Eu andava pela grama molhada da área verde do prédio. O ar estava frio, porque havia acabado de chover. Olhei para o céu, as nuvens tinham ido embora, o que dava espaço a um céu coberto por estrelas. Meu vestido balançava com o vento acompanhando o movimento dos meus cabelos. Olhei para os lados em busca de alguma alma viva. Mas era só eu. Eu e as estrelas.

     Sentia meus pés descalços tocarem a grama molhada e gelada, mas gostava daquele sensação. Olhei no relógio. Eram 4:30 da madrugada. Fechei os olhos enquanto deixava meu corpo cair sobre a grama. Como em um flash back, voltei a 3 anos atrás, quando tinha 15 anos e escutei minha professora de Arte dizer que era mais ou menos essa hora que as estrelas cadentes apareciam. A partir desse dia, acostumei a, pelo menos em alguns dias da semana, sair de madrugada e ficar deitada, só observando aquele espetáculo de cometas.

     – Tem algo mais bonito que isso? - perguntei, sabendo que não obteria resposta.

     Geralmente as pessoas costumavam fazer pedidos às estrelas cadentes, mas eu nunca havia feito se quer um pedido. Talvez por nem lembrar, ou talvez por não acreditar que fossem realizar. Pela primeira vez fechei meus olhos com a intuição de pedir algo. Pedi mentalmente algo, mas ao mesmo tempo comecei a rir. Aquilo não fazia sentido algum.

     Fiquei parada pensando nas coisas que estavam acontecendo na minha vida. Eu já estava com 18 anos e na faculdade de medicina. Não tinha namorado e isso acabava deixando um vazio em mim, principalmente por morar sozinha. Mas o que deixava mais triste, era ter perdido meus pais tão nova. A partir desse momento, só sobrara minha irmã e minha avó. Mas logo minha irmã formou, se casou e foi morar na França com sua marido e tive que deixar minha avó em sua cidade no momento que comecei a estudar.

     Balancei a cabeça afastando pensamentos que fossem me deixar triste.

     Era começo de ano, e só havia uma semana que minhas aulas haviam começado na faculdade. A vida começava naquele instante e eu não sabia ao certo como tudo iria ficar a partir daquela nova fase. Eu estava sozinha no mundo.

     Sorri, como se aceitasse aquele novo desafio.

     Olhei no relógio. Meia hora tinha se passado, e eu teria que voltar para o apartamento. Levantei-me e olhei em meu vestido branco sujo do marrom da terra. Sacudi-o, mas não liguei com a aparência. Continuei a andar em direção do elevador e fiquei surpresa em ver que alguém o usava. Geralmente, naquela hora, as pessoas ainda não estavam acordadas. Comecei a ficar nervosa por saber que alguém iria me ver naquele estado.

     Pensei em sair correndo, mas quem visse iria pensar que sou louca. Então resolvi ficar parada, enquanto observava o elevador abrir.

     Minha mão gelou quando eu vi a figura que estava parada dentro lá dentro. Era um rapaz mais alto que eu, dos olhos verdes e cabelo castanho. Ele vestia terno e tinha no ouvido fones de ouvido no volume máximo, tanto que eu conseguia ouvir a voz do Dave Grohl cantando Best Of You.

     Fiquei parada, completamente petrificada, sem saber o que fazer. Ele me olhava, talvez por causa do meu cabelo bagunçado, minha cara de sono e meu vestido sujo de terra. Passei por ele, que continuou dentro do elevador. O rapaz acompanhou meus movimentos com a cabeça e tirou os fones do ouvido, sorrindo.

     – Bom dia... ou noite. - sua voz era bonita e um pouco rouca. Ele riu quando disse isso.

     – É... bom dia. - sorri de volta. - Foo Fighters... - apontei para os fones. - boa escolha para essa manhã.

     – Ou noite.

     Ri. Havia gostado do jeito como ele conversava.

     Ainda continuava dentro do elevador.

     – Bom, eu tenho que ir. - ele disse erguendo a mão. - Sou Matthew, mas pode me chamar de Matt. Mudei ontem para o apartamento 302.

– Sou Jess e moro no apartamento 303. - sorri devido a coincidência.

Matt ficou me observando como se já me conhecesse.

– Então acho que vamos nos ver mais tarde. - disse olhando no relógio. - Tenho que ir.

Seu sorriso era encantador e eu não pude deixar de reparar no jeito como ele andava. Sorri sozinha, esquecendo da minha aparência ridícula. Parei em frente ao meu apartamento e abri-o. Entrei no banheiro e entrei no chuveiro. Precisava voltar a dormir.

*

Acordei 8 horas da manhã com o despertador tocando ao som de Stand By Me. Sorri ao ouvir a música e logo me lembrei de Matt, o garoto que havia conhecido a poucas horas atrás. Balancei minha cabeça como se afastasse aquele pensamento.

– Não, não quero me iludir. - sussurrei.

Devagar, levantei da cama. Não teria aula aquele dia, mas precisava estudar. Medicina realmente não era fácil, mas era o que eu gostava de fazer. Parei em frente ao espelho e fiquei observando meus cabelos escuros. Passei a mão por eles e sorri. Estavam perfeitos. Fazia tempo que não ficavam tão lisos e tão comportados.

Me dirigi ao guarda-roupa e abri-o procurando uma roupa para ir comprar algo para comer. Peguei uma blusa preta de renda e um short jeans e os coloquei rapidamente. Fiquei nas pontas dos pés, tentando alcançar uma caixa no alto do guarda-roupa, onde acharia algumas pulseiras. Todo o esforço foi em vão. Não conseguia alcançá-la, mas consegui pular e puxá-la. Com toda a força, ela veio a cair em cima de mim. Mas me afastei, fazendo com que ela caísse no chão.

     O barulho foi imenso. Logo, todas as coisas dentro da caixa estava espalhadas pelo quarto, inclusive fotos. Fotos que eu nem mais lembrava que existiam. Me inclinei tentando catá-las e sorri ao ver fotos com minha irmão, meus pais e... um garoto.

     Apoiei a foto contra o peito fechando os olhos. Pude voltar a ter a mesma dúvida de anos atrás.