For Amelie - 2a Temporada escrita por MyKanon


Capítulo 29
XXVIII - Uma nova história




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N/A: Oii!

Gente, achei melhor primeiro dar meu recado antes da fic, assim a última coisa que vcs terão na mente ao deixarem seus reviews, será a história, e não meu recado melodramático, he!

Poxa... Chegamos mesmo ao fim. Aproveitem até a última gota!

É claro que não é impossível me dar a louca e postar algum especial, como algumas de vcs já andaram pedindo! Rsrs! Porém, se acontecer, não será tão logo. Vamos deixar os personagens velhos descansarem um pouco, e gastar um pouco os novos, que tal? Rsrsrsrs!

Eu ainda tenho uma fic pra terminar, mas minha cabeça já está fervilhando de ideias novas...

E eu ainda não decidi qual delas vou explorar primeiro, mas uma coisa é certa: será imediato, pois tenho esse problema de picos de impulsividade alternados com períodos de hibernação... E vou aproveitar que estou na lua da impulsividade.

Bem, voltando à fic atual... Uau! Um ano, oito meses e três dias!!

Não foram todas que resistiram bravamente ao tempo, mas muito me orgulho em saber que muitas delas ainda estão aqui! Além de leitoras, ganhei verdadeiras amigas!

Aquelas que chegaram depois também estão incluídas!

Queria muito dizer o quanto amo cada uma de vocês, mas não vou citar nomes para não ser injusta caso alguma leitorina mais reservada seja esquecida.

Mas posso falar de grupos genéricos, rsrsrsrs!

Agradeço àquelas que se emocionaram e chegaram a ir às lágrimas com os altos e baixos da fic...

Agradeço àquelas que ficaram p.... da vida quando eu passava duas semanas sem postar. Mesmo com todas as ameaças! Rsrsrsrsrs! Sério, me diverti até com os chiliques!

Agradeço àquelas que quase enfartaram, quase tiveram um AVC, quase tiveram um treco, ou qualquer coisa parecida. Fico feliz por não chegarem aos finalmentes, senão, quem ia comentar o cap final???

Agradeço àquelas que gritaram diante do monitor, àquelas que xingaram ou até bateram nele.

Ah, claro, também agradeço àquelas que foram conferir minhas respostas durante o aniversário da amiga, e também àquelas que chegaram a escrever trechos da história à mão para levar para a amiga!

Agradeço àquelas que me confiaram outras amigas ao indicar a fic, e claro, àquelas que vieram conferir a indicação e acabaram ficando por aqui!

Agradeço àquelas que se identificaram, àquelas que se inspiraram, e até àquelas que não gostaram. Muito obrigada a vcs que mesmo detestando o casal principal, chegaram até aqui. Sua opinião sempre foi mto valiosa para mim!

Agradeço àquelas de reviews imensos! Àquelas que acabavam fofocando comigo por review ao invés de comentar o cap... E também àquelas que iam direto ao ponto e comentavam em uma única frase!

Agradeço àquelas que viraram as madrugadas, àquelas que leram tudo num dia e àquelas que lêem um cap por semana.

Sério... Muito obrigada.

Agora um obrigada especial ao staff. Rsrsrsrsrs.

Minha beta reader e grande amiga Keli-Angel-chan... Poxa, como teve paciência amiga... E me perdoe por não ter enviado o último cap para vc betar! Queria que fosse uma surpresa até para você!

Desculpa ter te tomado tanto tempo! Espero de coração que tenha lhe rendido alguma coisinha de boa que seja!

À minha musa inspiradora, Kikatz. Se alguém ler o primeiro review verá que não estou mentindo.

Tudo começou com sua complicada história de namoro-ou-amizade com alguém que também estava enrolado...

Claro, para lhe agradecer adequadamente, batizei uma das personagens mais queridas com seu nome verdadeiro. Mas não sei se ela vai me deixar revelá-lo! =X

Bem, agora acho que já chega né! É só uma fic!

Vamos ao que interessa?

Enjoy...

 ~*~*~

XXVIII - Uma nova história

Eu ainda não tinha me acostumado a acordar naquele quarto de hospital. Demorei alguns minutos até me dar conta de onde estava, novamente.

_ Mel?

_ Oi, bom dia, mãe.

_ Bom dia.

Ela me sorriu e acariciou minha perna coberta. Em seguida deixou o quarto. Acredito que para pedir meu desjejum.

Acho que finalmente ela se convencera que meu acidente não havia sido uma tentativa de suicídio.

Não foi fácil conseguir isso.

Mas acredito que ela deve ter conseguido enxergar a determinação e a sinceridade nos meus olhos quando neguei veementemente essa suposição.

Eu jamais me atreveria a colocar minha integridade física ou a emocional da minha mãe em risco novamente. Já tinha entendido que nada nunca valeria aquilo.

Não nego que constantemente desejei não existir nos últimos dias, mas não pensava em fazer acontecer. Tinha aceitado conviver com minha existência. O que soava extremamente redundante.

*~*~*

As memórias dos últimos dias ainda pareciam meio bagunçadas em minha cabeça, como um sonho ainda se desanuviando.

A última lembrança de antes do acidente era a mais surreal de todas.

Eu, prestes a atravessar a avenida da escola, enquanto alguns colegas riam e conversavam. Subitamente os risos tornaram-se gritos apavorados, enquanto eu mesma gritava. Tentei proteger-me com os braços, como se realmente fosse ajudar, e em questão de segundos, tudo desapareceu.

Uma lacuna tomou conta de minhas lembranças, até o momento em que eu acordei novamente.

Lembrava do desespero que senti ao despertar e não conseguir abrir os olhos, até cair novamente em sono profundo. Naquela ocasião minha mãe segurou minha mão com firmeza e pediu que eu me acalmasse.

E conforme minha mãe me contara, eu só despertara de verdade algumas horas mais tarde. Com a pior sensação que já tinha tido em toda minha vida.

Sentia dores por todo meu corpo, e ainda por cima, parecia sofrer o efeito da gravidade de Júpiter, sentindo-me extremamente pesada e incapaz de me mover.

Minha mãe debruçou-se sobre mim, agradecendo às divindades pela minha reação. E logo me soltou, antes que eu juntasse forças para lhe dizer que me sufocava.

Minha boca tinha um gosto horrível, mas pior era o mal-estar que a luz me causava. Aos poucos, tudo passou, e a única coisa que me incomodava era o olhar apreensivo da minha mãe sobre mim.

_ Mãe...

_ Por quê, Mel? - ela me interrompeu.

Sabia que não seria fácil convencê-la. Até mesmo eu quase acreditava na tentativa de suicídio. E foi praticamente isso, afinal, que tipo de pessoa em sã consciência se lança em uma movimentada avenida com as vistas embaçadas por lágrimas?

_ Foi um acidente. Eu juro. Eu jamais te abandonaria de forma tão covarde... Acredite em mim.

Ela voltou a me abraçar e beijou o alto de minha cabeça. E não voltou a tocar no assunto.

Ela sabia me ler. Não duvidaria de mim.

*~*~*

_ Já vão trazer o café. - ela anunciou ao voltar para o quarto.

_ Ah, não estou com fome... - mentira, só não queria aquele café.

Tentei ajeitar-me na cama com o braço que não estava engessado, mas o esforço fez a agulha me picar.

_ Mãe, me ajuda aqui...

Ela me ajudou a me apoiar e ajustou a inclinação da cama.

_ Hoje você tem que começar as caminhadas. - ela me lembrou em tom de ordem.

Referia-se às recomendações do médico de fazer caminhadas pelos corredores, a fim de fortalecer os músculos que ficaram imóveis por tanto tempo.

_ Hum-hum. - concordei desanimada.

Eu só queria ir embora o quanto antes, mas ainda precisava ficar em observação por alguns dias.

Logo aquele café horrível e insípido chegou, e só comi por estar perdida de fome.

Tudo ali parecia insípido. Na verdade, havia algum tempo que toda minha vida estava insípida.

Já estava no fim do mês. Juntando com os dias que eu ficaria em observação, não daria mais tempo de voltar às aulas.

Por sorte a coordenação havia me liberado as provas finais alguns dias depois do programado. Pelo menos isso...

_ Suas amigas vêm te visitar de novo? - ela me perguntou animada.

Ela e a Thaís já estavam extremamente íntimas. Era de se esperar, a julgar pela capacidade de ambas em socializar com um plâncton que fosse.

_ Acho que hoje não... Elas estão tendo revisões para as provas... Tá meio complicado.

_ Ah, quase nem te conto! O Fred e os filhos vieram te ver. Mas acabaram não subindo. Foi enquanto você estava dormindo.

Dormindo, né. Praticamente um cochilo, causado pelas doses cavalares de sedativos.

_ É mesmo? Poxa mãe, não deveria tê-los preocupado.

_ Que nada! Esquece isso. Ah, sabia que o Caio está namorando?

Pelo menos pra alguém, o nosso envolvimento havia dado certo de alguma forma.

_ Que bom mãe. Ele me contou mesmo que estava gostando de alguém. - Ou melhor, eu havia descobrido. Ele nunca contava nada.

Com a ajuda de muletas, caminhei pelo corredor acompanhada de minha mãe durante a tarde, e tive de me conformar com os programas sem graça de TV durante a noite.

Insisti para que minha mãe fosse embora para descansar confortavelmente durante aquela noite, mas ela recusou-se, decidida.

Jogamos baralho na manhã seguinte, e não respeitando meu estado enfermo, ela roubou desavergonhadamente durante todas as partidas. E ainda teve a coragem de me dizer que era eu quem não sabia perder.

_ Já começou o horário de visita. - ela começou despretensiosa.

Mas eu sabia onde ela queria chegar.

_ Mas como eu já disse, minhas amigas estão estudando para as provas.

_ Hum... Aquelas que não estão na sua lista de restrições, você quis dizer não é?

_ Manhê, não. Não falaremos disso.

_ Mel, talvez vocês devessem conversar uma última vez...  Ele tentou. Várias vezes. Perguntei pra recepcionista. Tá, desculpe!

_ Acho que está na hora da caminhada...

_ Tá certo, Mel. Como preferir. Mas vamos esperar até terminar a hora de visita. A não ser que pretenda participar dos 100 metros com obstáculos.

_ Tem razão, prefiro esperar.

Continuamos a jogar por mais alguns minutos.

Faltavam apenas dez minutos para terminar a visita. E eu jurava que não receberia nenhuma. Por isso fui pega de surpresa quando alguém parou na porta do meu quarto, perguntando se podia entrar.

O que eu poderia fazer? Coloquei na lista de restrições somente as visitas indesejáveis em potencial... Se fosse colocar todo mundo que era indesejável, mas que provavelmente não me visitaria, a lista seria muito extensa.

_ V-você? - balbuciei, enquanto as cartas de baralho caiam no chão.

_ Oi.

Seus cabelos agora estavam loiros e não negros como da última vez. Estavam presos em um coque no alto da cabeça, e a franja já não existia mais.

Como essas modelos podiam mudar tão drasticamente de aparência, e tão rápido?

_ O que tá fazendo aqui, Daphne?

_ Daphne? - minha mãe acabou se intrometendo sem pensar – Ah, desculpe. - ela disse ao perceber nossos olhares perplexos – Melhor eu ir fazer alguma coisa, fora daqui.

Dizendo isso, levantou-se e saiu.

Ela observou minha mãe deixar o quarto e aproximou-se da minha cama.

_ E então, como está? Fiquei sabendo que esteve em coma.

Eu não sabia como manter um diálogo. Só queria que ela respondesse minha pergunta inicial.

_ Estou bem, agora.

Me calei e continuei observando-a, atônita.

_ É, você deve estar bem surpresa mesmo. - forçou um riso.

Ela aproximou-se mais da minha cama, e percebi que não estava tão maquiada quanto na última vez que nos encontramos. Parecia até um pouco cansada, ou desanimada.

_ Não vim aqui para te ver, inicialmente.

E por que viera, então, raios?

_ Mas não vi outra alternativa.

Ela fez um minuto de silêncio, sustentando meu olhar com firmeza.

_ Amélia, você não pode fazer isso com o Aquiles.

_ Hã? Do que você está falando?

Quem era ela para me dizer o que fazer com o meu relacionamento? Especialmente por ser o motivo principal de nosso rompimento?

_ Você o ama? - me perguntou.

A pergunta veio repentinamente, e embora eu soubesse a resposta, não queria compartilhá-la com mais ninguém.

_ Mas é claro que ama. - ela mesma respondeu.

_ Olha, Daphne... Eu prefiro não conversar sobre isso. Com ninguém, e menos ainda com você. Me desculpe se isso te ofende de alguma maneira.

Ela agitou as mãos, sinalizando para que eu não me incomodasse.

_ Na verdade eu não vim conversar. Só vim falar. Me desculpe também se isso te ofende.

Pensei em chamar alguma enfermeira, mas de repente a campainha parecia muito longe.

_ Amélia, o Aquiles é muito impulsivo. Você devia ter pensado nisso antes de se envolver com ele.

“Ótimo, lição de moral da Daphne!”

_ Agora que ele está apaixonado por você, tem que aceitar as consequências. E claro, a burrice dele faz parte.

Isso eu já tinha aceitado.

_ O fato é: deixe-o falar quando ele tem algo a dizer... Mesmo que seja para rir da cara dele. Ou... Mesmo que seja para terminar com ele... - seu olhar se perdeu em um ponto no chão, mas ela logo retomou – Só não deixe as coisas mal resolvidas, pois ele tentará resolver do jeito dele. O que geralmente acaba sendo um desastre.

Ela estava tentando me fazer discutir a relação com ele, ou eu havia sido sedada novamente e estava tendo um daqueles sonhos surreais?

Olhei para os lados, em busca de algo indiscutivelmente real.

_ Amélia, me desculpe por isso, mas eu ainda o amo. E assim como você, tenho certeza, gostaria de vê-lo feliz. Ou ao menos saudável...

_ Do que você está falando agora?

Ela sentou-se numa das beiradas da cama e finalmente abriu o jogo:

_ Já que ele não podia entrar no hospital como visitante, ele resolveu entrar como paciente. Daqui a pouco ele rastejará até aqui, você vai ver.

_ O quê?!

_ Ele foi atropelado. Isso lhe soa familiar?

_ Atropelado? Onde? Quando?

Eu já estava me preparando para levantar.

_ Ei, só uma coisa, Amélia.

Parei com a preparação para encará-la.

_ Por favor, cuide dele. Queria muito acreditar que essa troca ao menos tenha valido à pena.

Aquilo parecia tão injusto. Ela o amava de verdade. Contudo eu não poderia lhe prometer aquilo.

Até quando ele ia ficar em dúvida e magoar as pessoas?

_ Desculpa, Daphne. Não posso prometer isso...

Ouvimos batidas na porta, e meu coração se acelerou. Mas era só a enfermeira anunciando o fim da visita.

_ Bem Amélia, era só isso que eu tinha a dizer. Espero que faça a coisa certa.

Ela se levantou e foi em direção à porta.

_ Daphne... - chamei.

Mas me dei conta da idiotice que estava prestes a cometer.

_ Obrigada pela confiança.

_ Hum.

E saiu.

Eu não podia perguntar a ela se eles haviam mesmo reatado quando ele terminou comigo. Não era mais da minha conta.

Eu já havia me recostado novamente.

Ele continuava a surpreender. Das formas mais estúpidas.

Como ele podia ser tão desprovido de capacidade mental e amor próprio?

Eu tinha que pedir para ele parar, antes que acabasse se matando. Já que ele queria falar, eu o deixaria falar, mas em nada mudaria minha decisão. Aquilo só a corroborava.

Queria que minha mãe voltasse logo para pedir um conselho. Ou pelo menos para peneirar as boas palavras dentre todo seu delírio verbal.

Toc, toc.

Inconscientemente prendi a respiração quando o ouvi bater no batente da porta.

Eu já estava de sobreaviso quanto à sua visita, mas esperava poder me preparar melhor.

_ Posso?

_ Ah! Acho que sim...

Ajeitei-me na cama, e pensei em levantar, mas ele me impediu:

_ Não precisa, eu vou até aí.

Apoiando-se em duas bengalas, mancou até a poltrona do acompanhante, e se largou sobre ela. Ajeitou a perna engessada e inspirou profundamente.

Também usava um colar cervical e tinha um curativo no queixo.

_ Alguma coisa na sua aparência me diz que deveria estar de repouso em seu leito. - comecei.

_ Não é nada. Nem dói mais.

Meu braço doía. Minha cabeça doía. Minhas pernas doíam. Logo, ele só podia estar mentindo.

_ Quis aproveitar que o horário de visita acabou e que minha mãe foi levar a Íris em casa.

Eu nada respondi. E depois de alguns instantes de silêncio, perguntou:

_ E então, como você está?

_ Estou bem.

_ Que bom... Eu estava preocupado.

_ Fiquei sabendo.

Desviei o olhar para outra direção. Será que aquilo já estava bom para fazê-lo ir embora?

_ Mel, me perdoe... Por favor.

_ Aquiles, não se trata mais de perdoar. Apenas de aceitar. Você não consegue fazer isso?

_ Consigo. Contanto que seja uma decisão tomada com o conhecimento de todos os fatos.

_ Conheço todos os fatos que me interessam.

_ Não conhece não...

Nesse momento ele foi interrompido pela minha mãe que começou a adentrar o quarto.

_ Dona Diângeles...

_ Ahn, me ignorem. Continuem. - girando nos calcanhares, ela voltou a deixar o quarto.

Bufei impaciente. Joguei o lençol para o lado e agarrei minha muleta. Ainda sentia certa fraqueza nas pernas.

_ A única coisa que não entendi foi esse acidente. Você está louco? Você podia ter morrido! Como se atreve?

Contornei a cama e fui até a poltrona onde ele continuava sentado, com a perna imobilizada pelo gesso.

_ Admito que foi uma besteira... Eu só não estava raciocinando direito.

_ Você nunca raciocina direito. - deixei escapar.

_ Você tem razão, Mel. Mas o que posso fazer? Essa é a única personalidade que eu tenho.

Ele não podia fazer nada mesmo. Nem eu.

_ Não faça nada, Aquiles. Só não me envolva mais nisso.

Virei-me e voltei a andar pelo quarto. Estava muito irritada.

_ Mel, não era sobre o meu acidente que eu queria falar.

_ Ok, Aquiles, não falemos mais sobre o acidente.

_ Olha pra mim, por favor.

_ Como queira.

Voltei a encará-lo de onde estava, no meio do quarto.

_ Vamos começar lá do começo. Quando eu terminei com você.

_ Não precisa se explicar. Já não faz diferença! Mesmo que seja o mais nobre dos motivos... Nada vai mudar.

_ Vai sim. Você vai saber.

_ Eu não quero saber-

_ A Daphne ficou muito mal. - ele me cortou.

Diante de minha indiferença, prosseguiu:

_ Ela me pediu um dia, apenas um dia, para que eu provasse meus sentimentos... - quando me viu revirar os olhos, complementou – Claro que eu sei que não precisava provar nada para ninguém, nem pra ela, mas... Eu fiquei com medo.

Nesse instante pareceu que muitas pessoas no recinto haviam silenciado para ouvir o que viria a seguir, apesar de sermos apenas dois, e eu já estar em silêncio.

_ É. Você nunca se sentiu insegura? Sua aversão pelas pessoas do início do ano não se tratava de uma insegurança que você foi vencendo aos poucos?

Nosso relacionamento o deixava inseguro.

_ Certo, você estava inseguro comigo. Já se explicou.

_ Não da forma que você está pensando.

Ele apoiou-se nas bengalas e se levantou.

_ Cara, eu amo você! E isso nunca aconteceu antes! E no entanto... Você me parece tão distante... Como se eu não fosse bom o suficiente para fazer parte do seu mundo...

Ele aproximou-se enquanto se explicava.

_ Eu só fiquei com medo de que você não me pertencesse, como eu te pertencia.

_ E voltar com a Daphne te ajudou a descobrir.

_ Eu lembrei que pra mim, ela era normal. E queria ter a certeza que eu já não conseguia ficar com alguém que pra mim era normal. Que tinha que ficar com quem me empolgasse... Você.

Ele já estava perto o suficiente para me tocar. Estendeu uma de suas mão e tentou alcançar meu rosto, mas eu dei um passo atrás. Tinha medo de não resistir. E que tipo de pessoa eu seria se me deixasse levar por um discurso bonito?

_ Pronto, já se explicou. Já pode ir. - finalizei friamente.

_ Ainda falta uma coisa.

Eu sabia o que era. Queria mesmo que existisse uma explicação para aquilo, mas nada parecia suficiente para justificar tal acontecimento.

Continuei imóvel, aguardando que continuasse, mas sem demonstrar qualquer tipo de interesse.

Dessa vez, ele que caminhou pelo quarto. Pouco, pois tinha mais dificuldade que eu.

Finalmente parou e voltou-se novamente para mim.

_ Eu não sei como explicar isso...

_ Não faço questão mesmo. - fui até a porta e a indiquei para ele.

_ Eu te vi na portaria aquele dia... Com seu amigo.

_ Nós já não tínhamos mais nada. E eu não lhe devo satisfações.

_ Eu sei. E acho que foi o que mais me incomodou. O  fato de você ser livre para outro relacionamento. Eu sou tão idiota...

Pensei em concordar, mas eu seria mais se fizesse isso.

_ Mel, você não sabe como doeu. - sim, eu sabia – Acho que foi por isso que fiz o que fiz...

_ Vingança? Sublime, Aquiles. Agora, se não se importa. - apontei novamente para a porta.

_ Não! Jamais! - outra vez ele se aproximou de mim – Eu só queria que você...

Antes de prosseguir, alcançou minha mão, e não tive forças para recuar.

_ Que você soubesse como era... Não para me vingar, mas para que você sentisse a mesma vontade que senti, de te levar para mim e nunca mais deixar que te tocassem.

Continuei em silêncio, com o olhar preso no piso branco e esterilizado do quarto.

_ E sei que foi extremamente egoísta e de mau gosto...

_ E pretensioso.

Interrompi nosso contato, e me afastei, de volta à minha cama.

_ Você está me dizendo que acha que é tão inesquecível que eu jamais o superaria? E que seus novos envolvimentos ainda fossem me afetar?

Ele permaneceu imóvel, visivelmente pasmado.

_ Não... Eu não pensei isso... - finalmente conseguiu dizer – Só achei... Que talvez você sentisse a mesma coisa... Afinal, achei que nosso sentimento fosse mútuo.

Eu não podia negar. Já tinha conseguido ir longe demais. Não conseguiria dizer que não o amava.

_ Você já se explicou. Nada vai mudar.

Ele pensou por alguns segundos e voltou a me seguir.

_ É? Então isso significa que ainda me ama? Eu também te amo! Por que não pode me dar uma chance?

_ Aquiles, aceite, por favor. Estou te pedindo.

_ Por quê, Mel?

_ Você é inconstante. Não posso lidar com isso. Não estou preparada.

_ Eu já me decidi! Já decidi o que eu quero, e é exatamente-

_ Já decidiu até que mude novamente de ideia. Não, Aquiles.

_ Eu não mudarei-

_ Você pode ao menos respeitar minha decisão?

O interrompi com tanta firmeza que ele foi obrigado a se calar.

Eu não podia desviar o olhar, seria sinal de fraqueza. Mas sustentar o seu estava muito difícil.

_ Claro. - ele respondeu ao se dar conta que eu não hesitava.

Continuou a me encarar por mais alguns momentos, até que se virou e começou a deixar o quarto.

Eu não queria que ele fosse, mas era preciso deixá-lo ir. Nosso relacionamento estava fadado ao fracasso desde o momento em que começou.

Antes de passar pela porta, virou-se para mim e se despediu:

_ Tchau, Mel.

Ambos sabíamos que não era só um “Tchau”, mas sim um “Adeus”.

_ Tchau, Aquiles.

*~*~*

A mágoa que eu sentia não deveria ser maior ou mais intensa que a habitual, afinal, minha situação com o Aquiles não havia se alterado, mas... Eu não podia evitar.

Talvez nossa conversa definitiva tivesse me posicionado melhor na realidade...

Aquela dor latente voltava a pulsar.

Inconscientemente eu esperei que ele me procurasse no dia seguinte, o que não aconteceu.

_ Ótimo, era assim mesmo que eu queria. - tentei me convencer.

Nem mesmo a notícia da minha alta em breve conseguiu me animar de fato. Dentro de três dias todo aquele pesadelo ficaria para trás.

_ Amélia Cristina! Oi!

A visita da minha ex-cunhada Íris me surpreendeu, mas não me incomodou. Senti-me próxima a ele enquanto conversava sutilmente com ela.

_ Eu quase não acreditei quando fiquei sabendo! E então, você já está bem?

_ Sim, já estou ótima. Em três dias estarei livre. E você, como está? Como foram as provas?

_ É mesmo, eu tinha que te agradecer por isso! Consegui passar em... Quase tudo. Fiquei em uma matéria, mas poxa... Nem quero pensar no que teria acontecido sem sua ajuda.

_ O mérito é seu. Você se esforçou.

_ Obrigada mesmo. - ela olhou para os lados, sem muito assunto – Hum... Acho que já vou indo.

Sem tocar no nome dele.

_ Ah, sim. Já está acabando a hora de visita né...

_ É. E... Meu irmão recebeu alta hoje... - disse parecendo sem jeito.

_ Ele já foi embora?

Ela surpreendeu-se com meu interesse, e senti-me obrigada a justificá-lo:

_ Eu também fiquei sabendo que ele teve um acidente... Bom saber que está bem.

_ Pois é... Mas ainda não. Meu pai vem nos pegar daqui a pouco.

_ Certo.

Ela aguardou não sei pelo quê. Talvez que eu perguntasse mais sobre ele. Mas eu já havia me decidido.

_ Bem, eu vou indo. Cuide-se daqui pra frente, combinado?

_ Hum-hum. - confirmei.

Depois de se despedir com um beijo, ela deixou o quarto.

Feito. Estava tudo definitivamente acabado.

Ele parecia ter aceitado com bastante facilidade.

Deixei uma risada escapar.

Não mesmo. Não foi com facilidade que ele aceitou. Quase lhe custou a vida.

Olhei para a poltrona do acompanhante vazia. Minha mãe tinha ido até em casa tomar banho e pegar roupas novas.

Agarrei minha bengala e perambulei pelo quarto.

Por que aquela angústia não passava logo?

*~*~*

Não seria 'fazem quarenta minutos'? Afinal, quarenta é plural, não é? Eu sei que aprendemos isso... Mas eu sempre me confundo se aprendemos “faz quarenta minutos” ou “fazem quarenta minutos”... Aí eu me baseio no verbo “passar”. Afinal, “passou quarenta minutos” é errado, enquanto “passaram quarenta minutos” é o correto, não é?

Ele tinha que deixar claro na nossa primeira conversa o quanto ele era tapado?

Eu não conseguiria tirar uma conclusão dessas... Se eu lesse que os caras mudaram de cor depois de entrar no rio, eu simplesmente ia interpretar que a água estava suja.

Ri sozinha no quarto.

Ele era tão inocente por me dizer tamanhas besteiras...

Você é melhor que todas elas juntas.

Como ele podia ter tanta certeza do que dizia a meu respeito?

Gosto demais de você Mel. A ponto de fazer o que não devo... Você já deve ter percebido.

E continuava a fazer o que não devia.

Eu não sei exatamente qual a resposta dessa pergunta... O que sei é que não aguentava mais. Estou apaixonado de uma forma imensurável. Não sei quando começou... Nem como... Só sei que não vou mais impedir isso. Você vai ter que dar parte de mim na polícia.

Sempre tão “romântico”.

Não vou mentir pra você. Não seria um bom começo. Eu estou triste sim... Mas não arrependido. Se tivesse que fazer essa escolha novamente, faria a mesma.

Mas sempre tão resoluto com relação a nós...

Mel... Eu também amo você. Você namoraria comigo?

Observei o movimento pela janela. Logo ele estaria passando por ali.

Então não é o fim?

Ele estava tão esperançoso quando me fez essa pergunta...

Era a segunda vez que eu terminava com ele.

Ele parecia não se importar com a minha inconstância como eu me importava com a dele.

Mesmo que seja para errar, nós temos esse direito. l.y.

Ao menos algumas vezes ele conseguira ser sábio.

Não deve ser muito difícil. Mas você tem que levar em consideração aquilo que está fora do meu alcance. Você não vai terminar comigo se eu for atropelado, não é?

Ri outra vez. Que ironia... E o que eu tinha respondido mesmo?

Pertencemos a dois extremos completamente diferentes. Por isso nos atraímos.

Como em sua profunda ignorância podia ser tão sensato?

Quem é que estava sendo verdadeiramente idiota ali?

Lutando contra meus próprios sentimentos por medo de não suportar a decepção...

Como eu era fraca! Covarde!

Tive tanto tempo para aprender alguma coisa com ele... Era isso. Eu eu quem tinha que aprender com ele. Mas meu menosprezo não me permitiu enxergar...

Rumei em direção à porta. Será que ainda estava lá?

Você é linda, Mel. E de certa forma, me assusta.

Como não assustaria? Sempre tão comedida, contida, fria...

Antes de atravessar a porta, larguei a muleta sobre uma poltrona.

Não me atreveria a perguntar qual era o quarto dele, pois certamente alguma enfermeira rabugenta me obrigaria a voltar ao meu quarto.

Rabugenta? Quem era eu para julgar alguém como “rabugenta”?

Como ele me suportara por tanto tempo?

Percorri o corredor até o final, esquadrinhando discretamente cada um dos quartos, mas não consegui encontrá-lo. Alguns dos quartos estavam de porta fechada.

Larguei-me sobre um banco no fim do corredor pensando no que poderia fazer. Mas não demorou muito para descobrir. Avistei a Íris deixando um dos quartos.

Não pensei duas vezes para correr até lá.

Para minha sorte, ele ainda estava lá. Mas parecia estar de saída. E nada conseguiria me fazer superar a vergonha de entrar em seu quarto tão abruptamente, e ainda usando pantufas e vestimenta hospitalar, com seus pais lá dentro.

Arregalei os olhos e tentei buscar as palavras adequadas para me explicar.

_ Amélia Cristina! - a mãe dele levantou-se da poltrona e veio até mim – Ouvi que você estava por aqui! Como você está?

_ Ahn, bem, dona Lívia...

_ Poxa vida... - ela lamentou.

Diante de minha expressão assustada, ela continuou:

_ Você ainda me chama de “dona”.

_ Ah... Sim... Continua sendo mais forte...

_ Você está mesmo bem? - dessa vez quem me perguntou foi seu marido.

_ Sim, estou... Receberei alta em poucos dias...

_ Isso é ótimo! Tome mais cuidado da próxima vez, hein. Isso serve para você também! - apontou para o filho.

Dei um passo para o lado, para que pudesse vê-lo. Já não usava o colar cervical e o curativo em seu queixo estava bem pequeno, mas a perna continuava engessada até a altura do joelho.

_ Bom, Aquiles, vou trazer o carro, daqui a pouco sua mãe vem te buscar. Vamos, Lívia?

Acho que ele percebeu meu interesse no filho. A mãe dele se despediu de mim e o seguiu para fora.

Senti minhas bochechas corarem quando fui deixada a sós com ele.

Aproximei-me da cama e parei a seus pés.

_ Você parece bem melhor. - arrisquei.

_ É... Meu maior problema é a perna agora... Terei que voltar para radiografar na semana que vem. Adeus inter-bairros... - diante da minha expressão de estranheza, explicou – O Guilherme tinha me chamado para um campeonato durante as férias.

_ Ahn. E, como ficaram suas provas?

_ Faltaram só algumas. Mas poderei fazê-las quando voltar, por causa do atestado. O que deve ser o mesmo com você.

_ É. Felizmente. E... Não interferiu no seu vestibular?

_ Não. Como fiquei com bastante tempo livre... - deu uns tapinhas sobre uma pilha de livros.

_ Então você estudou?

_ É... Acabei adquirindo alguns hábitos. - abriu um sorriso enquanto encarava os títulos sobre a mesa.

Quando voltou a me encarar, e viu que eu não acompanhava seu riso, parou.

_ Parece que pelo menos no final, eu aprendi alguma coisa, não é?

No entanto, era eu quem ainda tinha muito a aprender. E eu não queria que fosse o final.

Não queria ter de explicar, pois não encontrava as palavras corretas. Lancei meus braços ao seu redor e me escondi em seu pescoço.

Aspirei aquele aroma que sempre me tirava a lucidez, sua fragrância amadeirada. Não conseguiria ficar sem ele, era eu quem tinha que aceitar.

Senti meu abraço ser correspondido, e me aconcheguei nos seus braços.

Ele acariciou meu cabelo, e eu mantive o silêncio.

Mas logo a mãe dele surgiria para que fossem embora.

Afastei-me dele com dificuldade, e procurei pelo verde-paz.

_ Eu não te superei. Nem quero.

Ele abriu outro sorriso e me acariciou o rosto.

_ Eu estava quase te pedindo para me ensinar como fazer isso com tanta facilidade. Mas... Droga, você me enganou.

_ Aquiles... Você é a pessoa mais idiota que eu conheço... Não sei como fui te amar tanto...

_ Devo ficar lisonjeado?

_ Não sei. Mas é verdade.

Não resistindo, ele gargalhou. Em seguida, me puxou para si e me beijou.

Havia tanto tempo que ansiava por aquilo. Seu carinho, seu toque... Cheguei a pensar que tudo havia cessado... Como podia ser possível? Aquilo parecia não ter fim.

Eu teria de lidar com toda sua idiotice, e ele com toda minha rabugice. Era justo, e até mais: equilibrado.

Ou talvez eu só quisesse justificar.

Mas não precisava de justificativa. Eu ficaria com o Aquiles e ponto. Mesmo se fosse para dar errado. Nós dávamos certo, mesmo dando errado. Era nessa sintonia que funcionávamos... Era o efeito colateral por sermos tão opostos.

Por isso era tão imprevisível e absolutamente preciso.

*~*~*

Ele disse que me visitaria nos dias que eu ainda teria de permanecer no hospital, mas consegui convencê-lo do contrário. Precisaria depender dos pais para levá-lo e buscá-lo, e muito provavelmente retardaria a recuperação da fratura.

Não seria tão difícil encarar sua falta por alguns dias, diante do que já havia enfrentado.

Não precisei contar para a minha mãe, ela conseguia sempre descobrir o que se passava comigo. Aquilo às vezes era perturbador, mas sempre me poupava muito tempo...

Enquanto estava em casa, ela tratou de me mimar durante toda a primeira semana em que voltei do hospital, até me trazendo comida na cama, no sofá, ou em qualquer outra superfície onde eu estivesse estendida.

Em duas semanas eu já me sentia suficientemente saudável até para um triátlon, mas minha mãe fez questão de me levar para a escola. Eu era a única aluna em maratona de provas finais. Até o Aquiles já havia feito as provas que devia...

Naquele dia fiz três e dali dois dias fiz as últimas duas que faltavam. Agora eu podia me dedicar exclusivamente ao vestibular. Mas antes, eu ainda tinha que conferir meu desempenho.

_ Criiiiss, divonaa!!!

Eu estava anotando minhas notas finais quando sobressaltei-me com o grito da Thaís. Parei o que fazia e recebi seu abraço.

_ Como está? Tudo em cima?

_ Sim, já estou ótima! E você?

_ Muito bem, mas não vamos falar de mim! Conte-me tudo! Como está sua vida, suas fraturas, seu coração, tu-do! Ouvi cada papo... É verdade que o Aquiles...

Aquela foi uma longa conversa. Discorri sobre os recentes acontecimentos, enquanto me forçava a não rir de suas expressões surpresas.

_ Santo Deus! Quer dizer que ele é maníaco, compulsivo, obsessivo, perseguidor, desequilibrado e impulsivo?

_ É... Por aí...

_ Poxa Cris... - ela pareceu desanimada, mas mudei de ideia quando prosseguiu – Isso é tão romântico!!!

_ Eu achei meio doentio, mas no fim acabou dando certo... - o que era muito relativo.

Dar certo para mim, muitas vezes era dar errado. E o inverso também era verdadeiro.

_ Mas me diz Thaís, como foi nas provas? Fechou tudo?

_ Ah, consegui fechar sim, estou prontinha para meu próximo passo! Na verdade, poquíssimas pessoas pegaram DP... Os professores não curtem cortar o lance do pessoal justo no último ano... Convenhamos! Formatura! Época de ir à forra, e fazer tudo aquilo que não fizemos ao longo do ano!

_ Ah é?

Ela piscou para mim e confirmou:

_ Tudinho gata!

Não pude evitar o riso.

_ Mas é claro que um outro tinha que repetir né... - ela continuou – Não sei de todos que ficaram retidos, mas uma pessoa em especial eu precisava checar!

_ Quem? Não, espera! - eu imaginava quem fosse – Jura?!

_ Finalmente a criatura bestial recebeu seu castigo! Tá certo que eu preferia 100 chibatadas... Mas isso já serve!

_ Nossa... Poxa Thaís, coitada...

_ Hã?! O quê?! É impressão minha, ou estou sentindo vibrações de misericórdia vindas dessa região aqui? - ela agitou as mãos ao meu redor.

_ Thaís... Ela vai retardar todos os planos da vida dela em um ano...

_ Minha querida couve-flor! Ela teve a mesma oportunidade que todos nós... Mas preferiu empregar seu tempo em outras atividades não muito didáticas. Você lembra?

Absolutamente.

_ Mas mesmo assim... Nada deu certo pra ela. Não concorda? Isso não te dá pena?

_ Bem... Pensando por esse lado... - ela pareceu refletir – De forma alguma! Desculpa Cris, até tentei!

A Thaís me fazia rir mesmo da desgraça alheia...

Era mesmo uma pena a Bia ter repetido justo o último ano, mas era como minha amiga havia declarado, ela tivera as mesmas oportunidades que todos nós...

Pois sim... Minha mudança para aquela escola havia alterado muitos destinos...

Mas a alteração mais drástica tinha sido sem dúvidas, nos meus valores.

Sem dúvida havia tirado a sorte grande ao conhecer o Aquiles, e ele grudar feito chiclete no meu pé.

Aprendi muito mais com ele que ele comigo, afinal, para ele eu só havia ensinado a raciocinar. Nada que uma máquina não pudesse ser programada para fazer.

Já com ele, havia aprendido a arriscar... A superar obstáculos... A me impor... E mais importante, a me entregar por completo a tudo que me fizesse feliz.

Claro que nada teria durado se não fosse pelos conselhos insanos e ao mesmo tempo tão coerentes da Thaís...

E até o relacionamento da minha mãe me ajudara a entender algumas coisas... Como por exemplo que temos o direito de ser felizes a qualquer momento, sob qualquer circunstância.

Minha complicadíssima relação com o Caio foi a que mais me ensinou em menos tempo.

Cheguei a me sentir atraída por alguém tão parecido comigo, mas no fim ambos entendemos a mesma coisa: queremos o diferente. A mesma coisa já temos a todo momento.

Eu queria a ignorância do Aquiles. Precisava da sua impetuosidade. Sentia falta de suas piadas bestas. E acima de tudo, amava sua imprevisibilidade.

E até do seu ciúmes eu gostava. Embora não tenha sido nada fácil demover a ideia que tinha do Caio. E precisei mesmo fazer isso, para que pudéssemos viajar todos juntos no ano novo.

Por sorte meu meio-irmão-já-pegado levou a namorada, e a situação ficou menos tensa.

Nunca pensei que pudesse ser tão divertido viajar com minha mãe e a família de seu namorado, por isso me surpreendi.

Dormimos separados em quartos para meninos e meninas, mas se a ideia da minha mãe era evitar que nos “corrompêssemos” durante a viagem, não teve completo sucesso.

Eu realmente não pretendia, mas o Aquiles fora ardiloso... Enfim!

O balanço final da viagem havia sido: Sucesso!

*~*~*

Seis meses depois

_ Tchau, mãe. - despedi-me com um beijo da minha mãe, que ainda tomava café.

_ Tchauzinho, gatona.

Agarrei meu material sobre o sofá e pendurei o jaleco no ombro.

O semestre estava acabando, mas minhas provas, apenas começando.

Teria uma de anatomia logo cedo naquele dia, e o Aquiles fizera questão de me dar carona.

Eu já tinha pensado em comprar um carro para mim também, mas estava tão cômodo receber carona...

_ Oi. - inclinei-me e lhe dei um beijo.

_ Preparada para a prova?

_ Acho que sim... Espero não esquecer nenhum forame... - pensei alto.

_ Esquecer quem?

_ É só uma abertura para passagem de vasos e nervos em ossos ou entre ligamentos.

_ Ah! Só isso é? Quase que me assusta... Bom, vamos indo antes que você esqueça?

Consenti entre risos e partimos.

De fato, não fora tão difícil como eu esperava.

Desci para a cantina e pedi um café. Acenei para uma colega que acabava de fechar o livro e correr para a biblioteca e dei um gole na bebida.

Sentei-me numa mesa e abri um livro para estudar para a prova que teria depois do almoço.

Estudei pelo que pareceu ser mais que uma hora, até ser interrompida.

_ E se você desse só uma escapadinha para almoçar comigo?

_ Ah, eu não acredito! O que você está fazendo aqui?

_ Vim almoçar com a minha namorada.

_ Aquiles, você não trabalha mais com seu pai! Não pode abusar desse jeito!

Depois de começar os estudos numa universidade de tecnologia, ele fora contratado numa empresa de engenharia, e encarava os verdadeiros desafios da vida profissional.

_ Abuso seria eu não poder fazer um horário de almoço.

Eu realmente não esperava que um dia ele fosse ser levado a sério. Mas havia me surpreendido.

_ Tá bom. Dessa vez passa.

_ Mas e então, tem um tempinho pra mim?

Eu ainda não conseguia negar nada para ele...

_ Só um tempinho, hein.

_ Como quiser.

Fomos a um restaurante perto da universidade e pedimos uma massa. Depois de eu terminar de me deliciar com a sobremesa, ele começou:

_ Mel...

_ Sim?

_ Trouxe algo pra gente.

_ Algo bom?

_ Acho que sim...

_ E por que a hesitação?

_ Não estou hesitando.

_ Se não estivesse, já teria dito.

_ É que eu não sei se você vai querer...

_ Então não é bom.

_ Pra mim é.

_ O que é?

Pegando uma de minhas mãos, ele colocou uma aliança prateada nela.

_ Você vai usar nossa aliança de compromisso?

_ Parece que já estou usando.

_ E vai continuar?

_ Hum...

Dei uma olhada na joia. Pelo brilho, não era prata, era ouro branco. E uma delicada pedra brilhava em cima.

Tirei o anel, e observei seu interior. Tinha uma gravação.

Que seja infinito enquanto dure. AFD.

Eram suas iniciais.

Voltei a fitá-lo, inexpressiva.

_ Não gostou? É materialista demais? Simbólico em excesso? Desnecessário?

_ Isso, Aquiles... - comecei indicando o anel entre meus dedos.

Levantei-me e fui até ele.

_ Ok, se não gostou, basta recusar, não precisa me agredir! - disse quando parei à sua frente, com altivez.

Segurei seu rosto entre minhas mão e o beijei.

_ Nada pode representar o que eu sinto. Mas é lindo. E eu concordo com os dizeres. - o coloquei de volta no meu dedo anelar.

_ Tudo bem. É provisório. - replicou, abraçando minha cintura.

_ Provisório? Vai tirá-lo de mim?

_ Claro. Quando trocar por uma dourada.

_ Dourada?

Mas sem precisar de explicação, entendi a quê se referia. Gargalhei, mas preferi não me aprofundar no assunto.

Tudo tinha seu tempo, e na hora certa aquela conversa aconteceria.

E tinha certeza absoluta que estaria preparada. Naquele momento sentia-me completamente preparada para passar o resto da minha vida ao seu lado. Enquanto quiséssemos.

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa lhe dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure

E esperava sinceramente que assim fosse.

            Soneto da fidelidade (Vinicius de Moraes)

FIM


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