O despertador tocou e a ruiva esticou o braço direito na direção do som, abafando-o até encontrar o botão e apertá-lo. Sentou-se, esfregando os olhos inchados. Mesmo que fosse raro, havia dormido a noite toda. Jogou os cobertores para o lado, inclinando-se para colocar as pantufas de coelhinho.

                Arrastou-se até o banheiro, onde despiu-se e tomou banho. Vestiu as roupas íntimas e enrolou-se em uma toalha, parando diante do armário. Pegou uma camiseta de mangas longas, uma básica negra, o moletom escolar e calças quentes. Calçou os all-stars pretos e desceu as escadas, percebendo que deveria comer logo, ou atrasaria para a aula.

                Pôs o pão na torradeira e encheu um copo com iogurte até a boca. Quando terminou, agarrou a mochila que estava sobre o sofá da sala e correu para o ponto de ônibus, que, como sempre, chegou dois minutos atrasado.

                Desceu em frente à escola e acenou para o motorista, que sorriu e continuou dirigindo. Antes de virar-se, sentiu alguém abraçá-la por trás.

                “Adivinha quem é.” Disse uma voz doce. A ruiva sorriu e soltou-se.

                “Alice!” virou-se “Não me assuste assim!” exigiu.

                “Desculpa.” Riu-se, tímida “Mas então, como foi a noite?” as duas começaram a mover-se em direção ao prédio.

                “Normal.” Resolveu ocultar a agressão. Ainda não poderia estender seus segredos a outra.

                “A minha também.” O restante do caminho fora silencioso. Pararam em frente a porta da Aberração.

                “Bem, esse é o meu ponto.” Disse, com um sorriso torto “Acho que te vejo no intervalo, não?” A morena assentiu.

                “Eu venho aqui te buscar.” Mostrou-lhe a língua com um sorriso entre os lábios, então moveu-se rapidamente em direção a sua classe.

                O Monstro entrou na sala com um sorriso abobado, o que fez os Perfeitos estranharem-na. Sentou-se em sua classe habitual, a última da fileira da janela. Largou a bolsa sobre a carteira e abraçou os joelhos, olhando para o teto com um sorriso estampado no rosto. Uma garota andou até a Aberração e tocou sua perna esquerda.

                “Você é a Isabelle, né?” o Monstro concordou “Eu só queria dizer...” Ela percebeu que a loira tentava conter o riso “Que sua namorada é linda” gargalhou, deixando a Aberração sozinha novamente. Ela movimentou-se e tirou o celular da mochila. Abriu a rede social que usava e deparou-se com uma foto. O Monstro beijava uma garota de cabelos tingidos de verde. Isabelle apertou os lábios, com raiva. Guardou o celular na mochila e, em um movimento só, bateu o punho cerrado contra a carteira e levantou-se. Todos os olhares se voltaram para ela. Os que antes riam, agora tinham expressões apavoradas.

                “Vão para o inferno!” gritou, correndo para o banheiro. Ninguém sabia o que se passava dentro da cabeça do Monstro, e nem saberiam. Ela desejava matá-los, mas desejava que vivessem por milhares de anos, sendo torturados.

                Encarou seu reflexo no espelho e ligou a torneira, jogando água no próprio rosto. Aquela imagem era uma farsa. “Eu nem sei quem é aquela garota.” Pensou, sentindo os olhos inundarem-se com lágrimas. Evitou-as, mas lentamente, uma pequena teimosa escapou, brilhando por sua face. Em seguida, as outras começaram a escapar e seus soluços podiam ser ouvidos do lado de fora do sanitário.

                Poucos minutos depois, o sinal tocou e ela limpou o rosto, cessando as lágrimas. Deixou o banheiro com consciência de que as pessoas que não cometem erros a culpariam. Andou pelos corredores, sentindo os olhares pesados sobre sí. Sentou-se em sua carteira, pedindo por silêncio.

                Seus olhos mantiveram-se nos ponteiros do relógio, implorando para que o tempo passasse mais depressa. Quando a sineta finalmente alertou o intervalo, os Perfeitos saíram, deixando-a sozinha com os monstros de sua mente. Não levou muito tempo para Alice entrar na sala e sentar-se na carteira a frente da Aberração.

                “Você já sabe?” questionou.

                “É... Sei.” Resmungou em resposta “Vamos passar o intervalo aqui?” a ruiva negou.

                “Conheço um lugar. Quase ninguém sabe que existe. Quer ir comigo?” assentiu.

                O Monstro puxou a outra pela mão, levando-a até o pátio, em direção a parte de trás do ginásio de esportes, onde havia uma estufa esquecida. Ela sentou-se em um pequeno banco perto de uma roseira e a outra – maravilhada – abaixou-se e deitou no chão.

                Antes de qualquer coisa, o telefone da morena bipou e ela encarou a mensagem.

                “Eu vou ter que descer.” Informou, triste. “Volto logo.” Saiu e fechou a porta.

                Depois de alguns minutos, a porta tornou a abrir-se. A ruiva se inclinou, sorridente.

                “Bem-vinda de volta, Al...” O garoto loiro sorriu.

                “Estava esperando alguém?”