O telefone toca de repente.

Suzuno por impulso, ou talvez por estupidez, corre para atende-lo.

-Alô? 

- Me dê isso, ninguém pode te ouvir, seu idiota - falei, tomando o telefone das mãos dele.

Suzuno me olhou com cara feia e então se jogou na cadeira mais próxima. Me virei de costas para ele, evitando qualquer contato físico desnecessário. Algo vergonhoso - um beijo - havia acabado de acontecer, e eu não estava nada acostumado com isso.

- Oi? - falei.

- H-A-R-U-Y-A-C-H-A-N ?! - falou a voz no telefone.

- Quem diabos é você?

- Hiroto, oras!

- Sua voz fica 100 vezes mais irritante..

- A sua parece de uma criancinha...

- SEU MALDITO.. O QUE VOCÊ QUER?

- Ah, eu só quero saber como foi..

Eu não podia vê-lo, mas tive certeza de que Hiroto estava sorrindo "malditamente" malicioso do outro lado da linha.

- COMO FOI O QUE? NÃO FOI NADA.. - gritei para o telefone.

Suzuno sussurrou alguma coisa. Ignorei.

- Hãaãã? Como assim não foi nada? Vocês não conversaram sobre AQUILO ?

- Aquilo? AQUILO? DO QUE VOCÊ ESTA FALANDO?

- Af, estou tentando perguntar se você falou para Suzuno que você gosta dele..

Fiz uma careta, virando a cara para a parede, quebrando qualquer possibilidade de Suzuno ver meu rosto, mesmo que tentasse.

- O QUE? PORQUE EU FALARIA ISSO?

- PORQUE VOCÊ GOSTA DELE ORAS..

- Você é idiota, eu nunca falaria isso.. me deixa em paz..

- Você esta tão nervoso.. você falou né? Vocês se beijaram?!

Soltei um grunhido nervoso e desliguei o telefone com forma.

- O que foi? - perguntou Suzuno, tranquilamente.

- N-NADA..

- Então porque você esta tão nervoso?

Não olhei para ele.

- Não é dá sua conta! Este é um telefone particular..

- Telefone particular seria se fosse um celular.. se não é um celular, é um telefone da casa..

- Então, continua não sendo da sua conta.

- Se é um telefone da casa, é claro que é da minha conta, uma vez que agora eu praticamente moro aqui.

- O que? Que besteira!

Sai da cozinha bufando. Só virei para Suzuno quando eu já estava na escada, longe o bastante para ele não notar qualquer vermelhidão ou coisa do tipo que eu PODERIA ter no momento.

Ele estava sorrindo sugestivamente. Aquele pervertido.

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Enquanto isso, Hiroto caminhava em direção a casa de Midorikawa, segurando seu celular na mão e fazendo caretas.

- Oh, porque esse idiota desligou na minha cara.. porque as coisas tem que ser tão complicadas, Haruya? - perguntava ele, para o nada, é claro. Porque eu não estava lá, com ele.

Ele suspirou e apressou o passo, chegando na casa do verdinho rapidamente, e tocando a campainha.

Midorikawa demorou para atender, como sempre.

- Hiroto.. - falou ele, ao abrir a porta e fazer sinal para o ruivo entrar.

- Mido-chan, tudo bem? - perguntou Hiroto, entrando.

- Sim, né? O que foi?

Hiroto fez uma cara manhosa.

- Como assim "o que foi"? Tem que ter "ido" alguma coisa para mim te visitar?

Midorikawa o olhou suspeito, e um pouco sem jeito.

- Bom.. não. - respondeu.

Os dois garotos foram para o quarto - de Midori, é claro. Era um pouco menor que o meu, mas tinha uma decoração mais agradável e não era tão vazio. As paredes eram de um tom verde agradavelmente suave.

Ryuuji sentou-se na cama, e Hiroto fez o mesmo, mas, um pouco distante.

- Ryuuji, eu falei com Haruya - começou Hiroto, num tom sério.

Ryuuji o olhou um pouco intrigado. Ah, esqueci de mencionar, mas, POR ALGUMA RAZÃO, Hiroto só chamava Midorikawa pelo primeiro nome quando estavam sozinhos, ao contrário do que fazia comigo e Fuusuke (quando ele via Fuusuke, pelo menos).

- Falou com aquele doido? O que tem isso? - perguntou o garoto, um pouco bravo.

- Bom, conversamos sobre Suzuko..

- Acho que é Suzuno..

Hiroto fez uma careta.

- AAH, Suzuno, tudo bem.. falamos sobre ele.

- ELE? Ele quem, Hiroto? Não tem nenhum ELE Suzuno.. isso é alguma idiotice do Nagumo.. - Ryuuji parecia um tanto incomodado.

Hiroto suspirou. Ele sabia que seria complicado fazer Midorikawa mudar de ideia. Assim como Fuusuke costumava a ver, Ryuuji era incrivelmente teimoso.

- Escute, Ryuuji. Eu não vou dizer que você esta errado em desconfiar de Haruya, mas.. eu realmente acho que ele esta falando a verdade.. aliais, eu tenho certeza!

- Ah, é? Explique-me o porque..

Hiroto se ajeitou, ficando com as costas retas e se virando para Midorikawa, tentando fazer-se parecer mais sério.

- Porque.. bom, eu vi como Haruya fica, por causa de Suzuno, eu não acho que ele ficaria daquele jeito.. se não fosse algo importante.

Ryuuji arregalou os olhos.

- O que? Você notou que estamos falando de Nagumo Haruya e um cara que supostamente é invisível ? De que "jeito" você se refere? Ao jeito que ele fica parecendo um babaca tentando fazer a gente acreditar nessa bobagem?

Hiroto deu outro suspiro. Sim, vai ser difícil convencer Midorikawa. Ele é como o grande chefão do jogo. É tipo quando você já passou por todos os obstáculos e esta confiante, e então você dá de cara com o vilão final, grande e poderoso, e você simplesmente não tem HP suficiente para sobreviver a batalha, mesmo assim..

Você tenta.

Ok, foi uma comparação um pouco tosca.

- Acho que não vou conseguir convencer você conversando - falou Hiroto, meio desanimado.

- É, realmente, você não vai - Ryuuji fez uma careta, como se dissesse "Eu sou um cara difícil".

- Então vou ter que tentar de outra forma..

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- Oh, por favor, não..

Suzuno estava me abraçando em minha cama. Desculpe, eu não sei explicar como isso aconteceu, eu estava distraído demais falando sobre  Hiroto.

- Porque está tão nervoso, Haru-chi ? - sorria ele.

- Seu idiota, você esta zoando com a minha cara?

- Não, eu apenas.. tentando uma aproximação.

- O QUE? Não se aproxime!

Empurrei ele para fora, com toda minha força. Em questão de 40 minutos, Fuusuke saiu de "eu tenho vergonha de falar que gosto de você" para " eu quero agarrar você".

- E NÃO ME CHAME DE HARU-CHI!

- Porque? - perguntou ele, sério, sentado no chão, no mesmo lugar onde ele havia caído.

- PORQUE..PORQUE NÃO ORAS.. ISSO É MUITO..

- Íntimo ? - novamente o sorrisinho.

Virei a cara para a parede.

- Você ainda esta com vergonha? Ah, como você é bobo.. - começou ele - não precisamos fingir que não sentimos nada um pelo outro agora..

- Você está confortável demais, agora.. você não acha?  - olhei para ele desconfiado.

- Acho que porque eu já desconfiava, por alguma razão.. agora que eu penso sobre isso..

- COMO ASSIM? VOCÊ É DOIDO..

- Não sou.

- É SIM, VOCÊ É UM DOIDO INVISÍVEL, FIQUE LONGE DE MIM..

Ele se levantou, ainda sorrindo.

- Haru-chi, me deixe acabar com sua vergonha.

Corei violentamente, assustado.

- O QUE? SEU PERVERTIDO, FIQUE LONGE.. EU RETIRO TUDO O QUE EU DISSE, EU NÃO GOSTO DE VOCÊ.

Ele riu.

- Cara, é tão legal te fazer passar vergonha.. eu nunca imaginei que eu mesmo seria o melhor caminho para fazer isso com você.

- Desgraçado.. - me levantei, dando um empurrão nele e saindo do quarto.

Suzuno foi até a porta, ainda se divertindo.

- Eu estava brincando, Haru-chi, volte aqui.. eu quero dizer Haruya!

- Cala a boca - eu estava descendo as escadas.

- Haruya-sama? Hahaha

- Seu idiota.. - gritei de volta.

Só então eu notei Osamu parado no final da escada me olhando como se eu fosse uma espécie de aberração demoníaca.

Parei, sem saber o que dizer.

- O que você.. ? - ele tentou falar alguma coisa.

Bufei.

- Não fale nada, ok? - comecei, enfezado - Há um cara invisível e altamente perigoso, pervertido e provavelmente megalomaníaco no meu quarto.. então.. NÃO FALA NADA!

Passei esbarrando nele e fui para a cozinha, pisando o pé no chão. Ele me seguiu com o olhar, completamente espantado.

Suzuno desceu a escada logo depois.

- Haruya, eu acho que ele vai ter um treco - disse o albino, sem muito interesse.

- Deixe ele aí, quem se importa.. apenas não venha pra cá.

- Porque?

- PORQUE EU NÃO QUERO VOCÊ AQUI PERTO..

- Você sabe que ele continua ouvindo você gritando, certo?

- FODA-SE!

Esse provavelmente foi um dia muito agitado. Suzuno acabou indo até a cozinha fazer mais de suas brincadeiras malditas, dizendo coisas vergonhosas, apenas para me ver totalmente sem jeito. Ele parecia amar isso, por alguma razão, aquele desgraçado.

Osamu acabou saindo de casa. Ele provavelmente foi a igreja ou em algum lugar que ele acreditasse que acalmaria sua alma. Bom, enquanto ele não tentasse matar ninguém em algum colapso mental, ou saísse por ai pensando que é um alienígena do mal que destrói as pessoas com uma bola de futebol, estava tudo bem sobre o assunto.

Ao cair da tarde, eu estava jogado no sofá vagando pelos canais idiotas da tv. Enquanto isso, Suzuno estava sentado no chão, onde havia um tapete um tanto confortável, e morria de tédio. Não tínhamos planos para aquele dia... ou melhor, eu não queria falar com Hiroto. 

Tudo bem que nós tínhamos que dar um jeito de fazer Suzuno "existir" de novo, mas um dia a mais ou outro a menos não faria muita diferença, né? Hiroto provavelmente me perturbaria o tempo todo com coisas românticas idiotas, e Midorikawa não queria me escutar nem nada.

- Fome - falou Suzuno de repente.

Eu jurava que ele havia adormecido, uns 10 segundos antes.

- Vá comer alguma coisa, oras..

- Não tem nada que preste na sua casa..

- Ótimo, então vá procurar outra pessoa para perturbar.

- Eu poderia ir ver se Heat tem alguma coisa.. a dispensa dele parecia mais cheia..

- Hã? Então vai.. quem liga..

Suzuno virou a cabeça para mim, um tanto sugestivo.

- Você liga, tanto que foi me buscar hoje cedo.

Fiz uma careta e não olhei para ele, diretamente.

- Isso não quer dizer nada demais..

- Ah, é.. me diga o que quer dizer então..

Joguei uma almofada na cara dele.

- Para com isso! - gritei.

- Isso o que?

- VOCÊ SABE.

- O QUE?

Dei um suspiro. Estava impossível falar com Suzuno aquela tarde.

- Haruya.. - ele deitou o travesseiro no colo, depois de um tempo - eu estive pensando que..

Alguém bate na porta.

- O que você ia falar? - perguntei, desligando a tv.

- Nada, eu falo depois.

Balancei a cabeça e me levantei para abrir a porta.

Era Hiroto, é claro.

- Hi, Haruya-chan - falou ele, dando um sorriso amistoso. 

Eu quase..MAS QUASE.. fechei a porta na cara dele.

Kiyama Hiroto entrou sem nem se quer ser convidado, e já foi direto para o centro da sala, olhar em volta para tentar ver qualquer vestígio de Suzuno Fuusuke.

- O que você quer? - perguntei, mal humorado, cruzando os braços.

- Eu vim ver como vocêS estavaM - falou ele, ainda procurando - Onde esta Suzuno?

- Estou aqui - falou Suzuno, levantando a mão, desanimado.

- Esta ali - falei, apontando, desanimado.

Hiroto olhou. Claro, ele não viu nada, mesmo assim, se abaixou onde Suzuno estava para falar com ele.

- Aaah, como eu queria PELO MENOS escutar você - falou ele, fazendo uma cara triste.

- Diga logo o que você veio fazer aqui - falei, já de saco cheio.

- Hei, é assim que você me trata depois de eu ter ficado ao seu lado? - perguntou Hiroto, fazendo uma cara de mal.

- Que ingrato - Suzuno falou.

Fiz uma careta ainda mais terrivel do que qualquer outra, para os dois.

- Eu só vim ver como estavam.. e também, para dizer uma coisa.. - falou Hiroto.

- O que é? - perguntei.

- Eu acho que sei o que posso fazer para Ryuu..quero dizer, Midorikawa, começar a acreditar em Suzuno.. ou pelo menos, fazer ele escutar a gente.. - falou o ruivo, que não sou eu, se levantando.

Eu e Suzuno arregalamos os olhos para ele.

Ele arranjou um modo de fazer aquele jegue teimoso escutar? 

- Como?

Ele pareceu sem graça.

- Bom, é apenas uma teoria, na verdade.. mas talvez dê certo.