Uma semana depois...

Eu havia sido encontrada...me trataram no hospital mas eu fugi para a colina. Hoje era a missa de sétimo dia da Angie e eu fugi novamente, lá estava eu, sete dias, em todos eles eu acabei vindo parar aqui. Estava frio.

Ela ria de mim.

–Não ri! é sério...eu estou congelando!

–Para de ser fresca! está quente...- ela ria dos meus dentes batendo.

–Está quente pra quem tem cabelo de fogo...-me zanguei.

Ela veio e me abraçou. Quentinha. Queimamos juntas.

Eu lembro de queimar. Eu sempre queimava. Eu vivia soterrada por lava...Angie estava ateando fogo por todos os lados. Sete dias atrás a lava esfriou junto com o corpo da minha melhor amiga. E aqui estou eu...feito uma estátua de Pompéia. A lava esfriou e me tornou pedra.

Retiro o isqueiro do bolso, acendo e vejo a chama dançar. Estou feliz por ainda ter uma centelha de Angie por perto.

–Me diz...você está feliz aonde está?- pergunto para o fogo. Uma lágrima escorre. Está realmente frio hoje.

O isqueiro apagou, acabou seu combustível...choro. Angie...

–Por que você não está aqui?!?! hã!?!? eu queria conversar! eu queria falar com você! Eu sinto tanto a sua falta!-Grito para o isqueiro apagado e choro...choro porquê sei que o frio não vai passar nunca. Choro porquê a última visão que tive da Angie ainda está queimando em mim. -Me desculpe por não ter ido com você...-minha voz agora é um sussurro e os soluços me atacam violentamente.

Ela estava deitada no chão da casa na árvore. E nós duas estávamos sérias. A avó de Angie tinha morrido e o avô estava tão triste que adoeceu.

–Ollie...não deixe que isso aconteça com nós duas...quero dizer...se algo acontecer com você eu não quero ficar.

Olho pra ela.

–Promete que vamos envelhecer juntas e morrer no mesmo dia? -ela levanta o dedo mindinho.

–Prometo.-Enlaço o dedinho dela com o meu.

Caio de costas e viro de lado em posição fetal.

–Me desculpe. Me desculpe. Me desculpe. Eu sinto muito. Me desculpe. Me desculpe.- choro baixinho agarrada ao isqueiro.

–Angie...-eu imploro

Angie continua chorando, estamos ajoelhadas de frente uma para a outra no chão do quarto dela. O cachorrinho dela morreu atropelado na frente dela mais cedo e desde então ela não parou de chorar pelo filhotinho.

–Não me peça pra parar...apenas fique aqui comigo...sempre.

Estico minhas mãos em concha e recolho todas as lágrimas dela com as palmas. Fico lá ajoelhada até o final. Posso sentir suas lágrimas gotejando em minhas mãos, vou guardar todas elas até que sequem.

Alguém senta ao meu lado. Davi. Ele tem lágrimas descendo pelas bochechas. Puxa minha cabeça para seu colo e fica ali me ninando no escuro da colina. Nós dois choramos.

Mais tarde eu caio no sono enquanto choro então ele tenta me levar pra casa mas eu desperto.

–Não quero ir...

–Você precisa dormir...

–Eu não tenho conseguido dormir. Meu quarto é quente e meu ventilador faz barulho de chuva. O som me faz sentir dor e acabo ficando acordada lembrando de como ela foi embora.

–Quer ir pra onde então?

–Para a casa da árvore.

Ele dá partida no carro e lá vamos nós.

Chegamos e subimos. A casa parece menor agora que não tenho mais doze anos, a casa parece maior agora que não tenho mais Angie. Deitei-me no chão e Davi ao meu lado. Me virei e ele me abraçou. Ficamos lá deitados em silêncio, as lágrimas já haviam secado e o cansaço já nos embalava para o sono.

–Eu te amo...-sussurei antes de dormir.

–Também te amo.

Quase pulei de susto, pensei que ela estava dormindo. Mas ela não estava.

–Eu te amo também -Davi respondeu para a minha surpresa.

Dou uma risadinha sem graça- Pensei que você já tivesse dormido.

–Mas não dormi. -Ele me abraça mais forte. Pela primeira vez em sete dias sinto calor.