I Can't Feel You escrita por Nihaxy


Capítulo 8
VIII. Deceptively Complex


Notas iniciais do capítulo

Meu planejamento inicial foi definitivamente abandonado, e essa fic vai ficar muuuuuito maior do que eu originalmente pensei. Ainda não consegui me decidir se isso é bom ou não, psé .-.

Nota: Esse capítulo retrocede um dia de onde o anterior parou (por conta da mudança de POV). Esse se passa no dia seguinte ao primeiro assassinato e à chegada do FBI (ou seja, Maura ainda não ouviu Jane no telefone com Casey, nem deixou a notinha, e ainda não teve a "briguinha" do cap. passado) :B



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Depois daquele primeiro homicídio, imediatamente após Jane ter saído da sala para a reunião com o FBI, Maura se sentiu mal por ter sido tão fria, distante, completamente diferente do habitual. E, por mais que doesse se afastar de Jane desse modo, a legista sabia que isso era apenas o necessário a se fazer. Durante todo o curso de sua vida, ela aprendera, do modo difícil, o que é se doar ao máximo por alguém e ser deixada de lado. Seus pais, as tentativas falhas de amigos durante o colégio e a faculdade, Ian, e, mais recentemente, Hope. Maura sabia o que era começar a formar um laço e só depois perceber que a outra pessoa só a suportava por interesse. Ela sabia o que era se apegar, deixar existir a esperança de que dessa vez ia dar certo, apenas para depois vê-la se esmigalhar em suas mãos.

Talvez, ela apenas servisse enquanto tivesse algo a oferecer. Fosse a possibilidade de uma boa nota, prescrições de remédios que seriam transportados ilegalmente ou um rim.

Ela sabia que Jane não era assim. Jane parecia realmente gostar de sua companhia, e não pedir nada em troca.

Era exatamente por isso que seria ainda pior quando ela se afastasse.

Maura sabia que, mais cedo ou mais tarde, Jane faria exatamente isso: se afastaria. Era lógico, teoricamente comprovado. Todos, no final das contas, se afastavam, a única variável sendo seus motivos para fazê-lo. Na maioria das vezes, porque já conseguiram tudo o que Maura poderia oferecer de seu interesse. Mas Jane... o distanciamento de Jane seria especialmente doloroso, porque, simultaneamente, ela se aproximaria de algum outro. Sim, porque Jane acabaria arrumando um bom pretendente e, eventualmente, casando com ele. Talvez não fosse Casey, mas alguém depois. Fosse quem fosse, não mudaria o fato de que haveria distância, e Maura sentiria, novamente, a perda.

A decisão de se afastar agora, apesar de à primeira vista parecer precipitada, era a mais lógica. Criar a distância aos poucos, retirar Jane de sua vida um pouco mais a cada dia, no final, doeria menos do que se isso fosse feito abruptamente. Ao contrário do que pensavam, puxar um band-aid de uma vez nem sempre era a melhor opção. Devagar, a legista poderia se programar para voltar à sua vida anterior, em que Jane não estava presente em cada segundo. Se desse sorte, o processo seria executado em tempo o suficiente para o corte final ser quase imperceptível, obscurecido na sombra do que um dia, num passado distante, fora significativo.

Se tudo corresse como o planejado, ela teria tempo de reconstruir suas muralhas, de se proteger de novo atrás da fachada fria a que se acostumara e reivindicara como sua. Não adiantava correr atrás de Jane, lutar por ela. Não quando a detetive claramente demonstrava interesse em outro, não quando o sentimento não era recíproco.

Desse modo, a legista pelo menos teria uma vaga sensação de controle. Era um consolo minúsculo se comparado com o todo da situação, mas ainda era melhor que nada.

Ela não levou em consideração sua inaptidão para ler situações que envolvessem pessoas. Ela não levou em consideração que, quando se tratava de sentimentos, várias vezes ela se enganava. Ela não levou em consideração o fato de Jane ser a única pessoa que ela não conseguia decifrar, escrutinar, entender. Com qualquer outro, a legista estudaria e analisaria as microexpressões faciais, os sinais subconscientes enviados pelo corpo, e interpretaria seus pensamentos, acharia sentido em suas ações. Com Jane, esse tipo de análise se provava ineficiente e, na maioria das vezes, frustrante. A morena era simplesmente mais complexa do que qualquer outro ser humano que já tivesse aparecido na vida de Maura, e, a cada vez que esta parecia encontrar algum sentido, parecia interpretar corretamente os sinais, Jane a surpreendia.

Chegara um ponto em que a loira desistira de tentar entender os motivos de Jane, e passara a aceitar que a detetive era imprevisível. Essa era apenas mais uma das características que tanto a atraíam. Frustrava, sim, mas essa espontaneidade, totalmente desconhecida para Maura até então, era revigorante, interessante... perigosamente viciante. Mas, ao contrário do que pensou, o encanto de tudo isso não se dissipou com o tempo, como geralmente acontece com tudo o que é novo. Pelo contrário, a cada dia que passava, Maura se via mais absorvida em cada minúscula partícula que formava sua melhor amiga. Que, na verdade, já deixara de ser melhor amiga há muito tempo... pelo menos na visão platônica – ou assim ela própria pensava – da legista. Uma coisa, porém, é admitir para si mesma estar atraída por sua melhor amiga. Outra, completamente diferente, era expor tais sentimentos para qualquer outra pessoa, principalmente para o objeto de sua afeição. O risco de estragar tudo era simplesmente grande demais.

A legista repetia essa e outras razões em sua cabeça, de novo e de novo e de novo, como se tudo fosse começar a fazer sentido e a dor fosse ser amenizada se ela dissesse isso vezes suficientes, se se convencesse que era o certo.

Maura foi tirada de seu mundo particular quando ouviu um pequeno barulho. Rítmico, deliberado, e ainda assim sutil ao ponto de poder passar despercebido para a maioria das pessoas. Considerando que ela estava no corredor do necrotério, mais de uma hora adiantada com relação a qualquer outro auxiliar, a legista estranhou um pouco, mas continuou assim mesmo.

Ali, sentada no chão – talvez jogada fosse uma expressão mais pertinente -, cabeça encostada na parede e pernas esticadas, completamente despojada, como se simplesmente tivesse caído de qualquer jeito e não tivesse se dado ao trabalho de corrigir sua posição, estava a agente que assumira o caso do serial killer – o caso de Jane. No chão ao seu lado estava, provavelmente, o maior copo de café que Maura já vira, e no piso do corredor se espalhavam folhas soltas e arquivos. A mulher estava tão concentrada lendo alguns papéis – simultaneamente batendo a caneta no chão e produzindo o som que Maura escutara – que sequer notou a aproximação da legista, até que esta estivesse praticamente à sua frente.

–Bom dia, dra. Isles. – cumprimentou, enquanto erguia os olhos da folha em suas mãos e tateava à procura do copo de café.

Como era de costume sempre que iniciava algum tipo de contato interpessoal, Maura examinou a outra, da maneira eficaz e sutil que aperfeiçoara ao longo dos anos, o movimento quase imperceptível a não ser pelo mexer frenético das pupilas. Ela notou os fios lisos e curtos, estilo Chanel, completamente bagunçados, amassados onde a cabeça encostava na parede. O rosto pálido, bem marcado, nariz fino e lábios levemente avermelhados devido ao hábito da agente de mordê-los. O blazer estava jogado no chão e a blusa amassada – a mesma do dia anterior, Maura não pôde deixar de notar. Connors exalava fadiga pelos poros, o esgotamento físico e mental evidente desde os músculos relaxados até as enormes machas escuras abaixo dos olhos azul-elétricos.

–Bom dia, agente Connors. Essa posição não parece muito confortável. – Maura, sempre a cientista, notara em frações de segundo a postura da outra, e imediatamente começara a listar em seu cérebro os problemas de coluna que podiam advir dela. – Sua lordose lombar está praticamente invertida em relação ao arranjo normal, o que, apesar de cômoda no início, faz com que o corpo exerça uma tensão excessiva sobre seus músculos das costas e gera desconforto na região sacrococcígea.

–Me perdi depois do “confortável”. – a morena riu. – Mas não se preocupe, eu estou bem aqui. A não ser que esteja atrapalhando você?

–Não, não atrapalha. O turno só começa daqui a pouco mais de uma hora. Mas eu realmente recomendo um ajuste na sua postura. Se não se importar, no meu escritório há algumas cadeiras que não gerariam esse problema.

A título de resposta, Kate juntou rapidamente os papéis espalhados no chão em uma mão e pegou o café com a outra, enquanto Maura se virou para destrancar o necrotério.

–Sem querer ser rude – começou a legista –, mas não designaram uma sala especial para o FBI no andar de cima?

–Sim, designaram. Mas o barulho lá em cima estava um pouco demais para o meu gosto, e eu realmente aprecio o silêncio para me concentrar. Até tentei as escadas, mas um dos canos provavelmente está com problemas, rangendo um milhão de vezes por segundo. Esse corredor era minha última opção antes de sair do prédio. – completou, sorrindo.

Maura a guiou até o escritório, dizendo-a para ficar à vontade enquanto colocava a bolsa em cima da mesa. Connors agradeceu e se largou na poltrona mais próxima, enquanto a loira saía para verificar a sala de autópsia.

Dez minutos depois, quando Maura voltou ao escritório, encontrou a outra num estado de sono profundo, a folha quase escorregando da mão. A legista arrumou os arquivos que a agente trouxera na mesinha ao lado da poltrona, jogou o copo de isopor do café na lixeira e saiu da sala, apagando a luz e fechando a porta devagar.


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Notas finais do capítulo

Thanks for reading! :)