A primeira visão que teve pela manhã foi do teto perolado, do qual pendia uma simples luminária bege. Moveu o pescoço para cima e tentou ajustar a visão à claridade vinda da fresta entreaberta da cortina carmesim, apenas para descobrir um estranho peso sob ele.

Um peso que não estava ali quando fora se deitar na noite anterior.

Elfman pressionou as pálpebras juntas e abriu-as lentamente, percebendo os borrões que se dissipavam conforme dobrava o pescoço na direção do fardo misterioso, mas foi parado ao ouvir murmúrios pouco audíveis serem ditos conta sua pele.

Com a mente um pouco mais clara, foi capaz de se dar conta.  Havia alguém por cima dele, e com certeza esse alguém não poderia ser chamado de homem.

Guiado pela curiosidade, instintivamente cutucou a fonte da pressão conta seu peitoral, e se surpreendeu ao encontro de seus dedos contra finas madeixas, agora emaranhadas em sua mão. Novamente ergueu o pescoço para tentar enxergar o intruso, mas bocejos serenos novamente o interromperam no meio do ato.

O peso sob ele se mexeu, rastejando um pouco mais acima e esmagando contra eles um par de coisas macias, que ainda tentava descobrir a origem, quase chegando a seus ombros;  e o que identificou como pernas curvaram-se e abraçaram o ar, logo em seguida pressionado-se  voluntariamente contra as laterais de suas próprias pernas.

Com a consciência ainda nebulosa, ainda que não tanto quanto antes,  demorou a perceber, mas finalmente chegou à conclusão.

O misterioso intruso certamente não era um objeto, travesseiros, ou mesmo pesos que usava para se exercitar. Era alguém... não um homem; uma mulher. Não qualquer mulher, era Evergreen — aquela que quando acordasse teria certeza de castigá-lo por tal audácia, ainda que  cometida involuntariamente, já que ele nem mesmo sabia como havia parado em tal posição.

Rezando silenciosamente, retirou a mão de seu cabelo e deslizou os pés para fora da cama sorrateiramente, com todo o cuidado de não despertá-la.  Quando seus dedos tocaram o chão, começou a mover o torso para a borda do colchão, lentamente fazendo seu caminho para fora de seu alcance — e se sentiu aliviado quando percebeu que ela ainda dormia, num sono tão pesado quanto uma pedra,  ou melhor dizendo, aqueles que ela petrificava.

Mirando o relógio depositado no modesto criado mudo, percebeu já ser hora de se levantar. Seu olhar oscilou entre suas malas, onde estavam as cartas, e Evergreen. Por fim se levantou e agarrou uma pilha aleatória de roupas, levando os envelopes consigo.

O mago migrou para o banheiro  e vestiu-se apressadamente, dobrando seus pijamas e guardando-os na mala ao terminar. Deu uma última olhada na fada e girou a maçaneta, abandonando o recinto e sendo recebido pela palidez das paredes do corredor vazio.

A mesma atendente do dia anterior fez caminho por entre a multidão e tentou alcançá-lo, mas não antes dele atravessar a porta poupando-a de um mínimo olhar. Elfman retirou uma carta em especial do bolso, não havia mencionado seu conteúdo a Evergreen, já que o perigo era quase certeiro.

Entre frases vazias e palavras-chave escritas por seu misterioso autor, havia uma endereço. As palavras escarlate sobressaiam sob o papel amarelado e as outras letras, todas escritas em preto.

Enfiou o papel de volta no bolso e fez seu caminho para a locação determinada, alheio ao fato de ser observado por um par de olhos negros.

Um par de olhos que os seguiram até sua silhueta sumir no horizonte, para depois erguer um pequeno comunicador e sussurrar palavras de respeitos, que se seguiram de afirmações.

Quase tudo estava de acordo com o planejado.

Apenas havia algo fora do lugar,e esse algo, ou no caso alguém, deveria ser corrigido o mais rápido possível.