Forever & Ever escrita por soulsbee


Capítulo 36
Ímpasse


Notas iniciais do capítulo

Porque quando você cruza a maior estrada da vida, suas escolhas não podem ser desfeitas.

— Notas finais -



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/351591/chapter/36

Arrastei-me pelos corredores da forma mais silenciosa o possível, agradecida por quase todas as luzes estarem apagas e as poucas acessas piscando freneticamente, dando-me alguns segundos para fazer um movimento mais brusco sem ser notada pelos enfermeiros que faziam a segurança da porta.

Ali não era o hospício de ultima geração que normalmente via-se nas televisões, com portões enormes de ferro e grades pesadas que rangiam apenas de olhar para elas, ou aqueles tão antigos e sombrios que você poderia jurar ver o espirito do maior serial killer que existiu na cidade há algumas décadas atrás, mesmo que esse não existisse.

Ao dobrar o ultimo corredor, branco como todo o resto desse maldito lugar, encontrei um segurança de braços cruzados, sentado em uma cadeira de metal, apoiada na parede, deixando seus pés alguns centímetros acima do chão lendo um jornal do dia anterior. Rangi os dentes, irritada com o imprevisto que poderia estragar meus planos.

Esgueirei-me para trás de uma mesa do refeitório dos funcionários, utilizando as sombras para permanecer oculta, evitando o olhar que ele lançaram após ouvir os baixos ruídos de meus passos.

Estava ofegante com a saída dos fundos bem a minha frente. Ela parecia reluzir como ouro para os necessitados e água para algum viajante do deserto.

Meu pé escorregou batendo na cadeira de metal ao meu lado, arrastando-a alguns centímetros no chão, o suficiente para fazer o som ecoar por todo o ambiente e fazer o segurança se levantar nervoso, pegando sua lanterna e segurando sua arma de choque na outra mão.

– Droga! – Praguejei baixo sentindo minhas mãos soarem frias e tremer com a proximidade do homem.

– Shiu... – O sussurro do velho chamou minha atenção para o corredor do qual havia vindo, onde encontrei seu vulto rodopiando ao redor da luz. Era praticamente impossível ele fazer alguma coisa com aquela lâmpada, uma vez que sua força vital estava fraca demais.

“Vai logo!” Pensei, tendo uma chama de esperança de estar enganada, ao ver os pés do segurança na minha lateral direita, prestes a apontar sua arma para mim até que a lâmpada explodiu e ele, assim como eu, fitamos o teto espantado. “Ele conseguiu!”

Ele se afastou alguns passos de mim, dando a brecha necessária para que eu me esquivasse até a mesa seguinte e ficasse próxima a porta.

Esperei mais uma lâmpada explodir para caminhar silenciosamente até minha saída, porém, faltando dois passos, ele olhou para trás e me pegou com a mão na maçaneta, girando-a com facilidade e ouvindo um clique.

– Parada ai! – Gritou correndo em minha direção.

– Merda! – Reclamei quando a porta recusou-se a abrir, notando a existência de um trinco alguns centímetros acima de minha cabeça.

Pareceu uma eternidade o tempo que gastei para abri-lo, mas consegui sair poucos segundos antes dele me alcançar.

Minha sorte foi que a saída levava direto a uma rua deserta e escura, defronte a um milharal, para onde corri, indo o mais longe o possível do guarda que me perseguia logo atrás, fazendo poucas curvas para que não esquecesse o caminho de volta.

Parei subitamente, silenciando o barulho dos meus passos descalços sobre as folhas soltas enquanto os dele pareciam pisar em uma pilha de ossos até, finalmente cessarem, assim como os meus.

– Porra! – Praguejou alto, próximo, porém, sem visão alguma de mim – Ela escapou! – Disse no radio voltando para o sanatório em passos mais calmos.

Senti meus dedos afundarem sobre a terra molhada que também manchava as barras brancas de minha calça. Fui obrigada a agachar para tentar arrancar aquele pedaço que só iria me atrapalhar no resto da trajetória, porem o moletom era grosso demais e o máximo que consegui fazer foi dobra-la o suficiente para parar de arrastar na terra.

Andei cuidadosamente em linha reta, paralela a rua da qual havia fugido, em passos largos, contando até o cem para me aproximar da saída do milharal, vendo ao longe três seguranças parados na porta do sanatório com suas lanternas na mão, inspecionando os carros estacionados ali do lado e algumas casas vizinhas.

– Ótimo, agora onde vou achar rosas e a porcaria de um carro para ir até o cemitério? – Indaguei nervosa por ter esquecido de perguntar os detalhes para o espirito que, nem mesmo o nome sabia.

Os faróis de um veiculo velho e negro começaram a piscar há alguns metros de distancia, na esquina do sanatório e dentro, por incrível que pareça, estava aquele mesmo espectro, parecendo acenar para mim.

No caminho até o carro, foi então que eu percebi um vento gélido e úmido bater contra meu rosto, como em quase todas as manhas que permaneci internada ali, mas totalmente diferente agora do lado de fora.

O vento começou a se tornar mais forte, as gotas de chuva passaram de algo insignificante a uma garoa forte, deixando minhas roupas claras quase transparentes. As luzes da rua pareceram piscar ao adentrar no carro quente e confortável.

Respirando fundo algumas vezes, descansando daquele desespero todo e da maior fuga que já tive, tirando aquela do hospital com Jared que foi a melhor, apesar de não ter mais certeza se aquilo foi real ou não, estava feliz por sentir a liberdade de novo.

Abri o porta luvas tentando encontrar alguma toalha de papel na qual pudesse limpar meu rosto e minhas mãos, mas surpreendi-me ao encontrar a camisa xadrez favorita de Robert socada lá dentro.

– Esse é carro do meu “raptor”? – Indaguei furiosa para o espirito sentado no lado do passageiro enquanto girava a chave no contato e arrancava dali engatando uma marcha seguida da outra até alcançar uma velocidade consideravelmente alta e entrar na estrada principal.

– Não, esse é o meu carro. – Respondeu da maneira mais natural possível.

– Como a roupa do meu amigo está aqui?! – Perguntei jogando a camisa em sua direção, como se fosse lhe fazer algum efeito, se não borrar seu espectro por poucos segundos até ele refazer sua imagem perfeita.

– É minha, mas não há uso há décadas! – Resmungou igual no primeiro dia que o conheci.

– Robert?

– Como sabe meu nome?! – Dessa vez ele perguntou surpreso.

– Deus, você é o Robert! Como não notei antes? – Eu havia conhecido um que fora casado com Violet, outro que perdeu seu filho em um acidente e estava internado no hospício, tinha aquele que parecia ser o real, meu melhor amigo, e o que me impediria de encontrar um ainda mais velho? – Em que lugar eu estou? – Não fazia o menor sentido, era como se mundos paralelos houvessem se chocado e eu pudesse vivenciar cada fase de Robert sem sofrer alteração nenhuma em meu corpo.

– Você ainda não percebeu?

– Claro que não, caso o contrario, não estaria te perguntando! – Retruquei grossa, fazendo uma curva ouvindo os pneus derraparem sobre um asfalto embebido na água da chuva que se intensificara ainda mais.

– Você está aprisionada em sua mente, Hayley. Você nunca chegou a encontrar Violet, porque você sofreu um acidente grave no caminho. – O fantasma desapareceu deixando apenas um rastro de fumaça que me fez tossir como se as chamas de um prédio invadissem minhas narinas, queimando meus pulmões.

A noite se enegreceu ainda mais, a chuva permaneceu forte e em pingos finos, sem trovoes e raios, misturados com uma neblina fraca que cobria uma vasta extensão da estrada, sendo dispersa em um trecho com uma fraca luz vermelha, impossível de se identificar devido à curva e as arvores no lado esquerdo da pista, formando um paredão sólido de madeira.

Reduzi a velocidade conforme me aproximava do local, onde pude avistar um carro virado de ponta cabeça completamente amassado, como se tivesse rodado algumas vezes na pista até parar daquele jeito. E pouco mais ao longe, dois corpos estavam bloqueando minha passagem, obrigando-me a estacionar no acostamento e sair para ver se podia ajudar em alguma coisa.

– Ei, vocês! – Gritei marchando o mais rápido que podia até eles, sentindo a chuva gelada bater em meu rosto e limpar meu corpo daquele cheiro de hospital. – Ei! – Chamei de novo, mas nenhum dos dois olhou para mim.

Um garoto moreno estava debruçado sobre o corpo de uma garota, fazendo uma massagem cardíaca desesperado, com um olhar vidrado no rosto desmaiado dela, com toda a força que tinha, evitando que ela fosse embora.

– Você já ligou para a ambulância?! – Indaguei parando ao lado deles, levando minha mão até o ombro do rapaz, tentando atrair sua atenção.

E foi inesperada a maneira como meu corpo atravessou o dele, em uma nuvem de fumaça borrada até se materializar inteira novamente. Minha espinha gelou e meu coração pareceu parar dentro de mim, assustado com o que via. Ele já estava morto, mas estava tentando salva-la, porque, talvez, não tenha percebido o que aconteceu consigo. Ao menos, já vi fantasmas que acreditavam estar vivos até dois dias depois de sua morte.

– Você não conseguira fazer nada assim! Deixe-me tomar seu lugar... – Pedi agachando-me para o corpo da garota, esperando que ele escorrega-se para o lado e me desse espaço para tentar salva-la.

Cabelos castanhos, acreditava eu, contrastando com uma pele pálida e cheia de água escorrendo por todos os lados, olhos azuis como o mar, entreabertos assim como seus lábios rosados, exibindo seus dentões brancos e alinhados, sem vida, sem pulso aparente...

Lancei um olhar para o garoto, vendo seus cabelos arrepiados e castanhos escuros grudados em sua testa, incapazes de esconder os olhos vermelhos de choro e rosto ensanguentado devido à colisão. Sua camisa clara estava manchada e rasgada no meio do estomago, exibindo um corte, aparentemente profundo, e ainda assim ele não largava a garota. Ele não me largava...

– Hayley! – Robert gritou pressionando meu peito ainda mais forte, tentando trazer-me de volta e agora, sabendo quem era, eu podia senti-lo tocar meu corpo sem alma. – Volta Hayley! – Dizia repetidas vezes, exausto de tanto esforço que fazia enquanto seu sangue não cessava e escorria aos montes de seu ferimento.

Olhei para o carro destruído e encontrei meu pai desmaiado com o rosto colado no airbag, porém, o corpo da minha mãe encontrava-se logo à frente, torcido no asfalto e com alguns ossos expostos.

Não conseguia chorar, não conseguia gritar nem sentir nada, além de um vazio, como se todos os sentimentos houvessem sido arrancados de mim.

Será que era assim a morte? A dor de não sentir era pior do que a dor ao perder a vida.

– Miss Paranoid... Não me deixa... – Robert sussurrou o meu apelido desde os treze anos, devido ao meu gosto por Black Sabbath, próximo aos meus lábios, tentando fazer uma respiração boca a boca, cessando por algum tempo a massagem cardíaca.

– Eles não te ouvirão nunca mais... – Jared surgiu atrás de Robert, olhando-me com um olhar compreensível, vestido de branco, assim como a ultima vez que o vi. – Está na hora de você vim comigo... – Disse estendendo sua mão direita em minha direção, com os lábios cerrados. – É o melhor... – Insistiu.

Percebi ter cruzado com o maior impasse da minha vida. A escolha entre viver aprisionada em meus próprios medos ou ter uma vida livre e, finalmente em paz, e escolher entre Jared em Robert, no qual, meu amigo morto estava levando total vantagem, pela primeira vez em muitos anos.

A decisão havia sido tomada e agora não havia como voltar, só espero estar fazendo o certo, porque essa será para sempre...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Perdão por não postar desde o mes 10... Mas eu tive problemas pra escrever o Forever e fui para o DW e o MM, sobre o Find Me, ta em hiatus e só vou escrever quando eu realmente estiver morrendo de tedio, sobre essa, espero estar atualizando regularmente a partir de fevereiro.

Obrigada a todos que me acompanharam até aqui, pois agora vos dou o primeiro ápice da história... :3



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Forever & Ever" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.