Passos vindos de diversos lugares rodeava-nos. Nunca pensei o quão assustadoras, podiam ser apenas simples bonecas.

A escuridão tomava conta do lugar. Apenas a fraca luz da lua entre as nuvens iluminava o local, mas que bastava para ver a presença delas. Podíamos sentir através de seus grandes olhos redondos e vermelhos, o desejo de sangue, ou melhor... De vingança. Mas por que vingança?

Michael passou os olhos por todo o lugar e quando avistou o que queria se abaixou e cuidadosamente, sem fazer algum som, pegou uma pedra do chão. Com seus braços fortes, ele atirou a pedra para um pouco longe de onde nos encontrávamos. As bonecas logo ficaram confusas e seguiram na direção do som de pedra caindo.

– Quando eu falar, vocês vão prender a respiração e como se nada estivesse acontecendo vão passar por elas. – Sussurrou baixinho, o garoto dos cabelos negros. – E não ousem respirar até que tenham passado por elas.

– O que? Passar por entre elas? Mas assim elas vão nos pegar! – Exclamei baixinho também. Ou será que era isso que esse garoto quer de nós? Que sejamos pegos? Ah não... Senão os quinze mil dólares abririam as asinhas e sairiam voando.

– Só faça o que eu mandei e depois eu explico, menina problemática. – Respondeu irritado. Nossa, nunca vi uma pessoa com pavio tão curto... Vai tomar um chazinho de camomila meu filho. Da uma segurada aí.

Eu apenas fiz uma careta pra ele e resmunguei algo. Ele ignorou-me por completo e sussurrou para todos nós.

– Agora.

Todos nós prendemos nossa respiração, sabe por que motivo, e andamos em passos rápidos, mas silenciosos. Eu passava por entre as malditas, mas nem uma sequer percebia minha presença. Nem ficando a centímetros de distância.

Infelizmente a sorte não é muito amiga minha. Eu estava andando cada vez mais rápido, devido à falta de oxigênio, que tropecei numa pedra. Caí no chão e acabei respirando.

Gelei.

Todas as bonecas olharam em minha direção. Umas delas soltavam risadinhas, outras diziam “Eu te encontrei, pequenina”. E vinham em minha direção sorrateiramente. Apenas uma palavra rodeava a minha cabeça.

“Correr.”

Tentei me levantar, mas não consegui. Havia algo me impedindo. Foi quando eu vi uma pequena garotinha, ou melhor, uma B.A que aparentava ter seis anos, que tinha longos cabelos pretos presos numa maria chiquinha por dois laços vermelhos e usando um vestidinho rosa e branco, segurava um bichinho de pelúcia na mão esquerda e com sua outra mão segurava meu vestido com força.

– Você não vai escapar... Hehe... Hehehe...

Não pude me mexer, minhas pernas não me obedeciam, devido ao medo que me tomava conta. Estava tão assustada que podia desmaiar a qualquer momento. Senti ser puxada para trás, por uma mão fria e dura, como porcelana. Olhei para trás e vi.

– Não se preocupe, minha filhinha. Você vai ganhar um novo brinquedinho hoje também.

– Sim... Mama. – Respondeu aquela garotinha com o bichinho de pelúcia, um tanto exótico. Um ursinho branquinho, que tinha apenas um botão preto como o olho direito.

Lágrimas começaram a se formar nos meus olhos. Eu queria voltar pra casa. Voltar para os braços seguros da minha mãe. Queria que ela me salvasse... Igual àquele dia.

Ao longe passos apressados vinham em minha direção. Chamando o interesse de todas as B.A que se encontravam ao redor de mim, com facas de cinquenta centímetros nas mãos.

– BIANCAAAAAA!!! – A voz grossa familiar, me fez abrir um pequeno sorriso. Eu queria poder gritar de volta, mas não conseguia, minha voz simplesmente não saía.

Há alguns metros, pude ver a figura masculina correndo rapidamente.

– Ro..dri...go...Me aju..de! – Consegui dizer.

Em questão de segundos, o garoto de cabelos castanhos cerrou os punhos e socou a cara da boneca, que me arrastava pelos braços. A pele que era feita de porcelana, se partiu em mil pedaços pontiagudos, o que fez a mão de Rodrigo sangrar e a B.A mais velha cair no chão.

– Bianca!! Você está bem?! – Ele veio ao meu encontro com seus olhos verdes opacos de preocupação e me abraçou fortemente. Murmurei um pequeno “Hum” e o abracei de volta, tremendo.

O caloroso abraço do meu melhor amigo me acalmou e me senti segura. Até ouvir uma voz nada reconfortante.

– O que você fez com a minha mama...? Mama... MAMAA!!! – A menininha gritou. – Vocês mataram a minha mama!! IMPERDOÁVEL!! MATEM-NOS!!!

No mesmo instante as bonecas ao nosso redor, começaram a andar e falarem.

– É por isso que todos eles merecem morrer.

– É tudo culpa deles! Não, dela.

– Nunca a perdoarei.

Fechei meus olhos com força. E senti os braços de Rodrigo me apertarem mais, como forma de proteção. Quando ouvi um barulho de algo se quebrando.

– Nossa, mas que guria mais problemática! Tinha que estragar todo o plano?

Abri os olhos, e avistei Michael na nossa frente, com uma cara de “Eu mereço?” socando outra boneca, acompanhada de duas criaturas maluquinhas.

– Oh meu Deus! Quer matar a gente de preocupação, garota? Nunca mais faça isso, ou serei obrigada a fazer aquilo. – Dizia Melina me repreendendo. Vishe... Sorte, cada você minha fia?

– OH NOOOOO!! Prefiro as bonecas!! Bonecas voltem!!! – Gritei histericamente.

– NÃO GRITA MENINA!! ELAS PERCEBEM-NOS ATRAVÉS DO SOM! QUER ATRAIR MAIS DELAS?! – Gritou Michael. Epa... Agora ele que está gritando!!!

– Hum...Sim, quer dizer... Não.

– BUAAAAAAAA BIBI!!! – Paty me agarrou.

– Desculpa ter preocupado vocês. – Abracei a de volta. – Hã... Pode me soltar agora Paty.

–...

– Paty?

– Não vou soltar nunca mais.

–... Ai...

– Vamos matá-los... – A voz de uma das B.A me levou de volta a realidade.

O garoto estressado de olhos vermelhos alarde, sacou seu machado de trás das costas.

– Muito bem... Estou empolgado... Ge-he. – Deu um sorriso de lado, dobrou os joelhos, numa posição de ataque. Aliás... Que risadinha é essa? (De um anime perfeito). – Me mostrem o que podem fazer.

Michael começou a correr em uma velocidade incrível, passava por trás de suas inimigas e dava um triplo combo certeiro. Empunhava o machado, como manusear um garfo na mão. Fabulosa comparação, não? As bonecas atacavam todas juntas, com seus enormes facões. Assim, Michael da um mortal do ar e pega cinco facas de sua cintura e lança cada uma na direção delas, acertando o coração de cada uma. Desvia com facilidade dos ataques inimigos, e quando achava uma brecha, dava chutes e socos um atrás do outro. Ele era veloz, e incrivelmente forte. Eu apenas via as cabeças delas voando, após ser acertada pelo enorme machado do mesmo. Aquieta um pouco o facho aí cara, também não é necessário fatiá-las. Logo todas aquelas trinta bonecas estavam no chão, com ou sem cabeça.

Aquela era a verdadeira força de Michael? Existia realmente alguém assim?

Mas por um descuido, Michael sem perceber foi atingido na perna por uma faca e caiu de joelhos no chão. Olhou raivoso para a direção em que foi acertado, e eu acompanhei-o com o olhar. Foi então, que vi a mesma garotinha que por sua vez agora, estava com o vestidinho rosa e branco sujo por uma tintura vermelha, e os olhos incrivelmente famintos por vingança, mas sem mais nem menos fugiu e desapareceu pela noite.

Ela ainda voltaria. Isso é certeza.

Eu senti um pequeno aperto no coração. Ao me lembrar da cena em que ela gritava pela morte da mãe, tentava chorar, mas lágrimas não saiam. Será que nós é que somos os monstros daqui? Invadimos o mundo delas e estamos matando-as? Mas uma coisa é certa. É cada lado por si. Não poderemos ter dó dos inimigos, se eles pedem pelo nosso sangue. Por mais que eu odeie essa frase, a partir de agora será “Matar ou morrer”.

Rodrigo, Paty, Melina e eu, olhávamos assustados na direção do outro. Que tipo de ‘monstro’ ele era?

Depois de guardar suas armas em sua cintura e seu machado nas costas. Vinha calmamente até nós, mas com grande dificuldade por causa de seu ferimento na perna, que sangrava muito. Meus três amigos ainda me abraçavam, quando seus olhos alardes passaram sobre mim. Ele colocou as mãos no bolso da calça e me fitou.

– Nunca... Nunca vá para tão longe de nós. – Ele ficou alguns segundos me olhando, quando seu rosto se avermelhou levemente. – E não entenda mal essa frase! Isso é pelo os meus quinze mil dólares! – Desviou o olhar.

Dei uma risadinha discreta.

– Claro. – Sorri.

– Hã... Vamos procurar por um lugar seguro, antes que o clima fique mais tenso. – Disse Melina apontando para Rodrigo que estava encarando Michael mortalmente. Não entendi o porquê do clima, mas me levantei e concordei com Melina.

O moreno rasgou com uma de suas facas, um pedaço de pano do vestido de uma B.A e enfaixou o corte, pra tentar parar um pouco o sangramento.

O céu agora estava límpido e estrelado com a lua cheia brilhante no centro sem nenhuma nuvem ou quem sabe B.A por perto. Ninguém falou nada durante o caminho, até eu me surpreender com algo e chamar a atenção dos outros.

– Nossa!! Olhem! Eu estou reconhecendo esse lugar! É a pracinha que fica perto da minha casa!

– É verdade! É a mesma pracinha! Mas como?! – A minha melhor amiga de cabelos esverdeados perguntou incrédula.

– Será então que a sua casa está por perto, Bianca? – Paty disse. É a primeira vez que ela me chama de “Bianca”!! É um progresso.

– Tem um motivo. – Michael andava despreocupado e com os braços atrás da nuca. – Esse mundo é paralelo ao nosso. Ou seja, tudo e todos que estão no nosso mundo estão aqui também.

– Q-Quer dizer, que minha mãe e minha irmã esta na minha casa há alguns metros daqui?!

Ele assentiu.

– Mas aqui todos são bonecos, são todos feitos de porcelana.

– Uhuuu!!! Vamos bagunçar a casa da tampinha!! – Exclamou Rodrigo animado.

– Ca-ham... - Repreendi Rodrigo com o olhar. - Mas... Tipo se esse mundo é paralelo ao nosso, significa também, que existe outro eu de mim, certo?

– Sim...

– Como vamos entrar lá então?

– Matando? – Perguntou o moreno pensativo.

– NÃÃO!! LOGICO QUE NÃO! ESTÁ LOUCO?!

– Ah! Lembrei! Eles não podem nos ver ou nos ouvir. Só as B.A, que apenas nos ouvem.

– Sério? Mas por que elas não podem nos ver?

– É a lei da natureza! Você não pode atrapalhar a história de si mesma ou das pessoas que as rodeiam. Cada um já tem um destino formado.

– Desde quando sabe tanto?!

– Um psicopata é mais do que apenas matar. Eles estudam sobre vários assuntos ou mundos, para estar preparado para as missões futuras. E agora para de ficar perguntando, é irritante.

– Ok ok!! Vou parar de perguntar, mas e sobre aqu-

– CHEGA!!!

Abaixei a cabeça e fiz biquinho. E continuamos a caminhar em direção... A MINHA CASA. Como sempre as pessoas curtem tudo o que é MEU.

Quando chegamos a porta estava trancada. Típico. Assim, o Michael deu a ideia absurda de pular a janela que estava aberta, e como os meus amigos são um bando de loucos, eles aceitaram a ideia, e então nós realmente pulamos a janela. Mesmo eu sendo contra. Exatamente! Eles... Ignoraram-me.

Tinha uma arvore no terreno da casa, que ficava do lado da janela do meu quarto. Uma hora depois até finalmente eu conseguir escalar e pular para janela adentro. Medo de altura desgraçado.

Eu tive a pior noite da minha vida. Nós tivemos que dormir no tapete do chão, que estava um tanto desconfortável, porque o meu “Eu” deste mundo estava dormindo na cama. A Melina ficava me chamando toda hora, falando que estava com fome. Então eu tive que fazer um lanche para ela na cozinha. Quando voltei a dormir, a Paty começou a me chutar e falar “Ladrão!! Roubou o meu bolo de morango!!”. O Rodrigo a roncar, incrível ele não acordar com o seu próprio ronco, porque parecia que a casa estava desabando. E o Michael a dar umas risadinhas sinistras, nem quero saber que tipo de sonho ele estava tendo, mas não parecia nada amigável. Quando enfim eu consegui dormir, dois minutos depois todos estavam gritando e me chacoalhando.

– Vamos, sua dorminhoca! Já é dia!! – Rodrigo pulou em cima de mim. Maldito! Filho duma mãe!

– Comeu uma maçã podre por acaso, em Branca de Neve?

– É envenenada! – Corrigi Melina, cobrindo os meus olhos com as mãos, devido à claridade.

– Você comeu MAÇA ENVENENADA, BIBI?!

Todos olharam para Paty, com uma cara de “O que?”.

E assim, foi a pior noite que já tive e sinto que vou sofrer muito mais daqui pra frente.

Continua...