Paradoxo Temporal escrita por Vanessa Sakata


Capítulo 11
Entre açúcares, óculos e gorilas




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No cair da noite em Edo, passos apressados ecoavam pelas ruas do distrito Kabuki, parecendo procurar algo ou alguém. Eram os mesmos três Amantos que haviam ido até a Yorozuya confiscar o que Ginmaru possuía. Aproximaram-se do prédio e subiram as escadas sorrateiramente. Um deles, meio réptil, pegou uma espécie de chave-mestra do bolso e abriu a porta corrediça principal, onde não encontraram ninguém.

Aquele moleque malcriado havia desaparecido. Porém, o “carrasco” também desaparecera inexplicavelmente, com a desculpa de terminar um serviço inacabado.

Estaria o Shiroyasha antecipando a conclusão de seu serviço?

Haviam perdido o sinal dele, que portava um microchip implantado em sua fronte. Será que o dispositivo fora danificado? Se isso tinha ocorrido, teriam sérios problemas.

Precisavam informar o ocorrido aos seus superiores.

*

- Ah, que chato... – o Gintoki do futuro reclamou. – Faz dez anos que não boto os pés na minha própria casa e ainda vou continuar sem entrar lá...?

- Pai, não seja chato. – Ginmaru disse aborrecido. – Pelo menos nós temos um lugar pra ficar.

- É verdade – Shinpachi emendou. – porque não podemos ficar onde podemos ser descobertos. Ainda mais vocês três. Não é, Gin-san?

O Yorozuya mais parecia um zumbi de tão acabado, o que assustava seu alter-ego mais velho, que compartilhava o mesmo pavor de coisas fantasmagóricas e cadavéricas com cara de filmes de terror.

- Shinpachi-kun... – disse com voz moribunda e com o estômago roncando. – Acho que perdi tanto sangue que minha crise de abstinência de açúcar resolveu aparecer mais cedo...!

Nisso, a porta se abriu, aparecendo nela Shimura Tae, que continuava com aquele mesmo tipo de sorriso que adorava estampar no rosto. Um sorriso aparentemente inocente que poderia ser até o prenúncio de algo cruel. Porém, não era este o caso, pois a recepção foi tranquila, apesar de um Gintoki do passado ainda parecendo um morto-vivo devido a uma hipoglicemia gerada pela abstinência de açúcar.

A Shimura parecia não ter envelhecido praticamente nada. Pelo jeito, sua cara sorridente ajudara a evitar quase todas as rugas que mulheres de sua idade começavam a exibir. Não estava tão surpresa em ver dois Gintokis, um Shinpachi extra e uma Kagura ainda viva, pois estava inteirada do que ocorria.

Nisso, apareceu seu irmão, que, antes de cumprimentar os “hospedes”, foi surpreendido por um Gintoki se arrastando até agarrar seus pés e fazer com que ele caísse de cara no chão. Constrangidos com a cena que seu “chefe” fazia, os dois companheiros de viagem intertemporal do Yorozuya apenas observavam tudo com cara de “não conheço esse cara”.

- Crise de abstinência de açúcar, Shinpachi-kun. – o outro Gintoki disse enquanto fazia um gesto que há dez anos não executava, o ato de limpar o ouvido com o dedo mindinho. – É que ele perdeu muito sangue me enfrentando.

- Eu já devia imaginar, e... Espera aí! GIN-SAN!!

O Comandante do Shinsengumi ignorou o albino que agarrava suas pernas como um morto-vivo para correr feito um menino e abraçar o amigo, que não via há tantos anos. O Shinpachi mais jovem sorriu ante a demonstração de amizade que acabara de ocorrer. O tempo não era capaz de mudar tudo.

Todos estavam sorridentes, menos um...

- Ei, pessoal...! Cadê meus açúcares de emergência...? Desse jeito eu vou morrer de hipoglicemia...!

... E ninguém ligava para o pobre albino vindo do passado, que rastejava implorando por um pouco de açúcar...

Nisso, uma menina apareceu e literalmente passou por cima de Gintoki, que berrou:

- VAI PISAR NA SUA MÃE, PIRRALHA!

- Não enche o saco, cabelo ruim! – a menina respondeu e mostrou a língua.

- Você xingou o cara errado, “garota-gorila”! – Ginmaru provocou.

- “Garota-gorila”? – Kagura perguntou.

- Aham. – Ginmaru respondeu aborrecido.

- Por que “garota-gorila”?

- Ah, falta de educação a minha! – Tae disse. – Essa é a minha filha Hotaru.

Surpresa geral, exceto para Ginmaru e para o Shinpachi vinte anos mais velho.

“E-Ela conseguiu se casar??”, pensaram.

Os dois Gintokis se entreolharam e, por olhares, se perguntavam quem era o insano a ter se casado com semelhante psicopata.

A garota que parecia um pouco a Shimura fazia caretas sem parar para Ginmaru, que se segurava para não revidar com violência contra uma criança de oito anos. Todos ouviram passos de alguém se aproximando.

- Parece que o papai está chegando, Hotaru. – Tae disse à filha. – Avisa pra ele que temos hóspedes!

- Pode deixar, mamãe!

Instantes depois, os passos eram ouvidos mais nitidamente pela turma que estava curiosa para saber quem fora o corajoso a se casar com Shimura Tae.

- Chegou em ótima hora, Isao-san! – Tae o saudou.

- Isso é ótimo, Otae-chan! – respondeu uma voz bastante conhecida.

O insano que se casara com Tae era o agora “ex-stalker” Kondo Isao. E, claro, o trio Yorozuya, bem como o Gintoki mais velho ficaram abismados.

“E-ELA E O GORILA JUNTOS??”, o Gintoki mais jovem gritou em pensamento. “O que ele fez pra conseguir essa façanha mesmo?”

O outro Gintoki tinha a mesmíssima expressão de seu alter-ego do passado. Onde seria possível um gorila de bunda peluda e assumidamente portador de impotência sexual conseguir se casar e, ainda por cima, ter filhos?

Até conseguir se situar no tempo, pressentia que muitas surpresas estariam por vir.

*

- Ei, ei, por que você vai ficar aí sozinho? Por que não se junta aos outros?

- Você e eu somos a mesma pessoa. Que diferença vai fazer ter um ou dois Gintokis lá?

- Por que essa cara de velho rabugento? – o Yorozuya perguntou.

O Gintoki mais velho suspirou antes de responder:

- Eu ainda não consegui me situar no tempo. Há uma lacuna de dez anos na minha memória, como se eu tivesse passado esse tempo todo dormindo, e... Quando acordo, vejo tudo mudado. Fico com aquela sensação de que eu fiz alguma coisa, mas não sei o que fiz. A sensação é a mesma de uma ressaca após um daqueles porres históricos onde você acorda com uma múmia ao seu lado, em vez de uma gostosona.

- Eu é que não quero acordar com aquela bruxa velha ao meu lado outra vez, sendo armação ou não. – o Gintoki vinte anos mais jovem disse. – Se bem que aqui você não precisa se preocupar com esse perigo.

- Por quê?

- Ginmaru disse que a velha conseguiu morrer faz cinco anos.

- Quem será que tá cuidando do bar?

- A Catherine. Transformou aquele bar em boteco de fumantes.

- Chegou a entrar na Yorozuya?

- Do meu ponto de vista, em vinte anos não mudou nada. O moleque, apesar de desaforado, parece esforçado.

- Pelo jeito não fiz falta pra ele. Soube se virar até agora.

- Aqueles ferimentos dele dizem o contrário.

- Mas você me enfrentou!

- Eu assumi a luta contra a vontade dele e quase comprometi nossas existências.

- Porque eu causei isso tudo.

- Não foi você. Você adormeceu à força na tal guerra e despertaram o seu lado Shiroyasha com um microchip. Alguém te controlava por dez anos.

- Então, enquanto eu adormeci, o meu lado Shiroyasha esteve ativo de forma forçada.

- Com aquele tal microchip, sim. Foi só eu arrancá-lo que consegui te parar.

Os dois, da varanda, olharam para dentro da casa, onde se desenrolava uma conversa animada, uma algazarra que só aquele pessoal era capaz de fazer. O Gintoki mais velho tinha um olhar completamente perdido. Para não ser confundido com sua contraparte do passado, decidira se vestir, de momento, apenas com seu característico quimono yukata branco, que ocultava as bandagens em seu braço direito. Tinha um pequeno curativo na testa, onde ficava o microchip que fora arrancado e era parcialmente coberto pelos cabelos prateados.

Sabia que pertencia a essa linha de tempo, mas se sentia completamente deslocado dela, como se a ela não pertencesse. No passado, nunca conseguira imaginar sua vida sem a Yorozuya de novo. Kagura estava morta e Shinpachi agora era Comandante do Shinsengumi.

Fitou seu eu do passado, que tomava mais uma taça de sorvete Bargain-Dash pra compensar a hipoglicemia que tivera momentos antes. Queria ser como ele de novo, ter aquela cara de despreocupado, pensando apenas no próximo número da Shounen Jump e em abastecer sua despensa de doces. Aturar os gritos histéricos de Shinpachi e ouvir as asneiras de Kagura.

O saudosismo o rondava sem parar, desde que enfrentara seu outro eu.

- Vou lá pra dentro. – o Yorozuya falou. – Você vai ficar aí?

- Por enquanto, sim.

- Vê se não começa a agir como um velho antissocial. Não quero ficar assim daqui a vinte anos.

O albino mais velho sorriu, pois ele também diria a mesma coisa. E era verdade. Não deveria agir como um velho antissocial, nunca fora assim. Nisso, Ginmaru apareceu.

- Não vai se juntar à gente, pai? – ele perguntou. – Vamos lá botar esse vácuo de dez anos em dia!

Ginmaru estava com uma expressão menos sarcástica e aborrecida. Na verdade, estava contente em ver seu pai de volta ali. E isso fazia com que o ex-Yorozuya sorrisse mais uma vez.

- Tudo bem, Ginmaru. – disse enquanto se levantava. – Só espero que aquele gorila não esteja pelado.

Pai e filho acabaram não indo a lugar algum, pois kunais quase os atingiram.

- Não vai a lugar algum, Shiroyasha traidor! – uma voz feminina disse.

Os dois olharam para trás, e o ex-Yorozuya logo reconheceu quem era... E tomou um susto:

- V... Você...?


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