Nascido Do Sangue escrita por Viúva Negra


Capítulo 7
Na Escuridão da Noite




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Em uma tarde, o adolescente estava trabalhando na ferraria. Usava um pesado avental que ia do pescoço aos tornozelos combinando com um par de luvas longas até os cotovelos, os cabelos compridos atrás das orelhas para que nem um mísero fio o distraísse enquanto golpeava fortemente um pedaço de ferro com um martelo dando-lhe um formato pontiagudo.





Suas lindas safiras tão brilhantes e delicadas estavam atentas ao trabalho que não era fácil, golpes sucessivos e que exigiam uma enorme força bruta sobre um metal que expelia lascas alaranjadas e incandescentes que caíam ao chão e como estrelinhas cadentes se apagavam. Aos poucos algo ia surgindo, a paciência era fundamental, o cansaço não podia vencer e as habilidosas mãos que seguravam e batiam e não podiam parar.

Um rapaz aparentando ter a mesma idade que o jovem entrara no lugar, seus passos foram silenciosos ou apenas a concentração de Damian era grande para que não percebesse a presença do outro, este dissera com um largo sorriso no rosto:

___ Como vai, Damian?

O belo par de safiras direcionou-se para a voz que ouvira e o jovem respondeu:

___ Tristan, o que faz aqui?

Tristan ao se aproximar do amigo, sussurrou:

___ À noite vamos nadar no lago, quer vir também?

___ Ah não sei se devo, há muito trabalho a se fazer aqui e...

___ Ora o que é isso, Damian?! Você trabalha muito todos os dias e quase se esquece dos seus amigos, vamos! Só esta noite.

Tristan tinha um excelente poder de persuasão, o tom de sua voz animada e um pouco alta causava a impressão de que apenas com uma breve lábia poderia conseguir o que bem quisesse, como se o mais cordial cumprimento fosse uma solene ordem na qual puniria quem não a cumprisse. Após alguns segundos de silêncio, a expressão pensativa de Damian mudara e um sorriso se abrira em seu ebúrneo rosto ao responder:

___ Tudo bem, eu vou.

___ Mas que ótimo, prietenul meu¹, irei avisar aos outros! Até a noite.

___ Até.

O amigo saiu em disparada do estabelecimento e ao mesmo tempo Ionel viera dos fundos do lugar indagando:

___ Então vai sair para nadar esta noite?

___ Ah, tata², se o senhor achar que não devo ir, eu...

___ Está tudo bem, fiu³, é claro que pode ir. Você tem trabalhado tanto aqui, seria mais do que justo relaxar um pouco.

___ Mersi, tata! ___ respondeu o garoto sorrindo.

Depois daquele momento, o tempo parecia não querer passar, o trabalho tornara-se mais estressante, rapidamente o garoto queria terminá-lo, golpes desferidos mais rapidamente sobre um canto avermelhado de um minério bruto, o suor escorria por seu rosto, o lugar estava fervendo enquanto mais e mais lascas se apagavam ao tocar o chão.

Ao cair da noite, ambos estavam fechando as portas da ferraria com correntes e cadeados. Ionel deu um abraço no rapaz e disse:

___ Cuide-se bem, fiu, avisarei à Irina que chegará mais tarde.

___ Tudo bem, tata, noapte bună.

___ Noapte bună, meu garoto.

Damian ia caminhando pelas ruelas escuras do vilarejo, a única coisa audível era o som do vento beijando as folhas das árvores e o estremecimento dos galhos, por onde passava via as luzes de lampiões iluminando o interior das humildes moradias, aos poucos elas iam se apagando.

O rapaz gostava de andar sobre a noite, sentia-se em paz sem todo o tumulto e ruídos confusos que se tinha durante o dia, a noite era tranquila e misteriosa, ninguém sabia o que poderia encontrar ao virar a esquina era isso que excitava seu corpo e o deixava inquieto quando o sol se punha.

A escuridão era sua protetora, o vazio era seu lar e a lua era sua linda amante na qual fazia amor ardorosamente, não se incomodava de minúsculos olhos brilhantes cercarem-no ao regozijar e suspirar por sua voluptuosa amada. A noite chamava seu nome, por onde passava podia ouvi-la sussurrando e chorando, sussurrando e sorrindo, sussurrando e gritando.

Era tão jovem e sadio, muitas coisas aconteciam dentro de si, fenômenos confusos e inexplicáveis, as mudanças o deixavam pensativo e assustado, num minuto uma fúnebre dor o invadia dilacerando seu coração no outro uma espantosa alegria parecia que ia explodir de dentro de seu peito fazendo-o partir-se em mil pedaços.

Na escuridão da noite ele tinha paz para organizar seus pensamentos, vagando como uma alma perdida em busca de uma resposta para todas as suas inquirições, na noite ele era livre e sentia-se seguro, não conseguia explicar nem para si mesmo de onde vinha esta estranha força que entrava por seus poros apenas quando o dia fenecia aos poucos.

Sentia o atrito das pedras em contato com as solas de suas botas de couro, o barulho que faziam e também o partir das folhas secas ao pisoteá-las a cada passo dado. Tudo era tão calmo, porém os sons eram mais nítidos, o piar de uma coruja, o bater de asas de um morcego, até os roncos dos moradores emanavam das paredes de madeira por todo o adormecido vilarejo.

Damian não temia nada que a noite pudesse oferecer-lhe, todavia, parecia que o jovem não estava sozinho, cada vez que seus pés tocavam o chão em direção ao lago, cada pensamento vago que penetrava em sua mente tão distraída, cada suspiro mórbido, tudo estava sendo acompanhado de perto, devia estar em outro mundo para perceber que não era somente ele que sentia-se seguro entre os braços confortáveis da escuridão.

Depois de alguns longos minutos caminhando por entre casebres de madeira, a civilização terminava onde a natureza iniciava-se, podia avistar grandes árvores frutíferas que escondiam o grande e límpido lago no qual estariam reunidos seus amigos para uma noite divertida em meio às suas águas.


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Notas finais do capítulo

1."Prietenul meu" significa "meu amigo" em romeno.
2. "Tata" significa "pai".
3. "Fiu" significa filho.
4. "Mersi" significa "obrigado(a)".
5. "Noapte bună" significa "boa noite" para despedidas.