Antes Que Seja Tarde escrita por Mi Freire


Capítulo 13
Parte II - O outro lado da história.


Notas iniciais do capítulo

Esse é o único capítulo onde Maria Luiza é a narradora. Quatro anos se passaram desde que ela mandou Daniel sumir de sua vida. Afinal, todos nós temos nossos próprios motivos para sermos quem somos. E ela vai nos contar agora, quais são os motivos dela. Espero que entendam o seu lado e compreendam o que ela tem a dizer.



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“Dessa vez não vou querer tudo de uma vez, porque sempre acabo ficando sem nada no final.” Caio Fernando de Abreu.

Muito tempo se passou desde aquela despedida. Eu continuo sendo a garota chamada de Barbie por qualquer lugar onde passo.

Estou no quinto ano da faculdade de medicina, me preparando para me especializar em pediatria. Ainda moro no duplex com as minhas amigas. Aos finais de semana, ainda vou visitar meus pais.

Atualmente, estou namorado com o meu primo, Fernando. Faz exatamente três anos. Foi algo repentino que surpreendeu a todos, especialmente a mim. O melhor de tudo é que nos relacionamos bem.

Tudo começou numa época muito difícil da minha vida. Os estudos, a recuperação do término de namoro com Daniel e uma suspeita separação entre meus pais. Para minha sorte, ficou tudo melhor quando Fernando se mostrou mais que um primo.

Durante uma viagem de férias ao Sul do país, quando já percebia uma intimidade incomum entre nós, ele me pediu em namoro da forma mais incrível possível: me presenteando com um lindo anel de diamante.

Obviamente eu aceitei, fiquei grata em saber que eu poderia contar com alguém que acima de tudo era o meu primo e estaria por perto sempre.

Nosso namoro é estável, discutimos pouco. Na maior parte do tempo ele está trabalhando e eu estudando ou se divertindo com os amigos. Mas sempre viajamos para o exterior, passamos dias fora e aproveitamos cada minuto juntos.

Sou uma mulher extremamente feliz. Sou bastante presenteada por meus pais, que tem um orgulho enorme de mim, e por meu namorado. Mas ainda assim, sinto que nos falta algo. Talvez o mais importante.

Bom, quando me separei de Daniel, foi muito difícil compreender os meus próprios sentimentos e quem eu era. Talvez eu tenha amadurecido bastante desde então, e hoje reconheço meus erros sem vergonha de expô-los.

Chorei bastante por saudade, a ausência e, principalmente, a distância. Aos poucos, fui me recuperando. Principalmente, quando Fernando estava por perto com sua solidariedade em me fazer parar de chorar.

Tenho que confessar que ainda amo muito Daniel e penso constantemente nele. Penso onde ele estaria e o que faz de sua vida. E o mais importante: se havia encontrado outro alguém melhor do que eu.

São exatamente quatro anos sem saber absolutamente nada sobre ele. Sinto que o amor é tudo que falta em minha vida. Sei que não amo Fernando da mesma maneira que amei Daniel e, por essa razão, sinto-me tão incompleta na maior parte do tempo.

Hoje, percebo o quanto fui tola e egoísta. Pensava apenas em minha felicidade enquanto ele fazia de tudo para tentar salvar nossa relação. Pensei que poderia ser mais feliz sozinha, sem ter por perto alguém para perguntar onde estava, com quem estava e o que fazia. Eu tinha anseio de ser feliz. Aproveitar a fase mais preciosa de minha vida e curtir com a galera.

Quando me dei conta disso, tentei correr atrás do prejuízo. Mas seu número não existia mais. Em casa, ele nunca estava. Conversei com sua mãe ao telefone e cheguei a ir até lá, mas ela sempre dizia que era melhor eu me afastar. Assim, eu acabei me perdendo. Desisti facilmente. Pensava que ele jamais me perdoaria por tudo que fiz.

No entanto, insisto em repetir que falta amor. Na verdade, em toda a minha vida sempre fui carente de amor. Não que Daniel não tenha me amado de verdade. Sim. Eu sempre acreditei no quanto ele me amava, refletia em seus olhos. Mas na questão de família, papai e mamãe sempre tão ocupados, se esqueceram de me dar o mais importante.

Cresci como uma criança mimada. Era cercada por brinquedos, dinheiro, e viagens. No entanto, sempre que chorava ao cair de uma escada ou quando precisava aprender a ler e escrever, não tinha meus pais por perto para me auxiliarem como todas as outras crianças. Quem estava sempre ao meu lado era Teresa, nossa arrumadeira.

Hoje, uma senhora de cinquenta anos, além de cuidar dos deveres da minha grande casa, cuidou também da minha educação, minhas roupas e meus medos.

Teresa é uma senhora de família humilde, nasceu e cresceu em uma casa pequena junto com mais cinco irmãos. Quando ouvia suas histórias ficava chocada. Teresa tem três filhos e se desdobrou para cuidar deles sozinha.

Sei que ela é uma mulher guerreira. Ela me ensinou a amar e ser alguém melhor sem ter que me importar somente com o dinheiro dos meus pais. Talvez, por isso, eu tenha crescido valorizando mais o amor. Mas admito que fui irrelevante em alguns momentos da vida. Feri a quem mais me amava por deixar me levar por um dinheiro que nunca foi meu.

Apesar de tudo, eu só queria consertar as coisas. Queria admitir para Daniel o quanto errei. Por um momento eu queria poder sentir novamente aquele amor, aquele abraço apertado que me fazia estremecer, aqueles olhos calorosos nos meus, os seus cuidados com a minha carência.

Seus olhos negros me faziam ver uma infinidade de possibilidades para que pudéssemos ficar juntos por toda uma vida, como nos contos. Seus lábios pequenos, rosados e bem contornados faziam com que eu os desejasse todas as vezes que fixava meus olhos neles. Sua pele branca sem qualquer imperfeição, o perfume que nunca esqueci. Será que ele ainda o usa? Gostava dos cabelos negros que delineavam seu rosto com a franja que caia sobre os olhos.

Eu realmente gostava de cutucar os dois furos de sua orelha de 12 mm, como se fossem brinquedos em meus dedos. Em noites calorosas, amarrados um no outro costumava deslizar as pontas dos meus dedos delicadamente em seu peito nu e a barriguinha lisa. Sentindo seu corpo se arrepiar a cada toque meu.

Apesar de magro e alto, seus ombros largos faziam com eu me sentisse especialmente segura. Era sempre tão elegante ao se vestir, com suas roupas radicais. O mesmo All Star velho, o jeans preto, os bonés de diversas formas, as camisetas com pouca estampa, os moletons sem zíper. Tão alternativo e diferente de tudo.

Daniel era, e provavelmente ainda é, a perfeição em forma de pessoa. O tipo raro de garoto que a gente não encontra em qualquer lugar. Sorte fora a minha de um dia ter sido tão sua e ele tão meu.

O resto do mundo parecia não mais me importar quando ele dizia me amar. Sua voz rouca era como sussurros apaixonados penetrados nos meus ouvidos. O sorriso tão divino, os dentes certos e esbranquiçados. O riso engraçado que sempre conseguia arrancar gargalhadas minhas. O olhar apaixonado quase que inexplicável, o beijo doce de lábios quentes.

Vontade absurda eu tinha de ligar para ele, só para ouvir sua voz ao telefone nem que fosse só para me xingar. Queria que ele sentisse a minha falta e fosse capaz de me perdoar para voltarmos a viver juntos mais uma vez. Sim. Eu deixaria toda essa minha vida tola só para viver ao seu lado.

Hoje, só me resta a dor, a vontade de tê-lo, a saudade que sinto de todos os momentos bons ou ruins que vivemos. Hoje, só me resta aceitar a companhia que encontrei nas amizades que construí. Mesmo sabendo que ele era a melhor parte de mim eu o deixei e entendo que deva sentir uma raiva imensa de mim a ponto de não me aceitar, nunca mais.

— Benzinho, o que está pensando? – perguntou Fernando interrompendo meus pensamentos.

Quando me dei conta, estava em casa deitada no colo de Fernando enquanto ele alisava meus cabelos com seus dedos. Lágrimas em vão escorriam em minha face, enxuguei-as fugando.

— Nada não – menti.

— Está infeliz? – perguntou.

— Não, não é isso – respirei fundo tentando me recompor. — Só estou cansada. Não sabia que era tão difícil assim ter que crescer, estudar e ganhar a vida.

Caminhei até a varanda e me debrucei no parapeito da sacada. Via o céu escuro, cheio de estrelas, com um luar magnífico. Uma lua tão encantadora.

Será que apesar de tudo ele ainda me amava? Pensava em mim? Em me encontrar? Em tentar me ouvir? Sim, eu tinha tanto o que falar. Verdades que só descobri depois do nosso fim.

Mas também pensava em Fernando e em tudo que ele fez por mim todos esses anos. Eu estava sendo injusta com alguém que tanto gostava de mim. Estava o prendendo em meus encantos enquanto ele poderia estar livre e encontrar alguém que realmente o amasse. No entanto, não tinha coragem de falar tudo para ele. Não queria fazer a mesma coisa que fiz com Daniel naquele dia. Não queria ferir Fernando também. Eu sei bem o que é me sentir culpada pelo choro de alguém e creio eu que ninguém mereça sofrer por minha culpa quando eu tão pouco mereço o amor.

Sou uma pessoa injusta que fere corações sem mesmo ter a intenção. Sou uma pessoa egoísta, pois só penso em mim. Falo o que quero e quando quero sem pensar nas consequências. Daniel estava enganado dizendo ter encontrado em mim uma garota diferente.

— Você não tem motivo para se isolar – ele disse colocando seus braços por volta dos meus ombros.

Respirei profundamente tentando adormecer aquele ódio, eu tinha vontade de sumir, explodir. Sumir comigo mesma. Eu já não queria mais ninguém por perto, nunca soube valorizar nada em minha vida e não merecia ser amada.

— Saia daqui! - fuzilei-o, nervosa. Sem conseguir me conter. — Preciso ficar sozinha.

De cabeça baixa ele se foi sem dizer mais nada, como quem realmente entendia o que acontecia ali.

Voltei a chorar quando aquela cena me fez lembrar do dia em que pedi para Daniel sumir da minha vida, sentia tanto ódio dele naquele momento.

Poucos sabem, mas depois que o deixei no quarto, me escondi no banheiro. Tranquei-me ali calada para que ninguém soubesse do meu sofrimento. Tinha vergonha de chorar, de ter que admitir que eu estava enlouquecendo.

Chorei encolhida no chão. Confesso que tive vontade correr atrás do meu amor e pedir para ele ficar. Eu sei que ele ficaria. Assim como eu fiquei todas as vezes que ele se desculpou mesmo sem ser o culpado depois de uma briga.

Daniel me amava, já eu nunca fui atrás de um perdão, reconciliação. E sabe por quê? Porque eu sabia que uma hora ou outra ele viria todo manhoso se desculpar, sabia que ele tinha sempre as palavras certas para usar, sabia que o meu jeito o iria enfeitiçar. E me acomodei com aquilo.

Ele realmente deve ter sofrimento. Por todas as vezes que deixei de atendê-lo por estar entre amigos no barzinho perto da faculdade. Estava farta dele pegando no meu pé. Em outras vezes me escondi no quarto fingindo não estar em casa só para não ter que me explicar porque estive tanto tempo sem dar notícias.

Tão cara de pau que quando batia aquela saudade, eu ia atrás dele só para ganhar mimos, como se nada houvesse acontecido, sem ter que dar explicações.

Tudo que eu queria era alguém que me amasse acima de tudo e ele me amou. Mas apesar de acreditar seriamente que ainda o amo, será que eu o amei de verdade aquele tempo? Fui leal e sincera com o nosso amor?

Fiz tantas promessas falsas. Prometi um amor eterno, prometi dias melhores, prometi a minha companhia. Eu prometi e nada cumpri. Eu sempre acabo com tudo. Apesar do amadurecimento que conquistei nos últimos anos sinto que ainda há muito que aprender e mudar em mim.

Será que não está na hora de mostrar o melhor que eu posso ser?

Chega de pensar e deixar de agir. Está na hora de levantar a cabeça e fazer meus planos darem certo. Hora de agir. Concretizar meus sonhos, realizar meus desejos e vontades.

Independentemente do final dessa história, vou poder dizer que tentei, fiz o melhor que pude. Vou me explicar e mostrar o quanto cresci, dizer o quanto posso ser diferente. Sem esconder o que senti ou pelo que passei com a sua ausência. Apesar de tudo, o amei muito e só quero uma nova chance. Vou fazer por ele o que sempre fez por mim. Pois sei que Daniel é quem eu quero. Para sempre. Para toda vida.

Aguarde.




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Notas finais do capítulo

E ai, o que acharam do outro lado da história, contado pela nossa Malu?
O que ela fez com Daniel é perdoável? Ou não? Tem justificativas? Ou não? Ela merece uma segunda chance? Ele deve perdoa-la mesmo depois de tudo que fez e do tempo que se passou? Comentem!



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