Vida Interrompida (HIATUS) escrita por Allie Próvier


Capítulo 6
5. Venha me acordar


Notas iniciais do capítulo

DEMOREI (MUITO), MAS CHEGUEI.
Final tenso, espero que gostem!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/349922/chapter/6

5. Venha me acordar


“Tudo que eu fiz e o que não pude fazer

Vem á tona, esta noite.”

Come Wake Me Up – Rascal Flatts


Kate tinha os olhos vidrados em meu rosto. Sua expressão vazia.

Eu me remexi, desconfortável, na cama. Ela suspirou e se remexeu na poltrona em que estava sentada, em meu quarto.

Eu havia acabado de lhe contar tudo o que vinha acontecendo com Anna, e ela escutou tudo em silêncio.

Ela piscou aqueles olhos grandes e verdes e me olhou finalmente parecendo surpresa.

– Isso é... – ela murmurou incerta.

– Bizarro?

Ela me olhou como se eu fosse um idiota.

– Bizarro? Isso é incrível! – ela pulou da poltrona e foi até minha escrivaninha. – Vamos pesquisar.

Eu a olhei sem entender, enquanto ela pegava meu notebook e se sentava ao meu lado na cama com o computador no colo.

– Pesquisar o quê, Kate? – perguntei, observando-a digitar rapidamente algo na barra de pesquisa do Google. – Kate, dá para responder?

– Como você é chato. – ela resmungou.

Bufei e me ajeitei ao seu lado, de modo que eu conseguisse ver o que ela via na tela do notebook. Na barra de pesquisa estava escrito “Médiuns”.

Revirei os olhos.

– Kate, você acha que a minha irmã é médium? Isso é ridíc...

Ela me interrompeu, colocando uma mão sobre os meus lábios e clicando em um dos resultados da pesquisa. Ela começou a ler algo sobre espíritos e comunicação com os mortos.

Mediunidade – Kate falou em voz baixa, os olhos passeando pela tela do notebook. –

Interrompi sua leitura fechando a tela do notebook e pegando-o. Kate me olhou contrariada.

– Me devolva! – pediu.

Bufei, negando e colocando o notebook sobre a escrivaninha novamente.

– Josh, qual o problema?!

– Isso é ridículo! – bufei. – Anna? Médium? Essas coisas não existem, Katherine!

– Não me chame de Katherine. – ela resmungou, irritada. – Se “essas coisas” não existem, como é que você explica tudo o que aconteceu?!

Respirei fundo, desviando o olhar dela e observando a janela do meu quarto. A luz azulada do poste da rua iluminava fracamente parte do quarto, e o galho da árvore ao lado da janela roçava no vidro, sendo balançado pelo vento.

Dei de ombros.

– Não sei. – respondi. – Vai ver é alguma coisa de adolescente.

Kate revirou os olhos.

– Eu nunca fui chamada pelos mortos, Josh! – ela falou, ficando de pé e cruzando os braços. – Você disse que precisava da minha ajuda em relação à Anna, e eu estou tentando ajudar, mas vai ser difícil se você continuar com todo esse ceticismo!

– Eu não sou cético, é só que... – bufei, passando a mão nos cabelos.

Merda! Mediunidade? “Comunicação entre homens e espíritos”? Essas coisas não existem na vida real, apenas em filmes!

Sentei na cama novamente com o rosto nas mãos. Senti Kate sentar ao meu lado e colocar uma mão sobre meu ombro.

– Josh, pelo o que você me contou a Anna não está bem. E você sabe que isso não é “coisa de adolescente”. E ela também nunca faria algo do tipo apenas para querer chamar atenção...

Assenti fracamente. Kate tinha razão, mas... Por quê?

– Kate, não faz sentido. – falei com a voz fraca. – Por que Anna veria essas coisas, se comunicaria? E por que diabos a Holly a chamaria?

– Você nunca leu livros e viu filmes? – ela perguntou.

– Porra, Kate! Você falou certo: filmes e livros! – falei nervoso, olhando-a desesperado. - Essas coisas não podem existir, não entende?! É surreal!

Kate suspirou. Levantou as mãos, como quem se rende.

– Eu não vou discutir com você. Eu vou dormir, é melhor. – ela murmurou. – Amanhã conversamos.

Ela saiu do quarto, e eu bufei. Passei a mão nos cabelos, puxando-os, nervoso. Saí do quarto e ainda tive tempo de ver Kate se preparando para abrir a porta do quarto de hóspedes.

– Espera. – pedi, e ela me olhou. – Me desculpe, é só que...

Eu não sabia o que falar, nem o que pensar. Ela sabia disso. Kate sorriu levemente para mim, assentindo, e murmurou “Boa noite”, entrando no quarto de hóspedes em seguida.

Voltei para o meu quarto e me joguei na cama. Eu vou acabar ficando louco.

****

Acordei sentindo uma mãozinha acariciando minha cabeça. Abri os olhos, incomodado com a claridade, e vi Amy sentada ao meu lado na cama, agarrada em um ursinho. Ela sorriu para mim, e eu sorri para ela.

– Bom dia, pequena. – murmurei ainda grogue.

Ela deu um risinho.

– Bom dia. – falou. – A tia Sam falou para você ir tomar café-da-manhã logo.

Assenti e ela me deu um beijo no rosto, saindo do quarto em seguida. Tão pequena, e tendo que suportar tanta coisa dentro de casa... Ela tinha sorte de ter Kate. Caso contrário, eu não sei dizer como estaria o psicológico dela.

Logo tratei de levantar e tomar um banho gelado. Era Sexta-feira, e geralmente nesse dia os caras do time saíam após o colégio para fazer algo. Eu me olhei no espelho, terminando de ajeitar a jaqueta.

Eu ainda estava no time? Era um mistério. Mas depois daquele surto de Henrie, eu duvido muito que ainda faça parte do grupo.

Peguei minha mochila e desci para a cozinha. Minha mãe, Kate e Amy já estavam lá, conversando e tomando café-da-manhã.

Notei Anna sentada à mesa, olhando para o seu próprio prato de panquecas, com o olhar distante. Eu deixei minha mochila em um canto e me sentei ao lado dela. Anna pareceu despertar de seu transe e me olhou com a expressão vazia.

– Bom dia. – sorri levemente.

Ela apenas suspirou levemente e sorriu minimamente.

– Você está melhor? – perguntei baixinho.

Minha mãe e Kate conversavam, então não tínhamos a atenção sobre nós. Anna olhou-as, receosa, e percebendo que apenas eu a ouvia, apenas assentiu.

Ela não iria abrir a boca para falar nada, então, comecei a tomar meu café. Logo todos terminaram de comer, e deu a hora de irmos. Minha mãe levaria Anna ao colégio, e eu levaria Kate e Amy.

Amy já estava vestida em seu uniforme. Ela estudava em uma creche-escola, e passava o dia inteiro lá. Fechamos a casa e eu fui para o meu carro, sendo seguido pelas meninas. Acenei para minha mãe e Anna, no outro carro do outro lado da garagem, e minha mãe sorriu e acenou de volta. Anna se enfiou dentro do carro.

Suspirei.

O caminho até a creche-escola de Amy foi rápido. Nós a deixamos lá, e Kate pediu para que passássemos por sua casa para que ela pegasse alguns livros. Ela lembrou de pegar o material de Amy, mas esqueceu os seus.

Logo estávamos chegando no colégio e eu estacionei na minha vaga de sempre. Saí do carro com Kate e cumprimentei algumas pessoas que falaram comigo. Procurei com os olhos por Jake, e logo o avistei vindo até nós. Ele tinha uma expressão tensa no rosto.

– Aconteceu alguma coisa. – Kate afirmou.

Jake chegou até nós e abraçou Kate. Logo parou na minha frente, fazendo uma expressão agoniada.

– O que foi, cara? – perguntei.

– Você... Você está na merda. – ele falou de vez.

– Nossa, que coisa bonita de se ouvir logo às sete da manhã! – Kate sorriu irônica. – Explique direito, Jake.

Jake suspirou e olhou ao redor. Sua postura ficou tensa ao avistar algo, e seguindo seu olhar eu encontrei Henrie junto com os outros caras do time. Jake voltou a olhar para mim, e eu entendi tudo.

– Não sou mais do time, não é? – murmurei.

Kate arregalou levemente os olhos para mim, e logo olhou para Jake, pedindo explicação. Jake apenas assentiu.

– Aquele... Eu vou mata-lo! – Kate vociferou.

Ela já se preparava para ir até o ex-namorado, mas eu e Jake a seguramos cada um por um braço. Kate era tão baixinha que ficou meio pendurada. Jake riu baixo.

– Calma aí, duende. – ele a zoou, fazendo-a bufar novamente.

Kate se desvencilhou das nossas mãos e cruzou os braços, com uma expressão sofrida.

– Ele não podia ter feito isso. Ele não podia ter te tirado do grupo assim, Josh!

– Na verdade, ele pode. Ele é o capitão. – falei.

Ela revirou os olhos e algumas de suas amigas gritaram seu nome do outro lado do estacionamento. Ela se despediu brevemente de nós dois e foi falar com as meninas.

– Agora o assunto é sério. – Jake falou de repente, pegando meu braço e me puxando até uma área mais vazia do estacionamento, próximo a um gramado.

– O que?

– Eu não queria falar perto da Kate porque ela é meio maluca. – ele cochichou.

– Meio? – revirei os olhos.

Jake me deu um tapa na nuca e me lançou um olhar reprovador.

– Ele está planejando alguma coisa. .

– Como assim?

– Eu não sei... – Jake bufou, nervoso. – Eu o ouvi combinando algo com o Paul, e ouvi o seu nome no meio, mas eu não consegui entender sobre o que era.

Ah, que ótimo.

– Esquece isso, vamos para a aula. – suspirei.

– Esquecer como, cara? O Henrie é louco e...

O interrompi, balançando a cabeça negativamente.

– Deixa isso de lado, hoje tem prova.

Jake assentiu, contrariado. Eu sei que ele estava preocupado comigo, mas se ele continuasse naquele desespero quem ficaria desesperado sou eu, e isso não é bom.

Encontramos Kate no corredor e ela nos acompanhou. A primeira aula eles dois fariam juntos, e eu fui sozinho para a minha aula de Física.

Ótima maneira de começar o dia: expulso do time, na mira de um aspirante a psicopata e Física. Tem coisa melhor às sete da manhã?

Está para nascer uma vida mais fodida que a minha.

****

Eu teria aula de Biologia com a Kate, mas ela não havia aparecido. Batuquei o pé no chão durante a aula inteira, sem prestar a mínima atenção ao que o professor dizia. Na última vez em que ela sumiu em uma aula nossa, havia dado problema com Henrie...

Onde essa garota se meteu?

Respirei fundo, tentando controlar a preocupação. Assim que o sinal indicando o fim das aulas soou, eu fui o primeiro a ficar de pé. Pendurei minha mochila em um ombro e coloquei os óculos escuros. Meus olhos estavam cansados, talvez pelas luzes fortes do colégio ou porque eu não durmo bem há dias.

Andei apressado pelos corredores, procurando por aquele anão de jardim, e de repente senti uma mão me puxando pelo ombro.

– Tá correndo de quê? – Jake perguntou, rindo.

Expliquei o que havia acontecido, sobre o sumiço de Kate, e ele ficou preocupado então.

– Vou te ajudar a procurar por ela. – ele disse.

Rodamos o colégio, e o clima já começava a ficar um pouco abafado pelo começo da tarde. E nada de Kate aparecer. Fomos para a parte de trás do colégio, onde havia um jardim e alguns bancos. Rodamos o local inteiro, e eu já começava a me sentir cansado. Eu respirava com dificuldade, meu corpo parecia estar em chamas. Senti o tecido da blusa começar a querer colar em mim devido ao suor que começava a brotar e minha vista começava a ficar turva em certos momentos. Parei, me apoiando na parede do colégio. Jake parou ao ver meu estado.

– Está se sentindo mal? – ele perguntou.

Ri sem humor algum, negando com a cabeça.

– Claro que não, eu me sinto ótimo, não vê? – perguntei, despejando minha ironia em cima dele.

Jake revirou os olhos.

– Você e Kate, e essa ironia de vocês. – ele resmungou.

Ficamos em silêncio, enquanto eu tentava melhorar. Como estávamos na sombra e eu finalmente havia parado, meu corpo começou a refrescar novamente. Respirei em alívio, e tirei os óculos do rosto, passando a mão sobre meus olhos para ver se eles paravam de me deixar tonto.

Respirei fundo e olhei o local ao nosso redor. Jake se apoiou na parede, ao meu lado, e começou a olhar para o céu com uma cara pensativa.

Ri ao ver um casal meio escondido atrás de uma das árvores. Esse pessoal realmente não perde tempo...

Espera. Tem algo errado.

Cutuquei Jake com o cotovelo, mas acho que o fiz forte demais, já que ele me xingou enquanto esfregava o local atingido.

– Olha aquilo. – falei, sem tirar os olhos do casal atrás da árvore. – Eles...

Jake seguiu meu olhar e arregalou os olhos.

– Não pode ser. – ele murmurou. – É mesmo a Kate e o Henrie?

Eles pararam de se beijar, e sim. Era Katherine com Henrie.

Jake ia falar mais alguma coisa, mas eu peguei minha mochila e coloquei os óculos novamente, indo embora. Jake me chamou com a voz baixa, talvez para que o casalzinho não nos visse ali, mas ignorei.

Cheguei em meu carro e joguei minha mochila dentro do mesmo, com raiva. Minhas mãos estavam trêmulas de raiva.

Minha vontade era de puxar Kate de lá e gritar “POR QUE DIABOS VOCÊ ESTÁ FAZENDO ISSO?!”, mas se eu fosse até lá, provavelmente quebraria a cara daquele filho da puta do Henrie.

Katherine era burra.

– Josh, pelo amor de Deus, sai desse carro! – Jake pediu, batendo no vidro.

Bufei, abrindo o vidro e o olhando sem paciência. Ele me olhou receoso.

– Cara, fica calmo. – ele pediu. – Olha, vamos lá falar com ela e...

– Foda-se a Katherine! – praticamente gritei. – Ela faz o que quiser da vida dela! Ela quer ficar com um cara que nunca a respeitou e nunca deu valor a ela?! Então que fique!

Jake deu um passo para trás e eu liguei o carro. Saí do estacionamento cantando pneu, sentindo um peso em meu peito. Tentei respirar fundo para ver se me acalmava, mas acabei bufando e socando o volante.

Dirigi em direção às colinas, pela estrada, para ver se me acalmava.

Idiota. Era isso que Katherine Jones era.

Apertei o volante com força, e passei os olhos pelo painel. 120km/h.

Engoli em seco e meu coração acelerou. Eu estava indo rápido demais sem perceber, acabaria pegando uma multa para completar meu dia maravilhoso.

Pisei no freio, mas o carro continuou na mesma. Merda.

Pisei novamente, com mais força, e a velocidade não abaixou. Senti meus olhos arderem. Isso Josh, chore como uma menininha!

Pisei com força na porcaria do freio, seguidamente, sentindo dificuldade em respirar. Com dificuldade eu virei uma curva, e respirei de alívio ao ver que não havia mais nenhum carro na estrada além do meu. Dos dois lados da estrada, apenas as árvores. Eu tinha que dar um jeito de sair desse carro, mas nessa velocidade...

Não tinha jeito. A estrada estava em linha reta, então rapidamente retirei uma mão do volante e desfivelei o cinto de segurança. Tirei o pé do freio e olhei nervoso para o painel, e em seguida para a janela ao meu lado, vendo as árvores passando como um vulto.

Ouvi uma buzina alta e sobressaltei. Arregalei os olhos ao ver uma carreta vindo em minha direção. O carro havia ido para a contra mão e eu não havia notado.

Segurei no volante com força, tentando virá-lo para jogar o carro para a pista certa novamente, mas era tarde demais.

Apenas ouvi o barulho de vidro sendo estraçalhado, e meu corpo sendo impulsionado para frente. Logo, a escuridão.

****

Estava quente. Abafado. O ar pesado entrava com dificuldade em meus pulmões.

Tentei enxergar algo na escuridão, mas parecia impossível. Procurei algo para me apoiar, e achei o que parecia uma mesa. Aos poucos minha vista foi se acostumando ao breu, e eu vi que me encontrava em uma cozinha.

Era pequena e desarrumada. A janela de madeira estava fechada, e alguns pedaços de madeira estavam presos por parafusos, como se para impedir uma invasão.

Dei alguns passos para frente, tentando identificar o lugar, mas eu nunca havia estado ali antes. A casa era pequena, e logo eu achei a sala. As janelas da sala estavam como a da cozinha: tapada com pedaços de madeira. Voltei para o corredor estreito e pequeno, e vi a porta de entrada e saída trancada com vários cadeados, do topo ao chão.

Mas que lugar era esse?

Achei um banheiro pequeno e sujo, e me olhei no espelho quebrado que havia sobre a pia. Meu rosto parecia mais pálido que o normal. Ouvi um barulho baixo, e saí do banheiro. Andei até o fim do corredor e apenas achei um quarto vazio e desarrumado, assim como o resto da casa. Voltei para a cozinha, dessa vez ouvindo o barulho com mais clareza. Andei devagar pelo chão de madeira e, ao pisar sobre um tapete encardido, senti a madeira debaixo dos meus pés fazer um ruído baixo. Empurrei o tapete com o pé e vi que havia uma pequena porta ali, talvez do porão. Eu me agachei e a abri. Vi um pequeno lance de escadas de madeira e comecei a descê-las com cuidado. Estava tudo tão escuro quanto o restante da casa, mas havia uma pequena lâmpada com uma luz amarelada bem fraca em um canto do porão. Não consegui ver direito o que havia ali.

O cheiro de suor e mofo era sufocante ali em baixo.

Terminei de descer as escadas e vi um homem de costas para mim, mexendo em uma mesa de ferro. Não vi no que ele mexia. Ele estava sem blusa, apenas com uma calça surrada. Era um pouco mais alto do que eu e era forte, não parecia ter mais do que 28 anos. Seus cabelos oleosos e bagunçados estavam jogados para trás, e ele pegou algo na mesa, se virando. Dei um passo para trás, com medo de ser visto, mas ele não me viu. Ele olhava para algo no outro lado do porão, e um sorriso doentio apareceu vagarosamente em seu rosto. Desci meus olhos para suas mãos, e vi que havia um canivete nelas. Ele brincou com o objeto, e começou a ir em direção ao que lhe prendia os olhos. Dei alguns passos para frente, me apoiando em uma das pilastras de madeira velha. Procurei andar com cuidado, já que o chão estava molhado de algo que não consegui identificar.

Comecei a sentir um cheiro forte de sangue. Engoli em seco, e finalmente avistei o homem novamente. Ele estava de frente para uma das pilastras de madeira, e havia algo lá...

O homem deu um passo para o lado, rodeando a pilastra ainda com aquele sorriso doentio, e eu senti meu coração perder uma batida.

Era ela.

Era Holly ali, com as mãos e os pés presos por correntes à pilastra. Seu corpo pequeno e branco estava completamente nu, com marcas roxas e avermelhadas. Seus cabelos longos e loiros estavam sujos e despenteados, deixando-a com uma aparência abandonada. Havia cortes ainda sangrando em suas pernas e braços, e ela chorava. Dei um passo para trás, arfando com a visão. O homem falou algo que eu não entendi para ela, e ela chorou ainda mais, os soluços tomando conta de todo o porão.

– Por favor... – ela implorou, com a voz embargada. – Por favor, não...

O homem parou na sua frente, e levou o canivete até o queixo de Holly, levantando seu rosto pequeno e delicado com a ponta afiada. Ela mordeu o lábio inferior, tentando controlar os soluços, enquanto tentava desviar o olhar do homem.

– Você sabe o que acontece quando me desobedece, não sabe, boneca? – o ouvi dizer, ainda sorrindo. – Não aprende nunca?

Ela abriu a boca para falar algo, ainda com os olhos baixos, mas sua voz não saiu. Num ímpeto, o homem segurou seu rosto com violência e a obrigou a olhar para ele. Ele sorriu ainda mais, e acariciou o rosto de Holly.

Seu corpo pequeno estremeceu e com horror o vi levar o canivete até o ventre branco dela. Prendi a respiração ao ver a ponta afiada do canivete afundar na pela lisa. Holly tentou gritar, mas teve seu grito abafado pela mão suja do homem, que ria com vontade. Um filete de sangue atravessou a pele de Holly, que tentava se debater sem sucesso devido as correntes. O homem passou o canivete pela pele dela, fazendo um corte que parecia fundo.

Holly chorava copiosamente, e eu soltei a respiração, dando dois passos vacilantes para trás. Senti minha vista turvar, e um embrulho no estômago. Eu me apoiei na pilastra de madeira novamente, fechando os olhos com força enquanto o grito abafado de Holly entrava pelos meus ouvidos, me deixando louco.

Senti as lágrimas atravessarem meu rosto, e passei a mão em minhas bochechas tentando retirá-las. De repente, o grito cessou. Eu me segurei com mais força à pilastra, e olhei em direção à Holly novamente.

O homem havia desaparecido. Olhei ao redor, nervoso, e nem sinal dele. Meu olhar focou em Holly, que tinha o rosto abaixado e parte do cabelo tapando seu rosto. Seu peito subia e descia calmamente, como se ela estivesse dormindo. Em seu ventre, sangue ainda saía do corte recém feito.

Larguei a pilastra e dei três passos em sua direção.

– H-Holly? – gaguejei com a voz fraca.

Aos poucos, ela foi levantando o rosto. Vi seus olhos azuis procurando por mim e logo ela me achou. Sua expressão era vazia. Seus cabelos sujos caíam sobre seus ombros pequenos, parte dele sujo com sangue seco. Engoli em seco, e ela fez uma expressão sofrida.

– Você... – ela murmurou fracamente. – Por quê?

Eu a olhei sem entender, e ela fechou os olhos brevemente, logo os abrindo novamente. Controlei a vontade de chorar novamente ao ver toda a dor e tristeza, estampados em seu olhar.

– Você me deixou lá. – ela murmurou. – Você me deixou lá, Josh.

Balancei a cabeça, abrindo a boca para falar algo, mas minha voz não saía. Holly continuou me olhando com a expressão vazia e os olhos cheios de dor. Tentei dar mais um passo em sua direção, e senti toda a minha calça molhada. Olhei para baixo, assustado, e vi que havia água.

Muita água.

A luz amarelada da lâmpada foi ficando cada vez mais fraca, e com horror eu vi todo o sangue que escorria dos cortes de Holly misturando-se à água que inundava o chão. Tentei me afastar, correr de volta para as escadas, mas a cada passo que eu dava eu sentia o chão escorregadio sob meus pés. Olhei para Holly, e ela tinha o rosto abaixado novamente.

– Holly! – gritei. – Holly olha para mim!

Ela não se mexeu. Vi que ela não respirava mais, seu corpo estava pendurado de forma desconcertante.

Morta.

Tentei correr para a pilastra de madeira atrás de mim, mas tudo o que eu vi foi a lâmpada estourando e me vi preso na escuridão. A água batia em minha cintura e eu tentei andar para um lugar qualquer, quando senti meus pés saírem do chão.

E eu afundei.



Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado! O próximo capítulo já está prontinho (o que a falta de internet não faz?), então... REVIEEEEEEWS para adiantar o próximo capítulo! HUAHUAHUHAUHUA
Beeeeijos!

P.S: para quem ainda não faz parte do meu grupo no Facebook:
https://www.facebook.com/groups/524763704223492/