O movimento na Arena havia se intensificado, com a chegada de outros agentes de campo e treinadores. Rostos conhecidos a Kat, que convivia com as mesmas pessoas desde que tinha 14 anos. Seu treinamento, no entanto, não havia acabado. Depois de uma intensa prática de combate com Sargento, ela iniciou seu treinamento de resistência.

Pedalando na bicicleta ergométrica, Kat sentia o suor pingando quente pela sua nuca. Ela respirava e inspirava controladamente, mantendo o foco em seu exercício. Contudo, mesmo estando mergulhada no ritmo eletrônico que pulsava de seus fones, algo a chamou a atenção.

Levantou seus olhos para a escadaria de concreto da Arena, e soube quem a havia chamado. Julie. Os cabelos cacheados loiros como ouro estavam presos em um rabo de cavalo, mas o penteado não evitava que seus cachos balançassem conforme descia as escadas, indo em sua direção. Ela tinha o sorriso brincalhão costumeiro nos lábios, e aproximou-se de Kat quase saltitando pelos aparelhos de ginástica.  

Kat abriu um sorriso discreto quando a viu. Nem acredito que Julie possa ser cinco anos mais velha que eu. Parece ter treze anos! No entanto, Kat admirava o bom humor de Julie, mesmo que seu otimismo exagerado pudesse irritá-la às vezes.

– Adivinha quem vai ser homenageada no Baile de Honra em Washington? – Julie perguntou, em uma tentativa fracassada de tentar conter sua animação e manter a voz baixa. – Você!

Já vi que não vou poder continuar a pedalar. Droga, estava quase batendo meu recorde! Kat diminuiu a velocidade do aparelho até parar por completo.

– Quem te disse isso? – Kat perguntou, um tanto desinteressada no assunto, alcançando uma toalha para enxugar o suor.

– Tive uma reunião com os diretores agora à pouco, e eles não paravam de comentar sobre você! Kat, você tem cem missões bem sucedidas no seu histórico, e você mal tem dezenove anos! – Julie empurrou-a de leve com o braço, brincalhona. – Fique orgulhosa, garota!

Kat riu diante do entusiasmo da amiga.

– Você também vai para o Baile, não é? – ele perguntou, mudando um pouco o foco do assunto. Não gostava de ser o centro das atenções, pois nunca sabia o que responder a elogios.

– Sim, vou representar o Departamento de Simbologia da agência. – As meninas começaram a caminhar distraidamente por entre os aparelhos. – E já tenho um par!

– Ah, não me diga, – Kat rolou os olhos, fingindo não se dar conta do sucesso da amiga entre os homens. – Aquele cara da Divisão Internacional te chamou para ir com ele?

– Aquele é águas passadas, amiga! – Julie riu, passando a mão pelo cabelo preso. – Quando me mandaram para Chicago mês passado, conheci um capitão da Marinha chamado Reed. Um tremendo gato!

Mesmo se divertindo com Julie, Kat notou pelo canto dos olhos alguém que não combinava com a atmosfera atlética do lugar. Ela reconheceu de imediato o secretário de Melbourne, com seu terno azul marinho se aproximando com um Ipad na mão. Ele andava com passos rápidos na direção das duas, ao mesmo tempo que tentava esquivar-se de agentes suados que lutavam ali perto.

– Fala, Jim! – A desenvolta simpatia de Julie estendia-se a todos, sem exceções. – Qual é a boa?

– Senhorita Scott, senhorita McVeith, – ele cumprimentou as duas, inclinando levemente a cabeça. – Senhorita McVeith, o senhor Melbourne quer vê-la imediatamente em seu escritório.

O formalismo excessivo de Jim às vezes era motivo de piada entre alguns agentes, mas Kat sempre o respeitou por isso. Ele ainda era novo, não podia passar dos 25 anos. Assim que entregou o recado, Jim pediu licença e voltou aos seus afazeres.

– Tenho que ir, Julie. – Kat disse, já afastando-se em direção às escadaria. – A gente se vê depois, ok?

– Não se esquece que vamos sair para comemorar hoje à noite!

Retornando ao andar superior, Kat caminhou de volta ao centro de operações, onde alguns analistas já haviam retomado seus postos de trabalho, e dirigiu-se pelo corredor da Diretoria. Passou por algumas salas de conferencia até encontrar a porta de vidro onde se lia:

Jonathan Melbourne

Diretor

Com seu Ipod em mãos, ela bateu a junta dos dedos contra o vidro, indicando sua presença. O senhor impecavelmente vestido em seu terno escuro indicou para que entrasse.

O suave aroma de madeira e eucalipto da sala já era familiar à garota. Tão familiar como se fosse a colônia de seu próprio pai. E era de certa forma assim que se sentia em relação ao homem sentado à sua mesa de vidro. Os cabelos curtos porém volumosos de Melbourne já estavam completamente brancos, e algumas rugas teimavam em demarcar ainda mais sua pele. No entanto, seus olhos azuis ainda continham a seriedade e o compromisso que imprimiam respeito absoluto em sua responsabilidade.

– Olá de novo, Mel. – Kat aproximou-se para tomar o assento a sua frente. As persianas atrás da cadeira de Melbourne estavam parcialmente fechadas, e ela pode observar o Centro de Comando pela parede de vidro. – Mandou me chamar?

– Sim, McVeith, mandei. Temos uma nova missão para você.

Imediatamente, o semblante de Kat tornou-se sério. Ela não brincava em serviço.

– No entanto, quero antes de mais nada a parabenizar pelo feito de ontem. Os diretores ficaram muito satisfeitos em tomar conhecimento de sua conquista.

Ela abriu um meio sorriso, e apoiou-se no encosto da cadeira de couro.

– Pensei que o senhor já tinha me dado os parabéns com as rosas no meu quarto.

– Quais rosas? – Melbourne havia se abaixado para abrir uma das gavetas na escrivaninha, e disse sem dar muita importância ao assunto. – Não me lembro de ter mandado alguém para deixar rosas no seu apartamento.

O quê...? As sobrancelhas de Kat se arquearam com surpresa, mas quando viu que Melbourne havia colocado uma ficha amarela sobre a mesa, colocou suas indagações de lado.

Sobre a fina pasta cor de mostarda, havia um pequeno envelope branco. Melbourne entregou-o para ela.

– Seu convite para o Baile de Honra no próximo sábado. – Tomando-o em suas mãos, ela viu as promessas de Julie tornando-se verdadeiras. Ela virou o macio papel branco em suas mãos, e passou o dedo pelo selo presidencial. – O próprio presidente do Departamento de Segurança Nacional irá entregar a medalha de consagração aos agentes prodígios deste ano.

– Fico muito honrada, senhor.

– Bom. – Ele tomou nas mãos a ficha amarela, e girou para que ela pudesse dar uma olhada. – Agora vamos a sua 101º missão.