O Útimo Jogo - Em Cinzas escrita por Caderno Azul


Capítulo 3
Mentores


Notas iniciais do capítulo

Muito obrigada pelos comentários, gente!
Feliz Natal adiantado e boa leitura :)



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Anaïs soltou minha mão.

A menção de meu nome foi recebida com surpresa apenas por mim. Percebi pelo olhar das pessoas ao meu redor que já esperavam por isso. Os mentores tiveram as reações mais variadas. Johanna Mason lançou um meio sorriso, como se quisesse muito que aquilo acontecesse. Esnobaria também. Katniss apenas me lançou outro olhar inquisidor, talvez quisesse ver algo em mim que justificasse meu destino, que me fizesse merecedora daquilo tudo. Peeta e Beetie se fitaram, incomodados.

Com passos trêmulos, caminhei sentindo que havia um “X” em minhas costas. Eu me sentia um alvo. E agora, qualquer um dos trezes tributos poderia mirar em mim e acertar. Cheguei ao palanque e Effie Trinket me lançou um sorriso solidário. Parei e esperei que a Colheita continuasse.

Repetindo o processo, ela sorteou outro nome e anunciou ao microfone:

–Gregor Scarleet!

O menino franzino de quinze anos olhou para os lados, pálido. Sua mãe havia sido por muito tempo a secretária do meu avô. Aparentemente todos os tributos seriam escolhidos pela sua proximidade com ele.

Antes que Gregor pudesse chegar ao palanque e ocupar seu lugar, uma voz interrompeu aquele processo penoso.

–Eu me voluntario!

Fechei os olhos, não querendo ver o que meus ouvidos já haviam captado. Dive acabara de oferecer sua vida de bandeja.

Ouvi seus passos apressados e senti sua presença ao meu lado, me protegendo como um cão de guarda. Eu devia estar sentindo gratidão, sei disso. Mas já havia mortes demais em minhas costas, eu não poderia arcar com a de Dive. Com a de todos, mas não a dele. Não meu melhor amigo.

Evitei seu olhar enquanto a Colheita continuava. Outros nomes foram chamados numa velocidade vertiginosa. Moira e Routh Cooben, o casal de irmãos e filhos do Chefe de Conselho Pessoal do meu avô, foram chamados. Punt Crane, o filho do antigo programados dos Jogos, também. Winca, sobrinha de Cesar, o apresentador dos Jogos, logo depois. Todos estavam ligados de uma maneira ou de outro ao meu avô e ao Hunger Games. Percebi um padrão se formando. Dive não devia estar ali. Seus pais tinham uma joalheria, aquilo só fez com que o bolo em minha garganta aumentasse.

Ao final do sorteio que me pareceu muito suspeito, Effie exclamou:

–Tributos, conheçam seus Mentores! – A tela atrás de nós ganhou letras e percebi que ao lado de meu nome e de Dive estava escrito: Peeta Mellark.

Discretamente, fitei Dive para captar sua reação. Ele tinha uma expressão preocupada ao olhar para Peeta. Nada foi falado, muito embora eu soubesse exatamente como sua mente funcionava. Tinha ideia do que passava por sua cabeça naquele momento.

Peeta era o mais ingênuo dos sobreviventes, com exceção apenas de Annie Odair que desde sua participação nos jogos tinha a mente perturbada. Agora que Finnick estava morto e ela tinha um filho, eu presumia que sua loucura só teria piorado. Ela não seria uma boa mentora. Mas então, Dive devia achar que Peeta não ficava muito atrás.

E pelo seu olhar, nossas chances não eram boas.

Já eu partia de outra visão. Nossas chances eram inexistentes.

Mas não por causa dos mentores.

Dive se enganava ao fitar Johanna cobiçosamente. Sim, ela parecia letal. Tinha o olhar feroz e o tipo de frieza que nos faltava e seria essencial no Jogo. Mesma em seu olhar indiferente, uma figura poderosa como Katniss garantiria muita visibilidade aos seus Tributos.

E visibilidade significava patrocinadores, que por sua vez, eram nossa maior chance de sobrevivência, todos sabiam disso.

Contudo, no final das contas, estávamos todos ali, enfileirados a espera da morte. Era questão de dias para saber quem iria primeiro e quem restaria para recolher os cacos do que sobrou e seguir com a sua vida. E tudo isso, porque os sobreviventes quiseram assim.

Eles não podiam nos ajudar e o que é pior, eles não o queriam. Nossas vidas estavam em suas mãos, mas eles nos atirariam ao fogo num piscar de olhos. Não significávamos absolutamente nada.

– No que está pensando? - cochichou Dive ao meu lado, interrompendo minha linha de raciocínio. Eu o encarei rapidamente ao perceber que os mentores subiam ao palanque para ocupar seus respectivos postos.

–Nada – respondi rapidamente, tentando sorrir. Nunca falhara tanto em algo.

Peeta ocupou o espaço entre nós dois e delicadamente colocou a mão em meu ombro. Percebi que tinha feito o mesmo com Dive, que olhava abismado com aquela reação.

Tive vontade de me desvencilhar do aperto mas não o fiz. Não por mim, é claro, não havia mais esperança para mim. Mas se algum patrocinador, por algum golpe de sorte, fosse simpatizante de Peeta jamais poderia ver aquilo. Teria que nos ver como uma equipe unida.

Um pranto baixo me tirou a atenção do conflito interno. Winca chorava baixinho do meu lado. Beetie, seu mentor, parecia desconfortável. Ela não era a única que chorava. Várias meninas tinham o rosto enterrado nas mãos. Kiera Brantie, irmã mais nova do Chefe dos Pacificadores e tributo de Katniss, chegou a se jogar no chão, em puro desespero. Sua mentora não moveu um músculo, permaneceu indiferente e imune a sua dor.

Como se o clima não pudesse piorar, Effie Krinket subiu ao palanque com passos vacilantes em seus saltos ridiculamente inapropriados, chegou ao microfone e anunciou em falso tom animado:

– Feliz Jogos Vorazes, que a sorte esteja sempre ao seu lado!

Um silêncio cortado pelo pranto dos tributos atravessou a atmosfera, nos acertando.

Dive estava errado em tentar distinguir os mentores. Não havia diferença. Eles nos quiseram ali. Não iam nos ajudar.

Eu pisquei algumas vezes para impedir que as lágrimas caíssem pelo meu rosto. Uma ou duas me traíram, mas mantive o rosto firme. Ela não se contorceu numa carranca desesperada, minha família estava assistindo. Eu não poderia me dobrar. Não agora, não completamente como Winca.

Aquilo em nada se assemelhava a um evento festivo. Mas então, eu concluí, aquele não era seu propósito.

Quem estava assistindo e quisera a última edição dos Jogos Vorazes, não buscava entretenimento, buscava um banho de sangue.

Nosso sangue.

– Está na hora de partir. - A voz de um homem soou atrás de mim. Mais um dos guardas armados até os dentes.

Aquela ordem me despertou para a realidade. Tal como o aperto de Peeta em meu ombro que me guiava para dentro da sede do prédio.

Virei-me para meu mentor, falando pela primeira vez com ele:

– E as famílias?

Peeta apertou os olhos e pareceu genuinamente ferido ao me responder.

– Dessa vez não. Sinto muito.

Um zunido entrou pela minha cabeça, me impedindo de reagir. Por mais que eu quisesse protestar, apenas caminhei mecanicamente seguindo o comboio. Senti ao longe o aperto de Dive, ao segurar minha mão.

Então eu não podia me despedir da minha família? Eles tinham que tirar isso de mim também? Já não era suficiente? Uma dúvida nasceu repentinamente.

Será que o nosso sangue seria suficiente para aplacar o ódio e o desejo de vingança no coração de gelo daquelas pessoas?

Olhei de relance para Katniss. Um guarda ao seu lado carregava Kiera aos prantos e gritos. A garota em chamas nem ao menos piscou.

Não, nada seria suficiente para algumas pessoas.

O grupo começava a se dispersar depois de atravessarmos em silêncio a sede e chegarmos ao trem dos Jogos. Muitos deles haviam sido queimados na rebelião e por isso, devem ter achado melhor unir os que sobraram, transformando em um grande trem para todos os tributos e seus mentores. Johanna com seus tributos Moira e Routh ocuparam o primeiro vagão. Katniss, Kiera que ainda se debatia nos braços do guarda e Gybran Henally, sobrinho do antigo Chefe de Segurança dos Jogos, entraram no segundo.

Fomos designados ao terceiro.

Entrei em nosso vagão, logo depois de Peeta e Dive. Dois guardas entraram em nosso encalço. Certamente estavam ali para garantir a segurança de nosso mentor, não a nossa. Como se nós dois estivéssemos em condição de atacar alguém.

Foi Dive quem falou primeiro:

– Não temos direto nem a uma despedida? – sua voz estava firme e dura, mas eu podia ver que seu autocontrole ruía aos poucos. Talvez começava agora a se arrepender de ter se oferecido.

Peeta mais uma vez, para meu incômodo, parecia ferido com aquelas palavras:

– Sinto muito. – ele nos disse novamente e odiei aquelas palavras.

Eu poderia ter ficado calada. Provavelmente seria melhor. Mas eu já não conseguia me controlar.

– Você não sente nada – sibilei, com raiva. Dive e Peeta me encararam surpresos. Os guardas se mexeram, agitados; Talvez quisessem atirar em mim pelo que eu dissera, mas como aquele não era motivo suficiente, não puderam dar vazão aos seus impulsos.

Peeta demorou alguns segundos para se recuperar.

–Como disse?

Nem esperei para voltar a falar, minha voz verteu inflamada em ódio:

–Não finja que está do nosso lado, que quer nos proteger. Não finja que não é culpado.

Dive me olhou em alerta, num pedido silencioso para que eu parasse com aquilo.

Simplesmente o ignorei.

–Eu entendo a sua frustração. – Peeta voltou a falar, com a voz calma. - Mas se quiser sobreviver na arena, eu sou sua única chance. Conheço as armadilhas dos Jogos, a mente dos Idealizadores, o que atrai patrocinadores...

Interrompi aquele seu discurso otimista que estava dando nos nervos.

–Bom, não importa! – Explodi, causando certo susto aos guardas. - Nada disso importa! Porque a partir do momento que eu entrar naquela arena, já estarei morta!

Dive tentou, em vão, me acalmar:

–Vixen...

–Agora não, Dive. – Ergui minha mão em impaciência para mostrar que aquele não era um bom momento. Era o pior de todos, na verdade. Voltei-me para Peeta que me encarava perplexo. - E a culpa é sua, a culpa é de todos vocês!

A feição de meu mentor se endureceu e quando suas palavras saíram de novo, ele não parecia mais nem um pouco gentil:

–Faça como quiser, Vixen. Não vou perder meu tempo com quem não quer se salvar. – Ele já estava nos dando as costas para entrar no compartimento da frente, mas algo o fez acrescentar antes de sair. – E a propósito, eu votei contra.


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Notas finais do capítulo

Antes achei que não dava tempo, mas o capítulo caiu de paraquedas na minha cabeça e escrevi no celular enquanto estava no metrô...
Muito obrigada para quem está acompanhando e para quem comentou! Muito obrigada mesmo!
O capítulo ficou um pouco maior que os demais, não? Talvez eu mantenha esse tamanho ou fique um pouco maior. Se tiverem sugestões, podem opinar!
Quem gostou ou tem alguma sugestão, comentem. Quero saber o que estão achando da Vixen e da escolha do seu Mentor.
PS: O capítulo ainda não foi betado. Qualquer erro, me avisem!
Beijinhos e até a próxima!



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