A Rosa Que Sangra escrita por Wondernautas


Capítulo 16
Decadência


Notas iniciais do capítulo

Continuação da festa do Minos, narrado agora por Yuzuriha.



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...

Nuvens escuras cercam o céu noturno. Singelas trovoadas ecoam impiedosamente e pequenas gotículas molham a terra seca. Nas ruas da humilde cidade, uma mulher de longos cabelos negros caminha , sem temer a tempestade que se aproxima. Enquanto abraça a si mesma, as lágrimas de seus olhos escuros se misturam com as gotas da eminente chuva. O som dos seus sapatos representa o silêncio de sua tristeza. Sua face, cabisbaixa, é encoberta pelas suas próprias mechas.

Um pouco mais a frente, um homem anda, com passos firmes, segurando um guarda-chuva azul marinho. Seus cabelos azuis e longos adornam o rosto claro e seus olhos agitados e impacientes, da mesma cor de suas mechas, mostram sua pressa em chegar a algum lugar longe dali. O sujeito não parece perceber a presença da mulher metros atrás. Assim como ela não o nota a sua frente. Por incrível que pareça, a velocidade dos passos é a mesma para os dois. Mas mesmo assim, a proximidade física não é nada, pois cada um se mantém preso no seu mundo, o mundo de seus próprios pensamentos.

- Preciso chegar logo em casa! - pensa o sujeito, aflito - Está muito tarde e se e demorar demais, ele vai me dar uma bronca daquelas!

Cada vez mais preocupado, ele acelera seus passos sem nem perceber. A chuva, aos poucos, fica mais forte até, minutos depois, se tornar uma verdadeira tempestade. O guarda-chuva do belo homem não aguenta e é, sem que nada possa fazer a respeito, levado pelo vento, na direção contrária a si.

- Albáfica, Albáfica, Albáfica !! Vai ser vencido por um ventinho desse? - fala consigo mesmo, irritado.

Ao se virar para pegar o guarda-chuva ainda no ar, os olhos de Albáfica finalmente encontram a bela mulher de cabelos negros. Contudo, ela agora está no chão, caída de joelhos e com suas suaves mãos sobre o rosto. Lágrimas escorrem descontroladamente dos olhos ocultos da mesma, assim como as gotas daquela chuva torrencial.

- O que aconteceu com você? - pergunta ele, enquanto corre em direção a ela.

A mulher não responde. Continua aos prantos silenciosos, sem se importar com o resto do mundo. Um forte assopro do vento paira sobre a morena, jogando seus longos cabelos para o seu lado direito. Albáfica , sem nem se importar mais com seu guarda-chuva sendo levado, se agacha diante dela e pergunta:

- Me fala o que aconteceu com você, por que está no meio dessa chuva? Qual o seu nome?

Novamente, não há resposta. Decidido a levá-la dali com ou sem a tal resposta que queria e sem ao menos saber quem ela é, o jovem a ajuda a se levantar.

- Vem comigo, eu vou te ajudar. - fala para ela, caminhando na chuva.

Os dois andam juntos por alguns instantes. Aparentemente, por alguma razão desconhecida, a morena se encontra em total desespero. Em um assombroso desespero.

- Alguma coisa fez muito mal pra ela. Será que foi alguém que a machucou? - Albáfica se pergunta mentalmente, observando os cabelos da mulher sobre seu rosto ainda oculto.

De repente, uma forte luz surge a alguns metros a frente da dupla. O impacto de algo que se choca no chão com muita força, assusta, de certa forma, ele que se preocupa em ajudar a mulher desconhecida. Albáfica, impressionado, cessa seus passos para poder ver o que acontece, nesse instante, bem na sua frente. Por um deslize dele, ambos caem na chuva, que mais parece ser a personificação da ira dos céus. Mesmo assim, a morena mal se importa e não abandona o seu mundo de lamentos. Albáfica, notando que ela está indefesa, se levanta e encara o sujeito, de vestes escuras, que surgira.

- Quem é você? - pergunta ele, valente e inabalável - O que quer?

A luz, vindo de uma lanterna na mão direita do sujeito alto, paria sobre o rosto de Albáfica. Enquanto, na outra mão, ele segura um revólver apontado para o chão. O jovem, por sua vez, sente um terrível calafrio correr por todo o seu corpo. O indivíduo misterioso se aproxima com passos imponentes e ameaçadores.

- Entregue esta vadia de mulher para mim agora... - fala com uma voz grave e assombrosa.

- Não. - responde, levemente impressionado. Está decidido em ajudar a desconhecida.

O indivíduo, alto e mantendo o rosto escondido por uma máscara negra, ergue o braço esquerdo preparado para matar.

- Então vou te matar, idiota!! - exclama o sujeito.

- Pare agora! - ecoa uma voz feminina.

Albáfica, na frente dela, volta a olhar para a bela mulher. Ela, se abraçando no chão, se levanta. Ainda está de rosto baixo, apesar dos apesares. Em tal situação, a chuva forte praticamente se torna insignificante diante de tudo isso.

- O que que tá acontecendo...? - pensa Albáfica, olhando para a mulher, espantado.

Exalando um ar bem diferente do anterior, a morena se levanta, enquanto suas roupas e seus cabelos molhados adornam as formosas curvas de seu corpo.

- Quem é você? - pergunta o jovem, sem nada entender ou compreender, observando as atitudes da mulher.

Um sorriso diabólico pode ser percebido na pequena porção visível do rosto dela. A mulher levanta o rosto e olha diretamente para ele. A arma do outro homem dispara. O peito esquerdo da morena jorra sangue e seu corpo se projeta para trás, caindo em meio a chuva. Entretanto, antes de suas costas tocarem o chão, ela responde:

- Meu nome é... Pandora.

...

Por quê esse sonho estranho não sai da minha cabeça??? Estou aqui, na festa do Minos, há algum tempo. Porém, esse sonho estranho me assombra já há alguns dias. E insiste em permanecer dentre meus pensamentos. Posso não ter contado para ninguém sobre isso. Melhor dizendo: não contei! Por enquanto, me contentei em manter segredo e fingir que tudo está bem, à mil maravilhas. Como eu gostaria que estivesse... Que esse teatro fosse a minha realidade...

Realmente, não está saindo tudo como o planejado. Nem a minha vida e nem essa festa do Minos...

Primeiro, percebi que o aniversariante não parava de secar o Albáfica, enquanto o próprio Alba estava assentado em torno de duas mesas juntas, próximas à minha, com os seus amigos. Duvido que eu tenha sido a única, no salão inteiro, que tenha notado. Depois, Minos se aproximou e o Kazuya, irmão dele, começou a falar coisas um tanto quanto desagradáveis para o meu amigo. Em seguida, o Alba deu um soco no garoto. Ele decidiu sair da festa, afinal de contas, estava visivelmente alterado. E para completar, como se já não bastasse, fui " atacada " por uma doida que sequer conheço. Pelo que ouvi dos amigos do Albáfica, ela é uma ex-namorada de um deles. E essa verdade está se confirmando agora que, para a minha estonteante felicidade, ela saiu de perto de mim e foi na direção deles.

- Kardia, eu te amo. - fala a garota, olhando para ele, de pé ao seu lado.

- Me... ama? - pergunta, impressionado.

- " A semelhança entre uma rosa e uma pessoa não se dá somente pela aparência ou jeito de ser. São os sentimentos, são esses que nos aproximam das rosas mais do que a qualquer outra coisa. Ao mesmo tempo que nossos sentimentos podem ter belas pétalas, é raro não encontrar os seus espinhos. Nós... como humanos somos, literalmente, nossos próprios sentimentos. Por mais que um jardim tente ocultar suas rosas, nada será capaz de detê-las no instante do seu florescer. Assim como, por mais que as pessoas tentem esconder as pétalas ou os espinhos de seus sentimentos, cedo ou tarde ela fracassará. " - recita Dégel, o namorado do Kardia, olhando para a ruiva .

- Impressionante! Você lembra do que o Alba disse de cor e salteado! - comenta Kardia, ainda mais espantado, observando os olhos do próprio namorado, boquiaberto.

- Isso é óbvio. Afinal, o que ele disse foi algo realmente profundo. E que se aplica não somente no caso do Kazuya, irmão do Minos, como no dessa pessoa aqui... - fala ele, desviando o olhar da tal Asuka para Kardia, mas apontando o seu indicador direito, brevemente, para ela.

- Como assim? - pergunta a garota, colocando suas mãos sobre a cintura.

Dégel respira fundo, ao fechar os olhos. Todos no salão de festas continua, fielmente, observando a situação. Até mesmo meus amigos e eu não conseguimos deixar de fita-los. Tal como os outros do grupo do casal, seus amigos, que não falam absolutamente nada. Apenas observam, como todo mundo.

- Você não vai conseguir esconder os espinhos da sua rosa: você não ama o Kardia, você somente tem um desejo egoísta e frívolo de conquista-lo mais uma vez. Em outras palavras: orgulho e capricho. - explica ele, ao olhar dentro dos olhos dela.

Ela ri, por alguns segundos, sem deixar de encará-lo. Dégel, por sua vez, se mantem sério.

- Quem é você pra saber o que eu sinto? - indaga ela, risonha.

- Dégel, namorado do Kardia, o homem que você fez sofrer com o seu egoísmo ridículo e seu comportamento infantil. - responde, quase que automaticamente - Se até hoje não se deu ao trabalho de, no mínimo, entender os sentimentos dele é por que sequer sabe o que é o amor. Portanto, não tem o direito de afirmar que ama alguém.

Ela, fecha a cara, irritada. Mas não responde. E como responderia? Não há palavras que ela possa lhe devolver... há? Vendo toda essa situação, eu diria que não. E quando espero que o Dégel continue, quem dá sequência ao " diálogo amistoso " é o próprio Kardia:

- Asuka, você caiu... caiu e agora quer se levantar de novo às minhas custas? - pergunta sério, atraindo o olhar dela - Não importa o que você faça ou tente fazer, eu encontrei no Dégel tudo o que você nunca me ofereceu...

- Acorda, minha querida! - exclama seu amado - Você não ganha nada agindo como uma idiota.

- Hum... eu... - ela tenta falar, mas acaba parando, sendo interrompida pela própria incapacidade de se retratar.

- Garota, será que terei que ser mais claro para você? - pergunta Dégel - Então serei: xô!

Asuka arregala os olhos para ele, que continua:

- Xispa, some, evapora, se desmaterializa! Compreendeu ou sua mente está lenta para acompanhar esse raciocínio?

Ela, sem hesitar, olha para Kardia e rouba um beijo dele. Rápida, em poucos segundos, ela se vira dando as costas para o grupo e caminha firme para sair do salão e ir embora da casa do Minos.

- Ela é louca? - se pergunta Kardia.

- Tem dúvidas disso? - indaga Dégel, olhando-o.

- Você foi cruel com ela, Dégel! - exclama um homem moreno do grupo. Se não me engano, seu nome é Dohko.

- Ela pediu por isso... - responde - E ainda teve sorte por não levar um tapa bem dado. Mas prometo que se ela beijar o Kardia outra vez, eu esquento aquela cara deslavada dela!

Respiro fundo. A Asuka teve o que mereceu. Bem feito para ela! Minos, enquanto isso, não voltara do interior da casa. Deve estar conversando com o irmão. Ou o castigando, quem sabe? Mas tanto faz, tanto fez...

- Amigos... - falo, desviando meu olhar para a minha mesa.

Sasha, Tenma, Yato, Alone e sua namorada Michelle, uma jovem morena de cabelos negros curtos até os ombros e olhos verdes, abandonam a observação sobre os amigos do Albáfica e passam a olhar para mim.

- Preciso ir embora. - respondo, sorrindo, recolhendo minha bolsa do meu colo e colocando no meu ombro direito.

- Yuzu... não quer ficar mais? - Yato pergunta.

- Não. - respondo seca, dando-lhe as costas.

Indo a cada um presente na minha mesa, me despeço com um beijo no rosto da Sasha, do Tenma, da Michelle e do Alone, respectivamente.

- Mas se você quiser ficar, não tem importância - completo para Yato, enquanto caminho para a saída - Aliás, é melhor que você fique mesmo.

- Ahn? - meu namorado, ergue a sobrancelha direita, sem entender o que eu acabei de falar.

- Acabou, Yato. Nosso namoro acabou. - digo, ao parar por um breve instante, a alguns metros da mesa, permanecendo de costas para ele e os outros.

- Como assim?

- Você entendeu: acabou. Depois passe no apartamento para recolher as suas coisas...

Liberdade. Sinto que ela transborda em mim. Volto a andar, decidida, para fora. Não olho para nada nem para ninguém. A porta da saída é o único foco do meu olhar.

- Cansei de enganar a mim mesma... - sussurro para mim, no momento que saio para fora da casa do Minos.

Quer saber? Eu perdi tanto tempo da minha vida com tolices e coisas levianas. Porém, não quero perder mais nenhum segundo sequer! Sem amor, a vida não tem significado. E por sentir-me vazia, deixei que uma pessoa que não me desperta um sentimento tão profundo como esse me dominasse. Me entreguei, mas não amei. E por essa razão, a solidão me abraçou. Porém, o que eu preciso é do calor humano, do calor que é emanado por um coração...

Agora, eu desejo outro amor, um novo amor, o verdadeiro e sincero amor. Pode ser que muitos achariam inconveniente eu me dar conta e me libertar dessa relação logo agora. Contudo, ao ver o nítido sentimento que os dois amigos do Albáfica, Dégel e Kardia, nutrem um pelo outro... Me dei conta do quanto a ausência dessa cumplicidade e desses laços entre Yato e eu me fazem falta. Aliás, não necessariamente entre ele e eu, mas sim entre alguém e eu. Algo que vive nos olhos daqueles dois...

Algumas gotas de chuva respingam sobre mim. Seria um aviso das nuvens? Olho para cima, enquanto caminho para o meu carro, não muito distante e já visível do outro lado da rua.

- O céu parece tão triste... - falo solitariamente - Ou será que é meu olhar angustiante que vê tudo de uma forma tão... tão... acinzentada?

Me lembro, rapidamente, da Pandora, que costumava a ver a tristeza como o cinza da vida. E, por consequência, daquele sonho estranho. Bem... não me importa mais. Seja como for, algo me diz que nesta noite, não sonharei com a morte, mas sim com a vida...

- Amor... - penso, ao entrar em meu carro, dar partida e sair em alta velocidade dessa rua.

Não olho, em momento algum, para a casa do Minos. É a consequência da libertação rumo a verdadeira liberdade...

- A partir de hoje, Yuzuriha... - falo comigo mesma, dirigindo - Você alcançará tudo o que deseja. Trace seu caminho e realize seus sonhos: felicidade e amor... Enfrente o mundo e todo e qualquer obstáculo, pois esse é o desafio de quem os procura.


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Notas finais do capítulo

^^........ até o próximo cap XD!!