Enganada escrita por NepomucenoGiih


Capítulo 4
Capítulo 4 - O tempo para num “click”




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Quando abri meus olhos novamente, parecia que tinha passado um furacão no meu quarto, estava tudo no chão, parecia que alguém tinha entrado em desespero profundo ali. Olhei para o lado, na cama de Eduardo, estava ele e Jonathan, um virado para cada lado, suspirei um pouco. Parecia que ainda era noite, olhei no celular ao lado da cama, era quatro e vinte da manhã, meu sono tinha desaparecido, e pelo que conheço dos meninos, eles deveriam ter ido dormir tarde, porém eu estava com fome, e sabe mulher com fome e doente, não combina muito.

– Eduardo! – Gritei e Jonathan deu um pulo da cama caindo no chão, Eduardo olhou para o lado, assustado.

– Oque que foi Tati? Tá Passando mal? – Ele disse ainda meio sonolento, enquanto Jonathan levantava do chão.

– To com fome. – Sabe aqueles bicos, então, eu fiz bico e Jonathan riu ainda com cara de sono, e Edu também.

– Nunca pensei que fosse ficar tão feliz por você pedir pra comer, Tati. – A voz era engraçada, ele levantou da cama e veio até a minha.

– Eu quero comer lá em baixo. – Disse pondo um braço no pescoço do mesmo, ele riu, e me ajudou a ficar de pé.

– Deixa que eu levo ela, Edu. – Os dois trocaram de posição, Eduardo desceu pra preparar algo pra eu comer, e Jonathan me ajudava a ficar de pé.

– Pensei que fosse te ver, só daqui a duas semanas, quando eu resolvesse aparecer na escola. – Disse suspirando, olhando para frente.

– Ei, eu também tenho sentimentos, e isso doeu, tá! – Ele riu – Você vai pra escola comigo e com o Edu mais tarde. – Suspirei e ele me apertou de forma suave – Não me magoe tá. – Gargalhou, e eu também.

Continuamos andamos até a escada, que me deu um ataque de pânico, olhei para baixo, eu sempre desci aquela escada pulando e cantando, de três em três degraus e agora eu estava parada olhando a escada como se ela fosse um precipício. Apoiei a mão na parede e a outra em volta do pescoço de Jonathan, respirei fundo e...

– Deixa que eu te levo, Tatiana. – Não tive como rebater, ele pôs no colo e desceu as escadas.

– Eu queria descer sozinha, sabia? – Disse pegando as muletas do lado do sofá, e conseguindo finalmente me manter de pé.

– Eu sei que você me ama. – Ele disse jogando-se no sofá. Olhou-me sério, desviei o olhar.

Era estranha sabe a sensação de que você precisava de algo para ficar em pé, como se você voltasse há ter um ano e tivesse começando a aprender a andar, aquela sensação de medo, a qualquer momento você pode cair, se machucar, e ia pedir colo para sua mãe, só que agora eu não tinha a minha mãe, eu não tinha nada, só essa sensação de que não estava bom daquele jeito, que eu tinha fracassado, essa sensação péssima que meu corpo me obrigava a sentir, vontade de sair pulando, mesmo sabendo que eu não poderia, na verdade, eu não conseguia, e isso era péssimo.

– Tati, senta ali no sofá, que eu já levo seu mingau. – Eduardo derrubava tudo na cozinha, e sempre dizia que cozinhar era coisa de mulher, mas agora, as posições mudaram.

Fui andando com a muleta até o sofá, pensei que fosse fácil andar com aquele troço, mas não era, na verdade, era bem complicado, acho que tudo que fazemos obrigados é complicado, afinal, todo adolescente tem manias, a minha, era ser independente, gostaria de não depender de ninguém, mas isso era impossível, por isso era apenas uma mania. Quando eu finalmente sentei no sofá, deu um alivio tão grande, quando você se apoia em algo para se manter de pé, parece que faz mais força, tu tá tentando evitar isso, porém acaba é forçando mais suas pernas.

– Eu quero comer também. – Ouvi Jonathan resmungar e logo em seguida, virando a cabeça para olhar Eduardo.

– Ih ala, arranja um irmão pra você então. – Disse gargalhando, Edu também riu.

– Eu fiz mingau pra todo mundo. Mas só dou pra vocês, depois que eu ver vocês se beijando, porque, nunca vi. – Ele riu, corei na hora, e Jonathan me olhou com a sobrancelha arqueada.

– Oh, como assim? – Gaguejei um pouco, olhando assustada para Eduardo.

– Uai, se vocês namoram, precisam dar um beijo. – Ele disse colocando o mingau nos pratos.

– Não na sua frente né, Edu. – Disse gaguejando um pouco, Jonathan ria de mim.

– Ah, qual problema, Tati? – Jonathan dizia num tom irônico, senti raiva dele, vontade de socá-lo.

– Nem vem Jonathan. – Ele se aproximou de mim, empurrei-o com os braços, tentativa inútil. – Saí de perto de mim, agora! – Edu riu e Jonathan também, ele encostou os lábios no meu, e eu virei o rosto. – Pronto, saí daqui agora! – Meu rosto estava vermelho.

– Que namorada tímida essa minha, mano. – Jonathan riu, pus a cabeça para trás, nossa, estava enjoada.

– Cala a boca, Jonathan! – Gritei com ele, suspirei umas duas vezes, virei a cabeça para Edu que ria. – E isso aí, saí quando? To com fome.

– Ih ala, irritou ela, mano. – Eduardo disse rindo, e colocando os pratos na mesa. – Pronto... Quer ajuda aí maninha? – Olhei para as muletas e suspirei.

Peguei as muletas, e aquela sensação ruim dentro do peito voltou. Sentir-me dependente de qualquer coisa ou pessoa, não me fazia bem. Sei lá, era estranho, nunca gostei de ganhar colo da mamãe ou do papai, sempre preferi o chão, diferente do meu irmão, eu queria crescer sozinha. Apoiei-me na muleta, conseguindo ficar de pé, essa era a parte mais fácil, difícil seria andar até a mesa. Dei a volta no sofá com um pouco de dificuldade, mas consegui, cheguei à mesa, joguei as muletas no chão na hora que sentei.

– A gente te ajuda mais tarde, quando formos à escola. – Edu disse gargalhando um pouco, acho que ele nunca me viu tão vulnerável.

– É amor, a gente te ajuda. – Jonathan continuou, rindo também, e os dois enfiaram uma colher de mingau na boca.

– A ajuda de vocês eu to dispensando. Imagina a cena: Eu tropeço, o Jonathan me segura e caí também, o Edu vai ajudar a gente a se levantar e caí em cima da gente, resultado, todo mundo com um membro quebrado. – Coloquei uma colher de mingau na boca, estava quente. Os meninos riam enfiando outra colherada de mingau na boca.

– Nossa que imaginação fértil, Tati. – Edu dizia rindo, eu não entendi como ele conseguia comer e rir ao mesmo tempo detalhe que o mingau estava quente.

– Amor, precisa parar de ler um pouco, tá? – Jonathan riu, e enfiava mais colheradas de mingau na boca. Ainda sentia certa raiva quando ele me chamava daquela forma.

Comíamos o mingau em silêncio agora, fitava Edu, parecia um porco comendo, eu mal conseguia por uma colher na boca, estava muito quente, sei lá, ou eu que estava chata mesmo. Após eles acabarem de comer, que não demorou mais de cinco minutos, eles foram sentar no sofá, acho que tentar dormir não era uma opção, dali à uma hora teríamos que nos arrumar pra escola mesmo. Eu comia uma colher de mingau a cada cinco minutos. Fiquei uns trinta minutos comendo o mingau, quando terminei, os meninos estava jogados no sofá, olhando um para o outro, estavam se encarando, e eu fiquei sem entender nada, mas sabe como é, louco a gente não questiona.

O fato de ter jogado as muletas no chão, me dificultou um pouco, pensei em pedir ajuda aos meninos, mas não queria, ia me virar sozinha. Apoiei as mãos na mesa, e fiz um pouco de força, meus braços doíam, acho que ainda não estava na hora de fazer força, mas eu nunca me dei por vencida por causa de qualquer dorzinha. Fiz um pouco de força nas pernas e consegui ficar de pé, soltei um “eh” comemorando ter ficado de pé, olhei em volta, procurando alguma coisa que eu pudesse me jogar, para continuar “andando” até o sofá. Avistei a outra cadeira mais próxima do sofá, encarei-a alguns minutos, e me lancei para perto dela, sabe quando você planeja algo, mas dá tudo errado? Eu tive aquela sensação. Caí, fazendo um barulho enorme, joguei meus braços a minha frente tapando meu rosto. Fechei olhos alguns segundos, torcendo para que ninguém tivesse ouvido. Olhei para o lado e Jonathan já estava me pondo em seu colo, enquanto Edu descia as escadas correndo com uma caixa em suas mãos.

– Oque você estava tentando fazer? Se matar, é isso? Você sabe que pode pedir a nossa ajuda, Tatiana! Deixa de ser orgulhosa. Você por acaso é suicida? – Aquela voz grossa gritava comigo, e eu não tinha gostado disso.

– Para de gritar! Você não sabe o quanto é ruim depender de alguém! – Só aí, percebi que gritava com Eduardo. Eu gritei mais alto que ele. Suspirei.

– Eu sei oque você sente. Você acha que é fácil me imaginar sem a MINHA irmã? – Ela deu ênfase na palavra “minha”. – Se acontecer alguma coisa com você, eu me jogo na frente do primeiro ônibus que eu ver. – Ele ainda gritava. Mas um pouco mais calmo.

– Para de ser idiota! Deixa de ser dramático. Se eu morrer... – Vi decepção nos olhos dele. – Se eu morrer, quem vai estar morta vai ser eu, então, pare de ser dramático. – Eu não deveria ter dito aquilo, mas disse.

– Chega! Chega! Nana você está errada, então cala a droga da sua boca! – Jonathan gritou comigo. – Eduardo, saí daqui, vai tomar banho, sei lá, fazer o dever de casa do mês passado, deixa que eu cuido dela. – Ele falou calmo com Eduardo, que não pensou duas vezes e saiu rápido da sala.

Naquele momento eu pensei em falar alguma coisa, mas eu vi, sei lá, acho que preocupação no rosto de Jonathan, fiquei quieta, enquanto ele passava a mão pelas minhas pernas. Ele passou alguma coisa gelada, onde estava roxo, não doeu, mas o meu lado dramático gritou mais alto que eu, e eu gemia de dor, e era vergonhoso. Toda vez que ele ouvia-me gemendo de dor, ele parava, suspirava e voltava a passar os dedos. Eu não entendi oque ele estava tentando fazer, já tinha posto aquela droga de remédio, porque tinha que ficar “massageando”, eu queria gritar, falar palavrão para ele, dizer que estava me machucando, mas depois da forma que gritou comigo, eu senti medo de dizer qualquer coisa. Apenas olhava-o com cara de dor, ele parava alguns segundos suspirava e voltava a massagear. Se ele estava vendo a minha cara de dor, por que insistiu em ficar massageando aquela droga de machucado? Estava me torturando?

– Se você não percebeu, eu estou com dor! – Disse tirando a mão dele de cima do local onde estava roxo. Agora um pouco azulado, por causa do remédio.

– Se você não percebeu, eu tenho que fazer isso, para o remédio fazer efeito. – Suspirou voltando a pressionar os dedos em cima do machucado. – E você não tem o direito de reclamar, depois do que disse ao seu irmão. – Ele falou num tom sério, eu me arrepiei.

– Como se você se importasse muito comigo, ou com o meu irmão. – Suspirei. – Aí, tá doendo droga! – Minha expressão de dor era clara, e eu sabia bem, fazer uma cena dramática.

– Tatiana, eu vou pedir mais uma vez, só. – Suspirou. – Cala a boca, que quando você diz isso, machuca muito. Você tem noção do que disse ao seu irmão? Se eu fosse ele voltava aqui e te dava meia dúzia de tapas, e pontapés, porque você merece, sabia disso? – Ele suspirou, pressionando mais os dedos contra o machucado. – Só fica quieta. – Ele suspirou, falando mais calmo.

Depois daquilo tudo que eu ouvi, eu me calei claro, era horrível ouvir isso, e saber que era verdade. Oque eu estava fazendo com a minha vida, porque sim, Eduardo era o único motivo de eu estar viva ainda. Afinal, qual seria minha motivação para respirar, tendo um pai bêbado e uma mãe longe? Oque eu faria da minha vida? Provavelmente eu seria uma perdida, uma drogada, sim, eu seria que nem as outras meninas sairia para beber de tarde e voltaria de madrugada pondo tudo pra fora, até o meu estômago, eu já teria posto para fora depois de alguma ressaca. O meu fígado, não seria mais nada, talvez, eu não fosse nada sem Edu. Talvez? Tatiana, você não é nada sem ele.

Senti os dedos de Jonathan pararem me pressionar o machucado. Olhei para frente e ele fitava o nada, estava olhando fixamente para algum lugar, segui os olhos dele até a estante, onde apenas tinha um porta retrato, olhei para ver qual era a foto que estava ali. Não conseguia ver, estiquei um pouco o braço, pegando o porta retrato, na mesma hora, taquei ele longe, aquela foto tinha sido tirado quando a minha vida era perfeita. Mãe e pai juntos, irmão que me amava, e eu era uma criança feliz. Estávamos todos juntos no meu aniversário quando tiramos aquela foto, e era uma lembrança que trazia coisas boas, só que era passado. E depois de tudo de bom que tínhamos vivido passasse na minha mente, voltar ao mundo real seria dolorido.

– Eu acabei de descobrir que você é louca! – Ouvi uma voz vindo me tirar daquele transe.

– Hã? Eu? Por quê? – Perguntei um pouco confusa ainda, olhando para frente.

– Você joga as coisas que só te trazem lembranças boas. – Jonathan estava parado, pegando o porta retrato, e Eduardo falava comigo.

– Lembranças que jamais vão voltar a ser reais. – O corrigi, virando o rosto para o lado, não queria brigar.

– Só porque você se tornou fria, não quer dizer que os outros não tenham sentimentos. Eu ADORAVA aquela foto. – Ele gritava agora. Mantive-me calma, olhando Jonathan entregar a foto a Eduardo.

– Eu a odeio. – Suspirei. – Por saber que não vai voltar, por saber que a mamãe não reconhece mais a gente. Por saber que Diogo bebe todas para esquecer que tem uma vida. Por saber que eu perdi o meu irmão. Eu perdi a minha vida perfeita, meses depois que essa porcaria de foto foi tirada. – Agora, eu gritava, limpando a única lágrima que tinha escorrido no meu rosto.

– Você não precisa odiar o seu passado porque ele foi bom, sabia disso? – Ele sentou ao meu lado, me fez encostar a cabeça em seu peito, e assim eu o fiz. – Você não vai me perder nunca... Eu te amo pequena. – Dei um sorriso, mas foi puro impulso.

– Ah, eu quero um abraço também. – Jonathan disse fazendo-nos rir, e sentou se atrás de Edu, abraçando-o. – Momento de viadagem. Mas eu curti. – Ele riu e Eduardo também.

Parecia até cena de filme, e não, não ficamos abraçados até a hora de ir à escola, Eduardo subiu para pegar meu uniforme e ficou lá bastante tempo, e Jonathan foi pra casa se arrumar. Ah, e eu? Fiquei ali jogada naquele sofá, sem ter oque pensar, sem ter oque fazer, eu nem tinha um príncipe encantado para que eu pudesse imaginá-lo. Eu não gostava de pensar que alguém iria aparecer na minha vida, que eu ia me apaixonar e blá. Eu gostava de viver com os pés no chão, mesmo o meu chão não sendo o mais seguro de todos, mesmo não sendo o mais correto, era daquela forma que eu havia aprendido a viver. Podia não ter sido a melhor, mas era a forma que eu vivia, a quase seis anos. Deitei no sofá abraçando a foto que tinha ficado ali, eram várias lembranças boas que eu tinha quando era criança, não que eu já tivesse deixado de ser uma criança, mas era, como dizia a minha mãe, uma criança grande, que já sabia me cuidar, que não precisava mais dela para pentear os meus cabelos, eu já não precisava mais que ela fechasse os botões do meu short, eu já conseguia por os tênis sozinha, e não a chamava mais quando não conseguia dar o laço. Eu podia abrir e fechar o chuveiro, sem ter que pedir ajuda, porque ele era alto de mais. Afinal, eu sempre fui muito baixinha. Eu já sabia escovar os meus dentes, e agora usava creme dental normal, não brigava mais quando não tinha de outro sabor. Quando eu brigava pelo controle, eu já não precisava fazer bico, eu já sabia me defender sozinha. E também aprendi a ler as minhas próprias histórias antes de ir dormir, mas não eram mais aquelas história de contos de fadas, e sim histórias um pouco menos impossíveis de se acontecer. E quando eu já não precisava mais dela, eu queria ela ali, eu queria que ela nunca tivesse ido, queria que ela me telefonasse a qualquer instante dizendo o quanto se arrependia e que amava-me. No início eu acharia que era um trote, ou brincadeira de mau gosto, mas logo choraria e diria onde estávamos morando, e dizendo que eu amava, e que sabia que ela voltaria. Mas isso não aconteceria, porque eu já não tinha mais a mesma pessoa. Eu não pensava mais da mesma forma. Eu não queria mais mudar o mundo, não queria inventar uma nova princesa. E muito menos queria aprender a nadar, para poder chegar ao Japão. Na verdade, eu tinha medo de entrar numa piscina ou no mar. Eu já pensava em estudar, me formar, e só isso. Iria me formar fazer faculdade de alguma coisa, ou trabalharia como escritora, já que gostava tanto de escrever. Já não pensava em doar todo o meu dinheiro para os pobres, porque eu havia descoberto que não se pode viver sem ele, e, aliás, eu tinha descoberto que ele faz coisas mega erradas, que ninguém podia impedir, já que isso vinha da pessoa. Era estranha aquela sensação, de não ter mais a mente inocente de uma menina de oito anos, nem uma dez, muito menos, aquela menina que ainda pensa que vai achar o futuro marido no corredor da escola. Eu precisava, eu não queria ser fria, mas foi à forma que eu achei de me proteger do mundo, geralmente as pessoas só curtem, mas nenhuma delas passou pelo oque eu passei, nenhuma delas sentiu a dor que eu senti, mas eles não ligavam muito pra isso, só queria saber do próprio nariz, e eu não culpava ninguém por querer o próprio bem, eu invejo, porque eu queria poder ser normal também.

– Ei, quer que eu te ajude a por roupa? – Ouvi a voz de Eduardo vindo da direção oposta da onde eu estava.

– Não, eu consigo. Só me dê-as, e vire-se para o... – Suspirei. – Só me dá... – Lembrar que Eduardo me ajudou a tomar banho, me fez corar.

Ele me entregou as roupas e subiu, ele já estava pronto, por isso deveria ter demorado um pouco, estava da mesma forma de sempre, já eu não estaria, iria para a escola como a namorada do jogador do que é anoréxica. Já bastava ser irmã de um jogador, agora namorada, era uma crueldade. Tirei minha blusa com um pouco de dificuldade, mas consegui, por a de uniforme, foi até fácil. Desabotoei os shorts e fui tirando-o com as pernas, foi fácil tirar, difícil mesmo seria por. Abracei as pernas e enfiei um pé no short, doeu um pouco, mas pus o outro rápido para que doesse menos, puxei um pouco o short, mas ficou só na coxa, já que não conseguia me manter de pé para poder por ele por completo.

– Eduardo! – Gritei, e ele apareceu na escada. – Será que você poderia ajudar a sua irmã para ela não ir seminua a escola? – Pedi fazendo bico sabe como é irmão, na base da chantagem.

– Eu sabia que você ia precisar de mim. – Levantou os braços comemorando, sua vitória. – To descendo. – Quando terminou a frase já estava do meu lado, colocou meu short e eu abotoei. – Eu já disse que te amo maninha? –

– Várias vezes. – Ri – Eu te amo também, seu bobão. – Beijei a bochecha dele, e apontei para as muletas.

– Tá oque tem as muletas? – Ele riu pegando-as e tacando no sofá. – Eu sei que são feias, mas não precisa olhar pra elas dessa forma. – Eu ri.

– Eu só queria que você as pegasse, afinal, quer que eu vá pra escola carregada? – Ele gargalhou e fez uma cara de quem pensava. – E a propósito, eu não iria para a escola no seu colo, Edu. – Rimos.

– Você quem sabe. – Ele riu. – Mas você sabe né. Se cansar grita, eu sou forte. – Ele mostrou os músculos e arqueou a sobrancelha. Ri da cara que ele fez.

– Pretendo não precisar, obrigada. – Parei de rir, e voltei à expressão séria de sempre.

Peguei as muletas, pondo-as encostadas no sofá, respirei fundo e vi Eduardo subir, assim que seu celular tocou, deveria ser alguém, oferecendo carona ao mesmo, sempre era assim, eu andava de minutos até chegar à escola, mas tinha gente, que pensa que isso vai arrancar alguma perna e vai de carro ou de moto. Ouvi-o bater a porta com força, suspirei, e voltei a ter pensamentos diversos em minha mente, não queria ser intrometida na vida do meu irmão. Peguei as muletas pondo uma de cada lado do meu corpo, respirei fundo, e contei em pensamentos “1, 2 e 3”, fiz força, me mantendo de pé na muleta, ficar de pé era o de menos, difícil seria andar aquela escola toda, com aquele monte de gente me atormentando, por ter meus quinze minutos de fama, não que eu quisesse ter, mas eu não tinha outra escolha. Comecei a odiar novamente Jonathan, pensei que poderíamos ser amigos, mas não conseguiria perdoá-lo pelo oque estava me fazendo passar, trataria o bem, para que cansasse de mim logo, assim como cansou das namoradas que tentaram prender ele, queriam algo sério, e ele simplesmente mandava-as embora, como se fossem brinquedos, que ele poderia usar e jogar fora a hora que quisesse isso me dava nojo, raiva e ódio. Tudo misturado, fazendo com que meu coração acelerasse, e nos momentos que eu ficava assim, música sempre era bem vinda, mas para isso, precisaria gritar Eduardo e pedir para que descesse meu celular e meu fone, e a última coisa que eu queria, era que o mesmo olhasse nas minhas coisas.

– Tatiana, sua mochila tá aonde? – Ouvi uma voz me tirar totalmente dos meus pensamentos.

– Em baixo da minha cama... – Olhei para o lado um pouco assustada. – Para que você quer saber onde tá minha mochila, Diogo? – Encarei-o alguns segundos, desviando o olhar logo em seguida.

– Eduardo está com crise de “perdi minha ficante” e está em frente ao espelho se perguntando se é bonito. – Ele riu, continuei séria. – Então, eu vou pegar, para ele não esquecer. –

– Eu acho que não iria para a escola sem mochila, só acho, Diogo. – Disse desviando o olhar da escada, e virando o rosto pra cozinha.

De vez em quando, eu achava que era um pouco má educada com Diogo, mas o raciocínio dele era mínimo, e isso fazia meu cérebro dar respostas sem que eu as pensasse antes, quando eu fazia isso na frente da minha mãe, ela brigava comigo, dizia que eu deveria respeitar meu pai, por ele ser mais velho e tudo mais, sempre pedia desculpas por isso, hoje em dia não, eu o culpo por tantas coisas, que dar foras nele era só uma forma que eu tinha de descontar toda a raiva que eu sentia dele.

– Ei cabeçuda, está pronta? – Ouvi a porta bater, sempre alguém me tirava dos meus pensamentos, isso era chato.

– To sim. – Respondi olhando para a porta e vendo Jonathan adentrando a sala, bufei olhando para o lado.

– Ih ala, ela tá bolada. – Ele disse na maior tranquilidade, encostei as pernas no sofá não dando atenção ao mesmo. – Eduardo, desce, está na hora. –

Eduardo gritou lá de cima alguma coisa como “to descendo” ou “já vou”, não dei atenção. Estava cansada tanto fisicamente como emocionalmente, era um cansaço, que parecia que iria me fazer mal o dia todo, ou só aparentava mesmo. Às vezes isso era sinal que algo estava para acontecer, mas às vezes eu achava que tinha transtorno bipolar, que uma hora tá bem e na outra tá mal, só que são as pessoas mesmo que fazem a gente se sentir assim. Algumas pessoas são desperdícios de oxigênio no mundo, se nos livrássemos delas, o mundo seria um lugar melhor.

– Quer ajuda maninha? – Eduardo tinha descido e eu nem tinha visto, olhei para o lado e ele estava com sua mochila e a minha, esperando perto da porta. – Ih, quando ela viaja assim, demora pra voltar para o mundo. –

– Eu não viajei para lugar algum. – Suspirei, pondo as muletas um pouco a minha frente e dando um leve “pulo” para conseguir andar, era meio, complicado.

– Vai demorar isso em. – Jonathan fez um comentário, que me deixou tremendamente irritada.

– Jonathan, vá se ferrar! – A minha voz saiu meio rude e um pouco falhada, eu estava tentando me concentrar, para andar mais rápido.

– Ai deuses, assim não chegamos à escola hoje! – Ouvi Eduardo dizer, e eu suspirei, pensei seriamente em não ir mais a escola. – Me deixa resolver isso! – Senti alguém se aproximando de mim pelas minhas costas, olhei ao redor, e em alguns segundos estava no colo de Eduardo.

– Me põe no chão! – Gritei com Eduardo, eu era orgulhosa de mais, para ir para a escola carregada.

– Ainda bem, vamos Edu, a escola começa em quinze minutos. – Ouvi Jonathan falar da porta. Era um complô contra mim! Que injusto.

Os meninos riam muito, ou melhor, gargalhavam de forma alta, eu devia estar totalmente vermelha, escondia o meu rosto no corpo de Eduardo quando alguém cumprimentava-os, agora eu queria que Eduardo fosse aqueles nerd’s que não tem nenhum amigo, tipo eu assim.

Eu nunca me senti tão envergonhada antes, na verdade, já sim, algumas vezes, mas agora, eu queria enfiar a minha cabeça em algum buraco, que nem um avestruz. Eles riam, e eu os xingava, muito mesmo. Queria enfiar a mão na cara deles, e algumas pessoas perguntavam o porquê deles estarem fazendo isso, e eles só riam, assim, deixando a outra pessoa livre para rir de mim, também. Humilhação era para os fracos, oque eu estava passando ali, não tinha nem nome, ainda.

– Pronto maninha, enfim na escola. – Ouvi a voz de Eduardo, enfim, isso acabaria.

– Me põe no chão logo! – Falei batendo no tórax do mesmo.

– Calma, que mau humor, em. – Senti minhas pernas se erguerem, enfim estava no chão. Só não sabia como ia conseguir andar.

– Ih, o meu amor já consegue ficar em pé sem as muletas, Edu. – Jonathan gargalhou da situação, e eu quis bater nele, se eu pudesse, eu tinha batido.

– Ah, que lindo. – Meu tom irônico, os fez rirem. – Nenhum dos idiotas lembrou-se de trazer a droga da muleta, não é? – Eles se entre olharam, respondendo minha pergunta.

–A gente vai te ajudar a ir até a sala. – Mesmo sendo mais velhos que eu os dois palermas tinham repetido de série uma vez, então, estudavam comigo.

– Eu tenho que andar o colégio toda carregada pelo Eduardo, é isso? – Olhei para os dois bufando, “idiotas”, pensava comigo mesma.

– Não, eu to cansado já, seu namorado que te ature hoje, amanhã eu te aturo, e assim, vamos revezando. – Eles gargalhavam, e eu me senti sinceramente ofendida.

– Eu? Eu não pequei para ter que pagar, aturando essa aí. – Jonathan gargalhou, e deu vontade de gritar oque ele estava fazendo comigo.

– Não preciso eu vou sozinha! – Dei um grito com os dois, que pararam de rir, e todos os outros ao nosso redor, olhavam para mim.

Virei o meu corpo a fim de não encará-los, eu estava com raiva agora, afinal eu não estaria naquela droga de situação se Jonathan não tivesse me obrigado a fingir que estávamos juntos, ou talvez, se a vida do meu irmão não fosse tão perfeita, eu não precisaria estar nessa sozinha, mas do jeito que aquele idiota era, o nosso mundo já teria desabado há muito tempo, se isso estivesse nas mãos dele. Eu estava ali, por que eu estava protegendo a droga da carreira de futebol e reputação que ele demorou a conseguir, quem sempre viu chorando foi eu, e agora estava me sacrificando por ele, e o idiota fazendo piada da minha situação. Vontade de abrir o jogo, eu tive a todo o momento, mas eu não podia, porque sua gargalhada era o jeito dele expressar que estava feliz, e era pela felicidade dele que eu estava ali, me fingindo de namorada do popular, eu ainda só não entendia, o porquê daquilo, tanta menina querendo ele...

– Precisa de ajuda, Tatiana? – Ouvi uma voz me chamando. Uma voz estranha. Não a reconhecia.

– Hã? – Observei o garoto de cima a baixo, não o reconhecia. – Como sabe o meu nome? – Perguntei ainda meio “abobada” com aquele menino, ele era bonito, não como Jonathan ou Eduardo, mas era bonitinho.

– Sei muita coisa de muita gente dessa escola aqui. – Ouvi sussurrar como se para ninguém ouvisse. – Enfim, meu nome é Pedro, eu vi que estava parada aí, e vi que gritou com o seu irmão e o seu namoradinho... – Ele parou de falar, e eu queria que ele soubesse menos da minha vida.

– Hã. Você sabe muito da minha vida, não é? – Engoli a seco minha saliva. – Não preciso de ajuda, eu posso me virar sozinha! – Fui rude, mas ele tinha sido tanto intrometido.

– Tatiana! – Ouvi alguém falar do outro lado. – Oque esse menino quer contigo? – Pronto agora todo mundo queria saber da minha vida, que saudades de ser apenas uma nerd. – Saí daí garoto, essa garota tem namorado já! – Quando pude reconhecer a voz, tive vontade de me matar.

– Eduardo! O Pedro só veio se oferecer para me ajudar. Deixa de ser ignorante! – As palavras dele me fizeram mal, só me fizeram lembrar que infelizmente, eu tinha um namorado. Eu acho.

– O mande oferecer ajuda para a puta que o pariu. – Escondi o rosto nas mãos, eu sempre xinguei, e ele também, mas agora, tinha sido de mais.

Ouvi o sinal bater e todos saírem para ir para suas salas, Eduardo se aproximou de mim, para me ajudar ir até a sala, mas o impedi e o empurrei, eu não queria a ajuda dele, nem de ninguém. Eu ficaria ali parada, até tomar coragem para conseguir me jogar em algum lugar. Aquela situação estava me fazendo deixando totalmente atordoada. A minha paciência estava se esgotando, quando eu perdesse-a de vez, eu ia acabar jogando no ar tudo que eu estava passando, não era fácil, não tinha nem três dias nessa situação e a minha vida já tinha virado um inferno, não que ela fosse perfeita antes, mas agora ela estava começando a ultrapassar os limites de qualquer garota possa suportar. Acho que se tivesse um homem no meu lugar já teria desistido há muito tempo, eles são frágeis. Não estou minimizando um homem, só que eu já estava de saco cheio de ter que fazer tudo para o “homem da minha vida”, que geralmente as mulheres só têm um quando estão apaixonados, no meu caso, o meu homem, era o meu irmão, já que era o único homem que eu queria próximo a mim. E mesmo assim, ele continuava me deixando com raiva às vezes.

– Vem menina, eu te ajudo, deixa de ser orgulhosa! – Aquela voz grossa continuava a interromper os meus pensamentos.

– Não preciso da sua ajuda! – Falei rápido, trocando algumas palavras, mas ele entenderia.

– Está nervosa, é? Trocar as palavras nunca é um bom sinal. – Quase pude sentir que ele ria, queria encará-lo para ter certeza.

– Não estou nervosa, estou cheia de pessoas me infernizando. A minha vida parece um inferno ambulante. – Fui clara a agora, sendo um pouco grossa.

– Deve ser muito chato ter a sua vida mesmo. Ter um irmão popular, um namorado, digamos convencido. – Eu ri. – E ser uma nerd. – Agora pude ouvi-lo rindo.

– Você não sabe de nada da minha vida, na verdade, nem o meu pai sabe, e você fica aí dando palpites. – Bufei. – Não deveria estar estudando? Matar aula da suspensão. – Encarei a parede alguns segundos. Parecia que gente chata, brota na minha vida.

– Eu não preciso estudar. Eu já sei de tudo que o professor Fred vai ensinar mesmo. – Eu ri, mais um convencido. – E você também, né Tatiana. – Aquele garoto, estava me tirando do sério.

– Só aparece gente insuportável nessa porra de escola, é isso? – É, eu xinguei, tinha chegado ao meu limite.

– Ah, eu sou menos insuportável que muita gente, eu garanto. – O ouvi gargalhando, que saco. – Que palavreado feio, menina. –

– Quer saber oque é feio? E ter que aturar tudo isso com pose de boa menina. Que saco, porra! Caralho, é eu tenho um palavreado inapropriado para crianças da sua idade, então, vê se me deixa em paz. – Bufei, agora virando para encará-lo.

– Estresse dá rugas, sabia? – Ele estava encostado na parede, me olhando, como se nossa conversa fosse normal. – Tudo bem, eu deixo você falar assim, só hoje, tá? – Eu gargalhei.

Eu gargalhei mesmo, ficando sem ar e voltando a ter um pouco de ar, para voltar a gargalha novamente. Ele me encarava, mas eu precisava rir. Nem o meu pai mandava em mim, na verdade, nem eu mandava. Fazia oque em dava na telha, se eu fosse me arrepender depois o problema era meu. Era assim a minha vida, e agora vem um adolescente revoltadinho da vida dizendo que me permite falar palavrão? Era uma situação hilária, queria poder ter gravado e mostrado para Eduardo e Diogo, eles ririam comigo, afinal, ninguém nunca antes pensou em me dizer oque fazer.

– Não ri não. Eu to falando sério. Vou te ensinar a ser educada, garota. – Bufei, ele estava mesmo me chamando de mal educada.

– Tente para ver. Vai se ferrar, garoto. Vai vagabundear longe de mim. Que eu não to com paciência para mauricinho hoje não! – Ele riu, descruzando os braços e andando para perto de mim.

– Como você atura seu namorado, então? – Eu tive que rir, Jonathan era mauricinho mesmo. Só que, ele não estava me irritando nesse momento.

– Fica longe de mim! – Eu gritei, é, fui escandalosa. Eu senti frio na barriga quando ele parou na minha frente. – Saí de perto de mim. – Gritei um pouco mais alto, e tive minha boca tapada pela mão dele.

– Fica quieta! Quer que todo mundo veja você sentindo medo de um simples garoto? – Ele riu, e eu tentei tirar a mão dele da minha boca.

– Saí de perto dela! – Finalmente pude me sentir um pouco aliviada, eu não prestei atenção em quem gritava, só podia sentir o garoto saindo de perto de mim.

Olhei para trás e vi a professora de Educação Física do ensino fundamental, eu me senti totalmente aliviada, o meu corpo relaxou de forma que há tempos não estava, porque com o Jonathan por perto, não dava para relaxar nunca. Na verdade, eu só me sentia bem quando, estava no meu mundo, um lugar onde não tinha mais ninguém além de mim, buscando aventuras num mundo paralelo, onde em algumas vezes imaginava-o medieval, e em outras vezes, imaginava-o uma floresta. Era hilário, mas era bom.

– Você tá bem? – Senti uma mão repousar no meu ombro, tirando-me dos meus pensamentos.

– To sim, eu acho. – A professora do ensino fundamental, era bem gentil.

– Eu vou te levar para a sala de aula. – Senti um alivia tremendo, pelo menos, poderia assistir às aulas.

– Tudo bem. Mas vou ter que me apoiar em você. – Disse corando um pouco, demonstrar fraqueza não era muito bom.

– Não tem problema não, menina. – Ela não me reconhecia, ainda bem, quando estudei com ela, não era um exemplo de aluna.

Apoiei-me nela e fomos andando, sem pressa alguma, talvez eu tivesse que ficar sentada no fundo classe sozinha, por estar um pouco, ou muito atrasada. Mas, era a aula do professor Fred, então, ele entenderia com certeza. Era um ótimo professor o melhor. Quando eu tinha onze anos, eu dizia para a turma que ele era um bruxo, que nem em Harry Potter, e lembro também que inventaram que ele tinha um caso com a professora de ciências, meses depois ela até pediu demissão, por que alguns alunos conseguiram fotos dela de biquíni, e colaram na escola. E como já dizia minha vó, quando era viva “esses alunos de hoje em dia são uns animais”, naquele momento que humilharam a pobre da professora gordinha, ela foi embora. Acho que foi naquele ano que me tornei uma chata. É aquele teria sido um dos melhores e piores anos da minha vida. Naquele ano eu perdi meu irmão, entre aspas, porque ele tornou-se um pouco popular, ai me esnobava com os outros meninos. E também, tinha perdido minha mãe de vez, se eu soubesse que seria o último ano que a veria, teria ido vê-la mais vezes. Pediria que ela fizesse um filme, dizendo o quando me amava, e quanto sentia saudades de mim. Mas, naquela época, infelizmente, eu não podia ver o futuro.

– Está entregue, professor Fred. – Ouvi a professora do ensino fundamental se afastar.

– Então mocinha, vem, vou te ajudar a ir até sua mesa, para prestar atenção no resto da aula. – Eu quase posso sentir minhas bochechas ardendo de tanta vergonha que eu estava sentindo.

– Deixa que eu ajudo ela, professor. – Ouvi uma voz vinda do final da classe, olhei e vi Pedro de pé.

– Não, o professor me ajuda. – Minha voz saiu meio falhada, mas soou como um pedido de socorro.

Apoiei minhas mãos no ombro do professor e ele me ajudou a sentar no lugar de sempre, Jonathan estava encarando Pedro, e Eduardo também. Virei o rosto para o lado para não perder a paciência. Tinha três palermas numa turma só para tirar a minha paciência. Um palerma eu já conseguia aturar, mas também, só aturava porque amava. Os outros dois, eu queria mandar para o inferno, mas naquele momento, eu comecei a achar que eles tinham sido expulsos de lá, porque nem o capeta merecia.

– Ei Tatiana, do que o Pedro estava falando, quando disse que “me atrasei por causa da sua namorada”? – Pus a mão na cabeça, não queria me estressar.

– Aquele garoto é um pé no saco. Ele se aproximou de mais de mim, eu gritei, e a professora de educação física me ajudou a chegar até aqui. – Olhei para o lado encarando Jonathan, era engraçado o fato dele não querer ser considerado corno.

– Ele fez oque? Ela tá querendo tomar uma surra! Ele não pode chegar perto da minha garota. – Eu ri, com a situação, parecia mesmo que ele estava com ciúmes de mim.

– Sua garota? – Eu ri, e ele ficou um pouco corado.

– É sim. Minha garota. Minha namorada. E eu não tenho vocação para ser corno! Então, ele vai se vê comigo. – Sabe aquela expressão “agora a porra ficou séria”? Então, isso se encaixava perfeitamente nessa situação.

– Não vai arrumar encrenca em Jonathan! – Bufei. – Já me basta estar sendo conhecida como sua garota, agora a garota que levou a uma briga, eu não vou suportar. – Encarei-o alguns segundos desviando o olhar para Eduardo, que parecia bem irritado.

– Tudo bem. Agora, se ele tentar falar contigo de novo, não vai ser só eu que vou me irritar. O Eduardo, também não gosta dele! – Ele disse apontando para o Edu.

Quantos idiotas uma menina tinha que suportar até que venha o príncipe encantando? Muitos idiotas, muitos. A maioria dele as “princesas” iriam encontrar nas escolas, os sapos que diziam que virariam príncipes depois de um beijo, aí ganhavam o beijo e algumas coisinhas a mais, e continuavam sapos, mas partiam para outras princesas inocentes. Ou princesas que se diziam inocentes.

Os minutos pareciam que não passavam cada segundo, cada batida do meu coração que eu contava, parecia que fazia o tempo passar mais devagar, Fred falando estava me dando dor de cabeça, e alguns alunos pulavam e gritavam em sala de aula, isso me irritava. Olhar aquela bagunça era como, se o meu mundo me chamasse de forma rápida repetindo diversas vezes nos meus pensamentos “Tatiana, precisamos de você aqui. Tati precisamos de você.” E várias e várias vezes eu tive vontade de ceder aos pedidos da minha imaginação. E me deixar levar pelo meu mundo, lá não tinha nem um idiota, nem um sapo, nem um nada. Só tinha eu, que por incrível que pareça não era nenhuma princesa indefesa. Pelo contrário era uma plebeia muito corajosa. Aquele barulho infernal da sala de aula, que eu teria que ouvir mais um ano ainda, me estressava de mais. Eu deixei a minha mente se esvaziar, observando cada aluno, os meninos e as meninas. Os nerd’s e os descolados. Os morenos e os loiros. Cada um com a sua aparência, aqueles com os óculos, que estavam na moda, e as patricinhas com os cabelos preso em coque, já que estava na moda. Cada aluno com a forma da unha diferente. Com os olhos de cores diferentes. A Larissa tinha aqueles olhos engraçados, um verde e o outro meio azul. E ainda por cima usava óculos. Os meninos babavam nela. Que pelo oque eu sabia, nunca tinha cedido a nenhum. Era fiel ao tal do namorado via internet. Já Diego, tinha os olhos grandes e castanhos, magrelo que dava dó. Não sabia praticar nenhum esporte. Mas se enturmava com a galera, para que no dia da prova, pudesse passar cola para qualquer um. E assim iam os alunos, alguns inteligentes os outros medianos. Uma sala de aula com vinte e oito alunos, vinte e oito pessoas completamente diferentes, criações diferentes, e todos pareciam se dar bem. Mesmo com todas aquelas diferenças, tanto física como psicológica. Era nessas horas que eu perguntava para mim mesma o porquê de eu odiar tanto estar naquela turma, talvez porque eu queria estar na turma avançada, na turma dos nerd’s, oque não deu certo já que eles diziam que eu ainda não podia. Mesmo estudando com eles no horário da tarde, mesmo a cada momento que se passava naquela escola, eu mostrava que era capaz de ser igual a eles. Nem assim, o pessoal da diretoria se convencia que realmente a garota rebelde que aprontava com onze anos, não estava mais presente entre nós.

– A prova é semana que vem não se esqueçam, em. – Ouvi o sinal bater, cortando a observação que eu fazia nos alunos.

Os outros alunos corriam em direção a porta, daqui a quinze minutos eles teriam que voltar para as salas de aula, então eu nunca me empolguei tanto com o intervalo entre as aulas. Para mim deveria ter apenas um, assim como nas outras escolas, mas a nossa escola cismava que fazer isso deixava os alunos mais livres e mais inteligentes, oque eu discordava friamente.

– Olha para minha beleza, Tatiana. – A voz grossa voltava a me atormentar.

– Oque foi voz grossa? – Perguntei ouvindo-o gargalhar. Não acreditava que tinha chamado o daquela forma. Estava totalmente vermelha.

– Do que você me chamou? – Senti meu rosto corar mais, afundei minha cabeça nos meus braços, parando de encará-lo.

– Não te chamei de nada. – Bufei. – Poderia sumir daqui, por favor? – Fui educada, isso era raro, então ele poderia pelo menos atender a esse pedido.

– Não gosto de intervalos. Prefiro ficar na minha. Ainda mais que aqui, ninguém gosta de mim. – Senti o desviar o olhar de mim.

– Ah, nem sei por que não gostam. Acho que as pessoas não gostam de ser incomodadas. E isso que estava fazendo agora. – Bufei, voltando a olhá-lo. – Se eu disser que não gosto de você também, você vai embora? – Perguntei olhando para a porta.

– Não, porque eu sei que você me ama. – Gargalhei. – Não ri não, tá. – Ele riu. – Eu sei que a única pessoa que você ama na face da terra é seu irmão. – Ele estava mesmo investigando a minha vida? – Ouvi alguns boatos. –

– Tá ouvindo demais para o meu gosto. – Encarei a porta e alguns alunos que passavam e olhavam para a gente, como se eu estivesse atracada com ele. – Falando em ouvir, meu irmão não vai gostar de saber que você tá aqui. Vai embora, por favor. – Pedi por uma última vez, a vida era um desastre mesmo.

– Eu não ligo para o seu irmão. – Sério? Nem tinha percebido isso. – Ele é um Mané, assim como seu namorado. – Porra, que garoto tremendamente sensual e chato. – Como consegue beijar aquele mauricinho? – Ele foi irônico. E eu tive mais vontade ainda de manda-lo para o inferno.

– Da mesma forma que alguém consegue falar com você. – Fui curta e grossa, ele estava me tirando do sério.

– Oque que ele tá fazendo aqui? – Ouvi alguém gritar da porta, olhei e vi Jonathan e Eduardo adentrando a mesma.

– Estou me perguntando isso desde que ele sentou ali. – Bufei olhando para os lados, as pessoas desse colégio inventam qualquer coisa para ver uma boa briga.

– Opa, eu só estava conversando com ela. A garota ainda não tem dono, pelo que eu saiba. – Acho que Pedro estava pedindo para tomar uma surra, sorte a dele que odiava violência física.

– Não tem dono. Mas tem um irmão e um namorado. – Pude ouvir Jonathan falar. Pelo menos, ele não gritava e nem fazia algum tipo de escândalo.

– Muito possessivos pelo que estou vendo. – Pedro acrescentou. Ele tinha bons argumentos. Só tinha esquecido que os palermas parados na porta, quase podiam se considerar analfabetas.

– Você não viu nada. A minha irmã. – Ele de ênfase na palavra irmã. – E só minha! E eu não quero você falando com ela entendeu? – Eduardo se aproximou da mesa que eu estava como quem queria esconder alguém.

– Eu também não quero esse garoto aí, perto da minha namorada. – Tive vontade de gritar e acabar com tudo, mas acabei ficando calada mesmo. Jonathan ficava parado ao lado de Edu, bloqueando a minha visão do resto da sala.

– Será que eu podia falar? – Perguntei sentando corretamente na cadeira. – Ele veio perguntar por que os alunos não gostavam dele e eu respondi. E passou alguns alunos me encarando como se eu me atracasse com ele. Agora me diz, quando é que algum dos dois, ou melhor, alguém já me viu beijando alguém nessa droga de colégio? – Fui dura, eu quase que gritava com ele. Três palermas um do lado do outro. Isso era raro.

– Isso é verdade. Mas mesmo assim, o quero longe de você. – Ouvi Eduardo dizer, sério mesmo que ele estava dando uma de irmão protetor, eu teria que aturar palermas possessivos agora?

Vi Pedro se afastando dos palermas e saindo da sala, enquanto os dois me encaravam como se eu tivesse cometido algum crime. Conversar com alguém agora é crime. Imagina se eu conversasse com duas pessoas ao mesmo tempo, eles iriam me algemar em algum canto.

– Vão ficar me olhando com essa cara de quem espera uma reposta? – Encarei-os. – Eu já disse oque aconteceu. Vão ser possessivos agora, é? Que chatice. – Eles se entre olharam, estressei os dois.

– Acalma sua namorada com um beijo, irmão. – Vi Eduardo bater no ombro do Jonathan após dizer isso e sair da sala de aula.

– Nem pense nisso, Jonathan. – Olhei para o outro lado, droga de pernas que não serviam nem para eu fugir agora.

– Ah, Tatiana. Tem três dias que eu não dou um beijo de verdade. Esse é o namoro mais sem graça que eu já vi.

– Esse é o preço que se paga por chantagear alguém, e obrigar a pessoa a ficar contigo. Nunca vai ter um beijo meu de verdade, Jonathan. – Joguei na lata, quem sabe ele desistia dessa paranoia.

– A minha mãe disse que nunca me viu tão preocupado com alguém antes. Disse que você me faz bem e que quer te conhecer. – Encarei-o alguns segundos, quase em estado de choque.

– Eu não vou conhecer a sua mãe. Eu não te faço bem. E você não se preocupa comigo. – Mudei todos os fatos que estavam “em cima da mesa”.

– Poxa, eu acordei quatro da manhã, se isso não é preocupação não sei oque é. Tem três dias que não me meto em encrenca, ou seja, me fez bem. – Ele sorriu, porque diabos os rebeldes tinham que ser tão lindos? – E o fato de conhecer a minha mãe não é tão ruim. Poxa, ela é muito diferente de mim, ou seja, é chata, que nem você assim, vão se dar bem. –

– Se eu sou tão chata, você poderia arrumar outra menina para chantagear. – Parei de encará-lo, olhando para a porta.

Ele permaneceu em silencio, apenas sentou-se na carteira ao meu lado e ficou me encarando. Jonathan era um menino bonito, alto, forte, meio magrelo, mas mesmo assim, lindo. Podia ter todas as meninas que queria, e para que chantagear a uma? Só para poder por no caderno de anotações que já pegou todas as meninas da escola? Ele poderia anotar ali que tinha me beijado sem nem ter me beijado que todos iriam acreditar. Então, não tinha muito bem um motivo específico. Era só fogo dele mesmo.

– Às vezes perto de você eu me sinto a pior pessoa do mundo, você manda tudo na lata, parecia que não se importa com ninguém. – Encarei-o alguns segundos, parecia até que ele estava chorando.

– Como você deve saber, eu não tive tudo que eu sempre quis na minha adolescência. Então eu sempre fui sincera. Pelo menos, a consciência limpa eu tinha. – Encarei-o novamente, e ele limpava algumas lágrimas que escorriam no seu rosto. – Não chora. Por favor. – Se tinha um ponto fraco em mim, era ver alguém chorar. – Ai meu deus, eu fiz você chorar. Como eu sou ruim. – Eu repeti para mim algumas vezes.

Tentei ficar de pé, e caí, Jonathan continuava deixando aquelas lágrimas caírem em seu rosto. Tentei novamente e consegui, me apoiei na mesa da frente, onde ele estava sentado e consegui dar os passos até lá. Sentei na ponta ali do lado de sua cadeira, estava me sentindo péssima, ainda mais que agora ele já não me encarava mais. Ele tentava esconder seu rosto. Sabe quando você pisa na patinha de um cão ou de um gato, e se sente péssima? Era assim que eu estava me sentindo.

– Ei, olha para mim. – Passei os dedos no rosto dele limpando suas lágrimas. – Você é um rapaz bonito, pode beijar quem quiser Jonathan. – Disse fazendo-o me encarar.

– Eu não acredito que to chorando que nem um bebê na sua frente. – Ele disse passando a mão no rosto. – Mas sei lá, perto de você eu me sinto um monstro. – Pode sentir meu rosto corando. – Eu me sinto sem coração, e pode não parecer, mas eu também tenho sentimentos. Não sou um robô. – Ele deu um sorriso meio torto, como quem tentava se convencer que estava bem.

– Eu nunca pensei que você fosse sem sentimentos. – Menti, mas ele estava chorando. – Olha, eu só não entendo o porquê de ter que me chantagear para conseguir alguma coisa. – Suspirei e ele também. – Digamos que se você fosse uma pessoa mais amigável comigo, quem sabe eu gostasse mesmo de você. Sendo chantageada não rola, não é? – Disse forçando um sorriso suave.

– Desculpa Tatiana. Desculpa. – Ele suspirou tirando as últimas lágrimas de seu rosto. – Mas acredite, tem um motivo para tudo isso. Não é só por mim. Tem um motivo, me desculpe. – Meu coração acelerou, mas gente sabia da minha mãe? – Apenas não me odeie. – Ouvi suas palavras, mas ainda estava em choque.

– Como... – Suspirei. – Quem é que sabe da minha mãe além de você, Jonathan? Você prometeu que enquanto eu estivesse contigo ninguém saberia dela. Ninguém pode saber, destruiria a minha vida. Quem é que sabe dela? – Eu não gritei, nem falei num tom estressado. Era mais para uma voz de quem fosse começar a chorar.

– Ei calma. Sim, pessoas que viveram contigo anos atrás devem saber. – Suspirei como ele poderia brincar naquela hora? – Não chora Tatiana. Só eu sei da sua mãe. E não entendo o porquê de ser tão ruim alguém saber. Muita gente tem problema com a mãe e álcool. – Tapei a boca dele com a minha mão, era horrível entrar neste assunto.

– Fica quieto. Não gosto desse assunto. – O encarei, os olhos dele eram bonitos, aqueles castanhos que penetravam os seus olhos, te mantendo num transe.

– Desculpa Tati. – Ele me fitou da mesma forma eu estava encarando, e aproximou seu rosto do meu.

– Não vou te beijar Jonathan. Só acho seus olhos bonitos. – Sussurrei virando o rosto para a porta da sala.

– Eu não ia te beijar. – Ele bufou. – Você que veio para cima de mim. – Ele tentava se defender.

– Eu? Eu sou santa, meu amor. O tarado da história toda é você. – Fui irônica, queria quebrar o clima tenso.

– Eu? Tarado? Poderia ser um padre, querida. – Ele mexeu o cabelo de um lado para o outro, e eu tive que rir.

– Aqueles padres que abusam das crianças, né? Já ouvi falar na televisão. – Ele gargalhou alto, e eu ri da sua gargalhada.

– Ai meu deus, é isso que as pessoas pensam de mim? – Ele perguntou me fazendo rir, porque só eu que pensava dele naquela forma mesmo.

– Não só eu mesmo. As outras pessoas pensam que você abusa de velinhas. – Gargalhamos, pela primeira vez, de verdade.

– Seu sorriso é lindo, sabia? – Pronto, ele decidiu estragar o momento me cantando.

– Pode parando. – Me afastei dele um pouco encarando a porta.

– Calma, eu só disse por dizer mesmo. Não sou tarado. – Ele disse rindo, me fazendo rir também.

O sinal bateu e ele me ajudou a sentar na minha cadeira, o intervalo tinha sido um drama hilário, na verdade, eu não entendi muito bem oque tinha acontecido ali, mas tudo bem, ficar na guerra com qualquer pessoa não era bom, e já que eu teria que suportá-lo mais alguns dias, era melhor ficar em paz. Teríamos aula de biologia agora, sabe era só metade do ano que tínhamos essa matéria, então não me preocupava muito, na verdade, não me preocupava nada.

Prendi o cabelo em coque, era uma das grandes vantagens de não ter o cabelo escorrido, você podia dar um jeito nele fácil. Olhei em volta, e por incrível que pareça a turma prestava atenção na aula. Talvez, porque eles fossem péssimos nessa matéria, ou também, porque finalmente algum anjo da guarda tinha ouvido os meus pensamentos, fazendo a turma calar a boca. As vezes era até bom conversar com alguém, mas agora, a minha bipolaridade havia atacado, eu estava nem minutos antes, e de repente, veio turbilhão de pensamentos atacando a minha felicidade, fazendo com que eu me sentisse meio mal, por estar ali, naquele lugar, ao invés de ir ver minha mãe. Não que eu pudesse largar tudo e ir vê-la, porque, eu às vezes me perguntava o porquê dela ter ido embora, oque eu fiz para ela ir e me deixar sozinha. Eu sempre disse que a amava, eu e Eduardo, ela era a nossa mãe, mas se foi, como se não tivesse compromisso com nada. No início achei que a culpa fosse do meu pai, mas na verdade, poderia ser minha também. Às vezes ela queria curtir a vida dela sem filhos, ela não me amava. Porque mamãe, porque que você não me ama?

Senti alguém passar por perto da minha mesa, olhei para trás seguindo a pessoa com os olhos, eu não reconhecia aquela garota, nunca havia visto-a, nunca tinha reparado em tanta coisa, que se ela estudasse conosco há muito tempo, eu não teria notado ela ainda. Virei meu rosto para a janela, eu olhava o dia, como eu queria que começasse a chover que nem nos clipes de músicas, era legal me imaginar num deles, mas eu era só mais uma garota comum, como qualquer outra. Uma adolescente com os pais divorciados, com um irmão insuportavelmente chato, mas que eu amava. Assim como deveriam haver outras milhares de meninas assim, afinal, eu não era única muito menos especial. Quantas pessoas parecidas comigo não deveriam existir? Feias, problemáticas, nerd’s, simplesmente, pessoas normais. E isso doía tanto, porque eu não tinha uma vida como a de Demi Lovato ou One Direction? Porque eu não tinha amigos que nem eles são. Por quê? Uns tinham a vida perfeita, e outros, não sabiam nem porque tinha vidas. E depois ainda dizem que o mundo é justo. Para mim isso é injustiça. Todos deveriam ser felizes, e já que todos deveriam ser, onde é que foi parar a minha felicidade? Talvez a minha mãe tivesse levado a na mala junto a ela. Só que ela não levou, porque nem mala ela pegou. Simplesmente disse que ia embora, que ali não era o lugar dela, e até hoje eu consigo lembrar o rosto dela, estampado de alegria, saindo pela porta, e eu gritando atrás dela, eu e Eduardo, implorando-a que a voltasse. Mas ela não ouviu. Simplesmente mandou-nos voltar, disse que eu tinha que ficar com o meu pai, disse que ele precisava de mim. Mas eu precisava dela, e naquele dia, eu soube que o amor não valia nada, que não importa o quanto à gente ame alguém, essa pessoa, talvez, não fosse te amar da mesma forma. Eu me lembro-me bem de eu caindo na calçada abraçando os joelhos e soluçando de tanto chorar, e Eduardo sentar do meu lado e desabar num choro profundo junto comigo, e meu pai pegando-nos no colo e levando-nos para casa. Também lembro que naquela noite, meu pai saiu para beber e deixou eu e meu irmão sofrendo em casa, naquela noite, eu descobri que só tinha ao meu irmão. E meses depois nos mudamos. Então começamos uma vida nova, e meu irmão também se afastou. E de repente eu me vi obrigada a enfrentar o mundo sozinha. Sem ninguém, era só eu e o mundo. Doeu muito passar por aquilo sozinha, mas eu percebi que aquele era o melhor jeito.

– Tatiana? – Ouvi uma voz me chamar, respirei fundo, pisquei alguma vezes e suspirei.

– Sim? – Pude ver da onde aquela voz vinha, a aula já tinha acabado, estávamos no intervalo entre as aulas.

– Prazer Tatiana, eu me chamo Giulia. – A garota me estendeu a mão, e pude vê-la sorrindo.

– Muito prazer Giulia, me chame de Tati. – Apertei a mão dela e ri, ela parecia simpática.

– Eu fiquei sabendo que você é meio desastrada e vim perguntar se somos gêmeas. – Ela riu, e eu também.

– Devemos ser. Sou desastrada, ruim com as palavras e vivo num mundo encantando chamado “Não entre sem ser a Tatiana”. – Ela riu, e eu percebi que ela tinha covinhas.

– Ah, achei minha gêmea. Se não fosse pela cor do cabelo, iriamos ter que fazer teste de DNA. – Ela riu, me fazendo rir novamente. Ela era realmente linda.

– Você tem covinhas, isso é tão fofo. E ainda é mega inocente, meu deus, me deixa trocar de vida com você. – Ela riu suave, e pude perceber que ela tinha algum tipo de cicatriz no pescoço.

– Se você conseguir aturar o meu irmão, trocamos de vida. – Aquela garota tinha a vida idêntica a minha, ou quase.

– Se você suportar o meu irmão, te dou um prêmio. – Ela riu, olhando para a porta.

– Seu irmão é bonitinho. – Suspirou e eu ri. – Mas enfim, aqui tem intervalo depois de todas as aulas, isso não é normal. – Gargalhamos.

– Sim, eu acho meio ridículo, poderíamos ser um colégio normal, mas... – Suspirei.

– Eu também não curti, sei lá, aumenta nosso tempo na escola. Achei ofensivo. – Eu ri, ela deveria ser muito viciada em internet.

– Você é nova? Nem te reparei, sei lá, eu sou tão desligada que só fui descobrir quem era o professor de português depois que de três semanas de aula. – Ela riu de mim, e aquelas covinhas, estava me dando inveja.

– Eu cheguei hoje, vi você conversando com aquele garoto Pedro, e também com aquele bonitinho, jogador de futebol. – Suspirei. – E o gostoso do seu irmão. – Rimos.

– Posso te apresentar a ele, mas digamos que ele, não curte nada sério. – Ela suspirou, como se já soubesse disso.

– Eu posso tentar mudar isso, ele parece ser tão fofo. – Me engasguei rindo quando ela terminou a frase.

– Não, não se decepcione, meu irmão é um ogro. Não serve para você. – Ela riu de mim, fitando minhas pernas.

– Pelo que percebo não sou a única a cair por qualquer canto não é? – Olhei para as minhas pernas, era claro que eu não conseguia andar.

– Pois é, sabe como são, lugares com piso molhado. – Rimos. – Mas e essa cicatriz no seu pescoço, caiu num poço? – Perguntei rindo, fazendo-a gargalhar alto.

– Fui comida por um dragão, e ele não gostou e me vomitou. Quando ele vomitou, veio um idiota me empurrou escada a baixo e meu pescoço ficou preso na grade. – Gargalhei alto, que guria doida.

– Nossa, que emocionante. – Eu ri, respirando fundo encarando a porta. – Que é nunca me viu rir? – Olhei para Jonathan parado na porta ao lado de Eduardo.

– Não dessa forma, tão sincera e inocente. – Ele entrou e Eduardo veio atrás do mesmo. – Olá Giulia, me chamo Jonathan, jogo futebol e sou namorado dessa menina feia aqui, tá vendo? – Estendeu a mão para ela, que fitava Eduardo.

– E eu me chamo Eduardo, irmão daquela garota ali, e jogo futebol também. – Estendeu a mão para ela, e a mesma apertou a mão dos dois.

– Agora vocês vão embora que eu to conversando com a Giulia. – Empurrei Jonathan com uma das mãos, e ele riu.

– Eu não, vou ficar aqui, sentadinho. – Sentou no meu colo, e pude sentir que realmente, ele não era tão pesado.

– Saí de cima de mim seu gordo! – O empurrei com as mãos, e o mesmo levantou.

– Eduardo, leva a Giulia para conhecer o colégio. – Pude sentir maldade em sua voz.

– Giulia não vá com esse pervertido. – Gargalhamos menos Edu, que corou.

– Eu sou santo. – Ele disse pondo uma mão no rosto, fitando Giulia.

– Santo, que nem aqueles que foram expulsos do céu, né? – Giulia disse rindo, fazendo-nos rir também.

– Poxa todo mundo pensa mal de mim, vou ir comprar bala agora. – Ele se esticou e puxou Giulia pela mão. – Vem comigo? – Corou e ela também.

– Vão lá, vão. – Jonathan empurrou eles porta a fora, e eu ria.

– Vai você também. – Comentei enquanto ele voltava em minha direção.

– Eu sei que você me ama. – Ele sorriu que nem um bobo e sentou do lado da minha cadeira.

– Quem é que te enganou? – Ri fitando-o, e ficamos em silêncio.


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