Coração Vago escrita por KatherineKissMe


Capítulo 34
Capítulo 33




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"I blame everyone else not my own partaking
My passive-aggressiveness can be devastating
I'm terrified and mistrusting
And you've never met anyone who is as closed down
As I am sometimes"

Everything - Alanis Morissette

Era uma sexta-feira, três dias haviam passado depois do susto. Fatinha escutou o alarme do despertador e se levantou desativando-o. Ela estava acordada há horas, melhor dizendo, ela não chegou a dormir. A madrugada foi agitada, ou era Beatriz curtindo uma festa dentro do útero ou era a falta de posições para dormir. A barriga de sete meses atrapalhava, e muito.

“Era tão mais simples quando eu tinha o Bruno de travesseiro.” –Ela pensou se arrastando até o banheiro.

O banho foi gelado, com o intuito de despertá-la. Depois de banhada e devidamente vestida, a loira dedicou vários minutos da manhã para melhor a aparência através da maquiagem.

Bruno a encontrou sentada na bancada da cozinha com uma xícara de café na mão.

–Bom dia. –Ele a cumprimentou.

–Bom dia.

Ele foi até a cafeteira e se serviu.

–Você não deveria tomar café. –Ele disse.

–Eu sei. –Ela respondeu com um olhar culpado. –Estou abrindo uma exceção hoje, não dormi muito bem.

O moreno concordou e observou a loira pegar o waffle na máquina.

–Aceita? –Ela ofereceu.

Bruno aceitou e ela passou em um prato para ele. Vários ingredientes já estavam espalhados em outra bancada, e Fatinha foi até lá incrementar o seu café da manhã.

–O café está mais forte hoje ou é impressão minha? –Ele perguntou depois do primeiro gole.

–Eu acho que eu exagerei um pouco no pó. –Ela disse se desculpando.

O moreno reparou na roupa que ela vestia: um short curto e uma regata cavada. A lateral do sutiã preto de renda estava à mostra. Ele suspirou e tentou controlar o sentimento de posse que crescia.

Bruno mudou o foco da atenção para a arte que Fatinha fazia. O waffle havia sido acrescido de geleia de amora, bananas, chantilly e amoras em si. A loira pegou o prato já montado e foi para a mesa, levando também um copo de leite de soja na outra mão.

–O Michel me dispensou dos plantões. –Ela contou quando ele se sentou à mesa. –Ele acha que eu preciso reduzir a minha carga horária, e que o Pilha já está mais do que capacitado para o turno da noite.

–Eu acho uma ótima ideia. –Bruno disse. –Vocês já decidiram sobre a licença maternidade?

–Eu pretendo trabalhar até a Bia nascer. –O moreno engasgou, mas ela continuou falando. –O Michel não gostou muito da ideia, mas concordou que eu trabalhe enquanto der conta.

–Até a Bia nascer? Isso é muito arriscado. –Bruno comentou.

–Pelo contrário, não há risco nenhum. Boa parte do meu trabalho é ficar sentada atendendo aos hóspedes, não há esforço algum nisso.

–Mas e se a sua bolsa estourar no trabalho?

–De acordo com um dos livros que a sua mãe me deu, antes da bolsa estourar haverá contrações. Então as chances de eu entrar em trabalho de parto do nada são baixas.

–Mesmo assim, e se você tiver as contrações quando estiver trabalhando?

–Bom, aí eu vou ligar para o Michel ou para o Pilha para que um deles me substitua, depois venho aqui para casa me arrumar para irmos para o hospital.

–E se eu não estiver em casa?

–Aí eu te ligo, vou atrás da sua mãe, ou peço carona na rua, ou simplesmente pego um taxi. –Ela respondeu como se fosse óbvio.

–Prática você, hein? –Ele zombou.

–Sou muito prática mesmo. Só não faço eu mesma o parto porque não tenho formação. –Ela brincou.

–É claro. –Ele concordou.

O telefone dela apitou. Era uma mensagem de Ju, questionando o atraso da loira.

–Nossa, perdi a hora. –Fatinha comentou levantando da mesa.

Bruno observou a loira pegar um iogurte, a mochila e sair correndo dizendo “tchau”.

Fatinha encontrou Juliana na portaria, que esperava impacientemente.

–Nossa! O que aconteceu com você? –A it-girl perguntou.

–Me distraí no café da manhã. –Ela respondeu dando os ombros e saindo do prédio.

Ju a seguiu.

–Adorei o modelito. Tem assistido o “Dicas da Ju”? –Ela brincou.

–Ih, aquele vlog brega? –Fatinha perguntou fazendo cara de nojo.

–Isso tudo é ciúmes porque você ainda não apareceu lá? –Ju provocou.

–Não, eu não gosto da dona mesmo. –A loira brincou.

–Hn, sei. Sabe o que eu estive pesando? –A it-girl disse empolgada, ignorando a brincadeira. –Vou fazer um “Simplesmente Bia”!

–“Simplesmente Bia”? O que é isso?

–Vai ser uma extensão do “Dicas da Ju”, no qual eu exibo a minha afilhada fashion e dou dicas para as outras mães/madrinhas/avós de como deixar a sua filha/afilhada/neta na moda. E aí, o que você acha?

–Eu acho que o seu irmão nunca vai deixar você expor a nossa filha assim. Ele é ciumento demais pra isso. E para de falar que você é a madrinha da Bia, porque isso não está definido.

–Eu sou a madrinha da Beatriz e ponto, nem tente discutir comigo. Agora, mudando de assunto, faz quantos dias que você não dorme direito?

–Está tão na cara assim? –Fatinha perguntou.

–Olha, o corretivo e a base que você usou estão amenizando a situação, mas maquiagem não soluciona o problema. O Bruno não tem deixado você dormir, é isso? –Ju perguntou com um sorriso malicioso.

A it-girl torcia para que o casal fizesse as pazes.

–Quem dera o meu problema fosse o apetite sexual do seu irmão. –A loira disse suspirando. –Está cada dia mais difícil encontrar uma posição confortável com essa barriga enorme. A vida de baleia não é mole não.

–Vida de baleia... Olha o drama Fatinha. Você não engordou nada com a gravidez da Bia! Só a barriga que cresceu. Aposto que a diferença de peso é o peso da Bia.

–Que seja, o fato é que eu não consigo dormir direito há dias. Estou beirando a exaustão.

–Mas a sua barriga nem cresceu direito nessa última semana, é só você dormir do mesmo jeito que dormia antes dessa insônia começar. –Ju sugeriu.

–Não dá. –A loira disse.

–Por quê?

–Porque a dificuldade para dormir começou depois que voltei a dormir sozinha. Aparentemente o seu irmão é um travesseiro ideal.

–Meus amores, nesse passo de tartaruga que vocês estão só vão entrar no colégio depois do recreio. –Disse Robson chamando a atenção delas.

–Foi mal Robson. –Fatinha disse apressando o passo e sendo seguida por Ju.

–Mais um motivo pra você voltar com o Bruno. –A it-girl sussurrou para a loira quando elas entraram na sala.

–Juliana! –Fat brigou.

–Meninas, vocês já estão atrasadas, então entrem sem tumulto ou fiquem lá fora. –Jorge as repreendeu.

As duas se desculparam e cada qual foi para a sua carteira.

Fatinha tentava prestar atenção na aula que o professor dava, mas o sono que a consumia era tão grande que ela estava concentrada em manter os olhos abertos.

–Maria de Fátima, responda a pergunta. –Jorge chamou a atenção da loira que estava prestes a dormir.

–Oi? –Ela perguntou confusa.

–Quem foi o “Chanceler de Ferro” e por que ele foi apelidado assim? –O professor repetiu a pergunta.

Fatinha com o susto já estava acordada o suficiente para pensar.

–Otto Von Bismarck era conhecido como “Chanceler de Ferro” pela política baseada na força que ele usou para unificar a Alemanha. –Ela respondeu de imediato.

Todos ficaram em silêncio espantados pela resposta dada por uma aluna que estava praticamente dormindo há alguns segundos.

–Bem, pelo visto a memória voltou, mas a boa aluna ainda existe. Resposta correta. –Jorge elogiou.

Fatinha sorriu. Naquele instante a loira percebeu que ela gostava de saber das coisas. Desde pequena ela sempre foi muito curiosa, e era através dos livros e professores que ela matava essa curiosidade. Surpresa, ela percebeu que talvez gostasse de estudar. Ela ainda odiava matemática e física, mas pensava com mais carinho os poemas que Isabela passava na sala de aula.

Pensando em fazer o gostava, e não na opinião alheia, Fatinha foi até a sala dos professores no intervalo e pediu para falar com a professora de literatura.

–Oi Fatinha, algum problema? –Isabela perguntou estranhando a visita.

–Não, na verdade eu preciso de um favor seu.

–Que favor?

–Então, será que você poderia me emprestar um livro da Clarice Lispector?

–Claro! Então você finalmente decidiu ir atrás de uma citação verdadeira dela? –A professora brincou, feliz com o interesse da aluna.

–Também. Desde pequena eu gostei de ler, sabe? Mas eu acabei deixando de lado esse hábito para me dedicar a outras coisas menos... culturais. –Ela tentou explicar. –E como esse ano é decisivo, eu resolvi valorizar as coisas que são realmente importantes para o meu futuro.

–Fico feliz que você tenha tomado essa decisão. Sei que não vai ser nada fácil para você se dedicar aos estudos, mas pode contar com a minha ajuda. –Isabela disse. –Amanhã eu vou trazer o meu livro favorito da Clarice Lispector, chama “Água Viva”, já ouviu falar? Eu acho que você vai adorar.

–Sendo da minha musa inspiradora, eu vou amar! –Fatinha disse empolgada.

–Ótimo, então amanhã eu trago o livro para você.

–Obrigada Isabela! –A loira agradeceu.

O resto da aula passou tranquilamente. Fatinha continuava cansada, mas pelo menos conseguiu ficar acordada nos últimos três horários.

Já no Hostel foi só alegria, pois a loira adorava conversar com os gringos. Cada dia ela aprendia mais um pouco sobre diversos países que ela sonhava visitar.

No final da tarde Fatinha saiu do trabalho e passou na peixaria. Ela estava louca para comer peixe assado e iria realizar esse desejo. Ao chegar em casa ela limpou o peixe e o deixou temperando enquanto tomava banho. Depois de limpa, ela percebeu que ainda era muito cedo para assar o peixe, então decidiu relaxar um pouco.

Fatinha deitou no sofá com fones de ouvido, e folheando uma revista qualquer. Ela escutou de tudo o que havia no telefone, desde funk ao rock e a MPB.

–Bang bang, Gavrilo Princip. Bang bang, Europe’s going to weep. All for you, all for you, all for you, Sophia. Ela cantarolava acompanhando Alex Kapranos.

Talvez tenha sido o ritmo, ou a alegria da mãe, mas Bia começou a se mexer, quase como se dançasse.

–Está gostando da música, filhota? –Fatinha perguntou.

Bia continuou a se mexer, e a loira considerou isso um sim.

–Mamãe vai deixar você escutar a música. –Fat disse.

A garota levantou a bata que usava, deixando a barriga toda descoberta, e colocou o fone de ouvido dos dois lados da mesma. Era como se a Bia estivesse escutando a música.

Foi assim que Bruno a encontrou quando chegou em casa: com a blusa levantada, fone de ouvido na barriga e lendo uma revista.

–Cheguei. –Ele anunciou.

–Oi Bruno. –Ela cumprimentou.

–O que vocês estão escutando? –O moreno perguntou curioso se aproximando.

A música que tocava naquele instante era “A Outra” do Los Hermanos, o que fez Fatinha se lembrar de algo que ele disse no dia da briga:

–Cadê aquela garota que morria de vergonha de usar blusas curtas e só escutava Los Hermanos?

Bruno pegou o fone de ouvido para ouvir que música tocava, e a loira mudou imediatamente de faixa.

–“Show das Poderosas”? –Ele perguntou, não acreditando no que ouvia.

–Exatamente. Assim que a Bia começar a andar vou ensinar a ela uns passinhos de funk. –Ela provocou.

Bruno respirou fundo para não iniciar uma discussão. Fatinha percebeu que ele não tinha gostado nem um pouco da ideia, mas estava se esforçando para manter a paz.

–Eu vou tomar banho. –Ele disse devolvendo o fone de ouvido e saindo da sala.

A loira controlou o riso, e se levantou para preparar o jantar.

A noite correu normalmente. Eles jantaram, lavaram a louça e depois assistiram um pouco de televisão. Fatinha estava cansada, então deu boa noite e foi para o quarto dormir.

(...)

A garota olhou para o relógio irritada. Já havia passado da meia noite e nada dela conseguir dormir. Fatinha segurou as lágrimas, ela estava muito cansada e não sabia o que fazer. Ela havia tomado um leite quente antes de deitar, na esperança de ajudar no sono, seguido de um calmante, mas não tinha funcionado.

A beira de uma crise de nervos, a loira tomou uma decisão e torceu para que não se arrependesse no dia seguinte. Ela pegou o travesseiro e o cobertor e saiu do próprio quarto, indo em direção ao outro.

–Fatinha? Aconteceu alguma coisa? –Bruno perguntou preocupado, acordando com o barulho da sua porta sendo aberta.

–Aconteceu que eu não consigo dormir, e estou precisando de outro travesseiro. –Ela disse entrando no quarto.

–An, acho que tem alguns na parte de cima do meu guarda roupa. Vou pegar para você. –Ele falou.

–Não precisa, só chega pra lá. –Ela falou.

O quarto estava escuro, mas Fatinha percebeu que o moreno estava confuso ainda na mesma posição.

–Chega pra lá, Bruno. Deixa de ser folgado. –Ela mandou.

Ele chegou para o lado ainda sem entender o que ela estava querendo. A loira deitou na cama e olhou para ele.

–Nada de saliência para o meu lado. –Ela alertou. –A sua função aqui é unicamente de travesseiro.

Bruno não disse nada, e Fatinha se aproximou dele de modo que a barriga avantajada tivesse onde apoiar.

–Fatinha... –Ele começou a falar, mas foi interrompido.

–Travesseiros não falam, Bruno. –Ela disse.

Em poucos minutos Fatinha já estava adormecida, mas o moreno continuava acordado. Ele ficou observando a garota dormir, fazendo carinho no cabelo dela. Inconscientemente, a loira se aproximou mais dele, descansando a cabeça sobre o peitoral desnudo.

Depois de um tempo Bruno também adormeceu. Pela primeira vez em dias ele se sentia completo.


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Notas finais do capítulo

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