Édipo escrita por LFrinhani


Capítulo 10
No escuro da noite




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Assim que minha consciência foi levada entrei em um sonho perturbador, que pode ter sido o resultado do dia que havia levado ou do maldito livro que tinha lido. Primeiro era escuridão, só havia o som da minha respiração alterada como se tivesse acabado de correr uma maratona, depois se tornou possível ver minhas mãos, estavam cobertas de sangue e minha mão direita segurava uma espada também com sangue, logo após consegui ver meu corpo, estava com vestes estranhas que também tinham manchas. Mas de quem era esse sangue todo?

Foi então que vi a fonte de todo aquele sangue. Meu pai estava morto sob meus pés, estava completamente retalhado, provavelmente pela espada que se encontrava em minha mão, o que me levou a seguinte conclusão: eu havia feito aquilo. Eu teria tirado a vida do meu próprio pai e o motivo estava bem na minha frente, Misaki olhava para mim sorrindo do seu jeito habitual, ela se aproximava rapidamente, estava tão perto que poderia toca-lá.

– Yuu-Kun... - Ela chamava meu nome docemente.

– Misaki...

Não resisti a tentação de sua aproximação, estendi a mão e toquei seu rosto passando o polegar por sua boca, ela parecia tão macia e tão convidativa que nem pensava mais no estado de meu pai sobre meus pés, a única coisa que conseguia pensar era em cometer aquele pecado, aproximei mais meu rosto do dela quase selando nossos lábios.

– YUU!

Abri os olhos imediatamente. Não havia sido um sonho, Misaki estava mesmo ali sentada na beirada da minha cama, enquanto eu já com o tronco erguido segurava seu rosto a milímetros do meu, era possível sentir sua respiração batendo em mim, nossas bocas estavam tão próximas que por muito pouco o beijo não havia realmente acontecido.

Mesmo após ter acordado permaneci assim até que minha consciência captasse de fato o que estava acontecendo, quando me dei conta que tudo aquilo era mesmo real meu primeiro impulso foi de empurrar Misaki fazendo-a cair da cama para o chão.

– Desculpe acordar você Yuu-kun, mas você me assustou agindo daquele jeito estranho mesmo estando dormindo. - Disse Misaki enquanto se levantava lentamente e voltava a se sentar na cama.

Só então percebi que já estava do outro lado do quarto, não sei como consegui me mover tão rápido se considerar o estado em que me encontrava, já começava a sentir que as dores estava retornando, provavelmente o analgésico que Megumi havia me dado começava a perder o efeito. O quarto estava um pouco escuro, talvez por que minhas pupilas ainda não estarem dilatadas o suficiente, mesmo assim era possível ver que Misaki estava de camisola, porém o roupão que usava por cima não permitia ver muito além. Mesmo estando escuro me virei para outro lado, não queria correr o risco dela perceber que estava em um estado alterado.

– Desculpe ter empurrado você. O que você está fazendo aqui? - Foi a única pergunta que passou por minha mente naquele momento.

– Eu estava preocupada com você Yuu-kun, afinal você saiu muito alterado de manhã, só chegou tarde da noite nesse estado. O que aconteceu Yuu-kun? Você andou brigando na rua? - Ela me questionou seria e com tom de preocupação na voz.

– Não exatamente. - Foi o que pude dizer no momento ainda lhe dando as costas.

– Como assim "não exatamente" Yuu? - A mulher tornou a me questionar. - Olhe para mim quando eu estiver falando com você! - Sua voz subiu um tom o que me fez virar imediatamente para ela.

Agora minhas pupilas já estavam ajustadas a escuridão, pude ver a expressão de raiva na face de Misaki, respirei fundo antes de responder.

– Foi uma tentativa de estupro a uma amiga minha, eu só queria ajudar mas acabei apanhando mais do que batendo, ela me levou a casa dela e deu um jeito nas minhas feridas e foi só isso que aconteceu. - Despejei toda a verdade sobre ela que levou alguns segundos para dizer alguma coisa.

– Nossa, tentativa de estupro, Yuu-kun você foi muito corajoso, mas deveria ter chamado ajuda. Você e sua amiga estão bem? - Finalizou mudando seu tom de raiva para preocupação.

– Sim, eles não fizeram nada de mais com a gente, eles bateram mais em mim do que nela, ela está bem também.

– Mas por que ela não levou você para um hospital?

– Por que não quis ir. Não se preocupe, ela me examinou e disse que não havia quebrado nada.

– E ela sabia como se examina uma pessoa?

– Sabia. - Teoricamente.

– Ah Yuu-kun, você não deveria me preocupar tanto assim, já não sou mais jovem, meu coração não está tão forte como antes.

– Está se preocupando atoa, não tinha necessidade, eu não sou mais criança, nem seu filho eu sou.

– Não diga isso Yuu! Por favor! Sou casada com seu pai, faço parte da sua família agora. Você não sabe o que eu daria para poder ter um filho Yuu, esse é o meu maior desejo.

– O que você quer dizer com isso? – Perguntei ainda tentando digerir o que havia acabado de ouvir.

– Eu sou estéril Yuu, não posso ter filhos. – Ela respondeu com uma voz chorosa, mesmo que não parecesse estar chorando. – Muitos homens me rejeitaram por causa disso, não é atoa que só me casei agora com 38, seu pai foi o único que me aceitou assim, seca por dentro. – Ela falava enquanto brincava com a barra do roupão na mão sem me encarar de fato. – Eu já sofri demais Yuu, saber que não poderia gerar filhos e ainda por cima não ter ninguém que me amasse dessa forma era demais pra mim, se não fosse ter conhecido Toshi eu não sei o que teria sido de mim, ele é um homem muito bom e eu o amo muito Yuu, não tenha duvida disso. Quando Toshi me contou que era viúvo e que tinha um filho, não demorei muito a me lembrar de você.

Ela então ergueu seus olhos para mim, não acho que foi numa boa hora, era possível ver que ela sorria de leve, mas eu provavelmente estava com cara de assustado, até por que eu realmente estava assustado.

– Como assim “lembrar de mim”? O que você quer dizer com isso? – Perguntei demonstrando todo meu descontrole mental com aquela confissão.

– Eu lembrei daquele buque de margaridas que eu dei para o menino chamado Yuu, o buque que eu dei pra você.

Ela havia acabado de dizer que se lembrava de mim, isso significa que o tempo todo ela sabia quem eu era, mesmo ela mesma tendo me contado que ela era a dona da floricultura eu não esperava que ela se lembrasse de mim, na verdade eu já estava conformado com a ideia de que ela havia me esquecido, considerava impossível a possibilidade que ela um dia soubesse que era aquele menino.

– Como? Como você pode se lembrar? – Era o único questionamento que consegui fazer com minha mente ainda em choque.

– Não foi muito difícil ligar os pontos, afinal a noticia da morte da sua mãe se espalhou por toda a cidade, mesmo que eu não a conhecesse ela era muito querida por todos. Um tempo depois a morte dela seu pai começou a frequentar a floricultura onde trabalhava, ele sempre pedia um buque de margaridas e eu sempre fazia igual aquele que havia te dado. Quando ele me mostrou uma foto sua eu lhe reconheci na hora, confesso que fiquei muito curiosa em saber como estava aquele menino de anos atras, Toshi me contou que você estava morando com a irmã dele em Tokio já que ele não conseguia cuidar de você por conta do trabalho. Mas eu estou aqui agora Yuu, eu quero cuidar de você, já que não posso ter filhos eu ficaria muito feliz se você me aceitasse como uma segunda mãe, eu não desejo roubar o lugar da sua mãe, eu só quero compartilhar desse sentimento maternal.

Levei um tempo para digerir tudo que ela havia me dito. Misaki havia acabado de dizer que se lembrava de mim, que queria cuidar de mim e que queria que eu a visse como minha mãe. Isso era impossível, já era tarde demais para vê-la como mãe, meu sentimento já era outro, muda-lo agora parecia algo inimaginável, a coisa já tão profunda que seria preciso arrancar meu coração junto para tira-lo de mim. Mas eu não podia desistir, foi então que meu plano veio na minha mente.

– Desculpe, mas eu não te vejo como minha mãe e na verdade não pretendo ver nunca. – Disse olhando fundo em seus olhos tentando passar toda a seriedade que a frase necessitava.

Graças a Deus o quarto estava escuro, ela não pode ver que na verdade meu olhar transmitia dor e sofrimento, foi melhor também por não poder ver bem seu rosto pois sabia que havia realmente a magoado com aquelas palavras. Ela simplesmente se levantou e se retirou do quarto fechando a porta atras dela, fiquei ainda alguns segundos ali parado sentindo meu coração bater pesadamente, fui até a cama e me deitei novamente fitando o teto, porem agora levei as mãos a cabeça. Espero que ela esteja me odiando agora, por que eu estou.


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