Sem dúvida, o templo da água foi o mais difícil que ele enfrentou. Link deduzira ter ficado um dia inteiro lá dentro. Ele estava faminto, com vários pequenos cortes abertos pelo corpo, ensopado até os ossos e com os dedos insensíveis de tão enrugados – a túnica permitia que ele respirasse na água, nada mais. Parte do seu cansaço sumiu ao ser teleportado para a câmara dos sábios, mas ainda assim, só conseguiu prestar atenção em metade do que a Princesa Ruto disse. Algo sobre agradecer Sheik por ter salvo a vida dela, e muita conversa de amor e casamento que ele definitivamente não ligava. Perguntaria à Navi se houve algo importante além disso depois.

Enfim, o mesmo “tubo” de luz estava o levando de volta para o Lago Hylia. Ele pôde ver, antes de seus pés tocarem o chão, a água do lago voltando lentamente. E uma voz conhecida, falando mais consigo mesma:

- Enquanto a água sobe, o mau está sendo extinguido do lago... Link, você conseguiu!

Assim que pôs os pés no chão, Link pôde ver Sheik, não muito longe dele. Correu ao seu encontro, surpreso e sem nem pensar o que faria direito. Tinha muitas perguntas. Lembrou-se então do que a princesa Zora pediu.

- Sheik! – disse Link - A Princesa Ruto... Pediu pra te agradecer.

- Ruto quis me agradecer? Entendo... Devemos devolver a paz à Hyrule para o bem dela também, não é?

Sheik estava falando menos formalmente agora. Sua voz soava menos máscula, também. O misterioso homem fez um movimento amplo, indicando o lago, e continuou:

- Olhe isto, Link... Juntos, você e a Princesa Ruto destruíram o terrível monstro! Novamente, o lago está cheio de água pura. Tudo está como deveria ser.

Link se aproximou mais do misterioso Sheikah e ambos ficaram observando a paisagem do lago. O coração do jovem heróis batia mais forte agora. Ele piscou duas vezes para limpar a mente e preparar suas perguntas, ao passo que parecia que Sheik não iria desaparecer desta vez. Ledo engano.

- Sheik... – disse Link, virando-se para onde o homem estava antes. Porém, agora nada estava lá.

- Sheik, apareça! – continuou Link, irritado, correndo pelo gramado – Tenho perguntas para fazer! Navi, lembre do nosso combinado, procure ele!

Navi soltou uma pequena exclamação de surpresa ao ser lembrada do combinado e voou alto. Em segundos, a pequena gritou:

- Link, aqui! Na árvore!

Link teve tempo apenas de olhar para cima e ver a expressão assustada de Sheik, antes de este pular de cabeça no lago. Link, irritado, correu para onde o Sheikah sumiu e pulou na água também, esquecendo completamente da fome, cansaço, machucados e dedos ainda enrugados.

O herói avistou Sheik a uns vinte metros de distância, submerso um pouco abaixo e à frente, e começou a nadar com todas as forças que tinha. O outro fez o mesmo.

Ele não pode usar as cegantes Nozes Deku aqui na água, pensou Link vitorioso, nem sair de vista. Eu ainda estou com a túnica Zora, mas ele terá que subir para respirar cedo ou tarde. Tenho vantagem na água, só preciso alcança-lo antes que ele possa chegar em terra firme.

Sheik nadava muito rápido, mas Link, talvez por estar aquecido depois de nadar por um dia inteiro, talvez pela fúria de ser enganado mais uma vez por aquele homem estranho, estava ganhando a corrida.

O Sheikah alcançou a parte rasa do lago e parou por um segundo com pés e mãos no chão para dar um impulso grande e sair de vez do lago, mas não foi rápido o suficiente. Link puxou ambos seus tornozelos, fazendo com que o de olhos vermelhos caísse. Sheik correu de forma desengonçada até a margem, usando também as mãos, mas Link já estava de pé, meio curvado, e puxou o “inimigo” pelo ombro, virando-o de barriga para cima, deitado no chão, logo em seguida ajoelhando por cima dele, segurando as pernas dele com suas próprias, e prensando os pulsos dele no chão com suas mãos.

Houve um pequeno segundo onde ninguém havia processado o ocorrido, havia apenas um Link ofegante e sorrindo vitorioso em cima de um Sheik de sobrancelhas franzidas. Então, ao respirar para começar suas perguntas, Link notou como os pulsos de Sheik eram finos, o que era estranho. E ao olhar melhor, Sheik estava estranho. Sua roupa, antes bem justa, estava larga em alguns pontos. Tinha braços mais finos, ombros estreitos, cintura mais fina e... seios? Link olhou para o rosto do estranho homem – ou mulher? – e seus olhos agora eram azuis. E seu rosto era ainda mais familiar.

A mulher, ao encontrar os olhos do Herói do Tempo, ficou com uma expressão de profundo pavor, e seu rosto enrubesceu. Link podia sentir seu próprio rosto corando, e seu coração batendo mais depressa. Lentamente, ele soltou um dos pulsos dela. Não houve reação. Então, ele usou a mão livre para afastar o pano branco que cobria o rosto dela. Com esforço, conseguiu apenas dizer:

- Z- Zelda?

Ela apenas continuava a olhar com espanto. Link tentou novamente:

- Zelda, é-é você mesmo? O que você faz aqui? Cadê o Sheik?

Ela engoliu em seco e falou, com uma voz baixa e assustada, mas ao mesmo tempo irritada:

- Por que, por que você me seguiu? Havia um motivo para eu ir embora rápido toda vez...

Aquela voz. Aquele olhar. Sem dúvida, era a Zelda. Muito diferente da Zelda que Link conheceu em sua infância, mas ele tinha certeza de que era ela.

- Zelda, você podia ter me falado... – disse Link, em um tom carinhoso, mas um pouco triste – se eu soubesse antes...

- Não! – respondeu Zelda, agora irritada – Eu tinha uma missão! Você não podia saber que era eu! Eu estou me escondendo de Ganondorf, ele não pode saber que estou viva!

- Mas eu te protegeria! – gritou Link em resposta – Eu perdi 7 anos da minha vida para te proteger, proteger esse reino, e você duvidou que eu faria isso mais uma vez?

Zelda se calou. Ela sabia que era mais do que isso, que ele não podia protegê-la agora, mas se comoveu mesmo assim. Só pôde sussurar:

- Link...

Link não pensou. Apenas tocou o rosto macio da bela dama, com os dedos ainda enrugados, e se curvou em um beijo.