Dinho disparou de volta para seu quarto, sendo seguido por Alice.

–Alguém pode me explicar o que que está acontecendo aqui?

–Não tá acontecendo nada, mãe. – Respondeu Adriano, deitado em sua cama, irritado com as cobranças de Lia.

–Ah, tá, aquela gritaria toda no quarto foi à toa, então? E a Lia saiu assim cuspindo fogo de bobeira?

–Não, porque ela é uma idiota que quer tomar conta da vida de todo mundo!

–Idiota? Sei... – Alice se lembrou da cena que testemunhara na sala. – Eu bem vi o jeito que você olhou pra ela agora há pouco.

–Olhei como? –Observou a reação de Alice. - Qual é, mãe, você tá viajando! – Dinho tentou manter a voz inflexível. – A Lia... A Lia é insuportável, ela fica se intrometendo...

–Na sua vida, você quer dizer?

Na vida, nos pensamentos... Mas isso Adriano jamais admitiria. Não contaria que o que mais lhe irritava era que cada vez que estava prestes a esquecê-la, ela voltava a atormentá-lo, perigosamente perto e torturantemente longe. Que quando pensava que gostava de Juliana, que não desejaria mais quem não lhe dava valor, Lia fazia algo que lhe lembrava por que Ju jamais seria a garota de seus sonhos. Acima de tudo, odiava a presença de Lia. Vê-la todos os dias e saber que não teria chance com ela, que o odiava. Vê-la todos os dias e saber que o mais próximo de um beijo que teria seria a lembrança do ano anterior. Tê-la em seu quarto... apenas para ser pressionado a ficar com outra.

–Ela quer que eu volte com a Ju.

–Volte? - Depois do que Alice ficou sabendo sobre o passado de Lia e Dinho e depois do clima que testemunhou entre eles, era a última coisa que esperava ouvir. – Como assim, vocês terminaram?

–Mais ou menos... Não sei se ela pediu um tempo ou se terminou comigo...

–Dinho... Não vai me dizer que você tá saindo com as duas ao mesmo tempo?

–Claro que não, mãe! Só que a Ju acha que eu tô...

–Filho, se a Ju viu o mesmo que eu vi, ela tem toda a razão de duvidar!

–Chega, mãe! Não tá rolando nada entre a Lia e eu!

Era ainda mais torturante que todos percebessem, menos a roqueira, que haviam sentimentos entre eles. Pelo menos por parte dele... Que lhe jogassem na cara o que sentia, apenas para que lembrasse que não podia viver esse sentimento, que tinha que enterrá-lo cada dia mais fundo e quando estava quase fora de vista, novamente, alguém o encontrava e trazia à tona o que Dinho não queria lembrar.

–Não tá... – Começou a perder o controle. Sentia sua voz mudando, trancando. – Não tá rolando nada entre a Lia e eu, nem vai rolar.

Alice analisou a expressão de seu filho, tendo reconhecido a mudança de tom de sua fala. Por um momento pensou ouvi-lo soluçar e prender o choro.

–Você que sabe. Como mãe, eu preferiria não ter percebido o que eu notei. A Lia não é para você.

Percebeu uma nova mudança de postura do filho, que enrijeceu.

–Eu estou falando sério, Dinho. Essa Lia é do tipo que não vai parar de te fazer sofrer nem se um dia vocês se acertarem. Essa garota é problemática. Eu espero mesmo que você se acerte com a Ju, ela sim é a garota ideal pra você.

Adriano estava visivelmente alterado pelo comentário tecido pela mãe sobre Lia, mas Alice não se deixou abalar. Queria o bem de seu filho e, para isso, quanto mais afastado Dinho estivesse da roqueira perturbada, melhor. Deixou o garoto sozinho em seu quarto, esperando que ele pensasse no que a mãe lhe dissera.

–x-

Lia estava em seu quarto tocando guitarra em fúria quando Tatá entrou.

–Lia? – Observou a irmã largar a guitarra. – O que o Dinho fez dessa vez?

Lia riu.

–E o que você sabe sobre isso, pirralha?

–Você tava gritando o nome dele, todo mundo ouviu. – Tatá respondeu cautelosamente, para não irritar a irmã ainda mais.

–Ele nasceu, foi isso que ele fez! – Lia percebeu a expressão confusa da irmã. – Olha, Tatá, eu tô querendo ficar sozinha, pode ser?

–Tá bom... Eu posso só dizer uma coisa?

–Se você me prometer me deixar em paz depois disso...

–Se o Dinho te afeta tanto, talvez a Ju tenha razão em desconfiar. – Tatá saiu do quarto antes de ver a reação da irmã. Lia havia explicado a situação pra irmã mais cedo, quando voltara da casa de Juliana, e agora se arrependia de ter confiado seus problemas à caçula.

“Se o Dinho te afeta tanto, talvez a Ju tenha razão em desconfiar.” As palavras da irmã ecoavam em sua mente. Não gostava dele, só... Adriano era irritante, egocêntrico, metido... Gostar dele? Preferia beijar o Pilha! E ainda assim... Por que aquele beijo voltava a atormentá-la? Por que não conseguia esquecer aquele idiota? Não podia continuar assim. Já tinha perdido uma amiga só de passar a noite trancada com ele, não podia brincar com seus sentimentos. Aquela noite, o esqueceria.

Lia esperou que todos dormissem, saiu de sua cama já arrumada, pegou sua bolsa e saiu, cuidando para não fazer nenhum barulho. Pegou o primeiro taxi que encontrou e partiu para a primeira boate onde sabia que conseguiria entrar com sua carteira falsa. Luzes, som ensurdecedor, substâncias desconhecidas que rostos ainda menos conhecidos ofereciam, mas que pareciam acabar com seus problemas, e, claro, garotos que dificilmente reencontraria, era tudo de que Lia Martins precisava naquele momento para esquecer Adriano, sua briga com Ju, sua dor no estômago e a raiva de seu pai.

Bebia, dançava, beijava. Tudo corria bem nos primeiros copos. Passava das três da manhã quando o garoto com quem estava deu lugar a Dinho. Fugiu. Outro Dinho. E outro, e outro, estava cercada de Adrianos. Até ali sua imagem a perseguia. Correu para fora do local o mais rápido que conseguiu. Cambaleou porta afora e subiu em um taxi. Como pôde dar seu endereço era uma incógnita. Reconheceu a pracinha. O banco parecia confortável àquela hora da madrugada...