Câncer escrita por judy harrison


Capítulo 7
O Vilão apressado


Notas iniciais do capítulo

Todo o dia passou e ela não conseguia mais falar, sorrir, tampouco ingerir mesmo água sem tossir, e o que comia, por mínimo que fosse, voltava. Fui para casa em meu horário, e aquele peso ancorado em minhas pernas voltou. por alguns instantes imaginei que seu estado estava crítico e que talvez ela fosse internada.
Era um presságio. Mas no outro dia recebi o aviso. Bete estava mesmo internada e eu devia ir até lá para ficar com ela.



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–-----Os dias seguintes-------


Depois daquela recaída, Bete não seria mais a mesma, sorridente e conversadeira, não que eu tivesse ali para me aproveitar de uma companhia que para mim era um privilégio. Bete me fez sentir uma coisa diferente, eu percebia que naquela família havia coisas que me faziam bem, no sentido de reflexão. de raciocínio. Eu percebia o modo como Célio, Jonas e David se tratavam e me tratavam, descobri finalmente em cada um uma personalidade totalmente diferente, mas não os distinguia por isso, apenas pela aparência.

Marta estava doente, não chegaria naquele dia para manter a casa em movimento como semanas atrás. Então Bete já estava com suas forças mais vencidas, a sua alimentação estava péssima e eu não fazia mais do que acomoda-la onde ela estivesse deitada. Com o passar das horas daquele final de semana eu já sentia que o primeiro dia de trabalho na casa de Bete fora um sonho que sonhei, que nunca mais se repetiria, mas agora o que eu viveria era um pesadelo onde o vilão era o Câncer, eminente e poderoso, já pronto para fazer aquilo a que veio, por mais que os soldados de Bete lutassem.

Não era mais apenas o silêncio que incomodava. Bete passou a reclamar de dores, mal estar, seu estômago rejeitava todo tipo de alimento, os remédios que ela tomava constantemente já não faziam o mesmo efeito, e seu semblante era triste.

Naquela semana Célio estava lá, me contou que a outra cuidadora havia sido demitida e que precisava de mim por mais dias. Combinamos que eu passaria a trabalhar 2 dias a mais.

Foi na semana seguinte que tudo saiu do contexto. Digo, não devíamos contar nossa trajetória de forma poética? Até mesmo os desatinos deviam soar como poeticos, narrados com paixão... Mas não havia mais poesia. Bete não ia mais falar comigo sobre aquelas amigas de Paris, de seus perfumes, de seus alunos, e de tanta coisa que ainda faltaram para ela me dizer.

Como assim? Eu nem havia começado com minhas perguntas!

Era sábado, Marta estava lá e tomou o café da manhã conosco, conversamos bastante, enquanto a matriarca só escutava, parecia melhor que na última manhã. Mas era só uma brincadeira do vilão de toda aquela história. Logo depois, quando coloquei Bete na poltrona de André Rieu, ela me assustou pra valer, engasgou com um refluxo e perdeu o fôlego, vomitou. Tive vontade de entrar em seu estômago e arrancar toda aquela obstrução, a feri com meu desespero ao encliná-la para o lado, quase enfiei um dedo em sua boca, mas os dentes estavam rígidos, ela estava sufocando.

Como que adivinhando o que estava acontecendo na sala, Alberto apareceu, quando eu já tinha um grito em minha garganta para soltar, e outros vieram também. Aquilo foi muito desesperador, foi um esgasgo que não devia ter acontecido. Não entendíamos o que houve.

Todo o dia passou e ela não conseguia mais falar, sorrir, tampouco ingerir mesmo água sem tossir, e o que comia, por mínimo que fosse, voltava. Fui para casa em meu horário, e aquele peso ancorado em minhas pernas voltou. por alguns instantes imaginei que seu estado estava crítico e que talvez ela fosse internada.

Era um presságio. Mas no outro dia recebi o aviso. Bete estava mesmo internada e eu devia ir até lá para ficar com ela.

Aquele foi o último dia em que Bete sentou-se à mesa com sua filha e comigo, foi o último dia em que ela sentou-se à sala, ou que eu a observava da cozinha enquanto arrumava suas coisinhas.

Os dias naquele hospital foram tristes, cansativos, torturantes para toda a família de Bete e para mim também, mas por ver que aquele vilão vencia cada batalha travada, cada dose, que frustrava cada tentativa de reerguer uma mulher que foi um dia tão forte, tão ativa, tão importante para tanta gente.

Finalmente, exatamente uma semana depois a doutora conversou com David.

– Não há mais o que possamos fazer.


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Notas finais do capítulo

Bete estava internada, e eu aprendi de perto como a vida pode ser maltratada por uma doença



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