Era noite de sexta feira. Z estava dentro da rotação, e Bella tinha saído com Marissa, Beth e Mary para ajudar no Abrigo. Na noite anterior, Jane tinha concordado em ficar com Nalla enquanto a mahmen estivesse fora. Mas as coisas nunca são mesmo da forma como planejamos, não é?

*

“Como assim, eu terei que ficar com ela?” Vishous respondeu com a voz estrangulada.

Sua shellan estava parada, o encarando firmemente, à sua frente. Os olhos verdes dela tinham aquele brilho decidido, do tipo você-vai-fazer-o-que-eu-quero-e-fará-agora que ele tanto amava. Mas que lhe deixava com um frio na barriga, também. Embora jamais fosse admitir para ninguém. Jane era a mulher mais incrível do mundo, para ele. Não importava mais nada além dela (Butch era um caso à parte). Mas em momentos como esse, preferia não ter nunca se apaixonado pela doutora.

“Exatamente isso, Vishous. E você não tem como escapar.” A dra. Jane passou a mãos sobre os cabelos louros. Seus olhos relancearam pelo quarto deles. Estava mais organizado, mas só um pouco. Os livros deles ocupavam mais espaço que qualquer coisa. Suspirou. Odiava ter que colocar seu hell nessa situação, mas ela prometera que ia cuidar da menina, e não passaria essa tarefa para outra pessoa. Era responsabilidade dela. Okay, era de V, agora, também. “Olhe, você sempre pode pedir ajuda à Butch. Ele já ficou com ela algumas vezes, e tem jeito com crianças.”

O Irmão fuzilou sua fêmea. Ah, claro. Iria sim colocar seu melhor amigo nessa. Com certeza. Ainda mais depois que ele lhe confidenciara que o cio de Marissa estava se aproximando, e que estava apavorado com a ideia de que ela engravidasse. Totalmente.

“Peça para Rhage. Ele já ficou com ela...”

Jane revirou os olhos.

“Sério, V... Rhage? Ele a pega como se fosse um saco de batatas. E não iria alimentá-la com nada além de Totsie Pops, pipoca e sorvete.”

“Você acha que eu faria melhor? O que te faz pensar que posso cuidar tão bem da bebê?” o macho retrucou, enquanto ela se movia pelo Buraco, saindo do quarto deles e indo pela sala, pegando sua maleta preta de médica e indo para a porta da frente da casa de guarda. “Sério, Jane...”

A doutora se virou quando chegou ao gramado e encarou o marido.

“Você só está com medo, V. E está tudo bem. Mas vai dar certo. Conheço você e sei que vai conseguir.” Olhou seu relógio de pulso e depois o beijou suavemente nos lábios. “Tenho que ir. Prometo voltar assim que a paciente estiver estável.”

E desapareceu no ar.

Vishous respirou fundo duas vezes. Passou a mão direita, a com a luva e as tatuagens, na cabeça -num gesto mais típico de Z- na cabeça várias vezes, esfregando o couro cabeludo, desalinhando os cabelos.

Depois abriu a porta da frente, passou pelo vestíbulo, abriu a segunda porta, e entrou na sala de estar. No canto, perto na mesa de pebolim, Nalla dormia quietinha no seu berço portátil.

O coração de V disparou. Suou frio. Estava acostumado a ficar tranquilo quando enfrentava os redutores, mas cara... esse ser minúsculo, menor que seu antebraço, lhe davam uma sensação terrível.

Porque ele sentia que caso se movesse rápido demais ou com firmeza demais, poderia machucá-la. E não queria fazer isso. Jamais.

Caminhou até o berço e olhou por cima das paredes do cercado com cuidado, esperando passar despercebido. Seus olhos brilhavam de ansiedade. Estava quieto, tentando não chamar atenção para si.

“O que está fazendo?” A voz do tira ecoou por sua cabeça, lhe pregando um susto. V pulou, e se virou, tirando os cabelos dos olhos.

Butch estava encostado na parede que levava ao corredor, um sorriso divertido nos lábios. Estava relaxado demais.

Vishous fechou a cara e cruzou os braços sobre o peito.

“Não estava fazendo nada. E você?”

Butch levantou uma sobrancelha.

“Estava observando Nalla dormir... Sabe como é, as crianças dormem depois de comer.” E sorriu. “Ela não vai pular em cima de você, V!”

O outro saiu de perto do amigo, indo para a cozinha e enchendo um copo com a boa e velha vodca Grey Goose.

Butch pegou um copo para si e V o encheu, também.

Depois de tomarem a dose juntos, de uma vez, Vishous encarou seu parceiro.

“Ela não vai acordar tão cedo, não é?”

O tira deu de ombros.

“Não sei, Butch... Me dá um nervoso... Ela pode quebrar. E quem deixaria seu bem mais precioso comigo?” Encheu outro copo e tomou dois grandes goles.

“Eu deixo minha vida contigo todas as vezes, Vishous...” murmurou.

V olhou para seu Irmão. Aqueles olhos castanhos tinham muita emoção.

“Você sabe que não te faria mal, né, tira?” Vishous sorriu abertamente, suas belíssimas presas brancas brilhando. Os olhos reluzindo.

“Claro que sei.” respondeu com o sotaque de Boston. A voz arrastada. Seu sorriso animado e o tom descontraído deram confiança e relaxaram Vishous. Butch não estava levando aquilo para o passado. Para quando era apaixonado por ele. Que bom! “Mas veja, meu amigo, Jane jamais deixaria Nalla aqui se não acreditasse que poderia cuidar dela.”

Então, um choro foi ouvido da sala e o estômago de V afundou.

“Merda!” sussurrou, olhando para o chão.

Era aquele tipo de choro que só passaria se fosse colocada no colo e acalentada.

O Irmão deixou o copo de Goose para trás e foi até o berço. Lá dentro, de pé, batendo nas paredes do cercado, Nalla chorava copiosamente. Suas mãozinhas batiam contra o tecido, e os olhos amarelos estavam apertados e vermelhos. Lágrimas gordas desciam por seu rosto. Ela estendeu as mãos para Vishous e as flexionou, chamando-o.

“Acho que ela quer colo...” Butch murmurou.

V respirou fundo e se inclinou para pegar o pacotinho de Z e Bella. Oh, foda... ele não tinha jeito com crianças, não tinha... Não mesmo! Ele...

Nalla coube direitinho em seus braços. E parou de chorar logo que ele a encaixou em seu peito. Ela passou os bracinhos por seu pescoço, apoiando a cabeça no ombro esquerdo do tio. O segurava com força, apertando o tecido da camisa que vestia, e soluçava baixinho, ainda. Mas estava melhor.

Vishous se virou um pouco para Butch enquanto o tira se inclinava para pegar o pano com que a menina dormia. Quando os dois machos se olharam, o ex-policial sorriu. Então, colocou o paninho entre a cabeça da pequena e o ombro do amigo.

Nalla deu um suspiro e Vishous começou a andar para o sofá. A bebê fungou e se remexeu, voltando a choramingar.

“Butch o que eu faço?” V disse baixinho, mas desesperado. Não queria que ela começasse a gritar.

“Que tal falar com ela?” respondeu, junto com o choro, que aumentava ainda mais. Vishous sentou no sofá, o que só piorou a situação. Nalla passou a berrar.

Os machos se entreolharam.

“Você é quem deveria estar aqui!” sussurrou irritado para o amigo. Butch sorriu.

“Meu amor, eu estou aqui com você” pensou por um segundo. “Jane me disse para te ensinar algumas coisas, mas você sabe... Só aprendemos fazendo. Vou te ajudar. Aqui...” E pegou a mão maldita de Vishous, fazendo movimentos circulares nas costas da menina. Mas o outro a puxou de repente.

“Não coloque isso...”

“Não vai acontecer nada, Vishous!” Butch foi energético. “Pare de chilique. Ela gosta de estar nos seus braços. Fale com ela. Pergunte o que está errado. Vai ver como responde. Ela é inteligente! Seja carinhoso!”

V fez um bico com os lábios e voltou a acariciar as costas da menina com a mão direita.

“O que há de errado, Nalla?” Disse baixinho, enquanto o choro quase o deixava surdo. “Vamos, garota, pare com isso. Converse comigo...” caminhou pela sala, olhando Butch de vez em quando. O choro diminuiu o volume. “Não se preocupe, nós daremos um jeito, seja lá o que for.”

Ele sentiu que ela se apoiava em suas mãozinhas. Então a encarou. O rostinho pequeno de forma delicada, os olhinhos amarelos e os cabelos cacheados e multicolores o ofuscaram. Era uma linda criança, ele sempre soube. Mas havia inteligência ali. E curiosidade. Nalla o encarava como se perguntasse “tem certeza que sabe do que está falando?”.

“Sim, querida...” ele murmurou. “Nós vamos descobrir o que é, ‘kay?” falou suavemente, acariciando com a luva a cabecinha.

Ela fungou mais algumas vezes e tentou virar seu corpinho de dez meses para Butch.

“Oh, não se preocupe, o tira não vai fazer nada com você...” V sorriu quando ela tremeu os lábios, querendo chorar de novo. “Escute, que tal irmos ver se tem o que comer na cozinha? Quem sabe não encontramos algo divertido para fazer também, eihn?” balançou a menina nos braços. Estava se sentindo mais relaxado depois que vira os olhos expressivos dela. Nalla sabia o que acontecia à sua volta. E o que queria. A inteligência não deveria ser subestimada. Nunca!

Butch suspirou e sorriu mais uma vez, quando se aproximou e estendeu os braços para a garotinha de Z.

“Venha com o tio Butch, preciosa. O tio V não vai conseguir carregar você tanto tempo...”

Vishous franziu o cenho.

“Ora, o que é isso, tira? Claro que vou!”

Butch o encarou descrente.

“Há dez minutos, você não queria encostar nela.”

V apertou Nalla nos braços e rumou para a porta.

“Não se atreva a tirar Nalla de mim. Hoje será uma noite de nós dois!” e depois, quando chegou ao jardim e pensou que Butch não estava perto o suficiente para ouvir, disse para ela: “Nós vamos aproveitar para nos conhecermos, não é, princesa?”

O barulhinho de prazer que Nalla soltou era a confirmação que precisava. Ela estava feliz.