O Diário De Sophie escrita por HelenMárcia


Capítulo 12
Capítulo 12 - Verdades


Notas iniciais do capítulo

Estamos quase no fim... vejam o que Sophie descobre nesse capítulo.



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Depois de um longo fim de semana, era chegada a segunda-feira, e eu tinha prova na faculdade. Não havia estudado muito, mas procurei ler os tópicos principais de cada matéria. Eu havia levantado essa manhã com dores de cabeça e não acreditava que se estivesse estudado teria adiantado alguma coisa, não no meu estado atual.

De pronto fiquei surpresa por não ver Nícolas na sala. Ele nunca perdia uma aula sequer e não seria no dia da prova que perderia. Bom, pensando bem, talvez ele estivesse na mesma situação que eu, só que ao invés de vir para faculdade, decidiu ficar em casa. Mesmo assim era algo a que se pensar.

Um simples acontecimento tornou-se preocupante quando Nícolas não apareceu durante toda a semana. Se eu ao menos soubesse onde ele morava. Ele não podia perder tantas provas assim. Eu nem sabia se podia fazer segunda chamada, então, eu tinha que falar com ele de alguma maneira.

Juliana e Flávia me encararam curiosas, quando as perguntei se sabiam onde Nícolas morava. Claro, a mente delas estava cirandando por outros caminhos (Nícolas e Sophie?), mas eu não tinha tempo para ficar dando explicações. Infelizmente, elas também não sabiam onde ele morava. Pensei em perguntar na secretária da universidade, mas eles com certeza não iriam me informar isso, fazia parte do regulamento da escola, não informar dados dos alunos a terceiros. Só me restava uma pessoa, que eu não estava muito a fim de falar, mas que com certeza saberia me dizer onde ele morava.

Assim que cheguei em casa, depois de tomar um banho, liguei para o Jeff, mas seu celular só dava ocupado. Onde será que ele estava? Eu teria que ir na casa dele. É, era isso que eu faria. Mas antes que eu pudesse abrir a porta para sair, a porta se abriu e entrou minha mãe esbaforida e sentou-se no sofá com uma expressão muito triste.

Mamãe, aconteceu alguma coisa? A senhora está bem? Perguntei preocupada com seu estado.

Oh filha! Oh filhinha querida, eu te amo tanto. Murmurou ela com lágrimas nos olhos. − Oh Deus! Eu não poderia suportar...

Mamãe me diga o que está acontecendo. Sentei-me ao seu lado e a abracei. − O que foi mãe? O que a senhora não suportaria? Perguntei, mesmo já sabendo da resposta.

Não... não suportaria ver você morrer querida, não. Ela suspirou me abraçando fortemente. − Mas algo terrível aconteceu. Oh! Como sinto pela Joana, ela não merecia isso. Não, não merecia. Continuou chorando ainda mais.

Ela está doente? É isso, ela ficou doente?

Não, é o filho dela, o que eu sempre achava que estava batendo perna por aí. Ele está muito doente Sophie. Ele está doente como você. Disse ela, agora me olhando nos olhos.

Como eu? Ele também tem leucemia? Ele morreu mamãe? Perguntei já sentindo um dor no peito. Se ele morreu, eu também poderia morrer.

Jesus não! Não, isso iria matar a mãe dele. Ele está internado no hospital. Parece que ele largou o tratamento há muito tempo e agora a situação dele piorou. Ele não consegue andar de tão fraco que está. Ela fez uma pausa e continuou. − Eu estava lá quando ele caiu. Num momento ele estava andando para cozinha e no outro estava no chão inconsciente. A Joana gritou muito. Foi horrível Sophie, e eu não quero que isso aconteça com você.

Ah mamãe, eu vou ficar bem, eu estou fazendo quimioterapia, lembra?

É verdade filha. Agora posso te pedir um favor. Eu gostaria que você fosse visitar o rapaz. Acho que você vai servir de motivação para ele continuar o tratamento.

Por um momento eu pensei, seria muito bom servir de motivação para alguém, mas eu também estava ansiosa para falar com o Nícolas. Bom, mas eu não podia negar isso a minha mãe, ela estava muito sensível com a situação do garoto e eu não queria preocupá-la mais.

Tá bom, eu vou agora mesmo. Em que hospital ele está?

Foi internado no hospital Santa Teresa. Minha filha, tente dar esse apoio a ele. Ele é jovem assim como você e com certeza está precisando de um referencial. Converse com ele, tá?

Pode deixar mãe. Eu vou fazer o possível. Disse dando-lhe um beijo no rosto.

Assim que sai começou um temporal. E logicamente, assim como a chuva, vinha o frio também. Abri minha mochila e peguei meu casaco. Esse hospital ficava no outro lado da cidade. Mesmo morando ali há nove meses, eu ainda não conhecia toda a cidade e poderia muito bem me perder. Depois de pegar o ônibus soltei em frente a uma universidade chamada Estácio. Andei dois quarteirões e finalmente cheguei ao hospital. Minha viagem levou em torno de uma hora e vinte minutos.

Na recepção do hospital me informaram que o garoto com leucemia estava na enfermaria. Eu devia ter perguntado a minha mãe qual era o nome do rapaz, porque, vai que houvesse mais de um garoto com leucemia.

Na porta da enfermaria havia uma enfermeira que me fez algumas perguntas:

Você é parente do paciente?

Sou uma amiga. Respondi séria. O que eu poderia dizer?

Ela logo me deixou passar e me acompanhou até a cama do paciente. Passaram-se quatro camas. A primeira com um senhor de meia idade banguela, a segunda com um menino de aproximadamente sete anos, a terceira com uma mulher ruiva e gorda e a quarta com um jovem moreno que parecia ter a minha idade. Finalmente chegamos a cama de número cinco que estava escondida por trás de uma cortina verde.

A enfermeira arrastou a cortina e eu estaquei. Nunca senti dor tão forte como a que senti naquele instante. Eu não podia acreditar no que estava vendo e senti minhas pernas bambas. Na minha frente, deitado naquela cama, estava ninguém mais ninguém menos que Nícolas, o amor da minha vida. Sim, o amor da minha vida, por naquele instante também percebi que o amava.

Lágrimas quentes rolaram no meu rosto. Eu não conseguia me mover e nem piscar. Estava com o coração na mão, quase que literalmente, porque começava a soluçar sem parar. A enfermeira vendo meu estado me deixou à sós com Nícolas. Ele estava dormindo. Sua tez estava pálida e ele tinha profundas olheiras. Eu não conseguia desviar o olhar. Era como se fosse outra pessoa e não o Nícolas que eu conhecia. Meu Deus, por que isso estava acontecendo? Por quê?

Ele não podia estar doente. Ele era tão bonito. Tinha olhos castanhos lindos e o rosto simétrico e totalmente proporcional. Ele era perfeito. Perfeito para mim. Mas ele não podia morrer. Andei até o lado direito da cama e acariciei a sua bochecha.

Oh Nícolas, você tem que melhorar. Disse tocando-lhe nos cabelos encaracolados. − Eu não vou te deixar morrer assim. Você tem que lutar.

Eu não parava de chorar. E eu pensava que só eu tinha segredos. Pumft! Ele me escondeu um segredo e tanto. Eu nunca imaginaria que ele tinha leucemia. Ele parecia completamente normal. Fui recapitulando nossos momentos desde que o conheci, enquanto passava a mão carinhosamente sobre sua testa.

Sophie? Sophie? Ouvi uma rouca voz dizer. Percebi que era Nícolas. Graças a Deus ele havia acordado!

Nícolas, eu estou aqui. Eu disse buscando a sua mão. − Não se preocupe, eu estarei sempre aqui.

Você... você...o que pensa... que está fazendo? Murmurou ele ainda rouco.

Eu vim te ver. Eu não sabia que você estava doente, mas agora vou ficar do seu lado. Respondi tocando sua mão, mas ele a afastou bruscamente

Saia daqui agora. Eu não quero ver você aqui. Saia! Gritou ele com brusquidão.

Nícolas eu...

Eu disse agora.

Mas Nícolas eu preciso te contar...

Eu não quero saber. Eu não quero você aqui. Saia daqui senão eu chamo as enfermeiras. Saia!

Eu não podia acreditar, o que havia acontecido com aquele garoto sereno que dormia há alguns instantes? Ele me encarava com raiva, parecia outra pessoa. Não queria discutir com ele nesse estado de fúria, então sai do quarto.

Assim que sai do quarto liguei para minha mãe. Eu tinha que conversar com a mãe do Nícolas. Tinha que saber da história toda. Não iria permitir que a raiva dele o impedisse de se tratar.

Mãe? Estou aqui no hospital. Sim, eu já falei com ele, ele está bem. Vou sim mãe, pode deixar, ele vai se tratar. Preciso conversar com a mãe dele. Não só quero saber de algumas coisas. Vou anotar, pode falar. Disse eu anotando o endereço da dona Joana e logo corri para lá.

Em uma rua bastante tranquila e bem afastada do centro movimentado da cidade, haviam nove casas. Era uma rua fechada, por isso não havia movimentos de carros por ali. As casas estavam pintadas cada uma de uma cor. Olhando o papel aonde estava anotado o endereço, segui adiante parando de frente com a casa de número sete e verde.

Do portãozinho da casa chamei pela dona Joana. A porta da frente se abriu e apareceu uma senhora miúda, de pele morena e dos cabelos grisalhos. Ela tinha uma expressão triste no rosto e os olhos vermelhos, talvez de tanto chorar. Ela me chamou e eu abri o portãozinho e entrei.

Dona Joana?

Sim.

Eu sou Sophie, filha da Ângela. Vim aqui para falar do seu filho.

Oh! Por favor entre. Sua mãe me falou muito de você. Por favor fique a vontade.

A sala era escura e fria, todavia, aparentava aconchego. Num canto afastado estava uma máquina de costura sobre uma mesa e ao lado em uma cadeira, havia uma pilha de roupas.

Dona Joana me convidou a sentar e logo começamos a conversar.

Bom, eu gostaria de saber mais sobre seu filho, dona Joana. Comecei.

Oh, pobre Nícolas! Meu único filho, é a pessoa que eu mais amo nesse mundo. Disse ela com voz chorosa.

Eu o conheci há alguns meses e nós também fazemos faculdade juntos. Eu não sabia que ele estava doente. Foi minha mãe que me contou, eu sinto muito dona Joana. Sei como deve ter sido difícil para senhora, mas eu gostaria de saber quando foi que descobriram a doença? Perguntei.

Foi há muito tempo. Nícolas estava com onze anos quando meu... meu marido nós deixou. Foi um grande choque para ele, sabe? Ele tinha o pai como um referencial e depois que o pai se foi, ele nunca mais foi o mesmo garoto. Dona Joana fez uma pausa. − Se tornou um garoto irritadiço. Estava sempre arrumando confusão no colégio. Ele se tornou violento, sabe? Ao mesmo tempo, aparentava um garoto depressivo. Levei-o ao psicólogo uma vez, mas não deu em nada. Ele estava muito magoado. Dona Joana fez outra pausa. − Teve um dia em que voltávamos da feira e meu filho começou a entrar em convulsões e a sangrar pelo nariz. Eu fiquei desesperada, pensei que meu filho fosse morrer naquele instante. Nessa época ele já estava com treze anos. Alguns amigos nossos que passavam nos acudiram e nos levaram às pressas para o hospital. Disse ela agora com lágrimas nos olhos. − Ele ficou internado por uma semana. Os médicos fizeram vários exames com ele e depois vieram me dar a trágica notícia que meu filho estava com leucemia. Ele passou horas no soro, e eu não aguentava vê-lo ali, ligado naquelas agulhas presas no seu braço. Eles colocavam o remédio por ali, acho que disseram que era quimioterapia.

É isso mesmo dona Joana. Eu a interrompi.

Parece que houve uma pequena melhora e os médicos nos deixaram voltar para casa. Foi uma época muito difícil. Nícolas não podia fazer qualquer esforço, então tive que tirá-lo da escola. Ele não gostou, mas eu estava fazendo isso para o seu próprio bem. Ele começou a se afastar de todos, até mesmo de mim. Passava muito tempo trancado no quarto lendo. De dia ele aparentava estar muito bem, mas de noite ele gritava e chorava de dor. Eu não suportava isso e sempre vinha ficar do seu lado até que ele dormia em paz.

Essas dores ocorriam todas as noites? Perguntei.

Não, nem sempre isso acontecia, mas houve um dia em que eu o encontrei ali, ali no chão da varanda, respirando com dificuldade e sangrando pelo nariz. Quando isso acontecia, eu corria com ele para o hospital. Depois de alguns meses ele foi melhorando, melhorando até o ponto de não mais sangrar ou desmaiar, porque ele também desmaiava.

Então quer dizer que ele ficou curado? Perguntei.

Não Sophie, ele só estava um pouco melhor, mas não estava curado. Ele já estava com quinze anos quando largou o tratamento para voltar a estudar. Eu não consegui impedi-lo. Ele havia ficado careca, sabe? Aqueles medicamentos que os médicos aplicam são muito fortes. Ele ficou carequinha, mas continuava lindo. E assim que os cabelos dele cresceram novamente, ele foi para escola fazer supletivo.

Acho que apesar dele ter abandonado o tratamento, foi bom ele ter voltado a estudar, senão, hoje ele ainda não estaria na faculdade. Eu disse.

É, talvez você tenha razão. Mas as coisas não melhoraram porque ele foi escola não. Ele continuava irritadiço e brigava muito. Houve ocasiões em que ele chegou bêbado em casa, eu nunca tinha visto meu filho daquele jeito. E foram passando os anos e ele estava ficando pior. Além de beber, havia começado a fumar. Meu filho estava se destruindo completamente. Disse ela querendo chorar.

A senhora acha que talvez ele soubesse que ainda não estava curado e por isso fazia todas essas coisas?

Eu não sei. Se ele soubesse disso, ele não tentaria se matar. Sophie, veja que mãe horrível eu sou. Meu filho já tentou se matar duas vezes.

Duas? Por quê? Perguntei abismada com aquela nova informação.

Sim. Eu não sei porque ele faz isso, mas parece que ele não quer viver. Eu não sei o que fazer. Disse ela agora chorando abertamente.

Sem saber o que fazer, levantei-me e fui sentar ao seu lado e a abracei.

Dona Joana, não fique assim, ele vai ficar bem. Tentei consolá-la.

Ele está com depressão Sophie. Ele melhorou um pouco nesses últimos cinco meses, mas há muito tempo ele não me ouve. Tentei várias vezes falar com ele sobre o tratamento, mas ele...

A senhora tem que ter um pouco de fé. Ele vai ouvir a senhora. Basta fazê-lo ouvir. Ele precisa da senhora dona Joana. Ele quer ter o seu apoio e seu amor.

Amo ele demais, demais. Disse ela secando as lágrimas. − Mas será muito difícil, ele não deixa eu me aproximar. Não quero que meu filho morra.

É por isso que eu estou aqui. Depois de tudo o que a senhora me disse, eu tenho certeza que ele pode ficar curado. Ele só precisa da motivação certa.

E qual seria? Dona Joana perguntou.

Eu. Respondi sorridente.

Como assim Sophie? Acho que não compreendo. Disse ela me olhando seriamente.

Dona Joana, minha mãe não lhe disse nada sobre mim? Ela franziu a testa. − Minha mãe não lhe contou que eu estou tão doente quanto seu filho?

O quê, impossível. Você também tem... disse ela olhando ceticamente.

Leucemia? Sim eu tenho, além de um tumor no cérebro. Disse sorrindo. Acho que estava adquirindo um humor negro. Céus!

Jesus Cristo! Exclamou dona Joana. − Sophie, eu não posso acreditar. Você está tão...

Bem? A interrompi de novo. − As aparências enganam.

Sua mãe! Nossa! Ela está na mesma situação que eu, e mesmo assim estava aqui me ajudando.

Minha mãe é assim, mas ela também se preocupa muito comigo. E eu quero ajudar seu filho. Eu... eu... tenho uma enorme estima por ele.

Acha que pode convencê-lo a se tratar?

Não sem a sua ajuda.


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