Saint Seiya Memórias: História Oculta Do Santuário escrita por Katrinnae Aesgarius


Capítulo 62
Interlúdio :: Van Qüine


Notas iniciais do capítulo

Demorou, mas saiu!
Fazer batalhas é sempre um problema porque não quero ficar no ~copiar-colar, mas sempre mostrar variações e melhores dinâmicas de combate, além de, claro, permitir que o leitor veja e sinta toda a cena. E como há um mês chegou o servidor online de Saint Seiya, ajudou a ver alguns ataques e aprimoramentos, ajudando no que verão nesse capítulo e espero que gostem. :)



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Kiki havia acabado de guardar seus materiais e conferia o estoque de pó de estrelas que trazia enquanto se dirigia para suas dependências. Neste momento sentiu uma explosão de Cosmo, e sabia bem de onde viria aquilo. Olhou às suas costas como se pudesse ver a Oitava Casa. Imediatamente sentiu aquele Cosmo colidir com outro tão agressivo quanto aquele primeiro.

— QÜINE! — reagiu de imediato, largando tudo aquilo que trazia com ele e correndo em direção à saída de Áries rumando pelas escadarias.

 “A Armadura... Ela nunca mostrou tanta energia assim!”, pensou o ariano apreensivo. Teria que pensar em algo para explicar ao Qüine, sem revelar o que acontecia. Enquanto ele não aceitasse o seu destino e não se sagrasse Cavaleiro, nenhum esclarecimento sobre aquilo poderia ser prestado.

Ao chegar à Terceira Casa, constatou aquilo que temia. Sentiu o sangue sumir de seu corpo com o rápido pensamento que lhe veio. Foi então que o ariano apertou o passo, receoso do que poderia estar acontecendo. Por mais óbvio que fosse, tinha esperança de que pudesse encontrá-lo ainda mais à frente, nas escadarias. No entanto, foi Merihk quem ele avistou, correndo, trajado com sua Armadura de Câncer.

— O que foi essa Cosmo energia que senti? — indagou o Canceriano perplexo. — Só vi algo assim quando VOCÊ foi atacado, há três anos!

— Eu não sei! Apenas espero que não seja tarde demais! — o Ariano respondeu tentando disfarçar seu medo.


───────.∰.───────

Qüine aterrissou em segurança do outro lado da sala, sentindo o rosto queimar. Um filete de sangue desceu quente por sua bochecha, de um corte pouco abaixo de seu olho direito, indicando que escapou por muito pouco. O ar estava ficando denso, difícil de respirar, como se estivesse pressentindo que algo estava para acontecer.

No pedestal, onde descansavam os restos da Armadura de Ouro de Escorpião, um violento Cosmo parecia queimar como chamas douradas.

“O que diabos é isso?! De onde vem esse Cosmo tão agressivo?!!”, pensou ele engolindo a seco.

Uma sombra começou a se formar atrás da indumentária, tomando a silhueta de uma pessoa. O rapaz não conseguiu evitar de sentir um calafrio. Quando em Jamir, Kiki havia contado que as Armaduras, por vezes, podiam projetar ilusões para testar as pessoas próximas. Contudo, aquilo parecia real demais para isso.

Ele engoliu a seco naquele momento, mantendo seus olhos verdes arregalados enquanto se colocava ereto novamente. Poderia simplesmente teleportar-se para longe dali ou mesmo usar a sua ‘Outra Dimensão’ para retornar à Gêmeos, mas apenas fechou o punho e sua expressão ficou mais dura diante daquilo, numa seriedade incomum ao rapaz sempre tão debochado.

— Muito bem. Se isso é um teste, eu aceito ser julgado por você... Escorpião! — disse ele ascendendo seu Cosmo.

Diante dele, uma versão fantasmagórica de alguém, como se tivesse trajando aquela indumentária dourada, se colocava em guarda. Uma sombra cujas garras vermelhas e incandescentes pareciam ser tão sólidas quanto a proteção. Mas todo o resto parecia etéreo.

Não demorou para que surgisse uma segunda, logo à sua frente, com uma mão prestes a rasgá-lo.

Qüine imediatamente se teleportou, assustando-se com a forma dinâmica e ágil que aquilo se colocou diante dele. Jamais havia presenciado algo assim, o que não deixou de assustá-lo naquele instante.

“Como se luta contra uma imagem etérea...? Não há sombra ou um corpo para se atacar, então como poderei atingir isso?”, pensava enquanto a assistia de longe e vendo atingir um nada.

Porém, sentiu os pelos de sua nuca arrepiarem ao perceber um movimento ao seu lado. Instintivamente rodopiou o corpo, vendo uma mão em chamas passar rente à sua barriga de um modo perigoso. O calor foi o bastante para queimar sua pele alva dolorosamente, fazendo-o praguejar. O que quer que fosse aquilo, parecia muito bem-disposto a matá-lo.

Impressionado, ele olhou na direção de onde saltara, vendo a primeira imagem estática daquele Escorpião desaparecendo lentamente.

“Um reflexo?!”, deduziu em seus pensamentos, compreendendo o tamanho do perigo em que se encontrava. “Essa coisa é tão rápida que seria capaz de enganar até mesmo os olhos de um Cavaleiro de Ouro!!”

Nem bem terminou de pensar isso e se deu conta de que a sombra havia novamente surgido a sua frente. Qüine teve tempo apenas para se preparar para receber o impacto de um chute violento. Sentiu as esporas do calcanhar da Armadura Sagrada cortarem seu braço, seguida do impacto contra a parede.

“Essa coisa vai me matar se eu não fizer algo logo...”, ele praguejou, enquanto se levantava. Estranhou que a sombra não tivesse caído sobre ele naquele momento. Ficou bem vulnerável por alguns milésimos de segundo, fácil de ser atingido por aquelas garras flamejantes.

Ele a viu aterrissar há bons metros dele, e parecia encará-lo, assim como ele o fazia. Pode perceber melhor sobre seu oponente. A Armadura tinha formas mais esguias e graciosas, embora mantivesse o ar ameaçador. Um reflexo prateado e vermelho tomava o local onde deveria estar o rosto, talvez sugerindo uma máscara.

O Geminiano custou a se colocar de pé, mas não deixou de perceber quando seu oponente assumiu a postura de combate novamente, deixando-o novamente cismado.

— Espera...! Essa guarda...! — O rapaz murmurou, arregalando os olhos.

A perna esquerda da sombra estava semiflexionada, como que apoiando o peso nela. O corpo estava parcialmente de lado, com o braço direito erguido, na altura da cabeça, enquanto o indicador incandescente apontava em sua direção. Não tinha engano. Ele já tinha visto aquela postura e nem fazia tanto tempo assim.

Era a mesma que Antares adotou quando o enfrentou pela primeira vez.

Ele mordiscou os lábios, cruzando os braços frente ao peito antes de abri-los, com as palmas da mão aberta enquanto fazia a Casa de Escorpião ser engolida pelo vazio e dois planos paralelos surgissem sobre seus pés e acima da cabeça, como se mundos e universos distintos se colidissem.

A primeira vez que fizera aquilo, seguindo instruções de sua mãe sobre aquilo que seu pai chamava de 'Outra Dimensão', despertou tamanho encanto tanto quanto os perigos que aquele mundo dimensional poderia causar. Inclusive, aquele lugar poderia levar a qualquer mundo ou mesmo mundo algum. Embora fosse um mundo sem paredes e uma linha reta até onde os olhos alcançavam, era um verdadeiro labirinto para o infinito.

No entanto, aquilo não parecia ser suficiente. Na verdade foi surpreendente!

Novamente o oponente ressurgiu bem a sua frente. Porém, dessa vez, ele a percebeu com milésimos de segundos de antecedência, o que foi o suficiente para ter uma reação mais precisa. Foi capaz de não somente se esquivar de suas garras como experimentou segurar o braço protegido, ficando satisfeito em perceber que conseguia fazê-lo. Aproveitou o impulso da ilusão e a arremessou para longe, na direção dos confins cósmicos, certo de que os ventos dimensionais a puxariam e dariam fim àquela imagem.

Contudo, arregalou novamente os olhos ao perceber a imagem aterrissar em segurança e arrancar em sua direção em uma corrida em zigue-zague.

"Isso consegue andar livremente assim, na 'Outra Dimensão'...?!!", pensou Qüine surpreso com a agilidade dela naquele espaço criado por ele.

Aguardou o momento preciso, percebendo que ela viria para deferir um ataque como anteriormente, para abrir a fenda dimensional. Foi quando notou sua maior aproximação visando confundi-la enquanto ele mesmo se posicionava do outro lado do plano. “Essa coisa consegue desviar dos ventos dimensionais... Como isso é possível?!”

— Quem ou o que diabos é você e como sabe andar no espaço dimensional? — indagou ele, por mais que soubesse que, quem ou que quer que fosse, não responderia. — Já estou cansado dessas malditas recepções e desses testes...! — e cruzou os braços no alto.

As linhas dimensionais, antes retas, curvaram-se conforme o Geminiano girava o pulso, criando um funil por trás daquela figura espectral. Sentiu um calafrio ao perceber que seu oponente se voltava discretamente para trás.

Era perceptível o brilho do que seria seus olhos, observando aquilo o que ele fazia, por cima do ombro. Se aquela coisa sabia como se mover naquele espaço, esperava apenas que ela não tivesse ideia do quanto ele poderia mexer com aquele espaço dimensional. Do contrário, estaria muito encrencado.

Tal como antes, aquela ameaça buscou se deslocar, mas sentiu-se impedida de tomar uma ação rápida devida inércia provocada pelo plano. Sentia-se puxada, quando buscava seguir à direção oposta, conseguindo assim anular qualquer ação que intencionava.

No entanto, após o impulso nulo, foi preciso fincar suas garras flamejantes na distorção temporal, ficando quase completamente rente ao chão ao sentir que seu corpo era puxado cada vez mais violentamente para o funil.

— Se quer brincar... então vamos brincar! — dizia Qüine enquanto concentrava uma gama de Cosmo em seus punhos, os braços ainda erguidos e cruzados no alto da cabeça.

Por um instante ele estava certo ter visto a sombra daquela figura espectral reagir ao que ele estava pronto para fazer. E sim, aquilo faria uma última investida contra ele numa ação suicida. Por mais uma vez, viu aquele ser 'explodir' seu Cosmo buscando sobrepujar a força que o puxava. "Não tenho muito tempo...!", pensou Qüine deixando seu Cosmo também ascender com mais força.

Um lampejo e a criatura havia desaparecido. No entanto, diferente de antes, não havia como ziguezaguear com o plano distorcido e só havia dois caminhos a tomar. O jovem Geminiano tinha apenas uma única decisão e arriscou tudo nessa hipótese.

Sorriu de canto observando os planos e percebendo uma leve nuance numa das linhas e desapareceu, no mesmo instante que garras rasgavam o ar deixando quatro linhas de fogo tomar o vazio com alguns fios de cabelo. Nem bem teve tempo de compreender o que houve quando uma luminosidade surgiu bem diante dela enquanto mãos abertas irradiavam o Cosmo até então concentrado a poucos metros de onde estava.

— EXPLOSÃO GALÁCTICA! — exclamou Qüine naquele instante, fazendo galáxias, planetas e estrelas se unissem num só elemento e explodissem contra seu alvo.

A criatura cruzou os braços diante do rosto mediante a luz, rosnando por aquilo, sentindo sua pele queimar como papel. Novamente a viu correr na direção dele, desviando como podia daquelas chamas de um dourado quase pálido que a queimava.

O jovem Geminiano mantinha os braços cruzados, concentrando os golpes de explosão, ao mesmo tempo que virava a mão manipulando a intensidade do vácuo que puxava aquele fantasma. Percebia seu intento e aquilo o preocupava.

“Vai... m-maldita...!”, pensava mais uma vez quando a viu saltar em sua direção, certamente usando todo seu Cosmo para aquilo.

— AH... QUE SE FODA! — gritou ele descruzando os braços, deixando o último golpe surgir, mas não sem antes usar o último resquício de seu Cosmo, concentrado em seu punho, para um soco contra seu rosto, ainda que sentisse algo queimar seu ombro e empurrando este para trás.

Sentiu que atingira algo rijo e que o despedaçou, e como suspeitara, era uma máscara. Um olho vermelho e reluzente se mostrou, com uma fenda negra em seu centro, encarando-o desafiadoramente.

“E-esse olhar...!”, Qüine pensou, engolindo a seco.

Ele caiu ajoelhado enquanto assistia 'a coisa' ser tragada pelo espaço dimensional juntamente com seu ataque como que engolido por um buraco negro.

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Merikh e Kiki chegaram ao Oitavo Templo entregue às escuras, mas a atmosfera presente ali era de tensão e com resquícios dos Cosmos que ainda se dissipavam. A luminosidade no centro do edifício foi que guiou eles.

A armadura de Escorpião, ainda que com inúmeras fissuras e partes faltantes, irradiava sua luz dourada que esmaecia a cada instante. A cauda do Escorpião presente no elmo que se mantinha no alto com sua ponta flamejante, se apagava.

Encontraram Qüine no outro lado da sala, ainda bem próximo à parede onde foi arremessado inicialmente e onde mais permaneceu ao longo daquela rápida batalha. Estava arfando, com um dos joelhos no chão enquanto se apoiava na outra perna dobrada sentindo a dor excruciante da agulha em seu ombro esquerdo. Um sangue escuro e quente descia pelo seu braço.

“Sinto como se... meu corpo estivesse... entrando em ebulição... de dentro... pra fora...!”, pensou ele.

O Geminiano voltou-se para a armadura esmaecendo, sorrindo com aquilo, meneando negativamente ao pensar que foi bem-sucedido naquele mísero teste daquela armadura quebrada, embora ainda pensasse naqueles olhos que viu segundo antes daquela imagem espectral ser, finalmente, tragada pela fissura dimensional.

“Desgraçado...!”, praguejava mentalmente enquanto buscava se colocar de pé, mas a dor se tornava insuportável. Ainda assim, não o impediu de concentrar o mínimo de Cosmo em seu punho acreditando que aquela ‘coisa’ espectral tivesse retornado. No entanto, ouvir seu nome ser chamado o fez respirar aliviado.

— QÜINE?! — gritou Kiki, ouvindo ele dizendo ‘Estou aqui’ a alguns metros adiante. Encontrou o rapaz caído, ajoelhado ao chão. “Por Athena...!”, suspirou mais aliviado.

— Por que eu não estou surpreso com isso...? — Merihk questionou, com uma feição desgostosa, olhando do jovem para o restante da sala. — O que aconteceu aqui? Aliás, o que VOCÊ está fazendo aqui?

— Para o inferno com a bronca de vocês! — respondeu ele tentando, mais uma vez, se colocar de pé. — Façam isso... quando... eu sair daqui... e cuidar... da porra do veneno dessa... armadura maldita... e mal-agradecida!

— C-como é que é?! — o ariano questionou surpreso, olhando para ele e para a vestimenta destruída sob o pedestal.

Ela permanecia ali, como se nada tivesse acontecido, desprovida de brilho ou de qualquer sinal de Cosmo, ainda que tenham visto algo quando ali chegaram. Os dois se entreolharam intrigados erguendo seus semblantes.

O Ariano havia sentido uma segunda presença ali, quase tão intensa quanto a que percebiam quando Antares estava a treinar naquele lugar. Entretanto não havia ninguém por perto. Seu olhar pousou sobre a Armadura de Escorpião como quem acusava alguém de um crime.

“Será que ele conseguiu, ainda que por um instante, despertar a Armadura do mesmo jeito que a Mascotinha?”, o Canceriano se flagrou interrogando em pensamento. “Mas, segundo o Kiki, isso seria impossível!”

— Bom, eu concordo com o depravado. — Câncer falou, desviando o olhar. — Vamos sair daqui e cuidar desse ferimento... embora eu duvide muito de que ele vá morrer por causa disso. Vaso ruim não quebra!

Qüine olhou de soslaio, praticamente fuzilando-o com o olhar. Levantou o braço esquerdo para apontar na direção do Canceriano, o mesmo braço onde o ombro foi alvejado. Aquilo fez sentir uma forte dor onde apenas conseguir angustiar-se ainda mais, fazendo com que o Dourado de Câncer apenas sorrisse com aquilo.

Kiki foi de encontro ao irmão para que este se apoiasse nele e seguirem de volta para Gêmeos. O rapaz soltava murmúrios revoltados, enquanto acusava a armadura, e quem quer que fosse aquela ‘fantasminha’, como ele mesmo disse com puro escárnio. Aquilo deixou os dois Dourados ainda mais intrigados com o que quer que tivesse acontecido ali.

Entre as colunas, na área entregue à penumbra do oitavo templo, nem bem notaram que havia mais alguém presente, mantendo-se oculto e escondido nas sombras. Quando desapareceu, apenas deixou alguns fragmentos dourados cintilarem como indício de sua presença.

.

.

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— QUE INFERNO! — exclamou Qüine ao ser colocado em sua cama em Gêmeos.

— Não blasfeme, moleque! — interveio Merikh parando junto à porta, cruzando os braços. — Ainda nos deve uma resposta sobre o que diabos fazia lá em cima.

— Qual... a relevância disso agora...? — retrucou o Geminiano enquanto Kiki avaliava o ferimento, pressionando a área avermelhada e com ramificações que seguiam pelo braço. — Isso... queima... demais...!

— Isso é veneno, Qüine... — disse Kiki, rasgando a camisa do rapaz, para evitar que continue movendo o braço. — Não sei dizer ao certo qual é, mas parece do tipo que deixa o local da picada hipersensibilizado. — e colocou a mão sobre a pele, sem tocá-la. Podia sentir o calor dali.

Ao recolher a mão, o simples deslocamento de ar provocado foi o suficiente para fazer o jovem uivar de dor, deixando os dois Cavaleiros de Ouro em alerta. Nunca tinham presenciado algo como aquilo.

— Isso não me parece bom... — comentou Merikh olhando aquilo. — Foi uma única agulha? A armadura pode fazer isso, ainda que quase morta?!

— Pelo que vemos, pode. — replicou o ariano. — Fique aqui. Eu vou orientar os criados. — e saiu.

Merihk nada fez senão observar o ariano se retirar. Voltou sua atenção para o Geminiano que se contorcia de dor, suando demasiadamente, inquieto na cama. Aproximou-se um tanto desinteressado enquanto olhava a ferida dele.

— E então, garoto. O que foi fazer no Oitavo templo? — indagou mais uma vez, notando a expressão enraivecida do rapaz pronto para responder de maneira grosseira como nas últimas vezes. — Pensaria duas vezes antes de responder de modo malcriado. Não está em posição disso.

— Isso... não é... da sua conta...! — respondeu entredentes.

O Canceriano apenas respirou fundo e sorriu de canto, algo que fez Qüine se arrepiar. Nem bem sabia se era pelo sorriso maldoso do Dourado ou dos calafrios provocado pelo ferimento. Apenas acompanhou com o olhar ele levantar um dedo e inserir em seu ferimento, fazendo-o urrar de dor por aquilo meio a impropérios.

— Vou perguntar mais uma vez. — dizia o canceriano mantendo a calma na voz e ignorando os gritos do garoto. — O que fazia no Oitavo Templo?

— DESGRAÇADO! — urrou Qüine encolhendo-se. — APENAS QUIS VER A PORRA DA ARMADURA E DEI UMA GOTA DO MEU SANGUE... ISSO QUEIMA, SEU MALDITO FILHO DA P...!

— MERIKH! — ouviu-se Psychē surgindo na porta, também em sua indumentária dourada de Peixes. — O que está fazendo? Pare com isso ou lanço meia dúzia de Rosas Piranhas sobre você!

Ele removeu a mão, mantendo o sorriso no rosto enquanto se voltava para a Pisciana com seu notório cinismo.

— Calma, Peixes... — e levantava as mãos. — Apenas estava querendo saber o que nosso moleque depravado de Gêmeos fazia na Casa de Escorpião em PLENA MADRUGADA! — e mudou sua expressão de sorriso para uma seriedade aterradora.

— Eu também vim aqui por conta do que vi. — disse a Pisciana alternando entre os dois. — Senti um Cosmo explodir seguido de uma luz vindo de um dos templos. Pensei que se tratava de alguma invasão e mandei os Cavaleiros de Prata e Bronze em serviço patrulharem tudo! Com exceção dele, está tudo bem?

— Fora que interromperam meu sono por conta de uma estupidez sem tamanho...? — Merikh arqueou o semblante. — O que é, garoto? O diário da mamãe está entediante?

— Merihk, vai... — Qüine responderia quando era Kiki quem entrava no quarto silenciando-o.

— Diga isso ou te deixarei sem falar por uma semana e sabe bem como. — e colocou uns unguentos na mesa ao lado, vendo Qüine se calar. — E isso vai arder um pouco, mas logo vai aliviar isso... Espero!

— Duvido! — Merikh falou, cruzando os braços. — A única pessoa entre nós que poderia ser capaz de anular esse veneno está desacordada. — Explicou com alguma preocupação. — Mesmo ela, às vezes, passava três ou quatro dias lutando contra o efeito disso no próprio corpo.

Psychē apenas deu uma cutucada nele, chamando sua atenção por aquilo.

— Falei mentira? Além do mais, o que deu na sua cabeça de achar que deveria dar sangue seu para aquela armadura? — questionou o canceriano enquanto fitava Qüine. — Não tinha nada para fazer lá. O que aconteceu exatamente?

— Você disse que ia dormir e sobe até o Oitavo Templo...? — indagou também Kiki enquanto fazia compressa na ferida, fazendo o irmão se encolher de dor.

— Que tal... deixar... o interrogatório... para outra hora...? — suplicou ele, arfando. — Sirvo de alvo para rosas... podem me enviar para o inferno... num caixão de cristal... mas agora... — engole a seco, olhando para o ariano. — Só faz essa queimação parar...!

— Ela não irá parar enquanto você não disser o que foi fazer lá em cima, moleque. — Merihk falou sem rodeios. — Você viu aquilo, não foi?

— Fui saber... o que aconteceu... àquela garota... — comentou ele, cerrando os dentes de dor, chorando. — Saber... porque... ela se feriu tanto...!

Kiki o olha surpreso, enquanto Merikh e Psychē apenas trocam olhares sem nada dizer.

— Eu sei... que não me contam... enquanto não me sagrar Cavaleiro... então... fui saber... por conta própria... — murmurava.

— E por que dar seu sangue à armadura sem consentimento meu depois do que conversamos, Qüine?

— N-não me pareceu... uma má ideia... Ela... parecia tão... morta... — O rapaz disse, levando o braço bom aos olhos. A pouca luz do local estava começando a incomodá-lo.

— Façamos assim... — dizia Kiki buscando encerrar aquele assunto. — Conversaremos melhor sobre isso pela manhã, está bem? — e colocou uma compressa em sua testa. — Que isso te sirva de lição!

Qüine nada disse, apenas assentiu. Uma das servas da casa voltava com uma bandeja e um chá, do qual o lemuriano tomou para si e serviu ao irmão. Disse que ajudaria aliviar as dores, mesmo ciente que aquela seria uma longa noite.

Merikh e Psychē deixaram o ariano sozinho com o irmão que continuava a transpirar e gemer de dor de hora em hora. Kiki, logicamente, se mostrava preocupado pela displicência do mesmo, lembrando do quão curioso ele ficava cada vez que omitia determinados assuntos e o rapaz sempre buscava um jeito de descobrir.

A conversa que ambos tiveram antes de tudo aquilo, o deixou intrigado. “O que ele queria com toda aquela conversinha...”, perguntava-se quando tentava conter a nova onda de dor e calor que o fazia transpirar incessantemente, precisando hidratá-lo forçando-o a beber água. Num único instante que o viu mais calmo, foi o momento que saiu para buscar mais água fresca.

Naqueles minutos sozinho, Qüine até chamou pelo irmão, mas não ouviu resposta. Aliás, tinha impressão de que nem bem ouvia sua voz quando sentiu alguém lhe dar algo para beber e agradeceu. Sentia a boca seca e amarga como de quando sentia febre muito alta. A visão estava turva pela penumbra. Afinal, a claridade estava a irritar seus olhos e parecia intensificar a dor. No entanto, por mais confuso que estivesse por conta da dor, sabia que aquele contorno não era de seu irmão.

— Q-Quem... Quem é você...? — murmurou ele.

— Apenas, beba! — sussurrou a pessoa enquanto o ajudava a beber a água que tinha um leve gosto amargo. Ou seria sua boca? — Isso vai ajudá-lo com a dor.

— Estou... morrendo...? — murmurou de novo.

— Não, jovem Gêmeos. Não está morrendo. — e quem quer que fosse ali acobertado nas sombras, pareceu sorrir. — Apenas, descanse!

Ele piscou aturdido, assentindo, sentindo as pálpebras pesarem até que, finalmente, adormeceu.


───────.∰.───────

— Credo, Merihk... — censurava a pisciana enquanto subiam em direção ao quarto templo, pelos fundos da Casa de Gêmeos.  — O que acha que estava fazendo?

— Apenas queria saber o que ele fazia no Templo de Escorpião meio à madrugada quando deveria estar dormindo. — respondeu com seriedade e tom firme.

— E não pode esperar até ele estar melhor pela manhã? — repreendeu ela mais uma vez quando alcançaram o pátio frontal de Câncer. — Que cisma é essa?

— Não confio nesse garoto! — respondeu ele olhando-a incisivamente, sem piscar.

Psychē piscou aturdida com aquilo, sem nada a dizer naquele instante. Apenas ficou a observá-lo se afastar pouco mais em direção ao seu templo.

— Por quê? — indagou ela sem entender aquela afirmação dita pelo Canceriano. — Ele é o irmão do Kiki...

— Isso não vem ao caso. Nós dois sabemos quem ele é e de seu legado de Eras! —pontuou Merikh. — O Santuário ainda não esqueceu quem foi seu pai e ainda temem falar seu nome tanto quanto querem admirá-lo pela maneira como se redimiu... — e voltou para olhar o quarto templo, suspirando. — ... diferente de alguns que deixou um legado de assombros.

— Não está falando que esse garoto carrega com ele, também, a mácula de sua constelação, está? — questionou a Pisciana alternando dele para a Casa de Gêmeos que abandonaram.

— Há algo nele que me incomoda. — e se voltou para a companheira zodiacal que o fitava com ar interrogativo. — Não me olhe assim. Sabe bem que não cismo gratuitamente com alguém.

— Não é isso... — comentou somente. — O que exatamente está querendo dizer?

— Não sei dizer o quê ou o porquê. — comentou Merihk de volta. — Apenas que há algo nele que me intriga. Pensei ser mera impressão minha, mas hoje, quando ele ascendeu seu Cosmo e explodiu, percebi algo que ainda dissipava em Escorpião. O fato dele estar ali, apenas me deixa ainda mais incomodado do porquê ele estaria ali e conseguiria despertar a armadura, ainda que por um breve momento.

— Não sei como uma armadura morta como está a de Escorpião se negue aceitar qualquer oferta de sangue ou mesmo 'atacar' alguém. — dizia Psychē levando o dedo à altura dos lábios e batendo levemente sobre eles. — Por que isso?

— Já ouvi muitas histórias das armaduras guardarem memórias de seus Cavaleiros por conta do sangue que elas absorvem ou mesmo por compartilharem Cosmos... — comentava Merihk olhando para o Santuário. — Mas também sobre Cavaleiros e Armaduras se tornarem um.

A Pisciana se aproximou alguns passos do Cavaleiro enquanto ouvia-o falar sobre aquilo. Também ouvira falar sobre isso, mas sempre eram meras histórias contada por forjadores como o próprio Kiki dizia e, da qual, nem mesmo ele acreditava serem tão literais como as pessoas contavam.

— A maneira que fala, é como se a Armadura absorvesse a alma dos Cavaleiros para si... — disse ela com um sorriso nervoso, fitando-o. — ... e como se ela pudesse se manifestar mesmo com elas. — e engoliu a seco por aquilo. — Isso é assustador!

— Exatamente isso que estou dizendo. — respondeu Merikh com calma, fitando a companheira com aquele seu olhar sombrio e distante. — A armadura pode estar morta, mas as memórias e a alma dos Cavaleiros que um dia a trajaram, estão vivas o bastante para guardá-la e protegê-la... de quem quer que seja.

 


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Notas finais do capítulo

Bom, eu diria que "Memória" (in)felizmente vem chegando em sua reta final após dobro de capítulos que havia planejado. Como tenho dito, momentos sombrios virão e acho que criei um terreno já firme para a história que todos conhecemos. Preparem seus corações!!!



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