A Ilha De Circe: Fênix escrita por Daughter of Apollo


Capítulo 29
A feiticeira vitoriosa




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Dreah

Alguma coisa bateu no meu rosto levemente. Reclamei um pouco e virei a face. Mas aconteceu novamente e fui obrigada a abrir os olhos. Encontrei o olhar felino da gata de Jenny, Bastet, a pata pronta para me acertar de novo. Soltei um som exasperado. As pontas dos meus dedos formigavam. E também havia a lembrança do sonho. Enquanto dormia, sonhei com dor. Eu sei, é estranho, porém a sensação se dissipou quando abri os olhos. Durante o sono, no entanto, parecia que alguém estava arrancando minha pele. E havia as outras visões, ainda.

– Ela acordou! – Ouvi alguém exultar. Uma voz doce. Layla. Resmunguei alguma coisa a ela.

– Penélope, será que você poderia, por gentileza, retirar o seu felino inconveniente de cima de mim?

Ouvi a loira andar na minha direção e no instante seguinte a gata não estava mais ali.

– Ai, que ótimo. Nós pensamos que você ia morrer. Aliás, esse seu coma veio em ótima hora, não é? Se livrou de ajudar a levantar as tendas e de encarar o Rui.

Esperei minha visão focalizar e visualizei os rostos aliviados de minhas duas amigas. Queria perguntar quanto tempo dormi e o que aconteceu nesse ínterim, mas a única coisa que soprou por entre meus lábios, foi:

–... O quê?

Layla sorriu e Jenny revirou os olhos.

– Você está bem, é isso que importa. – Disse a sereia.

Sentei-me devagar. Parecia que eu havia corrido uma maratona da Macedônia até o Peloponeso sem parar. Meus músculos doíam. E eu sentia fome – muita, muita fome.

– Primeiro: Quanto tempo dormi? Segundo: O que aconteceu enquanto eu dormia?

– Você ficou um dia e meio adormecida. Foi Apolo que a pegou enquanto você apagava, senão teria caído na água. Ele disse que você usou energia demais para seu corpo mortal. Que seu corpo mortal não é forte o suficiente para a arma que usou. Você devia ter morrido.

– Como assim, devia ter morrido?

Jenny sacudiu a cabeça, incrédula.

– Ele disse que era para você estar morta agora. Mas não está. Quando ele sentiu seu pulso e viu que estava forte, chamou-a de alguma coisa...

– Chamou-a de feiticeira.

– Não, Layla, não foi bem assim. Ele não a chamou como se fosse “uma feiticeira”, mas “A” feiticeira.

– Acho que vocês enlouqueceram. – Falei, fazendo graça. É claro que eu era uma feiticeira.

– E ele disse para você esconder o seu colar. Nós o enrolamos e o colocamos junto de nossas coisas. Estão naquela arca.

Assenti.

– Alguma notícia de Kormak?

– Eles começaram a marchar para o sul e mandaram os navios seguirem pela costa, longe de Píton. Apolo ficou para trás para continuar a luta. Ele nos curou. Minha perna está ótima. E ainda ganhei a bênção de Píton.

– Isso vale de alguma coisa? – Questionei.

– Não sei, mas não vejo ninguém aqui com a bênção da Píton. Eu sim.

Bufei e reclamei um pouco ao erguer meu corpo.

– Ainda somos prisioneiras?

– Aparentemente, não. Kormak nos deu salvo-conduto para andar pelo acampamento e uma tenda particular com acesso aos servos dele, e isso é realmente muito bom. – Disse Penélope – Quer dizer, é muito, muito, muito bom. Sinto-me uma princesa. Os outros soldados dormem longe, ao relento, nós temos uma tenda perto do líder, com servos e tudo.

– Penélope – repliquei – Ele não nos deu uma tenda particular porque somos especiais, e sim porque somos mulheres e não podemos nos misturar aos soldados. E temos que ficar “protegidas”. Quanto mais perto do líder, mais proteção. Estamos aqui porque somos inferiores.

O queixo dela caiu.

– O quê? Sério? Que audácia.

Layla interveio.

– Ainda não há notícias quanto a marchar sobre o monte Olimpo. Vamos continuar a viagem pela manhã.

Concordei.

– Maldição, sinto-me como se tivesse corrido por toda a Grécia e então nadado até a Ilha sem parar para respirar. Tudo dói.

– Você usou muita energia. Quer dizer, fritou a Píton duas vezes seguidas. – Disse Layla, tentando dar-me apoio.

– E a cobra nem cansou – Replicou a loira Jenny, estragando um pouco meu sucesso. Lancei a ela um olhar ranzinza.

– Há alguma chance de eu voltar a dormir e vocês disserem a Kormak que eu ainda não acordei?

– Não.

– Definitivamente, não.

– Obrigada, amigas.

Suspirei, gemendo ao alongar meu corpo. Foi uma péssima ideia. Senti ânsia de vômito e por pouco não vomitei em cima de Jenny. Eu sentia que aquele nem era mesmo o meu corpo. Tudo parecia pequeno e fraco.

– Preciso falar com Kormak. – Declarei.

– Não vai adiantar – Respondeu Layla – Ele não deu ouvidos quando tentei argumentar, e não está aberto a audiências.

Sacudi a cabeça.

– Tive algumas revelações durante em meus sonhos. E não podemos desistir. Jenny, pode falar com Rui?

– O quê? – Ela elevou a voz, parecendo muito irritada ou com muito nojo – Eu não. Eu o beijei, lembra? Seria constrangedor falar com ele agora. Aliás, por que precisamos dele? É um idiota.

– Ele tem influência e contato direto com Kormak. Pode nos conseguir uma audiência.

– Olha, eu não tenho certeza...

– Por favor, Jenny. Por favor.

– Certo, pare de fazer essa expressão infantil. Não me comove. Farei porque realmente é muito importante. E sei que essa responsabilidade precisa ficar em mãos responsáveis. Voltarei em breve.

Suspirei. Bastet, a gata cinza de Jenny, seguiu-a para fora da barraca. Tentei ficar otimista. Ao menos a mordida da esfinge e os cortes nos meus braços, antes ferimentos quase recentes, agora eram meras cicatrizes.

– Layla – Chamei, por fim – Quando nos encontramos, você disse que a Ilha estava incomunicável e sob ameaça de ataque, correto?

– Sim. Por quê?

– Pretendo tentar falar com Circe. Não sei se vai funcionar, mas preciso tentar.

– Dreah, você acordou cheia de péssimas ideias hoje. Não vai funcionar, além disso, o Oceano também está em guerra. Mesmo que conseguisse falar com Circe, a que distância estaríamos dela para que enviasse uma ajuda em navios que conseguisse chegar aqui?

– Não precisamos de navios. Em cada ilha do Arquipélago há portais grandes e poderosos o suficiente para transportar exércitos até aqui. Eles são utilizados em casos de emergência porque demandam muita energia.

Ela anuiu. O assunto morreu. Lá fora, a luz indicava que era fim de tarde. Fiquei pensando nos sonhos.

Um tempo depois, Jenny voltou. Estava ofegante e, a primeira coisa que notei foi que as juntas de sua mão direita estavam machucadas – e também que havia um pouco de sangue nelas.

– O que houve? – Coloquei-me de prontidão, já indo olhar sua mão. Ela tinha um sorriso convencido no rosto.

– Consegui uma audiência, mas isso foi antes de Rui passar um pouco do limite. Tive que devolvê-lo ao lugar dele.

– Você o matou?! – Surpreendeu-se Layla – uma surpresa que, devo dizer, foi mais para o lado positivo.

– Não, não. Foi só um soco. Saiu um pouco de sangue, nada de mais. Não seria inteligente matá-lo agora, Kormak não iria gostar. – Jenny sorria.

Layla sacudiu a cabeça, sorrindo.

– Quem sabe depois que tudo isso acabar.

– Ei, ei – intervim – Vocês estão falando de uma vida.

Elas abriram mais os sorrisos. Layla passou o braço ao redor dos meus ombros, com jeito superior e experiente.

– Dreah, querida, nessa vida, você precisa aprender que os homens... Não têm muito valor. Mulheres como nós somos superiores. Devemos afirmar nosso comando.

– Tirou as palavras da minha boca, Layla. – Disse Jenny.

Revirei os olhos e as deixei. Layla era uma sereia, afinal, ela gostava dessas coisas. Jenny devia ter um quê de sereia nela, ou talvez isso fosse apenas um aspecto feminino. Ou ela estivesse brincando. Ou não... Bem, estava confusa.

– Quando poderemos falar com Kormak?

– Depois da refeição da noite. – Respondeu Jenny. – Aliás, consegui isso emprestado de uma das criadas do Kormak. Acho que vai gostar, Dre.

Ela jogou um objeto de madeira para mim. Peguei por instinto e percebi, agradecida, que se tratava de um pente. Bendito pente.

– Vou te amar para sempre, Jenny. Estava cansada de trança. Seria ainda melhor se tivéssemos um espelho...

– Eu penteio seu cabelo – Ofereceu Layla. Aceitei.

Depois de um tempo, verifiquei minha aparência. Meu cabelo solto corria até o meio das minhas costas, castanho e brilhante. Minha pele estava mais bronzeada e com algumas manchas, mas nada tão mal. A túnica branca chegava aos meus joelhos. Eu já estivera melhor em outras épocas.

Empregados trouxeram a refeição até nossa tenda. Era a típica ração de acampamento, só um pouco melhor, já que éramos próximas do líder. Alguns legumes, pão, carne de caça e um pouco de vinho. Enquanto comíamos, contei a elas sobre os sonhos e minhas intensões.

Mais tarde, um emissário nos chamou e nos levou à presença de Kormak, na tenda de liderança. Ele estava com o segundo no comando, Asini – e Rui também estava ali. Os três se reuniram atrás de uma mesa repleta de material para fazer cartas. Lâmpadas queimavam na mesa, o local estava escuro.

– Aí estão elas. – Anunciou Rui, parecendo sombrio.

– Senhor. – Saudamos Kormak. – Obrigada por aceitar ter uma audiência.

– Vão direto ao ponto, feiticeiras. Já fiz o bastante dando a vocês uma posição de honra. Vocês podem ter salvado o exército, mas não podem vir aqui para tentar mudar meu lado.

– Mas Kormak – Comecei – Os exércitos estão por toda a parte, não só a Grécia está em guerra. O Egito, Macedônia, as terras latinas a Oeste, as Ilhas... Não só soldados estão morrendo, como a população inocente.

– Sim, isso é guerra. E boa parte desses homens aqui são mercenários sem nacionalidade. Vivemos da guerra, não sei se percebeu. A matança não é tão antinatural assim.

– Mas não vai ser só uma matança. Massacres estão ocorrendo, e os dados que tenho são de meses atrás. O que pode estar acontecendo agora? Vocês acham que vai ser só a derrubada dos deuses, acham que podem colocar alguém no poder depois que tudo estiver destruído?

Ele estava um pouco vermelho. Olhou para os objetos na mesa: Mapas desenhados em papiro resistente, tinta e uma faca. Rui e Asini deram um pouco de espaço, no entanto, Rui falou:

– Kormak, quem sabe elas tenham razão em algum ponto. Quem sabe isso pode estar além do nosso alcance.

– Ficou louco, Rui? Quer desistir agora? Viu quantos homens temos? – Exclamou Asini, de quem eu nunca tinha ouvido a voz.

– Calados, os dois. As ordens que recebemos são de que tínhamos que marchar para as cidades ao redor do Olimpo e que nossa esquadra estivesse nas costas do Egeo. Mas agora estamos do outro lado da Grécia nos desviando cada vez mais da rota!

Um estalo ecoou em minha mente. Ergui a mão.

– Espere, espere. “As ordens que recebemos”...? Então você não é o líder de verdade?

– Sou o segundo no comando, nosso General, Leecher, desapareceu. Até que ele volte, sou o responsável por garantir que tudo saia direito.

– Foi em Atenas, não foi? Enquanto lutávamos.

– Sim. Depois que vocês fizeram seus truques lá, nós viemos parar aqui.

Sacudi a cabeça.

– Não fomos nós – Murmurei, pensando. Pensando em Hécate e Set, na pirâmide, o portal em Atenas, a serpente, Layla e Jenny – Não fomos nós. – Repeti, mais alto, quando Kormak estava prestes a perguntar o que falei.

– Como assim, não foram vocês? É claro que foram. Vocês fazem feitiços.

– Não. – Neguei – Nenhum mortal seria forte o suficiente para fazer um feitiço de portal dessa magnitude. Nem mesmo um deus. Ao menos não sem perder boa parte da magia.

– Ah, então os deuses simplesmente nos mandaram para o outro lado do continente em vez de nos matarem e acabarem com o problema?

– Eles não queriam matá-los. É claro, como fui burra! A fonte do poder, o inimigo verdadeiro, não eram vocês! HAHAHAHAHAHAHAHA.

Todos ficaram quietos de repente. Os olhos de Kormak emitiam um brilho estranho. Ele entendeu. No entanto, Rui me fitava de um jeito tão ridículo que ele deveria estar pensando em um milhão de troças. Devo ser realmente louca.

– Não entenderam?

– Eu entendi. – Disse Kormak.

– Nós fomos para Atenas para procurar o amuleto, o objeto que nos faria ter poder suficiente para derrotar o inimigo. Um inimigo que Circe sentiu ser mais poderoso que um deus, mas não sabia quem ou o que era. Então, em Atenas, fomos interceptados por homens desse inimigo, mas então alguns deuses entraram na briga. Eles não mataram nosso inimigo, e sim o enviaram para longe do objetivo inicial deles. E então nos mandaram para encontrá-los. Nós, as inimigas juradas deles, o pesadelo dos homens comuns, as feiticeiras. O que podemos tirar disso? – Não esperei resposta – Eles não eram os inimigos verdadeiros! Hécate nos mandou para recrutá-los contra alguém! Vocês não são a verdadeira ameaça.

– Faz sentido. – Layla apoiava o queixo na mão.

– Não sei de nada. – Jenny mal prestava atenção na conversa.

– Você está errada – Kormak cortou-me, no entanto – Se acha que isso mudará alguma coisa. Se não somos os únicos procurando a derrota dos deuses, o que me preocupa é que eles podem roubar uma glória que é nossa.

Ao ouvir isso, uma chama de irritação cresceu dentro de mim. Mas as palavras que saíram de meus lábios foram tão sussurradas que apenas eu ouvi.

– Vocês desejam dominação, não aniquilação.

– O quê? O que você disse?

– Nada. Escute, penso que você deveria ao menos saber de algumas coisas. Eu posso entrar em contato com minha de... Minha líder, Circe, através de um feitiço. Juro por minha honra que não é uma armadilha. Apenas escute o que ela dirá sobre a guerra. Sobre tudo isso.

– Por que eu deveria fazer isso? – Ele recuou, tenso. Rui e Asini apertaram os lábios. Layla mantinha as mãos em lugares estratégicos do corpo – cintura e costelas – procurando armas que não estariam lá. Era um movimento instintivo. Jenny parecia prestes a atacar, os olhos castanhos pintados de uma fúria crescente.

– Nós os salvamos, lembra-se? E salvamos um deus que nos deu uma bênção de cura. Isso é bastante honroso. Você nos deve.

Kormak retornou ao silêncio taciturno. Coçou a barba rala. Fechou os punhos. Olhou para o teto da tenda. O guerreiro deliberou por um bom tempo. Asini e Rui, a julgar pelas posturas, não aguentariam muito mais.

– Certo. – Ele disse, por fim – Vocês venceram esta batalha. Pela sua honra. Mas não farei algo assim novamente, nem permitirei que sua rainha meretriz e feiticeira me contamine com seus venenos. Vocês não vão me enganar.

Assenti rapidamente.

– Obrigada, Kormak.

– Quando o feitiço pode ser preparado?

– Agora mesmo. Só precisamos de água, brasas e um punhado de terra.

Ele assentiu.

– Rui, peça a um empregado que traga esses ingredientes aqui.

O homem se foi e retornou instantes depois. Ficamos parados, nos olhando, até que uma moça morena apareceu: Trazia um braseiro. Ela acendeu o fogo, depois trouxe-nos uma jarra de água limpa e um vaso cheio de solo arenoso da região. Kormak a dispensou.

– Certo. Penélope, me ajude com a mesa. Layla, organize os elementos. O resto vá para trás.

Só naquele momento prestei atenção no ambiente. Atrás da mesa e das cadeiras havia uma cortina que separava a parte em que o homem dormia da do resto. Havia outra mesa atrás de nós – uma servida com alimentos. Nós arrastamos tudo para os lados – como aquela era a tenda de comando, havia um espaço relativamente grande para esse tipo de coisa.

Lyla dispôs os objetos alinhados diante da cortina. Brasas à esquerda, areia a direita e água no meio. Ajoelhei-me diante deles e elas me imitaram.

– Vocês também. – Chamei-os, e eles se sentaram sobre os joelhos.

Comecei o encantamento.

– Da água a serenidade, do vento a leveza, da terra o sustento, do fogo a luz. O tempo aqui está. Como espírito, chamo minha irmã, Circe.

Uma brisa soprou meus cabelos para a frente e agitou as brasas. A água saiu do jarro e formou um arco completo diante de nossas faces, as gotas esféricas unidas.

Através do arco, a imagem da cortina cinzenta passou de nítida para esfumaçada. Logo, havia um espelho a nossa frente.

– Circe, apareça.

A superfície do espelho tremulou. De repente, eu via um brilho de cabelos de prata, cachos formosos e uma pele bronzeada. Os olhos e a postura poderosa de Circe nos saudava. Sua expressão estava diferente de como eu me lembrava. Estava mais como... Como uma sacerdotisa, uma rainha, do que a deusa bondosa que eu deixara para trás. Usava vestes cerimoniais, o vestido grego longo, preso em pregas de ouro. O cinto trançado de sua autoridade, também feito do material precioso. Os cabelos estavam presos em uma trança intercalada em ramos. A espada estava pendurada na corrente na lateral de seu corpo e braceletes em seus pulsos. A pele estava trilhada de tatuagens.

– Minha Senhora – Exclamei, mantendo o tom neutro, mas, de alguma forma, ela conseguiu captar o que eu queria dizer. Estava com saudades de casa. Saudades da Ilha. Por um instante, absorvi o ambiente que se mostrava atrás dela – o pátio do Espelho, um lugar cercado de colunas por onde o rio seguia. Eu podia até sentir o cheiro da grama fresca e ouvir o canto dos pássaros. Circe sentava-se com leveza na beira da fonte do espelho. Nós não a pegamos de surpresa. Ela nos esperava, de alguma forma.

– Dreah, minha Feiticeira. Você conseguiu, encontrou seu objetivo.

Do que você está falando? Como poderia saber do que aconteceu após Atenas?

– Minha Senhora, estou com o responsável pelo exército com quem lutávamos. Estes são Kormak, Asini e Rui. Minhas companheiras e eu propomos que eles ouvissem o que a senhora tem a dizer sobre a situação do continente neste momento.

Ela assentiu. Torci para que estivesse orgulhosa do meu comportamento, do que eu fizera. Para ser sincera, eu estava nervosa. Eles podiam decidir nos matar agora. As feiticeiras eram conhecidas por serem amaldiçoadas, inimigas dos deuses e dos homens. E lá estava eu, apresentando a rainha feiticeira para o senhor do exército inimigo.

– Então, penso que é adequado que eu me apresente adequadamente. Sou Circe, do Arquipélago. Feiticeira Anciã e Fundadora da Academia de Artes da Ilha de Circe.

– Sou Kormak, macedônio, responsável por esse exército. E apenas isso, madame.

Ela assentiu.

– Minhas filhas vieram até você com um propósito, Kormak. – Como assim? Layla e Jenny não são filhas da Ilha – E é um propósito louvável. Não entendo por que não ser nosso aliado nessa batalha.

– Não há por que ser! Somos inimigos declarados!

– Há mais do que isso em jogo.

– Então conte-me o que há em jogo.

– Vidas, Kormak. Vidas como as que carrega em suas costas. Mais do que seu exército.

O guerreiro fez som de desdém.

– Não posso ser comovido com esse argumento.

Os olhos coloridos de Circe cintilaram perigosamente.

– Então vamos colocar desse modo. Há uma fonte de poder vinda de uma dimensão além, um exército negro marchando para o Olimpo. Derrubaram Hades e Esparta. Isso não é uma simples dominação, uma troca de poder, é uma aniquilação, e o índice de morte é terrível. Se não agirmos, não só nos morreremos. Haverá morte para todos os lados, e mesmo o Hades não existirá mais. Haverá escuridão sobre a humanidade e Gaia será subjugada ao Caos. Mortos andarão sobre a terra. Nada para se dominar, para reinar sobre. Entende esse argumento?

A mandíbula de Kormak estava tensa. Ele encontrou uma resposta.

– Como posso saber se está falando a verdade?

– Juro por minha honra que tudo o que disse é verdade. E creio que foi ensinado sobre o que a honra de uma feiticeira significa.

– Sim – Ele grunhiu.

– Podemos fazer uma aliança, então?

– Não vejo por quê. Por que nós, e não qualquer outro reino? Qualquer outro exército? O seu próprio, por exemplo? Ou as meretrizes da Ilha não têm guerreiros descentes?

– Meus filhos lutam com honra. Meu povo está pronto para a batalha. Iremos nos juntar a vocês quando o momento for propício. No entanto, não somos suficientes para cobrir o que há de vir. E nenhum outro reino teria a bravura ou a sabedoria de seus homens. Eles já ouviram falar de magia.

– Eles são mercenários, madame, não leais. Não haverá glória de saques.

– São leais, sim. Isso eu posso ter certeza.

– Se o problema é ouro – Interrompi, com a postura de quem tinha o poder de fazer tal coisa – Glória ou saques, então sei como resolver.

– Como?

– Há um lugar que vi, no Egito. Uma dimensão escondida em uma pirâmide. Lá é tão farto de ouro, prata e pedras preciosas que enchia o lugar em montes. Podemos fazer um feitiço de transporte, de lá, para cá.

Kormak me olhou com suspeita. Tornou-se para Circe, então.

– É possível?

– Sim.

Ele parou para pensar. Coçou a barba rala. Olhou para o teto. Virou o rosto para cada um de nós.

– Ainda não vejo como é possível. Querem que marchemos para as cidades do Olimpo, sendo que estamos do outro lado do continente e nossa esquadra está presa na costa. De onde quer que venham, estarão mais perto que nós de chegar lá.

– De fato. Eles estão quase em Olimpo. Mas Dreah pode fazer o feitiço de portal que os transportará para lá.

O que... Como assim, Dreah pode fazer um feitiço de portal? Dreah não pode não. Nem com o amuleto novo poderia criar um portal tão grande.

Como se lesse meus pensamentos, a deusa continuou:

– Há um lugar, ao sul de onde estão, chamado Humior. Ele é propício a esse tipo de magia, e Dreah pode canalizar energia suficiente lá. Não é distante de sua atual localização.

– Certo.

– Então, podemos fazer uma aliança?

Kormak concordou, sem hesitar, dessa vez.

– Certamente. De agora em diante, O Exército de Vanags está aliado ao Arquipélago. Juro por minha vida.

Circe sorriu – um sorriso luminoso, cheio de autoridade.

– Juramento aceito. Agora vão, meus filhos. Ainda há muito o que fazer aqui.

Com a ordem da deusa, o Espelho desvaneceu. Eu podia ver a cortina cinzenta lá atrás. A água retornou para o jarro – não se derramou, não caiu, e sim retornou para o jarro.

– Então, agora somos aliados... – Começou Rui, mas Jenny interrompeu-o.

– Kormak, pedimos permissão para voltarmos a nossa tenda.

Ele assentiu. Nos viramos para ir embora. Deixei que Jenny e Layla saíssem primeiro. Quando ia segui-las, senti a mão gigante de Kormak segurar meu braço.

– Pode realmente fazer isso?

Um formigamento passou na área do meu estômago.

– Posso – Respondi, no entanto, e segui com minhas companheiras.

Mais tarde, quando não havia mais luz no quarto e o acampamento estava silencioso, chamei Circe em meus sonhos. Ela me respondeu.

Dreah, você sabe o que é, sabe sobre suas irmãs. O amuleto tem lhe mandado as visões. Você pode fazer isso. Suas irmãs ficarão bem. Não consigo ver Ariella, mas sei que ela é forte. Ela e Caeliora. Você tem as armas, Feiticeira...

Eu sabia do que ela falava – só não entendia o meu medo. Talvez, desde que pegara o amuleto na pirâmide, eu tenha feito uma besteira...

“Ele disse que você usou energia demais para seu corpo mortal. Que seu corpo mortal não é forte o suficiente para a arma que usou. Você devia ter morrido.”


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Notas finais do capítulo

Levanta a mão quem sabe o que uma aliança entre Vanags e feiticeiras significa para Ari e Lee?



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