas me atrapalhe. Claro que por conta disso sempre estarei em cargos importantes, mas e na questão de sociabilidade e capacidade. Quero dizer, e se ele me colocar em um papel onde ainda não estou capacitada para exercer? E se as pessoas só fingirem que gostam de mim, pelo fato deu ser quem eu sou.

Vai dar tudo certo. Vai dar tudo certo. Vai dar tudo certo. Repito várias vezes em minha cabeça tornando isto um mantra, algo que faço normalmente quando estou nervosa.

Termino de tomar banho e me enxugo com a toalha. Vou até o meu closet e visto um tubinho básico preto. Volto para o banheiro e seco meu cabelo, prendo-o em um coque estilizado e bem feito que parece um número oito. Pego meu kit de maquiagem e pinto meus olhos com cores neutras. Passo rímel e um batom rosa claro, dando um ar profissional a minha pele branca e minhas íris azuis.

Arrumo minha bolsa Gucci preta, pego meus saltos Louboutin da mesma cor e o iPod de Henry e saio do quarto.

Encontro Andrea e Henry sentados na mesa de jantar tomando o café da manhã. Ela ainda está de pijama, já ele se encontra com uma camisa social branca e uma gravata roxa. O cabelo castanho escuro dela está preso em um rabo de cavalo, e os fios loiros escuros dele estão penteados para trás.

Coloco os saltos e a bolsa no sofá e o iPod na mesa de centro. Ando até a cozinha e me sirvo de granola e iogurte. Sento em uma nas cadeiras na mesa, juntando-me a eles.

Henry me lança um olhar impaciente, enquanto Andrea dá um sorriso carinhoso.

“Qual é o nome daquela música que estava tocando? Ela me acordou.” Ela pergunta animada para nós, que nos encaramos seriamente.

“Waking The Demon.” Responde secamente Henry levando uma torrada a boca. Ele respira fundo enquanto mastiga.

“Muito boa ela.” Andrea continua com sua animação que se destoava no ambiente.

Não que eu esteja brava com o meu irmão, mas estou ansiosa para hoje. O fato do nome de Logan ser Hilbert ainda faz minha cabeça se encher de receios.

“É boa mesmo. Pena que poucas pessoas apreciam.” Ele me lança um olhar faiscante.

“Eu acho que as outras pessoas também apreciam, mas apenas são sensatas o suficiente para saber os momentos de escutá-la.” Digo dando uma colherada na granola.

Henry coloca o garfo sobre o prato e empurra sua cadeira para trás. Se levanta e vai até um dos sofás pegar seu paletó preto de riscas em chumbo. Isso é um aviso de que nossa partida está próxima.

“Não temos tempo a perder Rebecca.” Sua voz soa autoritária.

Limpo minha boca com o guardanapo e me levanto da mesa pedindo licença a Andrea. Retiro o meu prato e o de Henry e os coloco na pia da cozinha.

“Mas já?” ela pergunta.

“São oito e meia.” Henry responde guardando o iPod e o BlackBerry no bolso interno do paletó.

“Sério? Preciso me arrumar então.” Ela diz levantando.

“Vamos.” Digo pegando minha bolsa. Apoio minha mão na parede enquanto coloco meus saltos.

Henry abre a porta da sala e sai pelo hall, apertando o botão do elevador. O sigo trancando a porta atrás de mim. Posiciono-me ao seu lado.




• • •








Chegamos ao nosso destino, o prédio de trinta andares composto de vidro e aço, sede da advocacia Waldorf & Hilbert, das empresas Waldorf e das empresas Hilbert. São nove horas. Demoramos meia hora para chegar até aqui, por conta do trânsito já conturbado nas ruas Nova-iorquinas em uma plena segunda-feira pela manhã. Estamos no imenso saguão todo de vidro e mármore.






Passamos reto por todas as pessoas por ali agitadas procurando seus caminhos. Henry caminha a minha frente chamando a atenção de várias mulheres a sua volta. Até as recepcionistas param de mexer em seus computadores para prestar sua devida atenção nele. Rio da cena e imagino o quanto seu ego deve estar inflamado agora.


Chegamos ao corredor de elevadores passando por alguns seguranças que certificam se trabalhamos ou não do prédio antes de nos deixar passar.

O elevador nos leva em alta velocidade para o trigésimo andar. Uso este tempo para observar a expressão de Henry. Ele ainda está sério. Se o conheço bem, ele está louco de vontade que eu peça desculpas pelo o que fiz, mas não vou fazer isso.

As portas se abrem e me encontro em um outro saguão, composto novamente de mármore e vidro, uma decoração padronizada.

Nos deparamos com uma mesa de vidro, com uma recepcionista morena que se levanta para nos receber. Na parede atrás dela está escrito em letras garrafais Waldorf & Hilbert advogados.

“Bom dia Sr. E Sr. Waldorf. Sejam bem vindos novamente.” a mulher abre um sorriso nos cumprimentando. Me lembro dela da última vez em que vim aqui. Ela é secretaria de meu pai à anos.

Olho para os meus dois lados e tento me recordar deste ambiente. À minha esquerda há uma ampla sala de reuniões com paredes de vidro, onde no centro uma enorme mesa de madeira clara com várias cadeiras em volta. As janelas tanto da sala quanto do saguão, vão do teto até o chão, dando uma vista incrível da cidade. A minha esquerda há um grande corredor com várias outras salas, mas estas sem as paredes transparentes.

“Bom dia Susan. Meu pai já chegou?” Henry pergunta com um tom profissional, tanto quanto o de Susan.

“Sim, o Sr. Waldorf está a espera de vocês junto do Sr. Hilbert. Podem entrar.”

Henry não sai do lugar. Dou um passo a frente tomando a iniciativa, e sinto sua mão direita posicionar-se ao final de minha coluna, me guiando.

Sem bater na porta, Henry a abre cuidadosamente. Percebo que há três homens na sala. Um deles é meu pai posicionado ao lado de Dominic, junto as janelas. Os dois riem descontraidamente. Lanço meu olhar para o terceiro homem, e meus olhos travam nele. Não pode ser... Escuto a porta se fechar em um estrondo atrás de mim. Os três dirigem seus olhares para mim e Henry. Todos param de rir. Arregalo os meus olhos, meu coração acelera e sinto uma insuportável falta de ar. Me sinto travada no lugar. Tudo isso não está acontecendo por causa da minha ansiedade anterior, nem por causa dos olhares sobre mim, mas sim por que eu vi.























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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado!



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