Caída escrita por P H Oliver


Capítulo 6
Conflito Interno




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Passei praticamente toda a manhã de Domingo pensando no beijo que Jason me deu noite passada. A chama que havia sido acendida em algum lugar de meu peito ainda ardia vivamente a cada vez que lembrava o gosto dos lábios dele, da textura deles, ou apenas do seu nome. Mas a fome me faz parar de devanear. Penteio meus cabelos e os prendo num rabo de cavalo. Já havia acordado e tomado banho faz tempo. Quando desço, papai está sentado na mesa com o jornal aberto em suas mãos e uma pilha de waffles num prato a sua frente.

 - O cheiro está muito bom pai. – Digo

- Obrigado filha. Se sente. Há calda ao lado do prato.

Me sento e rapidamente espeto um waffle e o cubro de calda. Como praticamente metade do prato, coisa que raramente faço, mas acho que meu conflito interno estava me dando muita fome. Levanto meus olhos do garfo e vejo meu pai lendo o jornal com uma cara de espanto.

- O que houve pai? – Pergunto interessada, pois Paradise Fall’s não parece o tipo de cidade onde há algo que faça os pais se espantarem lendo o jornal.

- Um rapaz que estava trabalhando comigo na obra da cidade. Morreu ontem a noite.

Faço uma cara de espanto e pergunto:

- Como pai?

- No nosso local de trabalho está cheio de cordas passarinha. Para fixar no teto uns andaimes. Diz aqui que ele tropeçou e acabou se enforcando sem querer. Que horrível.

Estremeço só de pensar nisso. E se fosse meu pai?

- O que é essa obra pai?

- É a nova Prefeitura, querida. Ainda não havia falado para você?

- Não pai. Não havia.

- Desculpa. É que ando tão ocupado...

Isso é uma das coisas que gosto em meu pai. Ele me conta tudo, absolutamente. Mas ele andava tão ocupado a semana toda que não teve tempo de conversar comigo. Mas relevo (além do que, não estava nem um pouco a fim de falar com ele, pois poderia acabar soltando algo sobre Jason).

- Não precisa se preocupar pai. Eu entendo. Vou lá pra cima deitar um pouco. Talvez eu saia com a Judith mais tarde ok? – Adicionei a saída com Ju de última hora, pois não queria passar a tarde pensando no Jason.

- Ok filha. Mas, por favor, tome cuidado!

Subo as escadas como um zumbi, e fecho a porta do meu quarto. Lembro que havia anotado o número de Judith em algum lugar. Começo a revirar meus cadernos e livros, até que acho um pequeno papel cor de rosa onde está anotado um número em caneta roxa. Com certeza é o número da Ju, penso. Pego meu IPhone e disco o número. Depois do terceiro toque, alguém atende no outro lado da linha.

- Alô? – Diz a voz pomposa da Judith do outro lado.

- Ah, oi Ju. É a Courtney.

- Oh, oi Courtney. Tudo bem?

- Sim, sim, tudo bem. Eu só liguei para saber se você não gostaria de sair para passear depois, sei lá. Só uma volta por uns quarteirões para ver se conheço um pouco mais da cidade.

- Claro, com certeza. Que horas?

- Umas três horas, tá bom?

- Tá sim. Você passa na minha casa?

- Onde fica?

- Av. Paradise, 2010.

- Ah... Não brinca Ju! É na mesma rua que a minha casa!

- Sério?! Então porque não passa aqui para almoçar? Tenho certeza que não será nenhum incomodo para minha família. Passe aqui uma hora. Te espero, beijos.

Ela desliga o telefone antes que eu possa contrariar.

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Agora estou na frente do espelho vendo se minha roupa está vulgar demais. Ou fresca demais. Ou feia demais. Enfim, apesar de ser somente um almoço na casa de minha melhor amiga (sim, já havia promovida ela para melhor amiga), queria parecer uma boa pessoa aos olhos dos pais dela (e quem sabe do irmão totalmente gato dela).

Estou com um short florido que combina perfeitamente com o clima de verão que continuava lá fora e uma camiseta rosa. Meu rabo de cavalo passa pelo buraco de trás do meu boné branco. Em meus pés tem somente uma sandália de dedo rosa.

Desço e percebo que a casa tá num silêncio total. Papai devia ter saído novamente. Pego as minhas chaves em cima do criado mudo ao lado da porta, saio e a tranco. O ar está com cheiro de asfalto e flores exóticas que floresciam em cada esquina da cidade. Saio pela rua procurando pela casa 2010, até que a encontro. É uma casa muito bonita, com um caminho de pedra que levava diretamente até a porta. Ao lado do caminho havia pequenos arbustos com flores vermelhas delicadas, e entre elas havia gnomos de jardim. As paredes da casa são pintadas num tom de bege, que já estava desbotando, mas dava um belo charme a casa. Na varanda da frente, havia cadeiras de balanço e mesinhas com revistas em cima. Sigo pelo caminhozinho de pedra e paro em frente a porta. Respiro fundo várias vezes. Acalme-se e não se comporte como uma retardada Courtney. Toco a campainha e espero. Quem abre a porta é um senhor de cabelos cobre (e alguns fios grisalhos que lhe davam um ar de coroa sexy). Devia ter no máximo quarenta e cinco anos. Usava óculos de armação preta, camisa de manga branca e uma bermuda simples.

- Você deve ser Courtney – Diz ele com uma voz grave e levemente rouca.

- Ah, sou sim. Prazer em conhecê-lo, Sr.. – Nessa hora percebi que nunca havia perguntado da Judith o nome dos pais dela. Nem o sobrenome dela.

- Sr. Carlos. Carlos Benson.

Ele estende a mão para mim e eu a aperto. Ele faz um gesto me convidando a entrar. O que faço rapidamente, antes que o nervosismo tome conta novamente de mim. Ao passar pela porta sinto um delicioso cheiro de carne assada e batatas, que vem de um compartimento bem a minha frente que julgo ser a cozinha. A sala é modesta, o que não a impede de ser magnifica. Os sofás são de tecido preto com flores brancas desenhadas. A mesa de centro com certeza é mogno, há uma televisão de LCD numa escrivaninha muito linda. E não posso esquecer o tapete. Ele era todo felpudo e muito, muito fofo.

- A Judith está lá em cima no quarto dela. É a primeira porta a esquerda minha querida. Quando o almoço aprontar nós lhe chamamos.

- Ok, Sr. Benson. Obrigada.

Subo as escadas da casa e paro no último degrau. Saindo de uma das cinco portas do corredor, que julgo ser o banheiro, vejo Fred enrolado em uma toalha. Eu quase deixo escapar um nossa. Mas me controlei. Como ele não me notou, parei em frente da porta que devia ser a do quarto de Judith e bati.

Depois de um estrondo de dentro do quarto e um palavrão baixinho, Judith aparece na porta.

- Ah, oi Courtney! Entra – Diz ela abrindo a porta para mim.

O quarto dela é lindo. As paredes são de um violeta bem clarinho, e o teto era branco com detalhes em gesso nas bordas das paredes. Havia também nuvens pintadas no teto e um sol radiante. Parecia tão real que parecia que ela tinha um sol particular. As paredes eram cheias de prateleiras com livros e cd’s. E reparo que ela tem basicamente o mesmo gosto que eu. Há uma escrivaninha com um notebook e um guarda roupa também de mogno.

- Não é muita coisa, mas é... Aconchegante – Diz ela.

- Nada a ver Ju. Eu achei lindo demais.

- Senta aqui – Diz ela apontando para a cama.

Sentamo-nos e ela desata a fazer perguntas:

- Por que você teve que ir embora do shopping ontem?

- Ah, meu pai estava preocupado comigo, então achei melhor ir para casa... Mas preferia não ter feito isso. – Pensei alto, alto demais, e ela ouviu, o que só fez atiçar a curiosidade dela.

- Por quê?

- Bem... – Começo, incerta se devo dizer para ela. Decido que sim. – Bem, Jason estava me esperando no meu carro. – Nessa hora ela arregalou os olhos. – E ele... Ele me beijou.

Agora, nessa hora, os olhos dela só faltaram saltar das órbitas.

- Eu não posso acreditar! – Falou ela exaltada. – Por quê?

- Por que o que? – Digo confusa.

- Ora Court... Agora vai ser fácil para ele te manipular... E usar você e sabe Deus o que mais...

Nessa hora me lembrei de algo que Jason disse: “Ela sabe mentir muito bem”.

- Hum... Judith. Posso te perguntar uma coisa?

- Ah, claro que pode. Manda.

- Ontem à noite, Jason disse que você... Que você sabe mentir muito bem... Devo acreditar no que ele disse? – Perguntei com medo da reação de Ju. Eu sabia a ira que aquela baixinha continha dentro de si.

- Sabe Court, você é a minha única amiga... Sabe amiga verdadeira, digamos. Eu confio em você, mas do que confio em June ou Paige. Bem, eu sei mentir muito bem mesmo. Mas acho que você merece saber tudo sobre mim. Eu namorava o Jason, logo quando ele chegou. Eu não te contei, mas ele era meio que um delinquente naquela época. Eu também segui a onda dele, passei há furtar um pouco ali e um pouco aqui... Tentei roubar a casa do prefeito uma vez sabia? Ai, ai... Quase que me ferro. Mas papai é amigo do prefeito. Ele me limpou dessa. Tai, agora você sabe...

Dessa vez não fiquei chocada com nada do que ela me disse. Apenas sussurrei para ela:

- Nada do que ele, ou qualquer outro, fale me fará mudar de ideia sobre a pessoa que você realmente é Judith. Você pode até ter feito isso, mas foi no passado. Eu sei que agora você realmente é uma boa pessoa. E tenho um prazer imenso em poder chamar você de amiga.

- Oh, Courtney. Obrigada. – Nessa hora ela me deu um abraço apertado e caloroso, e senti a necessidade de retribuir o abraço do mesmo modo.

- O almoço está pronto, crianças. – Disse Carlos, ou melhor, Sr. Benson, lá de baixo.

- É melhor nós irmos, antes que esfrie o almoço. – Disse Ju. – Ou antes que o Fred acabe com tudo.

Descemos as escadas gargalhando e todo aquele conflito interno com o qual estava sofrendo foi embora, abrindo espaço para o enorme apetite que havia surgido com o cheiro de carne e batatas que estava no ar.


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