EMILY POV

Eu estava entediada. Sentada naquela maldita detenção. Só faziam meia hora, eu iria ficar uma hora lá. Sentada, sem fazer nada.

Após aquele interrogatório de Courtney e Alexis, finalmente voltei para a aula. Parecia que cada segundo demorava um ano pra passar. De repente, estudar não era tão legal. Porque eu não estava afim de estudar. Eu estava afim de ficar sozinha.

Foi então que eu decidi voltar pro quarto. Qualquer coisa era melhor do que ficar sentada na aula escutando a Sra. Taylor falar sobre palavras de sentidos contrários. Claro, cabular aula nunca foi meu forte. Eu odeio cabular aula. Mas depois de saber que eu era obrigada a passar uma semana na detenção e dar aula pro gatinho idiota do Jackson, eu NÃO iria assistir aula.

Afinal, deitar na minha cama quentinha era bem melhor. Eu estava lá deitada. Claro que não era tão agradável. O perfume da Courtney ainda tinha um cheiro forte pelo quarto todo. Mas eu não estava ligando, eu apenas deitei e fiquei pensando.

Eu sentia muita falta da minha mãe. Sempre que coisas bobas aconteciam comigo, eu chorava muito, porque minha mãe não estava lá comigo. Era o que eu mais queria, ter ela do meu lado. Então agora, eu só precisava de um belo sorriso de orelha a orelha como minha mãe dava. E por mais que parecesse esquisito, eu sentia saudades do meu pai. Eu queria ele por perto, como a Courtney e a Alexis nos mostravam os pais dela, como eles eram bonitos, carinhosos e alinhados. Mas eu sempre dizia minha desculpa atual: “Meus pais estão viajando”.

Eu não queria mentir para as meninas, afinal, elas são minhas melhores amigas. Mas não queria que todos soubessem a verdade sobre mim. Mentir não era legal. Até porque, minha mãe sempre dizia para se manter verdadeira.

Acordei dez minutos antes da detenção. Escovei os dentes e abri a porta do quarto. Poucas pessoas estavam pelos corredores. Nem sinal de Alexis nem Courtney. Elas deveriam estar andando pelo campus e falando mal dos outros, como sempre.

Eu amo essas meninas.

Fiquei andando um tempo e cheguei ao prédio. E se você pensa que estava sendo super-bacana a experiência de ficar de detenção, não foi. Ficar uma hora presa, trancada, com Jackson e mais uns alunos mais velhos que eu nunca vi por ali, não era nada legal. Nada legal mesmo. Eu estava começando a dormir sentada quando o tempo acabou.

- Ei, Emily – reconheci a voz e era Jackson atrás de mim no corredor – Amanhã depois da aula eu tenho treino. Não da pra ter aula com você – ele disse com cara de cansaço.

- Não ligo – falei me virando e continuando a andar, mas ele puxou meu braço novamente – O que você quer?

- Você pode me dar aula hoje? – ele perguntou sorrindo tentando me convencer – Aposto que você não tem nada melhor pra fazer agora. Por favor, me da aula.

Era verdade, eu não tinha nada melhor pra fazer do que ficar trancada no quarto estudando sozinha. Então, como uma completa idiota, concordei em dar aula pro Jackson. Eu era uma nerd idiota e amargurada. Eu só pensava em um jeito de dizer a verdade para a Courtney e para a Alexis.

- Tudo bem – disse em um fio de voz falhado.

- Legal – ele disse sorrindo e colocando a mão no meu ombro – Vamos?

Fomos andando até a biblioteca em silêncio. Claro que eu jogava alguns olhares para Jackson. Ele estava incrivelmente lindo naquela blusa coladinha de marca. E aquelas bermudas xadrez e um tênis que parecia ser velho... Ele estava muito bonito. E como se não fosse o bastante, sorria incontrolavelmente. O sorriso dele era branco e me iluminava.

- Ei – ele disse – Sei que sou lindo e tal, mas não precisa ficar me olhando.

- Te olhando!? – eu dei um grito e fiz uma voz bem típica de quando estava mentindo – Eu não definitivamente não estou olhando pra você!

- Por favor, definitivamente aprenda a mentir! – ele disse sorrindo com uma cara de quem estava me gozando – O que você gostou mais? O cabelo? O corpo? As roupas? O sorriso? Aposto que foi o sorriso!

Então ele sorriu novamente. Como Jackson era irritante e ao mesmo tempo, lindo... Lindo de morrer! Seus olhos azuis, agora, com uma expressão contente me encaravam, seu sorriso, branco, agora parecia mais pelas luzes da biblioteca refletindo nele. Seu cabelo, ligeiramente bagunçado, e sua blusa, agora, parecia mais apertada, realçando seus músculos.

- Sim, é sorriso – ele disse, parou de sorrir e adentrou na biblioteca, me deixando parada, plantada na frente da porta. E se você pensa que eu fiquei lá parada por uns dois minutos enquanto o Jackson idiota andava pela biblioteca achando uma mesa, sim, você está certo. Eu fiquei ali, plantada, tentando absorver como tinha me “entregado” a seu sorriso – Você não vem? Vai ficar ai, parada?

Adentrei a biblioteca, tive certeza que estava corada pelo “incidente” da porta da biblioteca. Olhei ao redor, ela não estava tão cheia. Seria fácil dar aula para o Jackson antes que ele pudesse se distrair com algo idiota. Como, um mosquito. Então, me sentei ao seu lado e abri minha mochila. Quando olhei para Jackson, ele estava sentado do meu lado, olhando pra mim com aqueles olhinhos que antes felizes, agora estavam tristes, com expressão cansada. Claro que pensei: “é tudo culpa minha, o Jackson está cansado de ficar sentado comigo porque sou chata e nem começamos a estudar”.

- Jackson, se você está cansado, podemos ter aula outro dia – falei, agora encarando o livro de Matemática que eu tinha nas mãos.

- Me desculpe – ele falou balançando a cabeça e agora me encarando – Eu estou cansado, mas você tem que me dar aulas e eu preciso de aulas – ele disse, agora sorrindo, mas ainda triste – Vamos?

- É, vamos sim – abri o livro de matemática e os cadernos. Ainda sentia Jackson me encarando.

- VOCÊ TEM UM PIERCING?

Merda, merda. Merda, merda!

JACKSON POV

Aquela nerd tinha ganhado meu respeito. Ela tinha, sim, ela tinha um piercing! Na orelha. E visivelmente, um buraco não fechado no nariz. No internato não era permitido nem piercings ou tatuagens. Caso contrário, você estava fora da escola se não removesse. Mas a nerd guardou muito bem seu segredinho pendurado no topo da orelha. Seu cabelo atrás da orelha me fazia ter uma visão melhor dela. O que parecia feio antes, agora, era bonito.

A nerd estava sem os óculos e seus cabelos, muito longos,  na cintura, estavam soltos. Eles eram ondulados e eram muito, muito bonitos. Sua pele já tinha uma cor natural morena, o que dava o ar que ela ia na praia quase todos os dias. O piercing agora, dava um ar mais rebelde a Emily. De repente, ela era linda demais para mim. Até mais bonita que a Hannah. Seus olhos verdes, antes, cobertos pelos óculos enormes, eram tão lindos. Verdes claros, quase azul. Uma cor indefinida, totalmente lindo. E sua boca, como não percebi antes? Carnuda. Ela mordeu a boca e eu percebi o que estava fazendo. Encarando a Emily do mesmo jeito que ela me encarou na porta da biblioteca.

- Jackson, você está bem? – ela perguntou, balançando as mãos na minha frente – Porque você esta de boca aberta e babando? – Sim, eu estava babando. Mas acho que a Emily foi boba demais para perceber que era por causa dela, a minha baba. Fechei a boca e sorri, em sinal de que estava bem.

- Eu não acredito que você tem um piercing – Foi a única coisa, que me pareceu inteligente que eu poderia ter dito. Eu poderia ter dito qualquer coisa tipo: “você é gata hein nerd”, ou “nerd, que isso! Porque nunca tirou esses óculos e mostrou esses olhos antes”? Mas nada me pareceu convencional.

- Eu fiz com 14 anos – ela disse, agora séria, curvando suas sobrancelhas grossas e totalmente feias em direção a mim – Não conte a ninguém, por favor!

- Tudo bem – eu disse, prestando atenção em cada detalhe do seu rosto, que agora parecida delicado, não bravo e curvado como antes – Me leva pra fazer um também, um dia?

- Tudo bem – ela sorriu e eu quase cai pra trás. Atrás de toda aquelas coisas de nerd, havia uma nerd gata pra caramba! Mesmo assim, ainda era nerd. E nerds não passavam por mim. Isso poderia soar idiota, mas as coisas são assim – Eu te levo, então, vamos começar a estudar?

- Não! – gritei, fazendo com que a bibliotecária mandasse o seu clássico “xiu” em sinal de silêncio – Você é bolsista?

- Por opção – ela respondeu tão rápido que eu até cheguei pra trás – Quer dizer – ela disse, agora sem graça, sorrindo – Meu pai e minha mãe não gostam de gastar com escola. Afinal, meus irmãos já reprovaram muitas vezes. Então surgiu a oportunidade da bolsa... – ela falou isso e seu tom de voz abaixou – E eu aceitei – ela sorriu.

- Entendi – falei, jogando a cabeça pro lado e tentando disfarçar a próxima pergunta que ela iria fazer: “e você, porque é bolsista”? Eu sou mesmo um idiota. Eu iria dizer que eu era pobre? Que minha mãe e meu pai moravam bem longe daqui?

Quer dizer, eu sou pobre. Não tão pobre, mas pobre pra estudar em uma escola dessas. Bem pobre. E como eu mantenho minha reputação, só a diretora sabe disso. A diretora é minha mãe “adotiva”. Sim, eu sou, adotado. “Adotado” não é palavra. Eu conheço meus pais biológicos, mas não vivo com eles. Vivo nesse internato desde os três anos. E a diretora, a Tia Katie, Katherine Brown, é minha tutora. Ela cuida de mim, como sempre cuidou a vida toda. Ela me dá tudo. Amor entre outras coisas materiais. Ela é muito amiga da minha mãe.

Mas disso, ninguém sabe. Eu não quero que ninguém saiba.

- Então – ela disse, quebrando aquele maldito silencio que estava entre nós – Vamos estudar matemática?

- Claro – falei, agora desanimado mais do que o normal – Vamos, matemática! – tentei me animar, mas foi em vão. Ela apenas soltou um sorriso de canto e tentou disfarçar que estava desanimada também. Ela colocou os óculos, prendeu o cabelo novamente e colocou aquele maldito aparelho móvel que cobria sua boca.

O encanto da Emydiota tinha acabado.