Two Lost Souls escrita por CGillard


Capítulo 4
Where innocence is burned in flames


Notas iniciais do capítulo

Peço desculpas pela imeeeeeeensa demora, mas final de bimestre é sempre corrido. E então, quem gostou do trailer de Thor 2? Eu não. Boa leitura, e me digam o que acharam.



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Loki se ajoelhou no chão com muita dificuldade e conseguiu deitar. A conversa com Morgana havia feito com que esquecesse um pouco a dor nas costas, que sentia devido às torturas as quais era submetido. Mas agora, no silencio da noite e com apenas a respiração de Morgana como consolo, ele se permitiu dormir um pouco. Mesmo contra o chão frio e sujo, com fome e feridas profundas por todo o corpo, ele se permitiu sonhar. Sonhar com tempos em que tudo era mais fácil, onde ele ainda era filho de Odin e não um monstro qualquer esquecido em uma prisão, onde apodreceria até o fim de seus dias. Sonhou com quando era criança, no tempo em ele e Morgana corriam por entre as arvores, rindo como se o mundo pertencesse somente a eles. E talvez, naquela época, pertencesse. Ele finalmente se permitiu pensar em todos os momentos felizes, algo que não fazia há anos.

Acordou cedo na manhã seguinte, mas permaneceu de olhos fechados. Logo os guardas chegariam e era melhor estar descansado, pelo menos para que as feridas e cicatrizes não doessem tanto. Eles se aproximaram pouco tempo depois e foram até a cela ao lado, intrigando Loki, que continuou de olhos fechados e atento à conversa que viria a seguir.

“Olha quem temos aqui, nossa princesinha.” Um dos guardas, cujo nome Loki não se recordava, falou com a voz carregada com um sarcasmo quase cruel. Ele era o pior de todos os guardas, um homem gordo e sujo sempre cheirando a álcool. “Por um segundo pensei que tinha finalmente conseguido escapar, mas enfim voltou para nós!” O som produzido por sua garganta, que mal poderia ser considerado uma risada, provocou náuseas no estômago de Loki. O que ele não daria para acabar de vez com a raça daquele homem. Se ao menos tivesse uma única chance...

“Não vai precisar se preocupar agora, não é mesmo? Seu desejo finalmente será realizado, e todo mundo sai ganhando!” a voz de Morgana permanecia impassível, como se ela estivesse acostumada em ter esse tipo de conversa.

“É verdade, não é? Até que enfim, depois de todos esses anos, todas essas fugas, Odin finalmente se cansou de você. Mas se pensa que vou ficar feliz com sua morte, pode mudar de ideia minha princesa. Esse lugar vai ficar muito sem graça sem uma... presença feminina.” Ele sentiu sua voz ficando mais baixa e sugestiva, mas Loki estava concentrado demais na palavra “morte” para reparar no rumo que a conversa estava indo.

“Esqueça, seu porco imundo! Odin vai saber se você tocar um dedo em mim!” Odin não se importava o mínimo com ela, mas exigia a disciplina de seus soldados, e respeito com as prisioneiras do sexo feminino. Nenhuma delas poderia ser tocada, e isso era ordem direta do rei. Muitos já sofreram as consequências por quebrar a lei, e não foi nada agradável. “Por mais que eu esteja condenada a morte, a lei continua valendo.”

O homem olhou-a com a expressão desgostosa. “Teve sorte de Odin ser tão rigoroso em relação a essa ordem, sabia disso? Se não, você não estaria mais aqui para contar a história.” Ela suspirou de alívio ao vê-lo colocar a comida no chão e ir embora. Não conseguia mais lidar com aquele homem nojento.

Mesmo após a partida do guarda, Loki não mexeu um só músculo de seu corpo. As palavras estavam lá, mas ele não conseguia interpreta-las. “Não, devo ter ouvido errado”, pensou afinal, achando mais fácil ignorar a verdade diante de seus olhos do que enfrentá-la. Após alguns minutos levantou-se lentamente, seu olhar fixo em Morgana.

“Eu sei que estava ouvindo.” Ela disse devagar enquanto permanecia sentada, comendo sua comida e sentindo-o a observar. Ficaram assim por alguns minutos até que ele finalmente se pronunciou, sua voz livre de qualquer emoção.

“Sobre o que ele estava falando, Morgana?” Ele a olhava intensamente, mas o que passava em sua mente ainda permanecia um mistério para Morgana. “A verdade?”

Ela desistiu de tentar ignorá-lo e respirou profundamente algumas vezes enquanto pensava nas palavras certas. “É a verdade que você quer? Então está bem, pode tê-la.” caminhou lentamente até ele com a cabeça erguida, tentando manter o quase inexistente orgulho que ainda possuía. “Eu fiquei presa nesse buraco por muitos anos, Loki. Enquanto você lamentava por não ser o ‘filhinho número um do papai’ eu fiquei enterrada nesse lugar úmido e imundo.” Ela virou-se de costas para ele e abaixou um pouco o vestido, só para que Loki pudesse ver algumas das várias cicatrizes que tinha. Eram ainda mais profundas que as dele, e Loki não conseguia sequer imaginar pelo que ela havia passado. “Mas eu consegui fugir. Quatro vezes eu me livrei desse lugar usando apenas a minha inteligência. Afinal, minha magia foi tirada de mim, assim como aconteceu a você, como forma de punição.”

Ela se voltou novamente para ele, esperando ver a pena em sua expressão. Mas não. Seu rosto estava vazio, como se por dentro fosse pedra. Mal ela sabia o quanto ele se culpava. No fundo, Loki sabia que não deveria ter acreditado tão facilmente em Odin. Deveria ter ido atrás dela, descoberto onde estava, e talvez pudesse tê-la salvado. Mas agora era tarde demais.

“Eu não consegui ir muito longe. Estava sozinha, sangrando e com fome.” continuou, olhando para um ponto fixo qualquer na parede, o olhar distante e perdido em recordações. Loki permaneceu em silencio, seu olhar ainda focado apenas nela. “Sabe, a primeira vez foi a mais difícil, devo admitir. Eu mal saí pelos muros. Mas a quarta... aquela sim foi quase perfeita. Consegui ficar um ano fora, respirando ar puro, vivendo secretamente com ajuda de uma velha mulher que vivia numa casa perto da floresta. Eles nunca iriam me achar, mas o filho da velha me viu e acabou denunciando para os guardas. Garoto desgraçado... eu ainda estaria livre se não fosse por ele.”

“E agora está condenada à morte?” as palavras saíram de sua boca antes que ele conseguisse contê-las, um pouco roucas devido às emoções que estava sentindo. Eram muitas, raiva de si mesmo, ódio, confusão, compaixão, admiração... mas nenhuma delas era pena. Ele sabia como era quando, em um momento de vulnerabilidade, alguém o olhava com pena. Fazia com que se sentisse o mais inútil de todos os seres.

“Sim. Odin finalmente se cansou e minha sentença está marcada.” Por mais que ela tentasse manter-se forte, Loki percebeu o quanto temia seu futuro.

Loki agarrou-se fortemente as barras da cela, quase chegando a machucar sua mão. “Eu não vou deixar isso acontecer. Já falhei em lhe proteger uma vez Morgana, e não cometerei o mesmo erro novamente.” Morgana ficou tocada pela intensidade em sua voz, porém um pouco confusa.

“Porque se importaria, afinal? Eu sou apenas uma garotinha que você conheceu na infância. Nada mais.” Ela se recusava a acreditar que existia realmente alguém no mundo que se importasse com ela. Ainda mais alguém como Loki, que nunca se preocupava com ninguém.

“Você sempre foi minha amiga. E também, não é como se eu planejasse ficar aqui para sempre.” Um pequeno sorriso apareceu no canto de seu lábios, passando quase despercebido por Morgana.  “Não confia em mim.” Não era uma pergunta. Ele parecia quase ofendido diante da desconfiança dela, mas não podia culpa-la. Afinal nem ele mesmo sabia se falava a verdade ou não.

“Não tente me enganar, Loki. Sou mais inteligente do que pensa” ela disse simplesmente antes de voltar-se para a parede e tentar dormir um pouco.

Por mais que tentasse, Morgana não conseguia deixar de pensar sobre a proposta de Loki. Provavelmente ele mentia sobre seus verdadeiros motivos, mas porque ela se importava tanto com isso? O importante era conseguir fugir dessa prisão e de sua sentença de morte. Era claro que ela não queria morrer, mas depois de tanto tempo fugindo talvez o melhor fosse aceitar seu destino. Ela suspirou tristemente enquanto se lembrava das varias ocasiões que planejou escapar mas acabou sendo pega. Por que desta vez seria diferente? Ela perderia seu tempo planejando uma fuga quase impossível em vez de aproveitar seus últimos momentos de vida.

Uma risada rouca e sarcástica saiu por seus lábios. Como iria aproveitar presa naquele buraco? Se fosse com Loki... Mas porque ele a ajudaria a final? Sua tola. Com certeza ele quer fugir, precisa da sua ajuda e está usando essa desculpa de 'amizade'. Mas, de que importa afinal? Se tudo der certo, ambos estarão livres. Ela pensava deitada em sua cela enquanto mais um dia surgia.

Quando Loki finalmente acordou ela estava ao seu lado, olhando-o. “O que esta fazendo?” ele perguntou com curiosidade, a voz rouca com o sono.

“Esperando você acordar. Temos muito sobre o que conversar.” Ela continuou na mesma posição. Sentada no chão, encostada à grade que separava suas celas, olhando-o cautelosamente.

“O que deseja? ainda mais a essa hora...” Ele se surpreendeu quando ela conseguiu passar suas pequenas mãos pela grade e o puxou com força para perto de si, sussurrando em seu ouvido.

“O guarda já vai passar, então serei rápida.” Ela o avisou, diminuindo a força que aplicava no braço de Loki enquanto olhava-o intensamente. “Eu não desejo saber quais são seus verdadeiros interesses aqui, Loki. Apenas me ajude a fugir antes que o dia marcado para minha morte chegue.”

Ele conseguia ver o desespero em seu olhar. O medo. O simples fato de que ela sabia que iria morrer. Todos morrem um dia, isso é fato, mas é muito diferente quando você sabe o dia exato. Por um segundo ele conseguiu ver sua amiga de anos atrás por detrás de toda a mascara de indiferença que ela havia colocado após de todos aqueles anos. Ele não sabia o que realmente tinha acontecia, mas seu olhar contava o suficiente. Ela sofrera por muito tempo. Loki queria perguntar tantas coisas, mas sabia que não havia tempo.

“Quantos dias ainda temos?” ele disse sem expressar nenhuma das emoções que sentia.

“Dois dias... A execução está marcada para depois de amanhã, ao anoitecer pelo que sei...” ele escutou sua voz quebrando-se, viu seus olhos turvos. Mas ele sabia que logo que ela se recuperasse e sua vida não corresse mais perigo, voltaria a frieza de sempre.

“Está certo, temos que ir esta noite, então.” Ele observou a mudança em Morgana. Primeiro veio a felicidade, o alívio, e então... mais nada. Novamente o vazio.

“Para onde pretende ir depois que, quero dizer, se conseguirmos escapar.” Loki perguntou. Não queria dar esperanças à Morgana sobre o sucesso de sua fuga, mas estava curioso.

Ela ponderou se deveria mentir, mas optou por falar a verdade. “Estava pensando em ir para Midgard, tenho assuntos pendentes naquele reino. E você?”

Loki ficou surpreso pela revelação, mas preferiu não fazer nenhum comentário. Ela não responderia suas perguntas, então seria inútil continuar o assunto. “Acredito que para o mesmo lugar. Sabe como chegar lá sozinha?”

Ela não era tola, sabia muito bem porque Loki ia para o mesmo reino que ela. Escutara alguns guardas comentando sobre a queda de Loki, como um grupo de humanos com superpoderes chamados “Vingadores” conseguiram derrotá-lo. Com certeza ele desejava vingança, e o sentimento era visível em seus olhos quando ela perguntou onde ele iria. Bem, mas os motivos dele não interessavam a ela, desde que ele a ajudasse a chegar lá.

“Estava pensando, já que vamos para o mesmo lugar, você poderia me levar até lá. Sei muito bem que conhece todos os caminhos secretos que interligam os reinos, e sabe como chegar em Midgard sem usar a Bifrost.”

Loki estava surpreso com o conhecimento de Morgana, mas ficou receoso em levá-la com ele. “Será mais fácil para os guardas nos encontrarem se estivermos juntos.” Ele disse como se fosse algo óbvio, mas ela não desistiu.

“Por favor, Loki, eu nunca vou chegar lá sozinha...” ela começou a ficar aflita, e por fim ele acabou cedendo.

“Está certo, nós vamos juntos. Mas chegando lá, cada um segue o seu caminho.” Ele disse em uma voz baixa e autoritária, mas Morgana estava muito feliz e aliviada para se sentir incomodada com algo assim. Tudo o que importava era que ele iria ajudá-la, e logo  estaria novamente com as pessoas que amava.

“Nada mais justo.” Morgana sorriu, triunfante, e ambos começaram a pensar em um plano.


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