Após longas voltas de vespa pela cidade, todo aquele misto de raiva e medo haviam cessado, ao menos por enquanto.

Ao entrar no apartamento, dei de cara com Klaus que falava ao telefone, e ao me ver ficou paralisado por um tempo, afastou o celular de seu rosto e disse gaguejando:

- Ky-kyle, você para a hora do almoço?

- É, parece que serei sua cobaia culinária mais uma vez. - disse ainda hesitante e meio desconfiado.

- Achei que não fosse voltar por agora... E por falar nisso, como foi à consulta com o tal Scott? – dizia ele enquanto apertava algumas teclas do aparelho e o guardava no bolso dianteiro.

- Nada de novo, talvez nem precise voltar. – Falei observando-o cuidadosamente, já que não me lembrava de ter dito nada sobre a consulta para Klaus.

- Olha só, que bom cara, mas eu estava pensando... Não estou com vontade de pilotar fogão hoje, que tal uma pizza?

- Esse é meu prato favorito que você faz – Disse com um sorriso de canto.

Antes que Klaus atirasse qualquer objeto em mim, saí correndo até o quarto e gritando.

- Vai pedindo aí! Acho que preciso de um banho agora!

Em meu quarto, joguei-me sobre a cama, fechei os olhos e deixei que os pensamentos me invadissem.

Pra começar, toda aquela história do doutor Scott e de seu pai terem um súbito interesse em minhas lembranças, que por sua vez insistiam em voltar. E então a sensação de Klaus estar me escondendo alguma coisa, com aquele comportamento estranho, telefonemas misteriosos, e desaparecimentos relâmpagos, o que era raro de se acontecer com Klaus, ao menos costumava ser. Isto sem falar no encontro que teria algumas horas mais tarde... É isso, o encontro, eu havia me esquecido de ligar para Sofie para confirmar nosso encontro.

Mais do que rapidamente, retirei o celular do bolso, levantei-me da cama, disquei o numero e confirmei. Fui até a janela e esperei que Sofie atendesse meu telefonema. Infelizmente a linha estava ocupada, e eu não sou o tipo do cara obsessivo que ligava mais de uma vez seguida, então desliguei o telefone, guardei-o, peguei a toalha, jogando-a no ombro e sai porta a fora em direção ao banheiro.

Assim que saí do quarto ouvi a voz de Klaus sussurrando algo. Prontamente esgueirei-me pela parede do corredor aproximando-me ao máximo que pude, e então pude ouvir:

- E então, ele já ligou para confirmar?

Minha mente produzia várias hipóteses, mas nenhuma delas tinha fundamento ou chances de ser verdade.

- Entendo, não se esqueça de retirar todas as informações que conseguir, quanto mais rápido formos, mais rápido teremos nossas recompensas.

Ele parou de falar por alguns instantes e logo prosseguiu:

- E então, quando nos veremos outra vez?

Infelizmente eu não podia ouvir o que a outra pessoa dizia, o que dificultava ainda mais identificar quem poderia ser do outro lado do telefone.

- Tudo bem, então acho que já vou desligar, não posso falar por muito mais tempo, ele está aqui agora, ligo pra você outra hora, até mais anjo.

Anjo... Com certeza era uma garota, Mas algo ainda não fazia sentido e sobre a frase “não posso falar por muito mais tempo, ele está aqui agora...” inegavelmente eu fazia parte do assunto novamente.

Recusei-me a deixar que os pensamentos me transportassem para sua dimensão novamente, me recompus e segui até o banheiro.

Após meu longo banho, vesti a primeira roupa que encontrei e segui até a sala de estar, sentei-me no sofá, como o controle em mãos, passando os canais e pra variar, não estava passando nada de bom. A campainha tocou, esperei que Klaus fosse atender, mas ele sequer deu sinal de vida. A campainha tocou mais uma vez, pulei do sofá e abri a porta. A minha frente estava um rapaz de estatura mediana com uma pizza na mão. Peguei a pizza, entreguei-lhe duas notas de 20 e disse-lhe para que ficasse com o troco.

Coloquei a pizza na mesinha de centro e procurei por Klaus, que aparentemente estava no banheiro. Voltei ao sofá e ao lado da caixa de pizza estava o celular de Klaus, aquela era a chance pela qual eu havia esperado, sem pensar duas vezes peguei o celular, e vasculhei a caixa de mensagens e tudo o que descobri foi que Klaus não usava muito deste serviço, logo após busquei pelas últimas chamadas, e muitas delas estavam endereçadas a mesma pessoa, a qual tinha apenas um “S.” como identificação. Mas isso não era tudo, apesar de saber que aquilo era errado, eu precisava saber, Klaus já não era digno de confiança, e foi vasculhando suas fotos que meu corpo inteiro estremeceu, ele colecionava fotos e fotos de Mellanie,  em várias poses, estilos e jeitos. Aquilo tudo era estranho, tendo em vista que Klaus nunca havia gostado de Mellanie e por diversas vezes mandou que eu desistisse dela. Mas ao ver aquelas fotos percebi que aquele não era o Klaus, não o mesmo Klaus de dois meses atrás, o qual costumava ser meu melhor amigo.