O Filho Do Olimpo E A Faca Da Noite escrita por Castebulos Snape


Capítulo 2
Detono Com A Ajuda De Uma Cobra Mitologica Gigante


Notas iniciais do capítulo

olá, segundo cap. para vocês. Obrigada, Fran Shadows, pelo coment incrivelmente perfeito. Vou postar toda a terça se der. A questão é que a pessoas que vos fala é pobre: sem internet em casa, sem net ou not, e, até pouco tempo, só o pendrave. Nesse cap. tem morte.



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A história do começo do meu fim começa justamente no ultimo dia da recuperação (Complicado, né?), minha prova seria naquela tarde e era minha ultima chance de ir para o oitavo ano e, em vez de estudar na hora do intervalo como todos os outros alunos a minha volta, eu estava na Quadra Azul sentado conversando...


Espera, volta. Antes de tudo isso me deixa falar da minha escola: o cnei, Colégio Nacional de Ensino Infantil. Nós chamávamos de Inferno Nacional para Estudantes (não) Compreendidos. Prefiro o nosso, é mais realista, mesmo que não esteja na ordem certa e tenha o “não”.

É um colégio publico federal que fica em Teresina, Piauí, Brasil (É eu sou brasileiro, muito brasileiro e com muito orgulho, obrigado.). Basicamente é um complexo de salas retangular entorno de um pátio enorme com piso de cimento, com quadra poliesportiva e campo do lado do pátio. No meio desse pátio tem uma mangueira e a, mais ou menos, quinze metros dela esta um galpão com piso azul e telhado de madeira que era muito fresco e que todo mundo chamava de Quadra Azul, o galpão é lotado de mesas para as crianças lancharem ou conversarem ou, bem, tinha gente que corria por entre as mesas e parava no hospital, não sei como, mas isso não vem ao caso. Nos dias mais quentes (o Piauí é um estado do nordeste que é mais quente que o resto do país que já é quente) era o melhor lugar do colégio e o mais concorrido.

 Tudo isso nos trás de volta a historia:


... conversando com três amigas: Amanda, Gabriela e Rebecca (sempre gostei de fazer amizade com garotas, muito mais maduras. Não que eu não faça amizades com garotos, mas é raro). Contando exatamente a historia de Leto, a mãe de Apolo e Ártemis.

Eu estava tentando fazer com que elas rissem então levantei o volume da minha voz e comecei a falar besteira por causa do professor de latim, o Novato, que tinha recebido ordens para me vigiar e que estava encostado na coluna do nosso lado a uns cinco metros de distancia. 

– Zeus! Ele gostava de ter ‘alguns’ – dobrei os dedos em aspas para aumentar a ironia – dos que nossos adoráveis e tão queridos professores chamariam de: ‘relacionamentos extraconjugais’ – fiz as aspas de novo –, ou seja, ele tinha um bando amantes. Sortudo! – elas colocaram as mãos na frente das bocas e riram baixinho – É ótimo simplificar as coisas! Sinto-me bem melhor assim. Acho uma baboseira isso de tentar aliviar coisas ruins. Por exemplo: Fulano faleceu. Isso não o deixa menos morto ou a noticia menos triste. Não que Zeus ter amantes fosse ruim. Nem de longe! Ele devia adorar, afinal teve tantas e duvido muito que alguém o tenha obrigado a fazer isso, se sim, eu quero conhecer essa pessoa, quero ser tirado do caminho.

Olhei pro lado e a cara do professor ia ficando vermelha, eu podia vê-lo rangendo os dentes. Ele estava a duas semanas no colégio e Martins já tinha feito com que ele me odiasse. O que é surpreendente, eu nunca consegui fazer com que gostassem de mim com apenas uma seção de lavagem cerebral.

“Algo me diz que eu vou fazer uma visitinha a Martins daqui a pouco, meninas”, falei baixinho, “Amanda ligue para minha mãe quando o Novato me levar. Não, espere alguns minutos pode ser útil e divertido. Sempre é divertido. Amo Martins, devia pedir ela em casamento, minha vida seria tão boa dentro de uma gaiola, ou um quarto acolchoado, vocês escolhem... Não ela é quem vai escolher, do jeito que é egoísta...”

Ela concordou com a cabeça e voltou a sorrir. Era bom demais ver aquilo. Em pensar que depois de todos aqueles anos de convívio, ela ainda ria das minhas besteiras repetitivas e infantis.

Amanda era uma menina morena, pálida, com sardas no nariz, de olhos negros e calorosos, de cabelos sempre soltos e bem escovados, tinha um jeito punk muito estranho, sempre se vestia com roupas surradas e usa um batom negro. Levava quatro anéis de prata na mão esquerda ela costumava dizer que representavam a terra, o ar, o fogo e a água, as coisas que existiam em todas as religiões antigas. Admito que meu vício por mitologia antiga passou para ela.    

“E, continuando. Leto era, como posso dizer... no tratamento popular: ‘a bola da vez’”, de novo fiz as aspas e Gabriela se segurava para não rir muito alto, “e ia ser mãe de...”, Os gêmeos, disse Vox, mal-humorado, “Ártemis e Apolo. O que é lindo, não acham? É impressionante o que pode nascer de um caso. Ares, que é pior, nasceu do casamento. Isso quer dizer que, se Zeus não tivesse tido amantes, nós não teríamos coisas boas no mundo? Pobre Hera. Pobre Ares... Pobre Zeus. Pobre de nós isso sim.

“Falando nela: Hera, não era nem um pouquinho fã das amantes de seu marido. Já era de se esperar, né? Deusa do casamento e tal. Ela mandou...”, A Píton, imbecil, completou Vox, “Ah, é mesmo! A Píton, uma cobra gigantesca, perseguir a rival e...”, uma pessoa gritou da porta do colégio e eu parei de coçar o rosto.

No geral todas as crianças gritavam durante as brincadeiras por uma ridícula diversão, que no caso era minha diversão predileta quando eu tinha dez anos, por isso ninguém reparou no grito, mas ele era diferente, tinha pavor, algo mais. Eu fui o único que parou o que estava fazendo.

Por reflexo meus olhos miraram por cima do ombro de Gabriela e meu sangue gelou nas veias: uma cobra branca e amarela, asquerosa e enorme estava se arrastando pela porta da frente quebrando as paredes e quadros do corredor.

Congelei.

Quando eu digo enorme, quero dizer enorme. Gigantesca. ‘Uau como aquela cobra é grande!’. A cabeça do bicho não caberia na carroceria de uma camionete; seu corpo já se enrolava pelo pátio e mesmo assim não começava nem afinar.   

O porteiro estava correndo para os banheiros, junto com alguns dos alunos imaginei que para o campo, o portão para lá ficava perto do banheiro. Ou pro banheiro, afinal aquela visão quase me fez sujar as calças e não é algo legal morrer assim. Eu acho.

Eles estavam preocupados demais com sigo mesmos (ou com suas calças) que se esqueceram de avisar ao resto do pessoal. A maioria dos alunos estava na Quadra Azul rindo, estudando desesperadamente ou comendo e nem sequer notaram a cobra que rastejava em nossa direção.

O professor a minha esquerda não entendeu o que eu estava fazendo, mas devia achar que era um tipo de piada sobre a escola ou o resto do corpo docente, franziu a testa e desencostou-se da coluna pronto para ir até mim e começar a gritar que é isso que acontece com gente como eu e me levar para a diretoria. Acredite já aconteceu. Mesmo que eu estivesse com sono e fosse apenas um cochilo. Aquele foi um dia estranho... muito longa e pouco oportuna história.

– Jack – disse Gabriela rindo um pouco –, você esta verde. Submundano, tudo bem?

Fale, disse Vox, Faça alguma coisa. Avise as pessoas.

Eu me levantei num pulo derrubando minha cadeira no chão, não conseguia dizer nada, portanto achei que o garoto dos deuses pulando chamasse atenção. Todos em volta me olharam, depois para onde eu olhava e entraram em pânico.

Jack? – chamou Amanda e se virou junto com as outras.

Gabriela gritou mais alto que qualquer um, ela morria de medo de cobras. O grito era compreensível uma delas saiu do seu brinquedo favorito quando tinha dois anos e isso não é nem um pouco legal, não é uma coisa que se supere com uma simples ida ao psiquiatra, mas ele foi alto o bastante para chamar a atenção da cobra para nós.

Esta mirou aqueles olhos amarelos pavorosos em mim e eles brilharam como se ela tivesse me procurado por muito tempo, estivesse feliz por finalmente me encontrar e ansiosa para me conhecer melhor.

Ferrou, disse Vox, exatamente o que eu estava pensando, Temos que tirar o povo daqui. E nos livra daquilo.

Por que eu?

Ótimo, então todos morrem!

– Vão para a biblioteca. Agora! – disse a elas. – Todos vocês vão para a biblioteca! Você – me virei para o professor que estava pálido, olhando para a cobra e parecia ter congelado, espero que não tenha se sujado – tire-os daqui! Faça o seu trabalho.

Por sorte todos me escutaram (Perigoso. Eu não sou tão confiável assim), se acalmaram um pouco, um pouco, e correram para lá. Rebecca e Amanda conseguiram fazer Gabriela se mexer e arrastaram-na para a sala atrás de mim. O professor guiou todos (aos berros) para fora do galpão e para dentro do auditório e biblioteca.

Eu continuei parado olhando nos olhos daquilo e, em uma onda de terror, entendi: ela me queria, estava ali por mim. Só tinha uma coisa que uma coisa daquelas pode fazer com alguém e não era tomar um cafezinho. E eu não era tão covarde para fazer com que outras pessoas sofressem por minha causa.

Amanda me encarou um pouco quando não me mexi, mas acho que entendeu o que eu ia fazer, olhou para a cobra, depois para mim, vi seus lábios se comprimindo em duvida, mas, finalmente, correu para junto do resto das pessoas.

Menos uma coisa para me preocupar.

Pelo menos, pensei, aquele idiota de latim serve para alguma coisa. É esperto. Primeiro a biblioteca vai ficar cheia, depois eles vão pro auditório.

O auditório, que ficava do lado da biblioteca, provavelmente ficaria cheio em minutos e ele era pequeno demais para uma cobra gigante e todos os alunos que ficaram na escola nas ferias (que eram muitos, só pra variar). Enquanto o pátio esvaziava, eu tinha que levar a cobra para o outro lado.

Corri para a esquerda por dentro do galpão, isso fez a cobra dar a volta mangueira. Ela tentou me derrubar do uma cabeçada monstruosa e acabou batendo nas pilastras do galpão (meio inevitável). Tudo veio a baixo e eu continuei correndo o mais rápido possível.

O bicho tentou me abocanhar quando estava no meio do pátio o que fez com que eu caísse, a coisa empinou e tentou de novo me pegar, mas eu chutei seu focinho com força e consegui, enquanto ela empinava em desespero e farejava ruidosamente, me levantei e continuar a correr.

Isso é uma cobra não um tubarão!, pensei, Se isso vai ser um bizarro que seja um bizarro coerente!                                     

Eu tinha como objetivo os dois lances escadas que levavam para as únicas três salas que ficavam fora do chão. Achei que ela não entraria pela porta estreita. Eu saltei os degraus enquanto a coisa colocava a cabeça no portão de ferro, que, aliás, quebrou.

Quando cheguei ao fim da escada percebi que a cobra tinha entrado e ficara entalada.

Obstinada, pensei, isso melhora tanto minha situação. Chega estou feliz por ter uma cobra gigante maluca e com objetivos fortes atrás de mim. Aquilo não vai durar muito tempo sua pele é escorregadia vai ajudar a subir, mas por ela ter desacelerado eu vou ter tempo para pensar um pouco. A questão é: como vou matá-la?  

– Herói. – chamou uma voz fria atrás de mim.

Por que eu fui perguntar? Tenho a impressão de que, se não tivesse perguntado, essa historia terminaria ali, o que não seria tão ruim assim.

Virei-me relutante para uma velha corcunda usando um manto preto com um capuz caído e a mão estendida para mim com uma faca nela. Eu podia sentir poder saindo dela, e não gostei disso. Parecia a madrasta má da Branca de Neve só que não tão feia.

– Pegue sua faca – disse ela – e mate Píton.

Eu queria protestar, dizer que não era um herói coisa nenhuma e que aquela faca não era minha, mas eu queria matar aquele bicho e achei a velha um pouco difícil de discutir (quem mais percebeu que ela disse Píton?). Então peguei a faca e ela encaixou facilmente como se fosse feita sobre media e aqueceu minha palma.

– Valeu – falei olhando por cima do ombro – Então... é mesmo Píton? Das historias?

A velha não me respondeu, só jogou seu capuz por cima da cabeça e desapareceu como se tivesse puxado o cabo da tomada de uma televisão. Eu arfei e teria ficado ali o dia todo maravilhado se não tivesse uma cobra de vinte metros me perseguindo.

Virei-me para as escadas e o focinho do monstro já estava virando para o segundo lance da escadaria. Suspirei, exausto, correr não era uma das minhas qualidades.  

Ótimo!, pensei, E agora quê que eu faço, meu Zeus?

Um trovão soou no céu azul. Levantei uma sobrancelha, me divertido. Parecia que tinha caído dentro de um dos meus livros de mitologia, a única diferença é que minha escola não está em nenhum deles, por isso eu gostava.

– Sem apoio divino?! – gritei para o céu – Estou morto. Apelar para o espiritual era minha última opção.

Mais um trovão fez as estruturas do prédio sacudirem.

As estruturas, pensei, é isso. Obrigado, meu Zeus!

Olhei para os lados atordoado, e vi que ao meu lado direito no fim do corredor tinha o começo do telhado que servia para o andar e circundava todo o colégio. O telhado mais alto bem ao seu lado servia para cobrir onde eu estava e para enfeitar já que também corria a escola inteira.

Nenhum deles agüentaria a cobra de jeito nenhum.

Droga!, xinguei, Por que eu fui subir aqui? Não sobram muitas opções, sabia? E por que uma cobra? Podia ser um cão enorme era só eu ter um tronco para ele ir buscar. Hummm, como será jogar um graveto para Cérberos? Seriam necessários três gravetos. Troncos, três troncos bem resistentes.  

Outro trovão só que mais perto e mais irritado me fez voltar à realidade.

Então subi nas telhas pisando leve e rezando aos deuses (que já tinha se provado bastante reais) para que ela não desabasse antes da hora e, no caso, comigo em cima.

Quando me distanciei o bastante para ter coragem de me virar, a cobra estava me encarando com os cacos de telhas do telhado na cabeça. Estranhamente ela me pareceu muito feliz em me encurralar num lugar alto.

Vou te mandar para o Tártaro sua cobra infeliz, pensei abrindo o maior sorriso sarcástico que consegui (o que virou minha especialidade depois de alguns anos) imaginando na frente da cara cobra o rosto da diretora. As duas tinham muita coisa em comum: provavelmente me odiavam, queriam me ver morto, eram horríveis, más. No resumo: almas gêmeas.   

Olhei para o lado (não sei exatamente o porquê) e vi que o campo estava cheio de funcionários e alunos. Meus colegas e professores estavam chorando em desespero alguns estavam desmaiados ou me olhavam com expectativa. Aquilo me deixou com raiva e com uma estranha vontade de rir.

A ironia do momento me encantou. Eu, o incorrigível rebelde marginal ateu, era a ultima esperança das pessoas que eu mais odiava na vida, e que mais me odiavam, e eu tinha escolhido ajudar.

Lá se foram três anos de reputação pelo ralo. Eu mereço!

Pensei por alguns momentos sobre o plano e percebi três coisas. Primeira: quando o telhado desabasse como é que eu ia me livrar da queda? Segunda ela não ia morrer na queda era uma cobra, uma cobra de duas toneladas, mas uma cobra. Terceira: como eu iria matar aquilo com uma faca de cozinha de uma velha estranha?     

Votei a encará-la. Meu medo me fazia ficar mais forte e mais irritado. Ela abriu a boca e do fundo de sua garganta pulou uma coisa viscosa e verde clara na minha frente. Eu já ia perguntar o que era aquilo quando começou a corroer a telha.

– Hera é bem criativa, não? – perguntei para o monstro sem conseguir conter o desprezo no tom.

Queria ter dito algo inteligente como: Belo tiro. Era de se esperar uma coisa assim de uma cobra de três mil anos, mas com sua cara achei que seria pior. Mas não! Agora, provavelmente, eu tinha a deusa mais vingativa do Olimpo de mal comigo, nenhuma pressão.

Ela (A cobra. Melhor: a cobra que rastejava em minha direção, não a cobra Rainha do Olimpo.), com certeza, não gostou do meu doce comentário (A outra também não deve ter gostado, não. Detalhe: não me explodiram em vários pedacinhos, já é uma vitória) sobre seu nascimento e começou a avançar me mostrando as presas retrateis.  

Não foi Hera que me criou, seu imbecil ignorante, disse uma voz áspera e masculina no fundo da minha cabeça. 

Espera, pensei, a Píton é macho? Meus bons deuses do Olimpo, quando foi que pequei?, olhei para cima dramaticamente, Que mal eu te fiz, meu Zeus?! E é exatamente com isso que me preocupo e não com o fato de ter outra voz na minha mente. Nem com a probabilidade do bicho ter bote. 

– É, eu sei. – me ouvi dizendo – Você nasceu do lodo na terra após um dilúvio. Você é filha, quero dizer, filho de Gaia. Mas foi Hera que te deu o serviço grotesco de perseguir Leto quando ela estava grávida de Apolo e Ártemis, então nisso ela foi criativa. Um criativo muito cruel, mas, devo admitir, criativo.

Epa!, pensei, De onde é veio essa? Doutor, minha loucura piorou. Muito compreensível é uma cobra de vinte metros qualquer um enlouqueceria, sem contar que eu nunca fui muito normal mesmo.

A cobra avançou um pouco mais com os olhos verdes brilhando mais intensamente e, como se aquilo não bastasse, conforme ele ia se aproximando as telhas ia estalando e soltando lascas do tamanho de estiletes e provavelmente tão afiados quanto eles.

Ora, ora, e eu achando que tinha vindo comer um semideus descrente, ele respirou fundo, Ah! Seu cheiro me chamou atenção, é delicioso, nunca devorei um semideus tão... atrativo. Entende isso, não entende?

– Aaaah... Não.

A estrutura de cimento das colunas em baixo de nos começou a ranger. E o monstro continuava avançando. Tec-tec-tec continuavam as telhas. Eu achei que meu coração fosse explodir.

Por que o telhado não desabou? Vou dar pela primeira vez esse conselho que me seguiu durante toda a minha vida: pergunte para as Parcas. Eu também nunca entendi isso. Nem fui burro o bastante para perguntar.

Recuei alguns passos para que ele avançasse mais um pouco e, ao mesmo tempo, ficasse longe de mim.

  – Você não vai me devorar nem ninguém aqui – retruquei com a voz tremida – Não se eu puder evitar.

Um herói sem treinamento e morrendo de medo quer lutar com o maior monstro da antiguidade há-há-há. Você cheira a Apolo, ele disse o nome com desprezo, e deve ser tão estúpido quanto ele, talvez seu pai venha te salvar e assim eu vou ter um lanche duplo.

Pensei que, se Apolo tivesse feito um bom trabalho no extermínio daquilo, minha escola estaria inteira para a prova final. Então agradeci silenciosamente por ele não ter feito um bom trabalho, não sabia de nada sobre a prova. 

– Apolo não é estúpido – minha voz ficou mais corajosa e cortante – Não é um gênio, mas estúpido já é demais! Quase um insulto à classe dos estúpidos. Conseguiu te matar, o que não deve ser sido tão difícil. Você não é o monstro mais temido da antiguidade, esse era Tifão. Eu não sou um herói. Você é um instrumento ridículo de vingança que não fez o trabalho direito. E sou Jack Leal e vou mandar você de volta para o Tártaro.

Reparem que eu não disse nada sobre o medo. Eu estava com vontade de gritar por minha mãe, bem alto e com a voz em soprano.

As tabuas estalaram mais alto, a cobra arregalou os olhos verdes e, em um segundo longo demais, tudo desabou.

Ele caiu em cima do bebedor, que esguichou água para todos os lados, e foi coberto por restos de telhas. Eu pulei para a parte superior das telhas me dando conta que ainda segurava a faca estranha.

Não. Você é filho de Atena, não de Apolo, que pena essa deusa nunca me encheu o saco.

Eu me pus de pé de novo, ofegante, estava exausto. Essa cobra chata não morria!

Que bom, pensei, o monstro que vai me ter como almoço não sabe nem quem é meu pai ou mãe olimpiano. Pelo menos o chute é Atena e não... sei lá, Ares.

Olhei para a faca e desejei que ela fosse maior, e não uma mera faca de cozinha. Então como um passe de mágica a faca se alongou em uma espada longa de dois fios.  

Só então percebi o quanto ela era estranha: era toda preta, do cabo a lamina, só que tinha traços vermelhos como se fossem veias que deixavam o ferro com aparência de inacabado.

Agora onde vou enfiar essa coisa bizarra naquela coisa bizarra?

Voltei minha atenção para a cobra que ficava de pé, mas meu olhar parou no chão não muito longe da nuvem de poeira e água.

Meus olhos se encheram de água; Amanda, tão pequena, encolhida e insignificante perto daquela cobra, estava lá com um pedaço de telha enfiado no abdômen, ela ainda estava respirando, tive a terrível impressão que não por muito tempo.

Meus joelhos ameaçaram vergar, meu peito se contraiu expulsando todo o ar que tinha nos pulmões e um pouco além. Eu queria gritar seu nome ou simplesmente gritar de ódio, mas a probabilidade do Píton desistir de limpar a poeira de sua cabeça gigantesca e tentar devorá-la era imensa. 

Um surto de ódio percorreu meu corpo, como se tivesse começado a produzir adrenalina sem parar.  Minha melhor amiga estava quase... e eu não podia ajudá-la, nem demonstrar choque eu podia, por causa daquele bicho. Meus amigos, colegas e inimigos de estimação estavam assustados e tudo era culpa dela.

Um rosnado involuntário cortou minha garganta e eu pulei em cima do monstro sem ter idéia o que fazer depois, mas não me importava nem um pouco. Aparentemente meu corpo, naquele momento, sabia mais que minha mente e agiu sozinho.

A espada entrou em sua cabeça bem no lugar em que a crânio se ligava a coluna e, é claro, ela sentiu e tentou me tirar de cima se sacudindo, mas já era tarde; quanto mais ela se debatia mais danos eu causava. Não imagina o prazer que eu tenho de escrever isso.

Eu desci por suas costas arrastando a lâmina dentro de suas escamas pálidas e ralando meu rosto nas mesmas. Ele empinou e soltou um chiado áspero e agoniante.

Quando cheguei ao chão arranquei a espada e a deixei cair no chão pronto para correr até Amanda.

Sem que eu percebesse uma gota de veneno caiu na minha mão e eu limpei na cobra magoando o ferimento que o veneno já tinha causado, mas um veneno corrosivo não doía tanto para tirar minha atenção de Amanda, quando alcancei minha amiga coloquei minha mão embaixo de sua cabeça e coloquei a outra no ferimento.

Ela abriu um enorme sorriso a me ver.

– Por que você não ficou na biblioteca como mandei? – perguntei segurando as lagrimas.

– Você não me mandou ficar lá, eu queria ver como você estava. E não alimente a ilusão de que alguém obedece você – ela sorriu – Eu ia te entregar isso – ela ergueu um facão de caça. Não me pergunte aonde ela arrumou aquilo. – eu sempre tive uma ótima pontaria, poderia acertar aquilo e te salvar.

“Que bom que está bem. Não precisou disso. Acho que só eu mesmo para morrer por causa de um pedaço de telha. Com minha sorte posso entrar no livro dos recordes – ela olhou para o vazio com se imaginasse um pôster com sua foto –: a morte mais inusitada.”

– Não– murmurei rouco – Socorro! Chamem uma ambulância!

“Você não esta morrendo, não pode estar, você vai para o hospital e vai me ligar na manhã de Natal bem cedo só para me deixar irritado como faz todos os anos. E vai rir da minha voz sonolenta por que ela é fofa. Fique com os olhos abertos, Amanda. Por favor.

“Vai ao meu aniversario, vai me dar um livro que eu ainda não tenho dizendo que vamos abrir uma biblioteca juntos quando estivermos velhos, porque nós nunca vamos nos casar mesmo só vai sobrar um ao outro. Os anormais têm que ficar juntos, não me deixa sozinho. O que espera que eu faça se você morrer? Não morre Amanda, por favor. Não me deixa sozinho aqui, não com eles. Você é a única que me entende. Continue respirando!

Ela respirou pesada e dolorosamente e tentou negar com a cabeça.  De novo um sorriso radiante pareceu em seu rosto e ele levantou a mão para acariciar meu de leve. Ela parecia tão calma que tive que me segurar para não ficar com raiva, meu desespero estava prestes a me enlouquecer, mas ela nem ligava para se mesma.

– Não vai dar tempo, sabe disso. Você sempre quis nos proteger de tudo e isso faz de você um bom amigo. Que sempre preferiu sofrer no lugar dos outros. Não importa o que disserem sobre você, esta bem? Você é um bom homem. Um bom amigo. Uma boa pessoa. Um bom homem. Nunca vai estar sozinho. E é um herói, querendo ou não, esta bem?

Ela sangrava muito e sua voz era quase um suspiro. Ela sorriu para mim como quando eu fazia uma piada sobre algum monstro ou deus das historias, como se eu ainda fosse o garotinho que ela conheceu, e fechou os olhos serenamente, rindo.

Sua mão caiu inerte no chão silenciosamente.

Olhei para ela com a testa franzida e com os olhos arregalados esperando alguma coisa que não viria. Meus ombros caíram o choro mais poderoso me subiu a garganta; meu corpo aceitou a realidade antes mesmo do que a mente ou a voz.

– Não – balbuciei minutos depois – Amanda olha para mim. Amanda! Por favor, não. Não! Você não pode morrer. Amanda abre os olhos. Amanda! Não, por favor.

Eu soltei um gemido dolorido, era tarde de mais. Aquela garota morta em meus braços foi minha melhor amiga durante toda minha vida, eu a amava como uma irmã, ou até mais que isso, e agora estava morta em parte por minha causa. Eu não sabia viver sem ela, meu mundo não existia sem ela, não podia existir. Não sem o calor que ela proporcionava em meu peito toda vez que dizia meu nome; não sem aquele sorriso bobo; o jeito rebelde e inconseqüente, pior até que o meu; não sem seu jeito único de me chamar de idiota ou Submundano.

Tinha que ser mentira. Um pesadelo qualquer, eu ia acordar a qualquer momento, eu riria daquilo, iria para a escola, eu contaria aquilo para ela e ela riria da minha criatividade estúpida. Eu precisava acordar, precisava sair dali, precisava encontrá-la, ela tinha que estar em algum lugar...

Entretanto era verdade, eu sabia. Eu já devia ter me acostumado com aquilo, já sabia que um dia ia acontecer, um dia eu ia perder todos, ia assistir isso, um dia eles ia me assistir partir. Mas uma coisa era saber que ia acontecer, outra, muito diferente, era ver acontecer, se sentir só como nunca, sentir que aquela pessoa, que sempre estivera ali, não ia mais estar, que alguém a levara para longe, para o nunca mais. No fundo eu sabia que... que... Ah, meus deuses! Recuso-me a escrever isso.

Eu queria acreditar que ela estava viva em algum lugar, que ela estava triste por me ver triste, mas estaria me esperando para me chamar de idiota e me dar uma bofetada. Mas aquilo não me consolava, não parecia real, eu sabia, sentia, que o consolo da vida após a morte não ia significar nada para mim.

Fiquei sem conseguir me mexer, estava com dor, raiva e uma infelicidade indescritível. Mantive meus olhos nela por mais alguns segundos, enquanto soltava o choro, um choro que eu só soltara uma vez em toda a minha vida; no dia da morte do meu avô, era um chora sofrido que parecia tirar tudo o que restava dentro de mim. Arrumei seu cabelo e seus baços para que parecesse dormindo ou só descansando um pouco.

Toquei seu rosto ainda risonho e me lembrei da primeira coisa que me disse: Porque tem dois bumerangues feios, pretos e malfeitos desenhados na sua mão? Quem me dera ainda ser o menino que ela conheceu há tanto anos, mas presumo que as pessoas mudam. Acho que é normal.

Me levantei e olhei em volta. A cobra tinha desaparecido, só ficara o pó e uma presa. A faca tinha desaparecido também. O que era bom; não queria mais ver aquilo de novo na minha frente. Eu andei até o dente que estava fincado no monte de entulho e o peguei.

– Um troféu. Como Heracles e a pele do leão de Nemeia. – eu enfiei no bolso da calça – Eu não sou um herói.

Acho que afirmei mais para mim que para os deuses, não tenho muita certeza.    

Meus olhos embaçados correram por todo o pátio do colégio. Aquele foi meu lar dês dos seis anos de idade, todas as minhas melhores e piores lembranças tinham sido ali, junto com Amanda para falar a verdade.

Eu amava e odiava aquele lugar com todas as minhas forças, afinal era minha escola e o lugar que me oprimiram e ridicularizaram, não poderia morrer de amores por ela, mas tinha sido meu lar de algum jeito estranho e surreal. Era o lugar onde eu encontrara pessoas que gostavam de mim e me apoiavam, era o lugar em que eu passei as melhores horas da minha vida.  

Era. Mais um era. Mais um fim, um rompimento. Acho que normalmente eu ficaria feliz com isso. Dês de pequenos meus amigos e eu planejamos o dia em que iríamos sair dali para ir para a faculdade. Seria o melhor dia de nossas vidas. Imaginei se teria algum dia bom a partir dali. Não consegui ver isso acontecer. Não sem ela.

Olhei as mangueiras indo com uma brisa fresca, o céu azul, o sol brilhando (seu calor parecia não chegar a mim), o dia tão estava lindo que quase me senti culpado por estar triste.

Fotos, anúncios, desenhos de classe e rostos felizes preenchiam os espaços vazios das paredes cinza sorrindo para mim.

Tudo parecendo ironicamente feliz, e completamente falso. Mesmo que no meu peito faltasse um pedaço enorme, mesmo que meu propósito ali, que já era muito vago, fosse inexistente, meu mundo não era mais ali. Não significava mais nada. Era apenas um lugar como todos os outros.

Eu jurei a mim mesmo que nunca colocaria meus pés ali de novo. Que um lugar com lembranças sem significado não importava, principalmente que toda vez em que eu me lembrasse dele veria Amanda morta e não nós crianças correndo pelo pátio ignorando o mundo e os olhares de reprovação. Não era mais um lugar importante. Não significava uma reunião de amigos. Era definitivamente desnecessário, dispensável, inútil.

Eu prometi a Amanda que não levaria o inútil a serio, pensei.

– Nada mais me prende aqui – disse a mim mesmo.

Os alunos e professores começavam a sair de seus esconderijos. Segurei-me para não chamá-los de covardes, gritar, extravasar meu ódio, afinal eles só sentiram medo exatamente como eu. Ainda me impressiono de que, em um momento como aquele, eu consegui me segurar de algum jeito. Acho que estava concentrado de mais em chorar. Alguns alunos correram em nossa direção os professores encaravam a cena como se não soubessem o que pensar sobre o que estavam vendo.

Eu não queria ser abraçado ou levado para o hospital, também não importava se meu corpo estivesse doendo ou se todos sentissem muito e estivessem agradecidos. Eles não deviam estar felizes com o que eu tinha feito, por que me agradeceriam por aquilo depois de me torturarem durante anos?

Então eu dei a volta no que tinha sido Amanda, dei uma boa e ultima olhada no rosto pálido, sujo e sorridente que tinha estado em todos os bons momentos da minha vida, que achei que nunca ai me deixar, e fui embora.

Talvez pro último lar que me restava.

O lar que em pouco tempo seria tirado de mim.


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Notas finais do capítulo

Notas finais: sorry pela morte, mas é como eu falo sempre: a gente nasce e morre (P essa foi para você). ficou meio piegas! Cap. que vem tem olimpianos: Artemis e Ares.



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